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PARTE I ENQUADRAMENTO TEÓRICO

CAPÍTULO 2 OPTIMISMO DISPOSICIONAL NA TRANSIÇÃO PARA O ENSINO SUPERIOR

2. Optimismo: Conceptualização e operacionalização

2.1. Optimismo disposicional

Scheier e Carver (1985, 1992) definem o optimismo e o pessimismo disposicionais como expectativas generalizadas positivas e negativas, respectivamente, representando variáveis relativamente estáveis, que promovem ou diminuem o bem-estar psicológico e físico. O constructo de optimismo disposicional é aquele que mais vai de encontro às noções intuitivas (e definições de dicionário) que temos do conceito.

De acordo com esta perspectiva, os indivíduos optimistas são aqueles que, quando confrontados com dificuldades ou adversidades, têm a expectativa de ultrapassar as situações e de alcançar resultados positivos, enquanto que os indivíduos pessimistas, face às dificuldades, esperam resultados negativos. Estas expectativas de resultados negativos conduzirão a uma tendência marcada para o aparecimento de sentimentos negativos, como a ansiedade, culpa, raiva, tristeza ou desespero.

Carver e Scheier (Carver, 1979; Carver & Scheier, 1981, 1982, 1985, 1990a, 1990b, 2002a, 2002b, 2003; Scheier & Carver, 1988, 2003) desenvolveram um modelo compreensivo e integrativo da motivação humana, emoção e comportamento, a partir do qual tentaram explicar os fenómenos subjacentes ao funcionamento do optimismo e do pessimismo disposicionais. De acordo com os autores, as variáveis e os processos considerados no seu modelo eram efectivamente muito simples, tentando explicar os fenómenos emocionais como resultado de processos de auto-regulação. Esta teoria parte de uma noção central da teoria de controlo de sistemas que é a redução de discrepância numa malha de alimentação, retomando a tradição cibernética iniciada por Wiener (1948) e a descrição dos processos homeostáticos de Cannon (1932).

Carver e Scheier (2002a, 2002b) salientam dois elementos conceptuais que consideram de primordial importância no seu modelo: (1) o pressuposto de que o comportamento se organiza em volta da persecução de objectivos, e (2) o conceito de expectativa, definido como o sentimento de confiança ou dúvida acerca da tangibilidade de um objectivo (ou do evitamento de um anti-objectivo).

Nesta teoria, um estado actual observado é comparado com um valor de referência (por exemplo, um objectivo). Quando uma discrepância é detectada entre o estado actual e o valor de referência, um comportamento específico é realizado para reduzir a discrepância. Desta forma, a realimentação do sistema com a informação de que existe

uma discrepância conduz à aproximação do estado actual ao valor de referência (Carver & Scheier, 2002a, 2002b). Este processo é ilustrado na Figura 2.

Em termos de comportamento humano, o controlo por “realimentação” significa que um indivíduo age de modo a minimizar qualquer discrepância entre a situação actual e os padrões comportamentais de referência (Coulson, 2004). Segundo Scheier e Carver (2002a, p. 305) “there is another kind of loop that enlarges discrepancies between present states and the reference value”. Neste caso, os padrões comportamentais de referência são designados de anti-objectivos. A auto-regulação referente a um anti-objectivo envolve a fuga, a desistência ou o evitamento. De qualquer forma, um indivíduo pode também evitar um anti-objectivo, procurando alcançar um objectivo que se opõe ao primeiro (Carver, Lawrence, & Scheier, 1999; Elliott, 1999).

Figura 2. Ilustração esquemática de uma malha de realimentação, a unidade base de controlo cibernética (adapt. de Carver & Scheier, 1990a).

Um outro princípio base subjacente a esta abordagem é a noção de organização hierárquica do comportamento. Em termos de teoria de controlo, isto significa que a saída de um sistema de alimentação num determinado nível pode determinar os valores de referência noutros níveis da hierarquia. A organização hierárquica da Figura 3 mostra 3 níveis de controlo. No nível mais elevado (designado de conceitos de sistema) encontram- se valores de carácter abstracto, tornando-se mais concretos à medida que se desce na hierarquia. Valor de referência Percepção Comparador Impacto no ambiente Comportamento Influências externas

Figura 3. Hierarquia de malhas de alimentação (adapt. de Carver & Scheier, 1990a).

No modelo proposto, são propostos mecanismos que permitem auto-avaliar a actividade dos vários sistemas de retroacção. Com base nessa capacidade de auto- avaliação, um sistema de meta-monitorização verifica a taxa de redução de discrepância ao longo do tempo. Os autores propõem que o próprio nível de monitorização funciona como uma malha de alimentação. Neste caso, o valor de referência será a taxa de redução de discrepância desejável. Assim como nos restantes subsistemas, esta discrepância é motivadora de comportamento no sentido de corrigir a mesma.

Carver e Scheier propõem que o resultado destes mecanismos de comparação é manifestado de duas formas: (a) através de uma sensação de expectativa de resultados; e (b) sob a forma de uma qualidade afectiva, expressa através de uma sensação de positividade ou de negatividade (cf. Tabela 2).

Valores de referência dominantes Comparador 3 Comport. 3 e valor de referência 2 Comparador 2 Percepção 2 Comport. 2 e valor de referência 1 Comparador 1 Comport. 1 Execução do programa Impacto no ambiente Percepção 1 Percepção 3

Tabela 2

Relação entre a variação da taxa de discrepância e o afecto em três condições de comportamento (adapt. de Carver & Scheier, 1990a)

Comportamento Acção Situação Afecto

Progresso em direcção ao objectivo, a uma taxa igual à de referência

Redução de discrepância em relação ao

objectivo Não há discrepância Nenhum

Progresso em direcção ao objectivo, a uma taxa inferior à de referência

Redução de discrepância em relação ao

objectivo Discrepância Negativo

Progresso em direcção ao objectivo, a uma taxa superior à de referência

Redução de discrepância em relação ao

objectivo Discrepância positiva Positivo

A expectativa acerca de um eventual resultado é um factor determinante importante no comportamento que um indivíduo demonstra face à adversidade, isto é, se continua a esforçar-se por alcançar um determinado objectivo ou se, em vez disso, se desliga dessa tentativa (Carver & Scheier, 1990a). Por outro lado, assume-se que as consequências comportamentais de expectativas de resultados divergentes têm um paralelismo em termos de experiência afectiva (Carver, 1979). Quando as expectativas são favoráveis, o indivíduo tende a ter sentimentos positivos, que são vividos de formas variadas, enquanto entusiasmo, esperança, excitação, alegria. Quando as expectativas são desfavoráveis, o indivíduo tende a ter sentimentos negativos, como ansiedade ou desespero.