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PARTE I ENQUADRAMENTO TEÓRICO

CAPÍTULO 1 O CONTEXTO DE TRANSIÇÃO PARA O ENSINO SUPERIOR

5. Teorias e modelos de adaptação ao ensino superior

5.2. Teorias e modelos de impacto

5.2.2. Modelo do Abandono Académico de Tinto

Tinto (1975, 1987, 1993) propõe um modelo que procura compreender e explicar o processo a partir do qual os estudantes universitários abandonam as instituições de ensino superior antes de concluírem os seus estudos e obterem o seu diploma.

Para Tinto (1975), o problema do abandono académico é um problema complexo que resulta das interacções dinâmicas e recíprocas que se estabelecem, ao longo do tempo, entre as características dos estudantes que decidem prosseguir estudos superiores (que

ingressam nas instituições com uma série de atributos pré-universitários e compromissos), os membros dos subsistemas académico e social que integram a comunidade universitária (e.g., professores, funcionários, grupos de pares) e os elementos da comunidade externa envolvente (família, amigos, tecido económico-empresarial).

De acordo com Tinto (1975, 1987, 1993), os jovens que decidem ingressar numa instituição de ensino superior trazem consigo uma série de atributos que os predispõem a persistir ou a desistir. Esses atributos incluem: características familiares (e.g., nível sócio- económico e cultural dos pais), atributos individuais (e.g., sexo, raça e handicaps físicos), recursos financeiros e disposições (e.g., motivações, preferências intelectuais, sociais e políticas) e características do percurso escolar anterior (e.g., médias obtidas no ensino secundários e nas provas de acesso). Espera-se que cada um destes atributos tenha efeitos, directos ou indirectos, no comportamento de persistência/abandono académico dos estudantes. As intenções e compromissos iniciais podem assumir duas formas: o compromisso pela obtenção de objectivos educativos e o compromisso pela concretização desses mesmos objectivos numa dada instituição de ensino superior. Quanto mais fortes forem estes dois tipos de compromissos, tanto maior será a probabilidade dos estudantes se adaptarem, obterem bons resultados e persistirem até à obtenção do diploma (Tinto, 1993). O autor refere ainda que a par destes compromissos, o grau de envolvimento/comprometimento do estudante com a comunidade externa pode também condicionar, de forma significativa, o comportamento de persistência/abandono académico. Desta forma, o modelo passa a contemplar a possibilidade dos estudantes desistirem, mesmo quando as suas experiências com os elementos que constituem a comunidade académica são positivas.

Embora os atributos pré-universitários sejam factores importantes na compreensão do comportamento de persistência/abandono académico, outros factores explicativos poderão ser indicados, como o contexto universitário. As instituições de ensino superior são constituídas por dois subsistemas – subsistema académico e subsistema social – cada um com características próprias e com estruturas formais e informais de funcionamento. O subsistema académico relaciona-se com a educação formal dos estudantes, podendo distinguir-se duas estruturas, que interagem influenciando-se reciprocamente: o subsistema académico formal (salas de aula) e o subsistema académico informal (e.g., contactos com professores fora da salas de aula). O subsistema social é constituído pelo conjunto de

interacções recorrentes que os estudantes estabelecem com os outros membros da comunidade universitária fora do domínio formal das salas de aula, envolvendo, estruturas formais (e.g., participação em actividades extracurriculares de natureza desportiva, recreativa e/ou cultural) e estruturas informais (e.g., saídas e encontros ocasionais com colegas). Também estas estruturas interagem, influenciando-se reciprocamente.

Assim, de acordo com Tinto (1975, 1987, 1993), a percepção das interacções que os estudantes estabelecem com os membros dos subsistemas académico e social como positivas e satisfatórias, conduzirá à promoção da integração, que reforçará as intenções e os compromissos educativos e institucionais inicialmente assumidos pelo estudante e consequentemente a decisão de manutenção nesse ambiente – a persistência. Se, pelo contrário, as interacções e as experiências forem negativas, haverá uma tendência para reduzir a integração, para enfraquecer as intenções e os compromissos assumidos à partida, para afastar o estudante da comunidade académica e eventualmente, para estimular o abandono – a desistência.

Os conceitos de integração académica e integração social são centrais na sua teoria. A integração é definida por Tinto (1993) como um processo complexo que define o grau em que os estudantes se sentem membros efectivos da comunidade universitária que frequentam, ou o grau em que se identificam, partilham e incorporam as atitudes normativas e os valores dos membros dessa mesma comunidade. A integração académica pode ser definida como o desenvolvimento de uma afiliação forte com o meio académico ou os aspectos académicos da instituição e do meio (quer seja dentro, quer fora da sala de aula). A integração social diz respeito ao desenvolvimento de uma afiliação forte com o meio social ou os aspectos sociais da instituição e do meio (dentro e fora da sala de aula). O termo integração abrange também o nível de partilha de cada estudante em relação às atitudes e valores normativos dos colegas, do curso e da instituição e ainda, a forma como colabora com as exigências formais e informais que são feitas aos grupos de que faz parte. A este propósito, Pascarella e Terenzini (1991) referem que “Academic and social integration may describe a condition (that is, the individual’s place in the academic and social system) or an individual perception (that is, the individual’s personal sense of place in those systems)” (p. 51). Quanto mais forte for o nível de integração académica dos estudantes, maior será o nível de compromisso subsequente com os objectivos educativos, quanto maior for o nível de integração social dos mesmos, maior será o nível de

compromissos institucional subsequente. Quanto maiores forem os níveis de compromissos institucional e educativo, maior será a probabilidade do indivíduo se manter em contexto universitário, persistindo até à graduação (Tinto, 1993).

Neste processo, Tinto (1993) prevê a possibilidade de um estudante enfrentar algumas dificuldades, decorrentes dos fenómenos da incongruência pessoal e do isolamento individual. O grau de incongruência pessoal refere-se ao grau de incompatibilidade entre as necessidades, interesses e competências dos estudantes e das comunidades que integram as instituições universitárias. O isolamento individual surge quando as interacções entre os estudantes e os membros da comunidade universitária são pobres e/ ou insuficientes. Desta forma, a integração académica e social dos estudantes é um processo complexo, pelo que a análise do processo de abandono académico deve atender, por um lado, à qualidade das experiências que ocorrem em cada um dos subsistemas da comunidade universitária, mas também à qualidade das interacções que entre eles se estabelecem (Tinto, 1993).

Tinto (2000, 2002, 2003) sugere que as instituições de ensino superior deverão possuir determinadas características que irão promover a integração académica e social dos estudantes e a consequente permanência na instituição até à graduação, nomeadamente: (1) a demonstração de expectativas elevadas acerca das suas performances; (2) o fornecimento de suporte pessoal, social e académico; (3) o provimento de feedback frequente e precoce acerca dos seus desempenhos; (4) a promoção do sentimento de envolvimento; e (5) o cultivo da aprendizagem.

Apesar das críticas de que tem sido alvo, nomeadamente em relação à falta de especificidade do conceito de integração ou ainda à concepção subjacente de que toda a persistência é positiva (e.g., Pascarella & Terenzini, 1991; Rummel, Acton, Costello, & Gillan, 1999; Soares, 2003), o modelo de abandono académico de Tinto (1975, 1987, 1993) é considerado por muitos autores como uma modelo quase-paradigmático no estudo do comportamento da persistência académica dos estudantes no ensino superior (Berger & Millem, 1999; Millem & Berger, 1997; Pascarella & Terenzini, 1991).