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O descanso semanal que deveria ser aos domingos, segundo a redação do Código do Trabalho (1926) teria que recair aos domingos e ter uma duração mínima, levantando algumas divergências com Afrânio Peixoto, que redarguiu que os costumes religiosos não deveriam entrar naquela discussão. Em relação a esta disposição, Carvalho Neto argumentara, com base no documento da Comissão de Legislação Social, que nos serviços nos quais o trabalho fosse prejudicado, já se previa mudança do dia para a proposição do “descanso semanal”.

[...] “Art. 7.º No caso de ficar provado que o descanso simultâneo, no domingo, de todo o pessoal dos estabelecimentos de determinada categoria profissional, será prejudicial ao público ou ao funcionamento normal desses estabelecimentos, é facultado ao Poder Executivo determinar em decretos especiaes, baixados nas condições dos parágrafos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º e 5.º do artigo 2.º desta lei, que o descanso seja concedido permanentemente ou em certos períodos do anno em qualquer das condições seguintes: a) em dia diverso do domingo a todas as pessoas do estabelecimento; b) do meio dia do domingo ao meio dia da segunda-feira; c) do meio dia do domingo, com o descanso de um dia, com revezamento e por quinzena; d) com revezamento a todo o pessoal ou a parte dele”. Pelo revezamento permitido, dada a rotação de tempo ahi prevista, facultando-se a alteração para dia diverso, o que ressalta é a plasmalidade da lei a varias modalidades na distribuição das horas de trabalho, de tal sorte que sempre se encontre um meio de conciliar o interesse dos patrões com a defesa dos trabalhadores, mantendo-se em permanente organização do trabalho. Não há, segundo me parece, logica bastante ardilosa, nem prodígios de mathematica que consigam obscurecer, na interpretação desta lei, verdades tão evidentes. Inexacto, pois, Sr. Presidente, é o affirmar-se, á conta da responsabilidade dos autores do projecto, a grosseira erronia material, com que aos créditos vacilantes de legisladores impiedosamente lhes flagelou o ilustre representante da Bahia. (CARVALHO NETO, 1926, p. 33).

O modelo da legislação francesa foi a inspiração para a propositura da legislação do trabalho, no Brasil, na época. Carvalho Neto chegara mesmo a ratificar que praticamente quase todo o texto nem havia sofrido alterações, ao confrontar os textos dos dois países. A circulação do pensamento foi um dos argumentos utilizados por Carvalho Neto (1926), no sentido de evocar certos juízos de valores universais que poderiam servir de base intelectual para os problemas sociais de lugares distintos, mas afeitos aos mesmos pressupostos de vida.

[...] De feito, Sr. Presidente, o Código do Trabalho da França foi o que inspirou o projecto brasileiro, que quase lhe copia integralmente, traduzindo- as, as mesmas expressões. [...] La durée du travail effectif des ouvriers ou

employés de l’um ou de l’autre sexe et de tout âge ne peutexceder soit huit heures par jour, soit quarente-huit heures par semaine, soit une limitation equivalente établie sur une période de temps autre que la semaine (texto francês). [...] a duração do trabalho effectivo dos operários ou empregados

de um ou de outro sexo, não poderá exceder de oito horas por dia, ou de quarenta e oito horas por semana, ou de limitação equivalente, calculada para um período de tempo diverso da semana (texto brasileiro – traduzido

na redação da defesa do Código do Trabalho do Brasil – grifo nosso).

[...] num e outro, como está patente, é a mesma a regra geral, informe, precisa, categórica. E assim, Sr. Presidente, lado a lado, a legislação brasileira acompanha a francêsa, em uma tradução rigorosa, ao pé da letra. Nos textos legaes, que veem de ser confrontados, obedece a distribuição das horas ao mesmo feitio, sem discrepância na forma, ou no fundo. (CARVALHO NETO, 1926, p. 34).

As contradições vistas por Afrânio Peixoto se referiam, da mesma forma rigorosa, ao que denominara “cópia”, com apoio de alguns parlamentares, que, em seus apartes, cobraram do relator Carvalho Neto adaptação às condições brasileiras, como o deputado federal Adolpho Berganini.

[...] O SR. ADOLPHO BERGAMINI – Não sei se é o melhor caminho a seguir. Talvez houvesse sido mais conveniente fazer uma adaptação, atendendo-se ás nossas condições. Consultar-se-iam, assim, melhor os interesses nacionais. O SR. CARVALHO NETO – Vou chegar a esse ponto: Estou mostrando que, se errámos em noções de arithmetica, errámos com o Parlamento francês, facto, aliás, absolutamente, não verificado. O SR. ADOLPHO BERGAMINI – Isto, aliás, não consolaria; o que consola é afirmação de que a Commissão não errou. O SR. CARVALHO NETO – Pois fique V. Ex. tranquilo; afirmo que não errámos. [...] De tudo, afinal, se conclue, Sr. Presidente, pela paridade em que se encontram os Codigos do Brasil e da França, neste lanço da questão, que as virtudes ou os defeitos, os erros ou os desacertos de um não são também do outro, e a nossa ignorância tem par na ignorância francêsa, podendo os legisladores pátrios dizer, então, com as palavras de Ruy Barbosa: “Em tão excelsa companhia me não podiam cair as faces de estar”. (CARVALHO NETO, 1926, p. 35-36).

Para corroborar com o pensamento legislativo francês, Carvalho Neto lança mão de um dos comentadores daquele país, com vistas a demonstrar a exequibilidade das concepções francesas no Código do Brasil.

[...] Escreve Paul Pie: "La loi du 23 avril 1919, dans son art. Ler. (art. 6,

nouveau C. T) pose le principe que ‘la durée du travail effectif des ouvries et employés de l’ un ou de l’autre sexe et de tout âge ne peut exceder huit

heures par jour’. Mais à ce príncipe d’une limitation journalière vient s’ajourtier celui d’une computation ou limitation equivalente établie soit par semaine (48 heures), soit pour une période de temps plus courte ou plus longue que la semaine (ex. période décadaire, usitée dans chemins de fer".

“A lei de 23 de Abril de 1919, em seu art. E. (Art. 6, novamente C. T), estabelece o princípio de que ‘as horas de trabalho efectivo dos trabalhadores e operários de um ou de outro sexo e de qualquer idade não pode exceder oito horas por dia’. Mas este príncipe uma limitação diária vem adicionar é a de um cálculo ou limitação equivalente estabelecida quer por semana (48 horas) ou por um período de tempo mais curto ou mais longo do que a semana (ex. Relativo à década, período, usual em ferrovias)”. (Tradução nossa). [...] Este largo comento espelha admiravelmente a significação exacta, curial, dos preceitos legaes concernentes a horas do trabalho. Dir-se- ia, Sr. Presidente, que o notável escritor e professor da Faculdade de Direito de Lyon escrevera propositadamente para o Brasil, tanto se ajustam ao nosso Código os conceitos por ele enunciados. Não devo, por isto, insistir em repisar este terreno, que já se me afigura de todo em todo percorrido pelas considerações que venho expendendo. O SR. THIERS CARDOSO – Brilhantemente. (CARVALHO NETO, 1926, p. 37).

Porém, Afrânio Peixoto, sem se dar por convencido com os argumentos de Carvalho Neto, não se deslocava da soma em relação às horas trabalhadas e ao descanso semanal. Relevante destacar alguns momentos da réplica e tréplica daqueles parlamentares, numa luta frenética em debate sobre a legislação do trabalho no Brasil. Enquanto Carvalho Neto revestia o discurso de referências, como já foi aqui salientado, Afrânio Peixoto mensurava o erro aritmético. Contudo, há de se pensar o que estava por trás da briga daqueles parlamentares no que concerne ao tema a se concluir, com fins a organizar a regulamentação da lei para os trabalhadores e patrões brasileiros.

[...] O SR. AFRÂNIO PEIXOTO – O argumento principal por mim é o do senso comum, Desejaria que o orador, ao envez de citar opiniões de professores de faculdades, invocasse apenas o senso comum: é possível dividir 48 por 5/1/2, satisfazendo as exigências do projecto? O SR. CARVALHO NETO – Se V. Ex. tivesse ouvido o começo de meu discurso, veria que eu afirmei ser preciso conhecer as regras da interpretação jurídica. O SR. AFRÂNIO PEIXOTO – Não é necessária a interpretação jurídica, nem citar autores para fazer um apelo ao senso comum, porquanto não é possível dividir 48 horas por 5/1/2 sem obter um quociente maior que 8. O SR. CARVALHO NETO – Prefiro ficar com o senso comum dos autores francêses, do código francês, da legislação pátria, e o de toda gente, com a lamentável exceção de V. Ex., que nesta questão abandonou o senso comum. O SR. AZEVEDO LIMA – E quem fixou esse divisor comum? O SR. CARVALHO NETO – Se o presado colega, Senhor Afrânio Peixoto, deseja, poderei repetir os argumentos que aduzi, antes de S. Ex. chegar, afim de mostrar que este ponto está sobejamente esclarecido. O SR. AFRÂNIO PEIXOTO – Lerei depois o discurso de V. Ex. O SR. CARVALHO NETO – Já não há, então, um erro palmar de arithmetica! O SR. AFRÂNIO PEIXOTO – Existem innumeras dificuldades burocráticas. O SENHOR

CARVALHO NETO – Considerarei, mais tarde, essa burocracia. (CARVALHO NETO, 1926, p. 38).

A polêmica entre Afrânio Peixoto e Carvalho Neto pode servir, além do problema das leis trabalhistas engendradas pelo Parlamento Nacional, para aferirem-se indagações sobre a configuração do pensamento de intelectuais brasileiros que, no calor das discussões sobre a modernidade no Brasil, divergiam dos caminhos a serem tomados, conforme as contradições expostas no discurso em análise.

Tais discordâncias manifestas pelo médico Afrânio Peixoto e pelo advogado Carvalho Neto demonstram, pois, a disputa por um lugar de destaque na condução dos trabalhos da Comissão da Legislação Social, no Congresso Nacional, o que faz pensar sobre os “tipos e mitos do pensamento brasileiro” evocados na análise de Octavio Ianni, quando indaga sobre a busca dos intelectuais, na busca de conceitos para definir se o país poderia ser “visto como país, uma sociedade nacional, uma nação ou um Estado-Nação” (IANNI, 2002, p. 178). As fronteiras demarcadoras desses conceitos estariam aliadas, segundo Ianni (2002), por aqueles grupos que reiteram ou recriam formas de se pensar o Brasil, tanto nas concepções que afirmam que a sociedade pode ser construída sob o ponto de vista de seus próprios caracteres, como pode absorver as demandas de uma política internacional, como uma sociedade cravada na herança do patriarcalismo e escravismo ou interpretado como uma “democracia racial”.

O que me interessa na análise de Ianni (2002) é observar, por meio dela, que quaisquer que sejam as correntes, elas se dividem em vários campos da ciência, com a História, a Sociologia, a Geopolítica e a perspectiva literária. Para Ianni:

[...] A perspectiva “tipológica” focaliza a realidade social ou a história do país em termos principalmente culturais, com nítidos ingredientes psicossociais. E focaliza a sociedade, a política e a cultura, seja em termos de estudos de ciências sociais, seja em termos de narrativas literárias, como setores ou círculos que podem ser tratados separadamente, nos quais haveriam dinâmicas próprias, certa autonomia. É como se a história do país se desenvolvesse em termos de signos, símbolos e emblemas, figuras e figurações, valores e ideais, um tanto ou muito alheios às relações, processos e estruturas de dominação e apropriação com os quais se poderiam revelar mais abertamente os nexos e os movimentos da sociedade, em suas distintas configurações e em seus desenvolvimentos históricos. [...] O clima que Sérgio Buarque de Holanda traduz no desenho de “o homem cordial” é o mesmo em que se gestou “Macunaíma”, “Martim Cererê”, “preguiça”, “luxúria” e “Jeca Tatu”, conforme os escritos de Mário de Andrade, Cassiano Ricardo, Paulo Prado e Monteiro Lobato, entre outros. (IANNI, 2002, p. 180-181).

A perspectiva da explicação sociológica de Octavio Ianni (2002) leva em consideração o processo cultural por qual o Brasil é envolvido para configuração de suas variadas vertentes e tempos históricos. Ao lembrar-se dos tipos de pensamento traduzidos na busca dos conceitos sobre a sociedade brasileira, é possível analisar na narrativa de Ianni (2002) a preocupação com a datação histórica para o esquadrinhamento realizado por aquele autor em seus estudos.

Na mesma perspectiva de localizar a vida brasileira na Questão Nacional na Primeira República, sob os auspícios da História Cultural, Oliveira (1990) traça um perfil do conceito de nacionalidade na primeira República e enfatiza, em sua investigação, o papel dos intelectuais nesta seara. A semana da Arte Moderna teve um papel preponderante na demarcação feita entre o passado que se queria esconder, bem como elevar o pensamento brasileiro sob a perspectiva de novos rumos, como a industrialização e a urbanização.

Para Oliveira (1997), “os anos 20, e principalmente o ano de 1922, são emblemáticos do novo clima intelectual e cultural no Brasil (Primeira Revolução Tenentista, criação do Centro D. Vital, Criação do Partido Comunista, Centenário da Independência e Semana de Arte Moderna)”. Para a autora, “a semana de 22 pretendia captar a vida em movimento, a eletricidade, o cabo submarino, o automóvel, o aeroplano, o cinema”. Embora Oliveira (1997) não fizesse referência direta às manifestações dos trabalhadores, às mudanças sociais ocorridas no bojo da modernidade, a análise geral das mudanças trazidas pela eletricidade e urbanização deu conta de me fazer entender, no conjunto da leitura de Ianni (2002) e outros autores já citados nesta seção, que o trabalho da Comissão de Legislação Social realizado em 1925, e publicado por Carvalho Neto (1926), traduziu, em certa medida, os anseios da sociedade brasileira na direção de sua vida econômica, política, social e cultural.

O que me faz inferir a respeito disso é possível de ser conferido nos discursos de Afrânio Peixoto e Carvalho Neto, dois dos deputados responsáveis por levar adiante a organização das normas do trabalho no Brasil, por ocasião da chamada Primeira República. As falas dos dois deputados federais, se por um lado flagraram as disputas entre o saber médico e o saber do advogado, por outro mostraram de forma contundente, no discurso daqueles intelectuais, as crenças que tinham, o conhecimento a respeito da ciência e como os intelectuais se apropriaram destas premissas para produzirem uma compreensão sobre a vida e o lugar de pertencimento de cada um.

Para além das farpas trocadas sobre a “pureza vernácula”, “redação confusa” e as críticas já refletidas nesta tese, outras questões foram abordadas e mereceram atenção, como a reforma constitucional, lembrada pelo deputado Adolpho Bergamini e, no mesmo projeto,

citada por Carvalho Neto (1926) como uma das estratégias de argumentação sobre a coerência da redação do Código do Trabalho e da Carta Magna do Brasil.

No cerne das contendas entre Afrânio Peixoto e Carvalho Neto, aquelas querelas faziam levantar a celeuma no Parlamento Nacional e, ao mesmo tempo, reverberavam-se no discurso daquela Casa as preferências e as tendências literárias e científicas dos parlamentares. Assim, foi possível delinear, por meio daqueles discursos, o lugar de produção dos intelectuais envolvidos; mas é bom frisar que, sendo Carvalho Neto o meu objeto de estudo, as lentes da pesquisa tendem a ampliar meu olhar sobre ele.

Ao passar a discorrer sobre as “obscuridades da redação”, apontadas na crítica de Afrânio Peixoto, Carvalho Neto evocara nomes como João Ribeiro, para quem “probidade de quem escreve polir, castigar e pôr em ordem os seus escriptos” (CARVALHO NETO, 1926, p. 40). Para aquele jurista, tratar bem a linguagem era uma obrigação daqueles que elaboram as leis.

[...] Em se tratando do preparo das leis, do amanho das codificações, é mister que as palavras sejam pesadas, medidas as sentenças, de modo que se condensem proposições práticas, capazes de lidima compreensão e execução fácil. Entre nós o oráculo no falar e no escrever, Ruy Barbosa, discorrendo com aquelle saber incomparável sobre o feitio das leis, construiu um monumento de logica e vernaculidade, no traçar as normas para os actos legislativos, dizendo até que “sendo a língua o vehiculo das idéas, quando não for bebida na veia mais limpa, mais crystallina, mais estreme, não verterá estreme, crystalino, límpido o pensamento de quem a utiliza”. E um dos maiores juristas de todos os tempos, senão o maior, R. von Ihering, não se descuidou de lavrar um volume inteiro, para explicar quanto “de uma terminologia rigorosa, nitidamente, acentuada, ricamente desenvolvida, depende a precisão, a segurança, a vivacidade do pensamento jurídico. Se nem isto é possível, mais raro ainda será que entre os lycurgos brasileiros o consorcio com as letras se haja celebrado através dos “Lusiadas” ou da “Nova Floresta” de Manoel Bernardes, ou da “Vida do Arcebispo” de frei Luiz de Sousa ou dos “Sermões” do padre Antônio Vieira”. (CARVALHO NETO, 1926, p. 41).

Seria, também, estratégia de Carvalho Neto lembrar sua “ignorância” nas letras, para arrancar os aplausos e apoio dos colegas de parlamento? Teria aquele intelectual aproveitado a discussão do Código do Trabalho para, em oportunidade rara, mostrar sua verve literária e gosto pelo conhecimento a Afrânio Peixoto? É bom lembrar-se deste detalhe, para que não pensemos que se trataria de um discurso “desinteressado”, pois isso não existe, no campo das disputas, como já nos alertou Pierre Bourdieu (2004). De qualquer maneira, penso que o mais provável é que aquela estratégia de exibição do conhecimento da língua, como o leitor poderá verificar na leitura da tese, fazia parte de uma característica que se tornara perene e

peremptória nos discursos de Carvalho Neto. Podemos desconfiar, também, que aquele intelectual poderia estar, naquele discurso, a responder a outros intelectuais e mostrar, naquela seara, o lugar do sergipano?

[...] De facto, nestes dias correntes de modernismo, quando até na cumeada da literatura nacional se planta “o pau-brasil”, quantos de nossos legisladores se dão á fadiga insana de ler Antonio de Castilhos, Alexandre Herculano, Latino Coelho, Almeida Garrett, Camillo Castello Branco, Mendes Leal, Rebello da Silva? Quantos, aqui mesmo no patrimônio das letras nacionais, já leram e releram o nosso formidável Euclydes da Cunha, ou as vistas serenaram nas bellezas tranquilas e majestosas de Machado de Assis? A começar por mim, Sr. Presidente, que me não corro de confessar essa ignorância (numerosos não apoiados). O SR. JOAQUIM MELO – V. Ex. demonstra o contrário. O SR. PLINIO MARQUES – Muito bem. [...] O nobre Deputado, que pelas justas credenciaes de eminente valedor das letras brasileiras, já presidiu com o ilustre que sempre imprime ás suas acções, á Academia de Letras, ha de ter sentido mais de uma vez que até naquele grêmio de escol não se está estreme de contatos impuros... Lembra-me que foi no seio desses immortaes que S. Ex. atirou estye gallhardete: “Por isso havendo tanta gente que escreve no Brasil, tem ele tão poucos escriptores dignos desse nome...”. Ora, Senhor presidente, se esta é a expressão fidelissima da verdade, eu só posso concluir pela indulgencia para com nossos legisladores. (CARVALHO NETO, 1926, p. 42).

Não há como se distanciar, porém, não obstante tantas perguntas impelidas à boa interpretação dos discursos, dos propósitos enfeixados na longa preleção do intelectual Carvalho Neto (1926), ao eleger o preciosismo, a erudição, como estratégia para defender ideias de um tema que lhe fora muito caro, pois a ele se debruçara com rigor. A luta empreendida por Carvalho Neto sobre os problemas sociais por que passaram a sociedade brasileira tivera um peso reconhecido por aqueles que o acompanharam. E a erudição da qual se orgulhava de usar, é atestada em todos os seus escritos, e foi lembrada pelo professor Alessandro Buarque Couto (2015), ao falar sobre a representação que tem de Carvalho Neto e porque indica o livro Advogados (1946) em suas disciplinas do curso de Direito de uma faculdade em Aracaju. Em que pese a esta seção não apresentar análise sobre o livro citado e sim, na que vem a seguir, a entrevista concedida pelo professor Alessandro Buarque Couto (2015), elucida o que tenho abordado sobre o autor e as representações por meio de depoimento ajudam a entender o processo de formação de um autor e as apropriações que se tem dele no campo científico ao qual pertencera.

[...] Carvalho do Neto foi o primeiro presidente da Ordem. Carvalho Neto tinha uma posição política. [...] na época ele tinha uma posição doutrinária; era um idealista, na verdade. [...] Carvalho Neto, ele trabalhava muito essa

questão de valores sociais dos mais variados, por isso ele tocava na questão do Direito Penitenciário, do Direito Penal, Direito do Trabalho, Direito Processual do Trabalho, do Direito Civil. Então, Carvalho Neto viajava em várias áreas. (Alessandro Buarque Couto, 2015).

A entrevista de Alessandro Buarque Couto foi realizada após uma visita feita ao Tribunal Regional do Trabalho/20ª Região, na qual tive conhecimento de que aquele professor havia sido um dos responsáveis pela organização do Memorial Carvalho Neto. Na entrevista, Alessandro Buarque Couto (2015) afirmou que foi um dos alunos idealizadores da criação do