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2.4. O FENÔMENO DA PERCEPÇÃO E SUA INFLUÊNCIA NA GERAÇÃO DE EMOÇÕES E SIGNIFICADOS NO AMBIENTE DE LOJA

2.4.2. O FUNCIONAMENTO DOS SENTIDOS E A PERCEPÇÃO

O ambiente da área de venda bombardeia os órgãos receptores sensoriais (olhos, ouvidos, nariz, boca e pele) do consumidor com estímulos de todo o tipo:

 Cor, iluminação, grafismos e dizeres sobre as paredes, equipamentos de exposição e as próprias mercadorias;

 Som proveniente dos equipamentos que permitem a operação da loja, dos atendentes, dos outros clientes e da música ambiente;

 Aromas decorrentes de algumas atividades operacionais como, p. ex., a manipulação ou produção de alimentos e a limpeza (ou a sua falta);

 Sabores também presentes em alimentos consumidos ou experimentados no local; e

 O próprio contato físico das instalações da loja com o corpo do cliente, que se traduz em calor ou frio, texturas como aspereza ou maciez, e assim por diante. A sensibilidade dos consumidores aos estímulos do ponto de venda depende da qualidade dos seus órgãos receptores (decorrente de fatores genéticos e de saúde) e da quantidade ou intensidade dos estímulos (que podem ser manipulados pelos varejistas). Em ambientes de loja que ofereçam um excesso de estímulos, ou sempre os mesmos estímulos a um ou mais de seus sentidos, os consumidores tenderão a se acostumar com os estímulos e não mais notá-los. A sensação depende, portanto, da intensidade e da variação dos estímulos.

Essa constatação leva a duas recomendações simples (a primeira óbvia, a segunda nem tanto) para caracterizar o ambiente de venda de uma loja e conseguir impactar os clientes:

 Para os clientes novos, há de haver decerto um mínimo de intensidade nos elementos sensoriais oferecidos pelo ambiente para que ele seja atraente a ponto de ser visitado; e

 Para os clientes habituais, há necessidade de variações periódicas intencionais na oferta de estímulos sensoriais de modo que se consigam melhores resultados de produtividade da loja, já que “as lojas podem se tornar periodicamente

“gastas” em termos de compras, parecendo cansadas aos consumidores.”

(TURLEY; CHEBAT, 2002).

Caso o ambiente de loja seja insosso ou imutável, os clientes poderão partir em busca de ambientes mais estimulantes e agradáveis oferecidos pelos concorrentes, ou simplesmente poderão se concentrar em suas compras planejadas, deixando de fora de sua cesta de compras mercadorias que são normalmente levadas por impulso (eventualmente mais lucrativas para os varejistas). Então, na configuração da apresentação de uma loja, há que haver espaço para mudanças planejadas na oferta de estímulos sensoriais.

“Varejistas que não atualizam suas lojas numa base regular correm o risco de parecerem fora de contato com o consumidor, e se um programa de renovação for deixado de lado por tempo demais, a mudança necessária para modernizar a loja

pode ser tão extensa que o varejista corre o risco de alienar os clientes que permanecem” (VARLEY, 2005, p. 18, tradução nossa)

Talvez seja conveniente que o projeto inicial da loja permita flexibilidade para alterações de menor ou maior escala na apresentação propriamente dita do estabelecimento, no seu layout e na sua exposição de mercadorias. Isto pode ser até prudente, minimizando a necessidade dessas reestruturações radicais, custosas e arriscadas a que um lojista pode ser ver obrigado ao ver a produtividade de sua loja cair significativamente, depois de oferecer o mesmo ambiente de venda por muito tempo.

A recíproca dessa recomendação também é verdadeira: embora o espalhafato na apresentação possa atrair a atenção dos clientes num primeiro momento, o excesso de estímulos (p. ex., som ambiente alto, cores berrantes, etc.) não garante a manutenção da pessoa inicialmente curiosa como cliente numa base estável.

Da barragem de estímulos a que o cliente está exposto no ambiente de venda, nem tudo é registrado por ele da mesma forma, ou com a mesma intensidade, podendo até nem chegar à sua consciência. O motivo disso, à luz do fenômeno da percepção, é que existem fronteiras (denominadas de limiares) que devem ser ultrapassadas pelo estímulo para que o processo perceptivo seja disparado:

 Limiar absoluto – é “o ponto no qual uma pessoa pode detectar uma diferença

entre “algo” e “nada” [...] “ em relação a um certo estímulo, ou seja, é “o nível mais baixo no qual um indivíduo pode experimentar uma sensação...“

(SCHIFFMANN; KANUK, p. 104). Em situações de estímulo constante, o limiar absoluto tende a aumentar. Há uma preocupação generalizada na área de comunicação em tentar aumentar o input dos estímulos sensoriais para ultrapassar o limiar absoluto de percepção do público. Às vezes também se trabalha o extremo oposto, privando o consumidor de estímulos específicos para chamar sua atenção. Na loja, isso pode ser implementado oferecendo-se estímulos sensoriais inesperados, como mudanças chamativas no padrão visual de exposição para destacar certos produtos, aromas pronunciados na entrada ou em certos locais da loja, forçando-se uma transição brusca no padrão de decoração para sinalizar a mudança do mix de produtos oferecido em uma área específica, colocando-se produtos em destaque numa área vazia, etc. Esse conceito de limiar absoluto também deve ser lembrado quando formatamos uma

mercadorias. P. ex., se abusarmos das cores, da iluminação, do som, etc. os clientes podem “se acostumar” ao nível desses estímulos e haverá a necessidade de aumentá-los ainda mais para que sua presença seja notada, o que, a partir de um certo nível, não é mais viável de se implementar. Portanto há um nível “razoável” (de saturação) que não deve ser excessivo para a utilização desses estímulos em bases relativamente permanentes no ponto de venda.  Limiar relativo (ou d.m.n. – diferença marginal notada) – é “a diferença mínima

que pode ser detectada entre dois estímulos similares ... ”, sendo sempre relativa

à intensidade do primeiro estímulo. Também conhecido como lei de Weber, esse principio reza que “quanto mais forte o estímulo inicial, maior será a intensidade

adicional para o estímulo ser percebido como diferente.” (SCHIFFMANN;

KANUK, p. 105). Uma aplicação desse princípio ao ambiente de loja seria o caso de se promover uma mudança progressiva na sua apresentação, em níveis sempre abaixo da d.m.n. para que as novas características da loja atraiam os novos clientes a que se propõem, porém sem perder os atuais que já se identificaram com o ambiente de venda da loja e os seus atributos ou significados. Essa ocorrência é mais comum do que parece, podendo acontecer, p. ex., quando uma loja muda de proprietário e/ou se decide por uma mudança no posicionamento da loja no mercado. Há pelo menos dois exemplos notórios de mudanças como essa no Brasil. O primeiro foi a mudança da bandeira Sears para a Dillards ocorrida há vários anos. O segundo, um pouco mais recente, foi a absorção dos pontos de venda da Blockbuster pelas Lojas Americanas (na sua versão Express). As duas mudanças, ressalvados os motivos estratégicos e os interesses corporativos que as ocasionaram, provavelmente foram bruscas o bastante para afastar de modo significativo os clientes originais dessas duas cadeias de lojas das suas sucessoras. Se fosse observado o conceito da d.m.n., ao invés de se realizar uma única mudança tão radical em todos os elementos da apresentação da loja, que certamente foi notada pelos seus clientes originais e os teria afastado, em vez disso poderiam ter sido praticadas várias mudanças sucessivas abaixo do limiar relativo de percepção dos clientes, chegando-se no mesmo ponto “final” desejado em termos de apresentação, mas com as “novas” lojas mantendo pelo menos parte da clientela original. Com mudanças muito bruscas na apresentação, o risco é o de ter que começar praticamente do zero em termos de recrutamento de público (o equivalente a montar uma loja

completamente nova, com um novo conceito). Antes de uma mudança como essa, deveriam ser muito bem avaliados os benefícios e os custos envolvidos. O que seria mais dispendioso: recrutar um público completamente novo (com gastos adicionais em comunicação fora da loja) ou diminuir o ritmo de algumas mudanças consideradas necessárias, para conseguir manter o público cativo? Outro fenômeno relativo ao funcionamento dos sentidos no âmbito da percepção que causa mais curiosidade do que impacto importante na prática (embora no passado já tenha sido objeto de tentativas de exploração na área de comunicação) é o da percepção subliminar. A percepção subliminar consiste na captação, pelas pessoas, de estímulos abaixo do nível de consciência. Ou seja, eles são captados, mas não percebidos conscientemente. Schiffmann e Kanuk (2000, p. 108-110) apontam por mais de uma vez que não existem evidências consistentes em termos de pesquisa que apontem para a possibilidade de que estímulos subliminares efetivamente motivem o consumidor, alterando, portanto, o seu comportamento de compra (e por extensão, suas ações de compra na loja e o desfecho resultante nos resultados, fenômeno que estamos estudando). Esse ponto é relevante para o desenvolvimento da metodologia de levantamento de dados que será discutida mais adiante: se existissem evidências mais concretas que estímulos subliminares influem no comportamento dos clientes, teríamos que desenvolver instrumentos para medir os sinais dessa captação inconsciente pelos consumidores, desconfiando que fatores muito sutis do ambiente da área de venda de uma loja poderiam interagir com os clientes e influenciar o fechamento ou não de uma compra. Como não parece ser o caso, nos limitaremos mais adiante a avaliar o impacto dos fatores objetivos do ambiente de venda que são percebidos conscientemente pelos clientes dentro da loja.