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O movimento da avaliação na educação: algumas abordagens teóricas

CAPÍTULO II. ENQUADRAMENTO TEÓRICO DA PROBLEMÁTICA

2.4 A avaliação em educação

2.4.2 O movimento da avaliação na educação: algumas abordagens teóricas

Deste modo, alguns autores traçam quadros evolutivos das concepções de avaliação em educação. De Ketele (2008) destaca um conjunto de cinco correntes diferentes centradas nas práticas avaliativas escolares e defende que, embora algumas tenham sido dominadoras em certas conjunturas sociais, actualmente é possível que certas concepções ainda existam e coexistam até umas com outras, ainda que algumas sejam predominantes e detenham muito mais visibilidade em relação a outras.

A primeira corrente que este autor destaca é a

prática avaliativa centrada em conteúdos

, na qual o foco reside exactamente na visualização dos currículos enquanto listas de matérias que se têm que transmitir. Para esta corrente avaliar é destacar uma amostra de conteúdos representativa do universo de referência dos conteúdos ensinados. A validade do processo avaliativo dependerá, neste caso, por exemplo, do carácter representativo da amostra em relação a todo o universo.

O movimento sucessor é o das

práticas avaliativas centradas nos objectivos específicos

, que provém da psicologia behaviourista e que critica a corrente anterior por não distinguir os resultados observáveis do ensino. Esta forma de perspectivar a avaliação está assim relacionada com a pedagogia por objectivos, na qual se definem objectivos gerais que se decompõem em outros específicos e que funcionam como universo de referência em relação à avaliação. Nesta corrente, a quantidade de informações da resposta do aluno já não se coloca, mas a presença ou ausência de indicadores considerados como indício de consecução dos objectivos seleccionados.

Outras práticas avaliativas são aquelas

centradas nasredes conceptuais

, que não foram dominantes, nem muito difundidas na medida em que exigem um domínio aprofundado expresso de modo declarativo, preciso, para que seja possível relacionar e hierarquizar e que significa uma forma de avaliar diferentes das anteriores, pois parte de um campo de análise mais global, que integra todos os outros conceitos para testar a compreensão de uma dada matéria.

Por outro lado, as

práticas avaliativas centradas nas actividades

vêm substituir o conteúdo, o conceito ou o objectivo das correntes anteriores pela actividade, muito apoiadas pela Educação Nova, enquanto

naturalização

da operacionalização das matérias. O movimento das actividades é, segundo De Ketele, aquele que prefigura em certa parte a abordagem às

competências. Também foi dentro deste contexto que se ergueram apoiantes de práticas avaliativas centradas num tema integrador, tendo em conta uma visão interdisciplinar dos conteúdos e que um tema ou actividade conseguem problematizar.

Já as

práticas avaliativas centradas nas competências

veiculam um conceito – competência – fraco, no sentido em que não existe muito consenso à volta deste conceito. De Ketele (2008) possui uma noção de competência que abrange vários tipos de saberes: “a competência é a capacidade de mobilizar um conjunto de saberes, de saberes-fazer e de saberes-ser para resolver um conjunto de situações-problema” (De Ketele, 2008: 119). Para os avaliadores esta concepção de avaliação implica que se definam as situações ou os problemas e estes sejam contextualizados. Este autor afirma uma pedagogia baseada no desenvolvimento de competências e de que esta não significa uma renúncia ao conhecimento dos conteúdos, antes apoia que “para não se tornarem

saberes ignorantes

, estes conteúdos-matérias, estes conceitos e aplicações devem ser regulados através de actividades” (De Ketele, 2008: 120). A competência não tem que significar necessariamente uma escolha entre os conhecimentos teóricos e as tarefas.33 Na verdade, a introdução de cada vez mais complexos elementos na vida actual, como os de base tecnológica, exigem não só saber operar, mas também compreender os processos de funcionamento desses elementos, para poder enfrentar o inesperado. A prática, neste caso, deixa de ser fazer sem pensar, mas aproxima-se do conceito de práxis34, que depende também do conhecimento científico, prático e tácito (Kuenzer, 2003). Para a real consecução deste tipo de práticas avaliativas, De Ketele, compreende que as escolhas de situações significativas têm que obedecer a certas características: distinguir informação essencial e acessória; mobilizar e aplicar importantes saberes e saberes-fazer e que sejam observáveis e avaliáveis, para além de que o avaliador tem previamente de identificar critérios – uma qualidade não directamente observável – e indicadores – sinais concretos e observáveis em relação aos critérios que concretizam. As práticas avaliativas centradas nas competências são também defendidas por Alves (2004) que vê a viragem da escola em direcção às competências como uma “resposta à constatação da inadequação entre «fazer a escola como ontem» e responder às exigências sociais de amanhã” (Alves, 2004: 76), contrapondo uma aprendizagem

33Tal como também é defendido por Perrenoud “As competências não voltam as costas aos conhecimentos” (Perrenoud, 2002: 133), na medida em que os conhecimentos prendem-se, em última análise com a acção e com o local onde ela é contextualizada: a realidade.

34 Kuenzer (2003) defende que estabelecer a identidade comum entre conhecimento teórico e prático não é certo, nem confirmável ou sustentável, pois a teoria será sempre um instrumento redutor, parcial, revelador e ocultador da magnitude do real, ainda que necessária forma de o apreender. Deste modo, cabe ao trabalho pedagógico promover esta mediação. Uma modalidade possível proposta por Kuenzer é um processo de alternância entre tempos e espaços, que complemente um período de actividades teóricas com outro de aprendizagem assistida no trabalho, em vez da sobreposição. Esta é uma metodologia que implica, entre outros factores: tomar o processo de trabalho e as relações sociais como eixo definidor de conteúdos e a reorganização dos saberes.

baseada na simples memorização dos conteúdos ao desenvolvimento do pensamento crítico, processo no qual os alunos devem estar no centro, em vez dos conteúdos.

Neste movimento da avaliação, também Alves (2004) faz uma proposta de descrição das fases de renovação conceptual da avaliação ao longo do tempo, em cada uma das quais a avaliação preocupa-se mais com: 1) a classificação e quantificação; 2) a medição; 3) a compreensão e 4) a descrição qualitativa. A autora defende que as mudanças ideológicas da avaliação no campo educativo vão desde as

abordagens de consciencialização

do século XIX, na busca por métodos mais objectivos, passando pela

abordagem da psicometria,

no período de 1900 a 1930, que focaliza esforços no aperfeiçoamento técnico da avaliação, para atenuar os factores subjectivos, sendo aqui sugeridos instrumentos de medida e o reforço da importância dos objectivos. A

abordagem da congruência

, presente no período de 1930 a 1945, considera a avaliação como uma comparação entre os resultados previstos e os obtidos, ultrapassando-se o juízo sobre a aprendizagem e alargando-se aos programas e aos métodos pedagógicos. Esta foi uma abordagem que teve como consequência a possibilidade de visualização do aluno e uma forma mais completa, introduzindo-se instrumentos de avaliação alternativos aos exames, como os dossiers, os portefólios, a realizações de perfis do aluno, entre outras apreciações de origem variada. Na

abordagem

da expansão

, de 1958 a 1972, na medida em que neste período as práticas da avaliação sofrem uma expansão para o contexto escolar e formativo, com o aparecimento de projectos revolucionários que reclamam um sistema de ensino democrático, nos quais a atenção volta-se para a avaliação do processo ensino-aprendizagem, introduzindo a avaliação formativa e distinguindo-a da avaliação sumativa35. A avaliação é percepcionada como sendo parte do desenvolvimento da aprendizagem, fornecendo informação de forma contínua e

permitindo uma maior regulação. Alves compreende a

abordagem

daprofissionalização

, que se

dá a partir do ano de 1972, como a última abordagem à avaliação mais importante, pois é neste período que aparece uma nova categoria profissional e de formação – a de avaliador. A avaliação assume um carácter sistemático e é considerada enquanto processo, detentora de diferentes etapas: 1) a avaliação do contexto; 2) definição das necessidades de mudança, que faz a avaliação de entrada sobre os recursos, limitações, custos e benefícios; 3) a avaliação do processo, que é a obtenção de informação sistemática e contínua sobre o processo de

35A avaliação sumativa distingue-se da avaliação formativa, pois ela representa “um inventário de competências adquiridas, ou um balanço, depois de uma sequência ou uma actividade de formação de duração mais ou menos longa” (Hadji, 1994: 188), enquanto que a avaliação formativa persegue a “ambição de contribuir para a formação. Procura guiar o aprendente para lhe facilitar os progressos” (Hadji, 1994: 187). Assim, a avaliação sumativa realiza o somatório dos resultados das práticas de avaliação durante o processo formativo e a avaliação formativa centra-se na produção de informações com o intuito de transformar e melhorar a formação.

desenvolvimento; 4) a avaliação do produto, na qual se decide se o produto final cumpriu as finalidades com vista a uma continuidade. As etapas enunciadas descrevem o que também pode ser denominado enquanto dimensões da avaliação em formação: o induzido, o produzido e o construído.

Deste modo, o mencionado carácter sistemático da avaliação possui cada vez mais correspondência nas teorias da educação e formação e tal é materializado por De Ketele, Chastrette, Cros, Mettelin e Thomas (1994) ao apresentar uma explicação do que é tido em conta e em que consistem as fases da formação: análise de necessidades; preparação da acção; desenrolar da acção e pós-acção. De modo não menos relevante, estes autores não deixam de explicitar a importância destas dimensões da formação na avaliação do próprio dispositivo de formação, tanto a nível temporal, como ao nível das funções. Assim, antes da acção da formação é necessário avaliar para fazer uma previsão e planificar o futuro, durante a formação é essencial detectar as falhas e corrigi-las, permitindo uma retroacção em tempo real e no final da formação, a avaliação serve essencialmente para verificar o grau de sucesso atingido e para fazer considerações para o futuro.