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Natureza jurídica e fundamentação teórica do instituto

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5 PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS

5.3 Natureza jurídica e fundamentação teórica do instituto

O pagamento por serviços ambientais como instrumento econômico de gestão é compreendido como um mecanismo de incentivo à preservação ambiental destinado à promoção do desenvolvimento sustentável, capaz de conciliar atividade econômica e conservação dos recursos naturais, sobretudo no meio rural, onde é priorizado o entendimento de que a manutenção de áreas produtivas localizadas nas áreas de reserva legal constitui prejuízo financeiro a cargo exclusivo do proprietário rural.

O Estado de Direito Ambiental é desenhado por princípios constitucionais, entre os quais se sobressai o princípio da função socioambiental da propriedade, condicionando a sua exploração à conservação dos recursos naturais, a fim de que a propriedade cumpra a sua tríplice função: econômica, social e ambiental. Quanto à reserva legal, em especial, a análise do instituto, no entanto, à luz da legislação específica, ou seja, o Código Florestal, conduz ao entendimento de que aquele regramento, estatuído no artigo 16, tem o caráter de norma de comando, podendo responder de forma bastante eficaz a uma sanção premial, sob o prisma da função promocional do direito.

Embora haja a obrigatoriedade normativa impondo a manutenção da área de reserva legal, a política de gestão ambiental que utiliza os instrumentos de comando e controle para compelir o cumprimento da lei e a redução dos desmatamentos mostrou-se ineficiente para conter a destruição das florestas.

Neste campo, importa considerar a possibilidade de ser adotada, em relação à reserva legal, uma política mista de gestão para ser considerada, ao lado dos

mecanismos controladores tradicionais, a aplicação de instrumentos de incentivos, direcionando o comportamento dos produtores rurais ao cumprimento da lei a fim de serem mantidas as áreas de reserva legal em suas propriedades rurais nos limites determinados e exigidos pela legislação. Os benefícios sociais a serem obtidos com o cumprimento da lei florestal são suficientes para justificar a adoção de uma política mista de gestão no setor florestal.

Os serviços ambientais, ecológicos ou ecossistêmicos, essenciais à vida e as atividades econômicas, historicamente foram compreendidos como serviços que a natureza presta naturalmente e gratuitamente e, por isso, o homem sempre se apropriou desses recursos, sem qualquer compensação à ordem ambiental50.

A exploração crescente dos ecossistemas para a ocupação do espaço físico e para a utilização dos recursos naturais resultou na diminuição expressiva de alguns dos serviços ambientais providos pela natureza. Diante deste fato, foram empreendidos esforços no sentido de racionalizar o uso desses recursos com objetivo preservacionista, uma vez que os instrumentos de comando e controle não foram eficazes para garantir o provimento dos serviços ambientais (ALTMANN, 2008, p. 37).

Segundo Furlan (2010, p. 188), a constatação da finitude dos recursos naturais e a conscientização crescente dos benefícios decorrentes dos serviços

50 Os estudos de Marx sobre as pressões antrópicas ao meio ambiente levaram à concepção da

teoria da falha metabólica que se revela na quebra do metabolismo que deve haver nas relações entre o homem e a natureza, enfatizando que o processo de produção capitalista conduziu a uma alienação da natureza, provocando a crise ecológica (FOSTER, 2005, p. 10 e 201). A teoria metabólica dos recursos naturais pode ser compreendida a partir de uma análise comparativa da teoria econômica ecológica e da teoria econômica tradicional. A teoria econômica, tradicionalmente, baseia suas análises na avaliação dos ciclos monetários/financeiros de acordo com uma concepção de um sistema fechado, incluindo as relações sociais e de fluxo monetário entre as empresas e as pessoas. As empresas produzem bens de consumo que são vendidos às pessoas e estas, por sua vez, fornecem a mão de obra (trabalho) para a produção destes bens e recebem, em troca, seus salários, que servirão para adquirir bens de consumo. A teoria da economia ecológica ampliou este campo de análise ao entender o sistema econômico como um sistema aberto. Isto é, a economia ecológica incorpora a análise econômica tradicional, mas entende que estas relações entre empresas e pessoas não podem ocorrer indefinidamente, uma vez que existem limites impostos pelos ecossistemas que afetam esta relação, como a extração de recursos naturais e a obtenção de energia necessárias à produção destes bens de consumo, além de existirem limites na capacidade de os ecossistemas absorverem os resíduos gerados pelo sistema econômico. De acordo com a terceira lei da termodinâmica, a lei da entropia, por mais que os processos de reciclagem ganhem eficiência, existe sempre perda de material e energia ao longo da cadeia de produção. Em síntese, o sistema econômico pode ser visto como um metabolismo que ingere recursos, os processa para gerar bens de consumo e os elimina na forma de resíduos e energia dissipada (WHATELY; HERCOWITZ, 2008, p. 33-34). A relação entre processos naturais e formas de regulação social desses processos passa, portanto, pela ideia de metabolismo entre sociedade e natureza e de como este evoluiu, foi e é alterado numa sociedade capitalista desenvolvida (NASCIMENTO, 2009, p. 272).

prestados pela natureza contribuíram para o fortalecimento da ideia de se compensar economicamente os provedores dos serviços ecológicos.

Neste sentido, Justianiano (2010, p. 39) argumenta que, se por um lado as externalidades negativas devem ser suportadas ao agente que as causou, por outro deve-se conIHULULJXDOLPSRUWkQFLDjTXHOHVTXH³SURWHJHPRXSURPRYHPDUHSDUDomR do meio ambiente, em face das externalidades positivas que propiciam à FROHWLYLGDGH´

O pagamento por serviços ambientais, nesse ponto, apresenta-se como importante instrumento de cunho premial, idealizado com o propósito de motivar, induzir, condicionar comportamentos ambientalmente desejáveis.

Acrescenta Furlan (2010, p. 188) que o pagamento por serviços ambientais H[LJH D ³DGRomR GR SULQFtSLR GR provedor-recebedor ou do protetor-recebedor paralelamente à aplicação dos já conhecidos e utilizados princípios do poluidor- pagador e do usuário-SDJDGRU´

O conceito de provedor-recebedor constitui desdobramento do princípio do poluidor-pagador, recomendado pela Conferência das Nações Unidas, Rio/9251, que estabelece sejam os custos da poluição (externalidades negativas) arcados pelo poluidor.

Ademais, o princípio do provedor-recebedor permeia toda a iniciativa do pagamento por serviços ambientais, em que se procura remunerar quem protege um recurso natural gerando benefícios a toda sociedade (FURLAN, 2010, p. 201).

O conceito provedor-recebedor é compreendido pela lógica que busca prestigiar e reconhecer as iniciativas conservacionistas de muitos provedores de serviços ecológicos por meio de compensação financeira, em reconhecimento pelas externalidades positivas geradas pelo comportamento ambientalmente recomendado que, inclusive, contribui para a redução de gastos públicos, trazendo benefícios para toda a coletividade (FURLAN, 2010, p. 230).

Considerar os benefícios trazidos pela preservação dos serviços ambientais atende a uma lógica econômica, porquanto o controle da erosão por meio da

51 O Princípio 16 estabelece que as autoridades nacionais devem procurar promover a

internacionalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais (BRASIL, 2011).

preservação de matas ciliares é um exemplo de como podem ser reduzidos os prejuízos da degradação dos mananciais (RECH; ALTMANN, 2009, p. 87).

Compreendido como um instrumento econômico de política ambiental direcionado à compensação, a adoção do sistema de pagamento por serviços ambientais tem crescido por constituir um eficiente mecanismo de incentivo positivo àqueles que efetivamente promovam a preservação e conservação dos recursos naturais.

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