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É sob o rótulo de caboclos que os autores Galvão (1979) e Loureiro (2009) os percebem misturados aos demais habitantes. O reconhecimento da identidade étnica de índios, na etapa de integrados não vem acontecendo, e nem a autodeclaração como indígena tem ocorrido, visto que, em geral a identidade étnica é negada, manipulada, o que tem levado a invisibilidade diante do ―outro‖ não indígena.

Assim, ao se analisar a questão dos índios de Belém, segundo a perspectiva de Assis30, a presença deles é requisitada em eventos, porém sem a continuidade de uma política que trate da temática indígena ou de demandas específicas para essa parcela da população citadina. Esse fenômeno, somado à questão demográfica dos indígenas presentes em Belém, os quais somam 2.268 indígenas (IBGE, 2010), provavelmente remete à dificuldade encontrada na tentativa de organização política desses indígenas.

A cidade de Belém possui muitos ambientes culturais, dentre os quais se destaca o Memorial dos Povos Indígenas, cuja obra pretendeu dar destaque a presença indígena, além de reforçar a ideia de que o lugar poderia servir como referencial para a construção da identidade étnica, em local diferente da aldeia. Essa construção foi realizada durante a gestão do Prefeito Edmilson Brito Rodrigues do Partido dos Trabalhadores (PT). Na gestão petista

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foi realizado o Congresso da Cidade no período de 2001 a 2004, que segundo Rodrigues (2008, p. 365) foi uma experiência de democracia participativa, a qual ―[...] permitiu o debate e o exercício do poder decisório sobre todos os problemas e dimensões da cidade, sua gente e seu território, aperfeiçoando e aprofundando os instrumentos de democracia direta‖. Nesse sentido, Rodrigues (2008) informa que a população belenense teve acesso aos debates do congresso e com isso exerceram poder de decisão sobre os problemas da cidade de Belém.

Segundo Ponte (2005), no citado lugar31, após a sua fundação, realizaram-se encontros e exposições de produtos indígenas, no entanto as gestões posteriores interromperam a ocorrência desses eventos. A provável motivação para a construção desse Memorial, por parte do governante municipal da época, era de devolver a dignidade aos indígenas que contribuíram para a construção de Belém. Para os índios, tal espaço nunca foi ocupado com as finalidades propostas, visto que não o ocuparam efetivamente como espaço de exposição e comercialização de produtos indígenas e nem como território, espaço simbólico da aldeia na cidade.

Para Cardoso de Oliveira (1976, p. 63), a territorialidade construída é simbólica, é o local em que ―[...] procuram manter uma relativa forma de organização e de sustentação do grupo‖. O território simbólico permite que o grupo se mantenha organizado. No estudo desenvolvido por Patrício (2000) os grupos indígenas construíram no espaço territorial em que vivem, seja na aldeia, seja na cidade, um espaço simbólico que os aproxima em termos de pertencimento à mesma condição étnica.

Entretanto, a construção da territorialidade simbólica do Memorial em Belém foi passageira, efêmera, tanto para os índios, quanto para os moradores da capital, os quais não identificam esse espaço como relacionado à presença indígena. Assim, observa-se que a pretensão inicial com a referida construção não conseguiu atingir o seu objetivo, uma vez que os índios residentes em Belém são invisibilizados pela população belenense, embora seus monumentos sejam visíveis, conforme assinala Simonian (2010). As imagens apresentadas pela autora denotam a visibilidade indígena na cidade de Belém por meio dos monumentos, entretanto isso não ocorre em relação à visibilidade dos índios e não índios no cotidiano das relações sociais, isto é, nas relações concretas.

Outra característica da população indígena residente em Belém pode ser identificada em termos demográficos, pois, conforme já mencionado, é pouco representativa, daí sua

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Em Yázigi (2002), o lugar é um dos referenciais indispensáveis à vida, nas esferas do cotidiano, do trabalho, dos afetos e dos ideais, mas, desoladamente, com perdas indizíveis. E a personalidade do lugar é composta de vários suportes e formada pelo mais amplo sentido da ecologia, isto é, as relações mútuas do meio e com o homem envolvendo a biosfera, a cultura material, a memória, as animações e as cognições.

limitada influência no grau de organização política. Mesmo em momentos em que o poder público ofereceu espaço à participação dos índios desaldeados de Belém, não houve a criação de uma entidade representativa de seus interesses.

Este foi o caso do governo do prefeito Edmilson Rodrigues, o qual proporcionou vários espaços de participação e discussão de questões relativas aos índios, como por exemplo, no Congresso da Cidade, contudo, essas oportunidades não foram aproveitadas no sentido de viabilizar a sua organização. Somente em 2009, após cinco anos do governo petista, os índios se organizaram em torno da Associação dos Índios da Área Metropolitana de Belém (AIAMB).

Em relação à articulação dos índios de Belém com o governo de Ana Júlia Carepa, que esteve à frente do executivo estadual no período de 2007 a 2010, essa administração possibilitou o acesso político na ocupação de cargos em algumas secretarias de Estado. Na Secretaria de Estado de Educação (SEDUC), uma indígena da etnia Tembé assumiu a Coordenação de Educação Indígena, e na Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (SEJDHU), uma indígena da etnia Tapuia assumiu a Coordenação de Proteção dos Direitos dos Povos Indígenas e das Populações Tradicionais. Além dessas secretarias de Estado, outro órgão que desenvolveu ações significativas para os índios de Belém, tanto aldeados quanto desaldeados, foi a Fundação Curro Velho, mediante apresentações de artes indígenas, a organização de encontros, entre outras atividades.

Assim, pode-se dizer que a população indígena habitante em Belém vem construindo sua identidade étnica no meio urbano, apesar das deficientes políticas públicas dirigidas a essa população, em especial as de educação e saúde objeto deste estudo. A seguir apresenta-se a ação do poder municipal em Belém em relação à questão indígena.

3.1.2 Ação do poder municipal de Belém e os indígenas

Nesta seção trata-se das ações do poder público municipal para os indígenas de Belém, com exceção da educação e saúde, que serão objeto de discussão em outro capítulo. No período de 1988 a 2010 a ação dos governos municipais dirigidas aos indígenas que moram na área metropolitana de Belém foi pontual, visto que apenas no governo do prefeito Edmilson Rodrigues havia registros sobre as referidas ações. Nesse governo, tanto os indígenas da área metropolitana de Belém, quanto aqueles que residem em municípios relativamente próximos à Belém, no nordeste do Pará como os Tembé de Capitão Poço, bem como outros da fronteira Pará-Maranhão, receberam atenção desse governo.

No referido governo foi inaugurado um novo modelo de administração, a gestão participativa, a qual foi denominada por cientistas políticos, como Santos (2003), de ―democracia participativa‖. Esta gestão se organizou mediante a realização anual do ―Congresso da Cidade‖, no qual havia a participação por setores segundo segmento social e étnico.

Os indígenas de Belém e de áreas próximas participaram do referido Congresso por meio da Conferência dos Índios. Além disso, os indígenas citadinos participaram de alguns conselhos municipais, os quais também agregavam outras minorias. Por ocasião desse evento houve a construção de um espaço planejado para ser simbólico em Belém, supracitado, o Memorial dos Povos Indígenas, conforme a Fotografia 1.

Fotografia 1 - Memorial dos Povos Indígenas

Fonte: Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (2006) e Associação dos Indígenas da Área Metropolitana de Belém (AIAMB), 2006.

No atual governo municipal se desconhece iniciativas em relação à população indígena que mora em Belém. Sabe-se, mediante conversas informais com os indígenas e pronunciamentos por ocasião de uma sessão livre, intitulada ―Conflitos sociais na Amazônia: mapeamento de identidades e territorialidade de novos movimentos sociais‖, realizada no ano de 2007 no XII Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (ANPUR), da ausência de políticas públicas para os indígenas citadinos e da inexistência de espaço político junto ao atual governo municipal.

Observa-se que a ação do poder municipal em relação aos indígenas relaciona-se à concepção teórica, filosófica e ideológica, assim como dos compromissos sociais, políticos e

econômicos dos gestores municipais. Nesse contexto, verifica-se a descontinuidade nas ações nos governos municipais relacionadas aos indígenas citadinos, residentes em Belém.

No que respeita à organização indígena belenense, mesmo com a criação da AIAMB não houve visível mobilização política desses atores sociais, visto que pouco pressionaram os poderes públicos no município no intuito de tratar suas reivindicações. Ressalte-se que tiveram de enfrentar questões relacionadas a assuntos coletivos, como por exemplo, a exclusão ao acesso às ―Ações Afirmativas‖ por ocasião da reprovação indígena no processo seletivo especial ao ensino superior, na UFPA, em 2010.

Feitas essas considerações sobre a cidade de Belém, direciona-se a atenção para a cidade de Manaus e para as políticas públicas dirigidas aos indígenas de Manaus, com exceção das de educação e saúde, nos âmbitos estadual e municipal, as quais serão tratadas no próximo capítulo.

3.2 CARACTERIZAÇÃO DE MANAUS

Manaus localiza-se na mesorregião do Centro Amazonense, na margem esquerda do rio Negro, sendo a maior cidade da região Norte do Brasil, situada à Latitude de -3,10194 e Longitude de -60,025, com área de 11.401,01 km² e densidade de 158,06 hab./km². Seu clima é considerado tropical úmido, tipo Af na classificação de Köppen Geiger, com aumento de chuvas no verão e temperatura média anual de 33,9°C. Devido à proximidade da linha do equador, o calor é constante.

Situa-se na confluência dos rios Negro e Solimões. É a cidade mais populosa da Amazônia, com uma população metropolitana de 2.210.825 habitantes de acordo com o IBGE (2010), a qual 1.802.014 residem na cidade. Destes, 48,82 % da população são homens e 51,18 % são mulheres; e 99,49 % vivem em área urbana e 0,51 % em área rural, constituindo- se como a sétima mais populosa do Brasil. Limita-se com os municípios de Presidente Figueiredo, Careiro, Iranduba, Rio Preto da Eva, Itacoatiara e Novo Airão (Mapa 3).