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OCUPE-SE: A luta entre o lápis e a borracha (50 min; 28 abr 2019)

5. PRIMAVERA SECUNDARISTA

5.2 DOCUMENTÁRIOS SOBRE AS OCUPAÇÕES

5.2.2 OCUPE-SE: A luta entre o lápis e a borracha (50 min; 28 abr 2019)

As primeiras cenas de Ocupe-se abordam a ocupação das ruas de São Paulo, a militância nos espaços urbanos com alunos entoando frases e versos, contrapondo-se às ações violentas da polícia posicionada para reprimir o numeroso levante:

Os vida loca estão juntos

Fazendo a força contra os imundos E eles, nós sabemos quem são São os que nos privam

Do arroz e do feijão Os que nos privam Da saúde e educação

Nos alienando com os jogos do timão Te prendem na frente da televisão Distorce toda informação

Diz que estudante era ladrão Que seu livro era um oitão Que morreu porque correu Mas quando o polícia gritou Ele levantou a mão.

Em imagens trêmulas, provavelmente do smartphone de algum atuante do movimento, a cena é cortada pelo texto que esclarece o contexto: “Em 2015, o governo de São Paulo aprova o projeto de ‘reorganização escolar’ que entraria em vigor no ano de 2016 afetando 311 mil estudantes”.

Seguem-se relatos sobre a violência vivenciada pelos jovens, que explicam a importância da utilização das TICs para se resguardarem física e moralmente. O argumento de defesa é o registro através de filmagens das ameaças ou ataques corporais. Todas as ações se transformam em vídeos para salvaguardar os sujeitos que reivindicam dignidade nos estudos e no dia a dia escolar.

Victor e Bárbara contam:

E no sábado, dia 12, às 8 horas, invadiram a escola. Alunos e pais tentaram invadir a escola instigados pela diretora a fazer isso contra a gente (...). A gente tem até vídeos na nossa página de como foi a repressão. Arregaçaram os portões daqui, quebraram nossos cadeados, quebraram nossas correntes, quebraram o vidro que tem lá em cima e queria nos agredir. A gente tem o vídeo de um pai que quase bateu na gente literalmente junto com outro aluno.

A figura 25 mostra o momento em que o documentário contempla, em sua narrativa fílmica, a self media produzida por recurso eletrõnico pertencente a algum aluno ocupante. Além do registro salvo no celular, nessa estratégia protetiva, o documento também é compartilhado nas redes sociais como forma de denúncia e proteção em simultâneo.

Figura 25 – Self media de agressão na escola ocupada.

Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=W3FjtBfSpbk.

Ao ser entrevistado, o poeta Sergio Vaz relata mais casos de violência, refletindo sobre os papeis sociais dos envolvidos no embate: “E duvido também que se não fosse obrigado ele iria. Eu tenho minhas restrições contra a polícia. Mas eu duvido que um cara desse saiu de casa para falar assim: ‘Eu vou encher o saco daqueles moleques que estão ocupados’”, finalizando com a seguinte colocação: “É o Estado. Nosso inimigo é o Estado”.

Uma questão não abordada no documentário anterior é concernente ao papel da arte, ou melhor, das manifestações culturais como um todo, sua demanda e relação com a juventude. Dentre os exemplos de práticas realizadas nas instituições ocupadas, estão: produção de grafite com artista convidado, oficina do café filosófico, debates sobre feminismo, oficinas de estêncil, música sendo produzida por alunos, estudante tocando violão. A temática é, desse modo, colocada pelos jovens secundaristas: “É uma forma de luta política através da arte” e “Mostrar que dentro da escola não é bagunça. Existe um propósito e este propósito é trazer a

mudança. É uma forma de revolução através da educação, e a arte é uma forma de educação.”

Novamente a formação cidadã está presente, em que a preocupação com o coletivo se sobressai em relação aos interesses individuais. A partir de uma indagação sempre colocada para os alunos do terceiro ano do ensino médio, uma aluna responde da seguinte forma ao seu familiar: “Mãe, não é para mim, é para a geração que está vindo”, ponderando em seguida: “Como a gente vai construir um país assim?”.

Nas reflexões acerca da função do partido político no contexto da ocupação, há um certo consenso na opinião em circulação do coletivo jovem, refletido neste excerto de fala, à guisa de ilustração:

O pessoal lá da minha escola fica me chamando de petista. Lá da minha família, eles mete o pau na Dilma, mete o pau na Dilma. E eu falo: gente, não é só a Dilma que governa aqui. Tá? Tem o Estado também, tem o Alckmin. Vocês parem de colocar a culpa nela, tá? A coisa está muito mais profunda. A política não é só partido. A política é pessoas.

Em muitas declarações postas desde o início da Primavera Secundarista, comumente com decisões votadas em assembleias, os grupos não se identificam com algum partido político especificamente. A propósito, o objetivo é exatamente este: não declarar um posicionamento de maneira a se vincular a qualquer partido, evitando assumir a dicotomia polarizada difundida massivamente nos grandes meios de comunicação.

Mesmo com tais cuidados, com bastante frequência, a militância é reconhecida como “petista”, “de esquerda”, “comunista”, “socialista” ou outras expressões correlatas usadas pejorativamente na intenção de descredibilizar a atuação legítima dos secundaristas. Distanciar-se de tais rótulos parece ser uma saída para que as vozes sejam verdadeiramente ouvidas sem o preconceito pertinente ao contexto reivindicativo.

Acrescenta-se o fato de que é importante o apoio da sociedade a este tipo de mobilização. Urge que a população observe os manifestantes como companheiros de luta, cidadãos que compartilham o mesmo desejo por um futuro melhor na educação pública.

Na seleção de cenas registradas nas ruas, um transeunte é entrevistado para que ele diga o que pensa a respeito daquele ato, o qual ele responde: “Eu só estou dando apoio aqui para os jovens porque eu acho que a solução está nos jovens. Se eles não fizerem, a velharada vai acomodar como sempre”. Logo, em seguida, um casal com bebê ao colo é convidado a declarar. A contribuição dessa família é: “Eu super apoio” e “A gente não só apoia como a gente está muito orgulhoso dessa molecada, são incríveis! E estão lutando pela escola pública de um jeito lindo”.

A finalização da iniciativa paulista de 2015 se desenrola com a volta decisória do governo estadual: “No dia 05 de dezembro de 2015, o governador Geraldo Alckmin recuou e suspendeu a ‘reorganização’, o que ocasionou a queda do secretário de educação Herman Voorwald e do chefe de gabinete Fernando Pádula”.