• Nenhum resultado encontrado

Do lado de cá do Atlântico, o britânico David Hargreaves (2001) apresenta o esboço de uma teoria que integra o conceito de capital social com vista à melhoria da eficiência da escola. Para além da noção de capital social, a sua proposta apoia-se em três outros conceitos: os resultados, a alavancagem (“leverage”) e o capital intelectual.

No contexto da Escola, Hargreaves (2001) considera que os resultados, ou seja o grau de concretização dos objetivos delineados, são sobretudo de ordem cognitiva e moral - no sentido Aristoteliano das palavras. Em linha com o filósofo grego, sendo o desígnio último do Estado proporcionar bem-estar e felicidade aos seus cidadãos e este bem-estar constituir uma atividade virtuosa ou de excelência em si (Hargreaves, 2001) compete à Escola educar os jovens para a excelência moral e intelectual, através das quais aqueles aprendem a agir e a julgar de forma moral e esclarecida, tornando-se bons cidadãos. Apenas através da vida em sociedade em interação com os outros é que os seres humanos se desenvolvem e atingem a sua humanidade, defende Hargreaves (2001): “The principal outcomes of schooling, both intended and unintended, are thus assumed to refer to the quality of the intelectual and moral life of students” (p.489).

Sobre a alavancagem, outro ingrediente indispensável a uma Escola eficiente (Hargreaves, 2001), trata-se da relação do input do professor e do correspondente output educacional, por outras palavras, as mudanças morais e intelectuais observadas nos alunos como resultado da ação investida pelo professor. Esta é uma relação que apresenta diferentes cenários, nos quais um input elevado nem sempre se traduz num

output de grandes mudanças pelo que a compreensão dos mecanismos que

desencadeiam uma alavancagem alta é fundamental para o aumento da eficiência da Escola:

The highest leverage occurs when single high leverage strategies are combined. Teachers in effective schools share and regularly apply combinations of high leverage strategies and avoid low leverage strategies: they respond to demands for change by working smarter, not harder (Hargreaves, 2001, p.489).

A terceira componente deste modelo (Hargreaves, 2001) assenta na noção de capital intelectual, entendido como a soma do conhecimento e da experiência que os intervenientes na Escola podem distribuir de modo a alcançar os objetivos desta organização. Nesta medida, Hargreaves (2001) considera que o capital intelectual se pode desenvolver de duas formas: pela criação de novo conhecimento ou pela transferência de conhecimento entre pessoas e situações.

Quanto ao capital social, é compreendido em termos da sua componente cultural e estrutural. A parte cultural refere-se ao nível de confiança entre as pessoas e à geração de normas de reciprocidade e de colaboração. O aspeto estrutural diz respeito às redes de relações sociais de que as pessoas fazem parte, às quais estão ligadas por laços fortes: “In a school rich in social capital, the high levels of trust generate strong networks and collaborative relations among its members and stakeholders” (p.490). O capital social elevado numa escola reforça o seu capital intelectual.

Apresentados os elementos imprescindíveis à criação de uma escola eficiente é necessário explicitar a forma como se combinam. Segundo Hargreaves (2001), uma escola eficiente caracteriza-se por mobilizar o seu capital intelectual e o seu capital social (em particular a sua capacidade para gerar confiança e suster as redes de relações sociais), de modo a alcançar os resultados educacionais de excelência moral e intelectual, por sua vez alavancados por estratégias apoiadas em práticas profissionais inovadoras e informadas.

Hargreaves (2001) sublinha que a relação entre capital social e capital intelectual é relevante acrescentando que um capital social elevado implica níveis altos de confiança entre os intervenienentes na Escola: entre o diretor e os professores, entre os próprios docentes, entre os professores e os alunos, entre os professores e os pais, e entre os alunos. Nestas circunstâncias, diz o autor, as pessoas estão mais recetivas à partilha de conhecimento, seja ele intelectual ou moral. Adotando uma linha de discurso que parece ecoar o pensamento de Putnam (2000), Hargreaves aventa: “Social capital is an important lubricant of knowledge transfer on which the mobilisation of an organisation’s intelectual capital depends” (2001, p. 492).

Os aspetos moral e intelectual que definem a missão e os resultados a obter pela Escola são indissociáveis, adverte Hargreaves (2001): uma Escola cujo corpo docente desenvolveu a sua capacidade e conhecimento para ensinar eficazmente a nível individual, será com certeza mais eficiente se existir capital social (moral) que possibilite a partilha desse capital intelectual. Os benefícios não terminam aqui,

sublinha o autor: nas escolas eficientes observa-se um grande investimento no capital social entre professores, porque tal favorece a transferência de estratégias de ensino de alavancagem elevada entre os docentes, o que por sua vez tem efeitos positivos no desempenho dos alunos, e nos próprios professores, que tentam desenvolver práticas de ensino inovadoras (algo que ocorre por exemplo nas escolas alemãs e japonesas, às quais Hargreaves alude).

Quando comparados ao capital financeiro, o capital social e o capital intelectual têm características únicas que devem ser consideradas no contexto educacional (Hargreaves, 2001):

Financial capital is lost if it is given away: you cannot keep your money and spend it. When intelectual capital is given away it does not deteriorate, but becomes shared knowledge which, if done on a reciprocal basis, means mutual learning and gain. Social capital increases when it is given away: If I give you my trust, you are more likely to trust me in return and our mutual trust grows progressively. In a situation of mutual trust, we will share our intellectual capital, which in turn confirms our relationship of trust (pp.498-499).

O ato de ensinar não deve ser encarado como um ato individual. E é aqui que o capital social se reveste de enorme relevância para o desenvolvimento da eficácia e da eficiência dos professores. Assente na confiança mútua e na reciprocidade, uma relação profissional docente encerra muitas possibilidades de partilha de experiências e de pontos de vista que se refletem na melhoria dos resultados dos alunos, pelo que Hargreaves (2001) é totalmente favorável à valorização deste conceito como forma de valorizar e potenciar o trabalho desenvolvido na escola.

3.4. O capital social e a dimensão da escola: de que se fala quando se fala de