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O paradigma digital e as dinâmicas de comunicação e interação

PARTE II – Projetos e tecnologia: os quadros interativos (QI)

7.1. O paradigma digital e as dinâmicas de comunicação e interação

A introdução das tecnologias em contexto educativo, apesar de passar por várias fases e contexto diferenciados, foi explorada de forma distinta e o objetivos da sua introdução também foram variando ao longo do processo. Apesar de hoje em dia essas tecnologias poderem assumir formas e características diferentes, em contexto de sala de aula todas elas servem de suporte às atividades de ensino. O docente tem à sua disposição toda uma gama de tecnologias e ferramentas através das quais pode expor e explicar os conteúdos que servem de suporte às suas aulas, possibilitando também aos aprendentes o recurso a documentos vários em suporte digital. Estas tecnologias acompanhadas de metodologias centradas no estudante permitem a criação de espaços de autoestudo, partilha e colaboração, criando assim as condições para a concretização do que deveria ser o objetivo da introdução de qualquer tecnologia em sala de aula: melhorar a qualidade das aprendizagens.

As tecnologias, e todo o conjunto de serviços associados, permitem alterar a conceção tradicional da sala de aula, fechada sobre si mesma e centrada no professor como elemento detentor do saber, para uma noção mais abrangente, na qual todo o conhecimento está acessível e onde as paredes da sala de aula deixam virtualmente de existir. As tecnologias desempenham, no contexto educativo no qual coexistem os diferentes media e tecnologias, uma mediatização dos conteúdos e da comunicação entre docentes e aprendentes e dos aprendentes entre si. Bidarra (2009), citando Guimarães & Kommers (2004), vai mais longe ao afirmar que as tecnologias digitais vieram alterar qualitativamente a relação entre as pessoas e o conhecimento. Para este autor, o processo de adquirir conhecimento através das tecnologias digitais passou a qualificar-se como flexível, interligado, aberto, dinâmico, não–linear, rico em informação multimédia e público, em vez de privado.

As possibilidades geradas pela introdução das tecnologias em contexto educativo vieram alterar a forma como podem ser geridas as aprendizagens em sala de aula, mas também podem servir de elemento motivacional para o aprendente, dado que as tecnologias em conjunto com a Web 2.0 são ferramentas que, integradas na sala de aula, podem incentivar os aprendentes a contemplar a escola, não como um local que

se fecha ao mundo exterior, mas como um espaço onde o conhecimento se constrói numa combinação subtil entre o formal e o informal, entre a aprendizagem e o divertimento (Coutinho, 2008). Na ótica deste autor, a investigação já realizada mostra que as ferramentas da Web 2.0 podem constituir veículos para o desenvolvimento de um sem número de aprendizagens que, em contextos formais, se tornam muitas vezes aborrecidas e desmotivadoras (Coutinho, 2008). A mesma ideia é sustentada por Bidarra (2009), para quem as tecnologias multimédia interativas e a própria estrutura da internet com evolução da Web 1.0 para a read and write web, também designada por Web 2.0, passou a ser um fator de alteração ao modo como é construído o conhecimento, já que este como elemento integrador e fator de convergência, oferece

um potencial motivacional muito forte (Bidarra, 2009 :359).

As consequências desta renovação, ou requalificação do espaço que é a sala de aula, vão obrigar a que haja uma mudança no discurso de sala de aula – este vai ter de deixar de ser sustentado por uma comunicação unidirecional, no qual os aprendentes durante a maior parte do tempo se limitam a serem sujeitos recetivos não interpretativos, cujas contribuições são restritas em tempo e qualidade (Galton et

al.,citado por Sessoms, 2008). O que de facto se espera nesta abordagem de ensino e

aprendizagem é que, em contraste com a sala de aula dita tradicional, se adotem estratégias encorajadoras de um ensino orientado para o grupo/turma, interativo com o objetivo de promover diálogos de elevada qualidade, discussão e pensamento estratégico (Sessoms, 2008).

No entanto, estas são modificações que necessitariam que uma grande quantidade de docentes modificasse de forma significativa o seu estilo triádico de discurso de sala de aula em resposta a orientações impostas a partir do exterior. Não é, assim, de ficar surpreendido que estes objetivos ainda não tenham sido atingidos, dado que “the more

complex a change, the less it can be forced” (Fullan, 1993; citado por Sessoms, 2008).

Uma das ferramentas que já passou a ser mais comum, quando se fala em renovação dos ambientes de aprendizagem, é a implementação de quadros interativos em contexto de sala de aula. Estes são visto pelos docentes como ferramentas que mantêm a semelhança com as ferramentas mais tradicionais da sala de aula: o quadro branco ou negro. Para além de facilitar a familiarização, têm a potencialidade de aliar uma estrutura física base semelhante à tradicional a características e potencialidades tecnológicas que permitem agregar num só elemento todo um conjunto de possibilidades e formas de exploração. Deste modo, com o recurso ao quadro

interativo, os discursos mediatizados já não surgem de forma compartimentada, mas sim de forma integrada, o que facilita a interação e o desenvolvimento das novas competências a desenvolver pelo estudante e pelo professor (Gallego et al, 2010). O recurso ao quadro permite que os aprendentes, ao terem acesso à tecnologia do quadro interativo, ganhem a possibilidade de partilhar o seu trabalho, pensamentos e ideias. Este passo pode ser considerado um passo importante na concretização do potencial transformativo desta tecnologia. Esta linha de evolução e de integração de tecnologia em sala de aula passa pela exploração de ferramentas que já fazem parte do quotidiano dos aprendentes – tais como o youtube, flickr e blogs, entre outros (Cutrim Schmid, 2009).

O potencial da tecnologia do quadro interativo na transformação do ambiente de aprendizagem reside na sua utilização como componente integral do processo de ensino e aprendizagem e não apenas para ser usado discretamente de forma isolada numa qualquer atividade (Cutrim Schmid, 2008). Dado que o quadro interativo se afirma sobretudo como uma plataforma que pode integrar várias tecnologias na sala de aula, as competências relacionadas com essas tecnologias, que vão ser exploradas, não estarão dependentes apenas das abordagens efetuadas pelos docentes, mas também pelo conhecimento que estes possuem dos novos media em geral (Cutrim Schmid, 2009).

No entanto, a realidade da sala de aula difere muitas vezes e não se verifica essa transformação que permita a utilização integral do quadro na mediação do processo de ensino e aprendizagem. Schuck & Kearney (2007) verificaram que nas aulas existe uma tendência para implementar de forma mais frequente atividades que têm como objetivo a transferência de conhecimentos do que atividades direcionadas para a construção de conhecimento. Por esse motivo, a integração inicial dos quadros interativos dá-se através de uma adaptação ou adequação a metodologias existentes, havendo no entanto, com o passar do tempo a adoção e desenvolvimento de novas práticas. Estas mudanças em curso acontecem através das atividades tanto de aprendentes como docentes, enquanto vão experimentando novas formas de usar o quadro.

Segundo Betcher & Lee (2009), quando é apresentada aos docentes a tecnologia dos quadros interativos com a consequente familiarização com o conceito de e-teaching, a sua adaptação a esta nova ferramenta passa de um modo geral por três fases previsíveis, que começam com a adaptação ao quadro interativo de recursos básicos,

que já tinham anteriormente utilizado, até à lecionação de aulas de forma sofisticada e altamente interativas. Este processo, pelo qual passam os docentes na sua adaptação aos quadros interativos, segundo Betcher & Lee (2009), pode resumir-se da seguinte forma38:

• Fase 1: O docente persiste em utilizar os seus materiais antigos à moda antiga. • Fase 2: Ao começarem a entender a tecnologia, os docentes continuam a usar

as coisas antigas, mas utilizam-nas de forma inovadora.

• Fase 3: Ao dominarem a tecnologia, os docentes começam por experimentar novas coisas de forma inovadora.

Com a implementação de quadros interativos em sala de aula, os resultados esperados não podem ser ambicionados a curto prazo. É necessário a conjugação de uma quantidade de fatores que tornam possível a rentabilização dessa ferramenta, que pelas suas características multimodais e potencial de comunicação, possibilita o surgimento de novos modelos de aprendizagem. As potencialidades da utilização dos quadros interativos, e das tecnologias de um modo geral, dependem da forma como são utilizadas e dos objetivos que sustentam a sua utilização. O seu impacto, no auxilio à criação de situações geradoras de aprendizagens significativas, estão dependentes dos conhecimentos, capacidades e criatividade dos vários intervenientes no processo. Os docentes são, neste contexto, o enfoque principal, e concordamos com Koenraad (2008) que cita Kennewell (2007) para realçar a formação inicial e complementar como um fator de extrema importância, porque aquilo que o docente faz com um quadro interativo é obviamente mais importante do que o próprio quadro em si, aplicando-se esta premissa a qualquer outro dispositivo.

38 Esta situação também pode igualmente ser observada durante a implementação do projeto Inov@r com QI no qual a generalidade os docentes necessitou de dois anos para adquirir competências básicas para começar de facto a tirar benefícios pedagógicos dos quadros interativos. A revisão da literatura também aponta para esta situação, referindo os dois primeiros anos como o tempo médio que um docente necessita para utilizar com eficiência pedagógica os quadros interativos (Beauchamp, 2004; Miller et al., 2005a, 2005b; Lewin et al., 2008; Slay et al., 2008)