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O Lulz

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CAPÍTULO IV OS TROLLS

4.7 O Lulz

O uso do discurso contra o politicamente correto tem como objetivo, para os trolls, causar uma reação aos alvos. As mensagens agressivas e as táticas descritas têm como objetivo gerar o que denominam de luzl, que seria a conquista máxima de suas ações, quando a missão foi cumprida com êxito. Lulz seria um anacronismo de ‘Lol’ (laugh out loud, em tradução livre, gargalhar, rir muito), porém, não são sinônimos. A pesquisadora Gabriella Coleman (apud RICHARDS e WOOD, 2018, p.189) ‘Lol’ é uma representação de risada, para algo realmente engraçado, enquanto lulz é algo sombrio, normalmente carregado com discurso de ódio, com a intenção de perturbar o alvo. Coleman (apud RICHARDS e WOOD, 2018, p.190) completa ao dizer que a ação seria a busca pelos “prazeres da transgressão”, ou seja, de romper com o politicamente aceito através de seus ataques.

Na mesma direção, Michael Presdee (apud RICHARDS e WOOD, 2018, p.190) vai indicar que o lulz é uma forma de representação do verdadeiro eu do troll, mantido por uma moral inversa, diferente da aceita fora desses ambientes virtuais. Presdee analisa que diante desta análise, luzl pode ser interpretado como um contra-ataque contra as condições culturais da modernidade, onde ganha também um sentido político. O uso de humor, ou o que é considerado engraçado pelos trolls, serve também como um escudo para se protegerem de acusações como racismo e misoginia, com a intenção de minimizarem suas consequências por ser apenas uma piada (MAY e FELDMAN, 2019).

O uso do luzl como discurso político extremo, se exemplifica na publicação Normie’s Guide to the Alt-Right (Guia para a Extrema-direita para Normies), que se tornou uma das principais fontes de informações para quem segue esta ideologia e que foi adotada pela maioria dos trolls (ANGELIN apud MAY e FELDMAN, 2019). A publicação tem uma seção que deixa bem explícito o uso do luzl:

Lulz

O tom do site deve ser leve. A maioria das pessoas não se sente à vontade com o material que aparece como ódio mordaz, enfurecido e irônico. O não- doutrinado não deve ser capaz de dizer se estamos brincando ou não. Deve haver também uma consciência de estereótipos zombeteiros de racistas odiosos. Eu costumo pensar nisso como humor autodepreciativo – eu sou um racista tirando sarro do estereótipo dos racistas, porque eu não me levo a sério. Isto é obviamente um truque e eu realmente quero aloprar. Mas isso não é nem aqui nem lá (ANGELIN apud MAY e FELDMAN, 2019, p.27, tradução nossa55).

55 Do original: Lulz

The tone of the site should be light. Most people are not comfortable with material that comes across as vitriolic, raging, non- ironic hatred. The unindoctrinated should not be able to tell if we are joking or not.

A citação indica que o luzl tem a intenção de atacar opositores com a intenção de afirmarem seus posicionamentos políticos sob o véu do humor. “Lulz é uma visão de mundo, uma perspectiva, uma filosofia política. Eles são o resultado deliberado do diálogo cívico, enraizado no cinismo, no desapego e na misantropia” (DEWEY apud OLSON e LAPOE, 2017, p.119). O trolling, neste contexto, vem como uma arma para que seus adeptos expressem sua indignação com a atual condução política da sociedade. Como explicam as pesquisadoras Candy Carter S. Olsen e Victoria LaPoe (2017, p.119):

O trolling contemporâneo é político, mas suas políticas nascem do niilismo e do desrespeito pela humanidade. Os trolls contemporâneos acham a dor humorística e a usam como uma arma da qual derivam diversão e poder à custa do bem-estar mental, físico ou emocional de outra pessoa (tradução nossa56).

Jamie Bartllet (2014, p.36) indica que o luzl atua como um vício em drogas para o troll, quanto mais faz suas ações em busca dessa risada sombria, mais precisa ir atrás dela para suprir seus anseios. Whitney Phillips (2015, p.25) explica que a busca pelo luzl tem como foco ataques a afrodescendentes, mulheres e a comunidade LGBT+, além também de ativistas que seriam considerados mais à esquerda, como sindicalistas e ambientalistas.

Os trolls acreditam que nada deve ser levado a sério e, portanto, consideram as exibições públicas de sentimentalismo, convicção política e/ou rigidez ideológica como um apelo aos brações do trolling. Desta forma, luzl funciona como um retrocesso contra qualquer e todas as formas de apego, uma postura altamente irônica de como os trolls são atraídos para a busca de lulz (PHILLIPS, 2015, p.25, tradução nossa57).

Apesar da autora afirmar que os trolls não querem levar nada a sério, o aspecto político deles, como descrito na sua busca pelo luzl, indica o contrário. Com o tempo, o que era uma forma de humor, mesmo que questionável, começou a se transformar em uma agenda política, com viés para a extrema-direita. Os espaços ocupados pelos trolls começaram a utilizar suas táticas para atacarem vozes discordantes de suas ideologias a sua maneira, com a utilização da regra 14 ao seu extremo: pela imposição, sem debates.

There should also be a conscious awareness of mocking stereotypes of hateful racists. I usually think of this as selfdeprecating humor – I am a racist making fun of stereotype of racists, because I don‘t take myself super-seriously. This is obviously a ploy and I actually do want to gas kikes. But that‘s neither here nor there.

56 Do orginal: Contemporary trolling is political, but its politics are born of nihilism and disregard for humanity. Contemporary trolls find pain humorous and use it as a weapon from which they derive amusement and power at the expense of another person’s mental, physical, or emotional well-being.

57 Do original: Trolls believe that nothing should be taken seriously, and therefore regard public displays of sentimentality, political conviction, and/or ideological rigidity as a call to trolling arms. In this way, lulz functions as a pushback against any and all forms of attachment, a highly ironic stanca given how attached trolls are to the pursuit of lulz.

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