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7 ANÁLISES

7.3 CATEGORIA APRENDIZAGEM

7.3.3 Mundo da Vida e intersubjetividades

A aprendizagem na perspectiva Habermasiana coaduna com a aprendizagem social Freireana, trazendo a contribuição dos elementos intersubjetivos (linguagem e identidades) para o entendimento desse estudo.

O desafio filosófico de Habermas está fundado na busca pela emancipação dos homens por meio da comunicação participativa, livre de influências do sistema. Esta premissa está relacionada à educação por meio das aprendizagens sociais representativas dos sujeitos. A filosofia e a ciência social Habermasiana fundamentam a origem das aprendizagens coletivas, a linguagem e o conjunto de regras válidas para o grupo social (Martini, 2011).

Na psicologia social, Habermas (1982) faz uma releitura de Mead para pensar a socialização e a individuação no curso da integração social e da linguagem na constituição das identidades. Nesse contexto, o sujeito individual aparece quando incorpora as intersubjetividades compartilhadas com outros em um diálogo interiorizado. A aprendizagem se desenvolve por intermédio linguístico da socialização dessas intersubjetividades e da construção consciente da história e do

contexto social dos indivíduos, denominado por Habermas de Mundo da Vida. O processo de aprendizagem estuda a identidade humana e sua concomitância entre a individuação e socialização mediados pela linguagem e intersubjetividade. Sobre as interações linguísticas entre os sujeitos diversos acontece um processo de reprodução cultural, integração social e socialização (HABERMAS,1987). Os objetos e símbolos do mundo da vida social são desvelados por meio do saber e das tradições expressas nas falas e nas ações desses sujeitos (LIMA, 2012).

Desse modo, a formação continuada de professores precisa aprofundar a discussão crítica sobre os processos culturais, políticos e sociais da comunidade em que se encontra inserida, tomando como base a problematização de temas sociais para a construção da educação representativa dos sujeitos, com o objetivo de transformações estruturais e orgânicas na sociedade.

A abordagem de temas sociocientíficos é um instrumento importante para ser trabalhado na formação continuada de ciências de modo a contribuir com a reflexão crítica da prática docente e na constituição do professor pesquisador. Nesse âmbito, a formação encontra grandes possibilidades de desenvolvimento com base em problemas/propostas de ensino propostos pelos próprios professores (PEREZ, 2010). Agora, trazemos para análise uma atividade proposta pela tutora e realizada pelos professores cursistas da turma de ciências, campus Vitória, na aula presencial da disciplina Metodologia do ensino de Ciência na EJA. Foi uma tarefa que contemplou a aprendizagem, socialização e (re)construção crítica do meio social vivido pelos cursistas, alunos da EJA e tutores. O contexto descrito pelos professores na tarefa é denominado por Habermas de Mundo da Vida com forte influência do sistema. Após uma manhã de discussão e exemplos a respeito dos temas Sociocientíficos: Aprendendo Ciências a partir da realidade local e regional, a tutora propôs que os cursistas construíssem em grupos narrativas relatando histórias do dia a dia, buscando encontrar possibilidades de se discutir ciências em uma perspectiva social. As histórias deviam narrar pequenos eventos do cotidiano, enfatizando cenas/eventos sociais que dialogam com os conteúdos de ciências normalmente trabalhados em sala de aula. Ao final do texto, deveria ser criado cinco perguntas a fim de gerar um debate sobre o tema narrado. Foram produzidas em grupos, nessa aula, três narrativas. Foi selecionada para análise a que segue abaixo por ser a que

mais se ajusta ao objetivo da aprendizagem por intermédio da socialização e da construção consciente do contexto social dos indivíduos, denominado por Habermas de Mundo da Vida.

Figura 10 - Atividade presencial da turma de ciência campus Vitória elaboradas por 3 alunas

Figura 11 - Continuação da atividade presencial da turma de ciência campus Vitória

Fonte: Arquivos da pesquisadora (2014)

A narrativa do texto (figura 10) produzido por um grupo de três cursistas descreve o cotidiano de um aluno da EJA, suas dificuldades para frequentar a escola, que traz como consequência hábitos alimentares pouco saudáveis. Os questionamentos referentes à narrativa são pertinentes e tem potencial para conduzir o debate para o mundo da vida, apesar de enfatizar o conteúdo específico de Ciências em quatro das seis perguntas elaboradas pelos cursistas. Os dois últimos questionamentos buscam relacionar a alimentação às questões de condição social e modalidade de produção de alimentos (agricultura orgânica) como elemento econômico e social. Na análise, reafirma-se o que foi constatado durante outros episódios no percurso da pesquisa, o conteúdo científico como ponto de partida e destaque. É importante considerar na tarefa analisada as questões sociocientíficas do texto narrativo e dar mais ênfase nas duas últimas questões de discussão.

A aprendizagem na concepção Habermasiana aplicada à educação viabiliza a construção do pensamento crítico, socialização e constituição consciente do conhecimento com bases históricas, sociológicas e culturais representativas das intersubjetividades das pessoas. A prevalência da racionalidade técnico-instrumental é preconizada desde a formação de inicial dos professores e se estende para os demais níveis e modalidades de ensino. Esta instrumentalização teórica, puramente conceitual, determina quais conhecimentos e valores os sujeitos têm acesso, gerando a instrumentalização da vida social, trazendo como consequência o poder e a ideologia do sistema capitalista neoliberal para definir os rumos da educação em detrimento da constituição e das representações do mundo da vida, da cultura e da história das pessoas.

As vivências dos sujeitos no mundo da vida dão origem às experiências a serem discutidas para gerar conhecimento por meio da reflexão e da aprendizagem social para mudanças orgânicas no sistema econômico e político a favor das classes populares.

O sistema sobrepõe-se ao mundo da vida reafirmando as práticas educacionais descoladas da realidade vivenciada, a formação tecnicista é preponderante a formação política, crítica e emancipatória. A hegemonia do sistema capitalista e econômico conduz o processo por meio da instrumentalização do pensamento das pessoas. O negócio e o lucro prevalecem sobre o processo reflexivo e comunicativo da aprendizagem, dificultando e até inviabilizando os processos de construção social do conhecimento.