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4. MOVIMENTOS SOCIAIS EM REDE

4.7 MOVIMENTOS SOCIAIS PELA EDUCAÇÃO

Na origem das organizações associativas do universo educacional – que inclui professores e demais profissionais da escola, estudantes, pais ou responsáveis, gestores etc. – a atribuição do governo e sindicatos se destacam em função da sua falta de visibilidade na sociedade como um todo.

Por isso, a primeira reunião de educadores ocorrida no estado do Rio de Janeiro foi instituída por iniciativa governamental, que contou com educadores do próprio município em 1873.

Deste ponto, seguiram-se: Conferência Pedagógica (1883), também no Rio, Associação Beneficente do Professorado Público em São Paulo (1902), Liga do Professorado Católico, também em São Paulo (1919) e criação da Associação Brasileira de Educação no Rio de Janeiro (ABE) (1924). Esta última, teve grande influência enquanto movimento docente mais amplo no país, pois passou a organizar que eventos que influenciaram a política educacional até a década de 60. (GOHN, 2013, p.59).

Em 1930, de reconhecida importância histórica, é criado o Centro de Professorado Paulista (CPP). Esta associação criou a Revista do Professor, estabelecendo uma estratégia midiática de comunicação que veio a postular a inteligência de classe, mesmo que ainda conservadora e corporativa. Neste ano,

sob a gestão do governo de Getúlio Vargas, ocorreu, ainda a reorganização do sistema de ensino dentro do pacote de reformas do Estado.

Vale pontuar que a “situação econômica do país era precária e em 1931 ocorreu a Marcha da Fome, convocada pelo Partido Comunista do Brasil” (GOHN, 2013, p.60) e, nesse ínterim, emergiu o Movimento dos Pioneiros da Educação criado por Anísio Teixeira, Lourenço Filho e outros importantes nomes. O grupo lançou um manifesto à nação o qual defendia o debate entre ensino católico e ensino laico – dentre outras pautas escolanovistas.

Em oposição à CPP – que veio a se internacionalizar ao filiar-se à Cmope (Confederação Mundial das Organizações de Profissionais do Ensino, na Suíça) –, que não representava toda a categoria, fundou-se, em São Paulo, a Apenoesp, Associação dos Professores do Ensino Oficial Secundário e Normal do Estado de São Paulo (1945). E mais de dez anos depois, aconteceu a Campanha em Defesa da Escola Pública (1958), liderada por diversos educadores engajados, dentre eles, Florestan Fernandes e Anísio Teixeira. Evento que retomou o tema sobre a escola pública laica versus religiosa, assunto que perdurou por catorzes anos.

Em 1961, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) é promulgada em sua primeira versão, fundando o sistema nacional de ensino e, ainda, o Movimento de Educação de Base (MEB), este “voltado para a educação popular de adultos segundo o método Paulo Freire” (GOHN, 2013, p. 61), que se tornou conhecido mundialmente.

Esclarece-se que outras associações foram sendo formadas, desfeitas e/ou reorganizadas posto que, naquele contexto histórico-político, havia a impossibilidade de sindicatos serem constituídos dentre as classes do funcionalismo público. Situação modificada somente com a Constituição Federal de 1988. Contudo, destacam-se as seguintes formações:

Uma de origem trotisquista, a OSI – Organização Socialista internacionalista (entidade que posteriormente deu origem a FQI – Fração IV internacional, filiada à IV internacional) e a Moap – Movimento de Oposição Aberta dos Professores – que passou a se organizar pela base, em núcleos nas escolas. Estas tendências nada mais eram do que reflexo do movimento mais geral dos trabalhadores que naquele momento se debatia nas formas de organização do sindicalismo de resistência do ABC, e os grupos das

Comissões de Fábricas do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e outras categorias (GOHN, 2013, p. 62).

As organizações populares brasileiras se opuseram ao Estado de exceção imposto pelo regime militar entre os anos 1960 e 1970, posicionando-se contra o Estado autoritário (SEMERARO, 2011, p.466).

A partir dos anos 1970, os coletivos populares no Brasil continuaram sua luta pela democratização do Estado à luz de atores sociais e políticos organizados pelo campo do trabalho, por direitos, justiça social e, aos poucos, angariando novos temas e problematizações. Com a participação de ONGs, entidades do Terceiro Setor, movimentos sociais globalizados, cooperativas e páginas colaborativas em rede, questões de étnicas, de gênero, ambientais e outras agregaram novas pautas às mobilizações civis (GOHN, 2013).

Nessa década, a organização dos professores iniciou sua articulação com outros profissionais da educação e as correntes sindicais que originaram, posteriormente, a CUT (Central Única dos Trabalhadores) e a Força Sindical.

No processo de defesa de direitos, nos anos 1980, os movimentos sociais em geral no país pressionaram pela abertura política a fim de constituir o Estado democrático de direito, subsidiado pela Constituição de 1988 (SEMERARO, 2013, p. 466). Observa-se que, no mesmo ano, foi lançado, em âmbito nacional, o Movimento em Defesa da Escola Pública.

Sempre se deve colocar que a análise do contexto histórico é fundamental para o entendimento da realidade social e compreensão dos paradigmas teóricos que fundamentam as formas de luta. E, neste novo século, novos sujeitos sociopolíticos e culturais adentraram em cena, em embates internacionalizados em ações e respostas mais dinâmicas e ágeis. Mais recentemente, a partir da década de 90, o Brasil vem enfrentando o chamado Estado mínimo, o que significa afirmar que o Estado passa a ser reconhecido como espaço de disputa para recriação e direção coletiva, não mais como “uma esfera externa e superior a ser combatida, controlada e melhorada” (SEMERARO, 2013, p. 466).

No cenário latino, caracteriza-se uma “sociedade fragmentada e polimorfa que se configurou a partir dos anos 1990”, através do modelo de associativismo que

vem se consolidando desde 2000 “pela tendência dos grupos e movimentos sociais organizados de se articularem em redes e criarem fóruns a partir dessas redes” (GOHN, 2013, p.11).

Na atualidade, as mobilizações são distintas da maioria dos movimentos ocorridos nas décadas anteriores, embora muitos tenham herdado a lógica do “direito a ter direitos” como premissa para a pauta reivindicativa. As iniciativas passadas não eram em demasia autocentradas, focadas apenas a si próprias. Pode-se notar que “olhavam para o outro, até para poderem construir a própria identidade” (GOHN, 2013, p.17).

Conforme refere Gohn:

O novo milênio apresenta uma conjuntura social e política extremamente contraditória na América Latina. Ao mesmo tempo em que vários movimentos sociais tiveram, em diversos países, mais condições de organização tanto interna como externa, dado o ambiente político reinante, em outros, eles perderam muito sua força política (2013, p.17).

No âmbito educacional, o movimento afrodescendente avançou em suas pautas de luta com a política de cotas nas universidades brasileiras e programas Prouni, pontuadas nas políticas públicas. Mais amplamente, na América Latina, o movimento dos estudantes chilenos representado pela Revolta dos Pinguins em 2006, na qual alunos secundaristas ocuparam escolas e realizaram passeatas exigindo educação gratuita (AGÊNCIA ESTADO, 2012, s/p.). Apesar dos atos de resistência, e “sete meses de manifestações e ocupações de escolas e campi universitários, o governo chileno não passou da promessa de reformar o sistema educacional” (AGÊNCIA ESTADO, 2012, s/p.).

No mesmo ano de 2006, em Oaxaca, México, a escola também fora um espaço de protestos de grandes dimensões. Acrescenta-se a estratégia do Movimento Sem Terra (MST) que ampliou a forma de sociabilidade e constituição de uma cultura política, adotando os processos educativos e pedagógicos como potencial de suas ações cidadãs (GOHN, 2013).

Privilegiar um estratagema de resistência em que a sociedade civil se faça Estado é uma necessidade premente das lutas. A democracia se constitui

efetivamente com a participação popular numa atuação política ética. E, para Gramsci, a questão se coloca de modo

Que se passe a lutar para destruir um conformismo autoritário, retrógrado e asfixiante, e por meio de um período de desenvolvimento de individualidades e personalidades críticas se chegue ao homem socializado, é uma concepção dialética difícil de compreender para as mentalidades esquemáticas e abstratas. Assim como é difícil compreender que sustentamos a ideia de que por meio da destruição do aparelho estatal se chegue a criar uma outra instituição mais forte e complexa44 (Q 9 § 23).

Ainda mais recentemente, apesar de se tratar de uma mobilização sem a pauta específica da educação, as Jornadas de Junho de 2013 – também identificadas como “Manifestações dos 20 centavos” e “Catraca Livre” (LIMA, 2017, p. 51) –, no quantitativo de manifestantes envolvidos, superou movimentos jovens anteriores, como o protesto pelo impeachment do presidente Fernando Collor em 1992. Foram ações coletivas que coadunavam no discurso pela “mudança”, criticando o governo a partir de uma pauta que contemplava diversas injustiças sociais.

De formação heterogênea, a respeito de sua constituição, Lima também coloca que: “A dinâmica dos protestos foi intensamente contraditória, pois nelas também reverberaram as vozes de segmentos reacionários da sociedade brasileira, lembrando-nos do conservadorismo que a constitui” (LIMA, 2017, p. 55), o que remete a sua natureza conservadora.

44 Tradução livre. Original: “Che si lotti per distruggere un conformismo autoritario, divenuto retrivo e

ingombrante, e attraverso una fase di sviluppo di individualità e personalità critica si giunga all’uomo‑collettivo è una concezione dialettica difficile da comprendere per le mentalità schematiche e astratte. Come è difficile da comprendere che si sostenga che attraverso la distruzione di una macchina statale si giunga a crearne un’altra più forte e complessa”.