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TÍTULO II – A TUTELA LEGAL DO IDOSO

1.4 O idoso e o direito de prioridade

O direito de prioridade que há muito é concedido ao idoso não guarda relação com o princípio da prioridade do Direito Registral Imobiliário, mas sim com a

Estatuto do Idoso, estabelece, com clareza solar, que ‘o primeiro critério de desempate em concurso público será a idade, dando-se preferência ao de idade mais elevada’. Nesse sentido, o Procurador- Geral da República, Rodrigo Janot, ao examinar a situação do impetrante, nos autos do MS 32.044/DF, de relatoria do Min. Celso de Melo, que deferiu medida liminar para que fosse observado o devido processo legal nos autos deste mesmo PCA 0005168-90.2012.2.00.0000 ora impugnado, assentou o seguinte: “O artigo 27 do Estatuto do Idoso reflete os esforços de integração do idoso ao mercado de trabalho. Em seu parágrafo único, determina ‘o primeiro critério de desempate em concurso público será a idade, dando-se preferência ao de idade mais elevada’. Nessa diretriz a norma é clara e expressa ao prescrever que o primeiro critério de desempate a ser considerado nos concursos públicos onde há idoso como concorrente, inclusive de remoção, é o etário. Em consonância com a diretriz da prioridade dada pela Constituição Federal ao idoso e com finalidade de inclusão social do mesmo, pressupondo que as atribuições do cargo público serão melhor desempenhadas por aquele com maior experiência e maturidade, concederam-lhe tal preferência. [...] O Estatuto do Idoso vem dar cumprimento ao preceito constitucional consubstanciado no art. 230. O Estado, por meio de legislação infraconstitucional, busca a eficácia máxima da tutela definida na Constituição Federal e sua observância pelos Estados-membros se impõe, sendo vedada a limitação. Ademais, o critério de desempate pela idade não é estranho à própria Constituição Federal, que o utiliza no art. 77, § 5.º, relativo à eleição do Presidente e Vice-Presidente da República. [...] No que se refere ao periculum in

mora, é inegável no caso, tendo em vista que o impetrante [José Carlos Fratti] já se encontra na titularidade da serventia e seu afastamento certamente causará prejuízo irreparável. O fumus boni iuris também restou demonstrado, pelos motivos a seguir expostos, os quais fundamentam também a manifestação pela concessão da segurança”. A lapidar manifestação do Ministério Público Federal no supracitado precedente recebeu a seguinte ementa: “Agravo regimental em mandado de segurança. Monocrática do relator que concedeu a liminar. Plausibilidade do direito invocado e risco de dano irreparável. Estatuto do Idoso. Norma de ordem pública. Inaplicabilidade do artigo 11 da Lei Estadual 14.594/2004. 1. Agravo regimental interposto contra decisão do relator que concedeu liminar no presente writ. 2. O impetrante na condição de titular do 6.º Ofício de Curitiba, foi frontalmente atingido por decisão do CNJ que determinou ao TJPR a aplicação do critério de desempate por tempo de serviço, desconsiderando o etário, no concurso de remoção para a referida serventia. In casu, presente o risco de dano irreparável. 3. O Estatuto do Idoso é norma federal, de ordem pública, que impõe observância aos Estados-membros. Seu artigo 27, parágrafo único, dispõe que o primeiro critério de desempate em concurso público é o etário. Havendo dois candidatos empatados e sendo um deles idoso, a ele deve ser dada preferência. 4. A Lei Estadual 14.594/2004 do Estado do Paraná, em seu artigo 11, estabelece que, no desempate, o critério etário só deve ser considerado por último. Nos casos em que há pessoa idosa em situação de empate, é inaplicável a lei estadual, por contrariar a referida lei federal. 5. Parecer pelo improvimento do agravo regimental e pela concessão de segurança. Por fim, sobre a utilização do critério de maior tempo de serviço público como fator de desempate na promoção de magistrados, colho da jurisprudência desta Suprema Corte, em decisão do eminente Ministro Luiz Fux, Relator sorteado deste writ, que o tempo de serviço público não pode ser um critério de desempate, pois favorece o serviço público inconstitucionalmente em detrimento da atividade na iniciativa privada” (MS 28.494-MC-AgR/MT, de 13.04.2012). Ressalte-se, ademais, que, nesse caso, a situação é ainda mais evidente, tendo em conta a aplicação do Estatuto do Idoso na espécie. Presentes a fumaça do bom direito e o perigo na demora da prestação jurisdicional, ante a possibilidade de afastamento do impetrante, idoso de 73 anos, do 6.º Ofício de Protestos de Títulos de Curitiba, onde exerce regulamente as suas atividades, por concurso público, há mais de 2 (dois) anos, e por decisão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça paranaense o qual aplicou o Estatuto do Idoso no critério de desempate. Isto posto, defiro o pedido de medida liminar para suspender os efeitos do acórdão impugnado, até julgamento definitivo deste mandado de segurança. Comunique-se, com urgência. Publique-se. Após, ouça-se o Procurador-Geral da República. Brasília, 16 de julho de 2014. Ministro Ricardo Lewandowski Presidente em exercício (STF, MS 33046/PR, Rel. Min. Luiz Fux, j. 16.07.2014, DJe-51, divulg. 05.08.2014, public. 06.08.2014).

garantia da dignidade dos idosos e com a facilitação de sua vida em todos os aspectos em razão da idade, do corpo e mente cansados e presságio do fim que lhe está, ao menos em regra, perto de chegar.

A primeira lei a tratar da prioridade de atendimento ao idoso foi o Código Eleitoral, que previa que os “mais velhos”, sem especificar idade, teriam prioridade na hora de votar.

A Política Nacional do Idoso trouxe essa prioridade em outro viés, no sentido de que o atendimento às necessidades dos idosos deveria ser prioritariamente realizado no seio familiar em detrimento do regime asilar. O Estatuto do Idoso reiterou essa prioridade.

Por sua vez, o artigo 17 do Decreto 1.948, de 1996, garantiu aos idosos atendimento preferencial nos órgãos públicos e privados prestadores de serviço à população. Veja-se que para fins desse Decreto o conceito de idoso que se adotava era o previsto na Política Nacional do Idoso (Lei 8.842/1994), que adotava como critério a idade de 60 anos para definição de idoso.

A Lei 10.048, de 08.11.2000, estabeleceu prioridade no atendimento do idoso, maior de 65 anos, em todos os bancos, órgãos públicos e concessionárias de serviço público. O Estatuto do Idoso, nas disposições transitórias, alterou o termo inicial da prioridade prevista nessa Lei para 60 anos, em compatibilidade com o critério já adotado pela Política Nacional.

Garantiu-se ao idoso, ainda por meio da Lei 10.048/2000, a prioridade na obtenção de assentos em transporte coletivo e demais pessoas portadoras de necessidades especiais. O Estatuto do Idoso reforçou o disposto nessa Lei e determina a reserva de 10% dos assentos para uso preferencial pelos idosos.

Veja-se que essa é uma daquelas normas que sequer deveria precisar ser editada, garantindo a prioridade de viajar sentado aos idosos, gestantes, portadores de deficiências, mães com crianças de colo etc. Em uma sociedade educada, isso é questão cultural e o jovem cede seu lugar ao idoso sem necessidade de se falar em assento reservado ou lei garantindo essa proteção. O sentimento de respeito, fraternidade e amor ao próximo deveriam ser suficientes para assegurar essa proteção.

No mesmo sentido, é triste ver que em pleno ano de 2013 é necessário ser editada uma Lei, tomando tempo do nosso Congresso Nacional, que deveria estar normatizando tantas questões urgentes, para acrescentar ao Estatuto do Idoso a seguinte disposição: “São asseguradas a prioridade e a segurança do idoso nos procedimentos de embarque e desembarque nos veículos do sistema de transporte coletivo (Redação dada pela Lei nº 12.899, de 2013)”. Novamente, em uma sociedade minimamente educada e humana, esse tema não é matéria de direito posto, e sim de direito natural.

O artigo 3.º do Estatuto do Idoso dispõe:

É dever da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, saúde, alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

Apesar da infeliz colocação da prioridade no caput do artigo, que dá a entender que o direito à vida e demais preceitos fundamentais dos idosos seriam prioritários aos das demais pessoas, acredita-se que não foi essa a ideia do legislador, mas colocar que os meios para garantir os direitos fundamentais contarão com atendimento prioritário ao idoso, como nos hospitais. O direito de prioridade ao idoso se traduz nas mais diversas áreas, seja no atendimento hospitalar, assistência social, recebimento da restituição do Imposto de Renda etc.

Por meio do artigo 41 do Estatuto do Idoso garantiu-se aos idosos a reserva de 5% das vagas nos estacionamentos públicos e privados aos idosos, sempre em local próximo a entrada para lhes conferir maior comodidade de acesso e locomoção.

Outro importante viés do direito de prioridade do idoso é visto na tramitação dos processos judiciais e administrativos, garantido por meio da Lei 10.173, de 08.01.2001, que incluiu os artigos 1.211-A, l.211-B e 1.211-C no Código de Processo Civil, estabelecendo prioridade na tramitação de processos judiciais de idosos, maiores de 65 anos, em qualquer instância ou tribunal. A norma editada pouco antes da promulgação do Estatuto do Idoso já havia sido tacitamente revogada por essa norma, que prevê em seu artigo 71 a prioridade dos idosos, assim entendidos aquele com idade igual ou superior a 60 anos.

A contradição legislativa foi sanada pela Lei 12.008/2009 e a prioridade de tramitação nos processos judiciais passou a valer para todos os que possuem idade igual ou maior a 60 anos.

O benefício é garantido nas instâncias judiciais e administrativas, em qualquer grau de jurisdição e independentemente do papel que o idoso exerça no processo.99 A ressalva é para o procurador, que, conforme entendimento da jurisprudência pátria, não faz jus ao benefício da prioridade de tramitação processual pela sua condição de advogado da parte.

Claro que não há sentido em garantir prioridade de tramitação de um processo envolvendo partes com idade inferior a 60 anos pelo simples fato de seu patrono ser idoso. Entretanto, quando a disputa versar sobre honorários advocatícios, a parte vencedora, no caso o advogado idoso, faz jus ao benefício da prioridade de tramitação100 para obtenção dos valores a serem percebidos pelo trabalho realizado.

O Estatuto do Idoso previu que a prioridade de tramitação não cessaria em caso de morte do beneficiado, desde que o litisconsorte ou cônjuge ou companheiro supérstite seja idoso nos termos da lei. O critério etário foi removido pela Lei 12.008/2009, e agora, independentemente da idade do cônjuge ou companheiro supérstite, o benefício da prioridade de tramitação é estendido e mantido havendo ou não outras partes nos autos com 60 anos ou mais.

Aparentemente, houve uma desvirtuação do instituto com a remoção da necessidade de que, para ser mantida a prioridade de tramitação, as outras partes no processo devem ser idosas. Se determinado processo era tratado com prioridade em

99 NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado e

legislação extravagante. 14. ed. São Paulo: RT, 2014. p. 1592-1593

100 O STJ já decidiu em consonância ao posicionamento acima adotado.

Processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Prioridade na tramitação processual. Advogado maior de 65 anos. Estatuto do Idoso. Não incidência. Desprovimento.

I – As disposições do Estatuto do Idoso, Lei n. 10.741 de 1.º de outubro de 2003, e do art. 1.211-A do Código de Ritos, somente se aplicam às partes da relação jurídica processual.

II – A prioridade na tramitação processual não alcança o causídico que não figura como parte ou interveniente, e nem está a executar honorários decorrentes de sucumbência definitivamente fixada. III – Agravo regimental a que se nega provimento (AgRg no REsp 285.812/ES, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 4.ª Turma, j. 07.06.2005, DJ 01.08.2005, p. 461).

razão de haver um litigante idoso e essa condição é removida pela morte do mesmo, não há mais a urgência e a tutela pretendida pelo Estatuto e, portanto, não careceria mais aquele processo de prioridade de tramitação.

Importa observar, por fim, a previsão contida no artigo 70 do Estatuto do Idoso, que trata da possibilidade de criação de Varas especializadas e exclusivas para atendimento aos idosos a fim de garantir-lhes prioridade de tratamento e de julgamento de suas demandas.

O Estado do Rio de Janeiro conta com algumas Varas Especializadas para Infância, Juventude e Idoso, mas não se se encontrou, ao longo do estudo que se realizou, uma só Vara, em todo o Brasil, criada exclusivamente para atendimento do público idoso, tal como idealizado pelos legisladores do Estatuto.