• Nenhum resultado encontrado

O princípio da precaução como finalidade do recall

3 O RECALL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

3.2 Os objetivos do Recall

3.2.2 O princípio da precaução como finalidade do recall

Para Ednara Ponte de Avelar118, o princípio da precaução é um dos princípios mais importantes do recall,

tendo em vista que não basta só prevenir o risco, mas também evitar possíveis danos, pois se surgir alguma dúvida a respeito da segurança do produto, caberá ao fornecedor informar os consumidores e as autoridades competentes sobre risco e também, retirar os produtos do mercado, ou então repará-los. Mencionar ainda que, nos casos do recall, deve o fornecedor provar que aquele produto ou serviço, no qual se plaina a dúvida científica sobre a necessidade de se realizar o recall não é perigoso e nem nocivo ao consumidor.

Roberto Grassi Neto119 entende que, no estrito âmbito do Direito do Consumidor, o “princípio da precaução” pode ser conceituado como sendo

117 Nesse sentido,cabe destacar o recall do veículo Fiat Stilo, realizado em 12/10/2010, por imposição do DPDC – Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça, vez que a empresa não reconheceu a existência de alto grau de nocividade ou periculosidade no modelo citado. Neste caso, apesar da inexistência de constatação inequívoca do defeito, a decisão do Departamento se deu com base no laudo do Denatran,“que apontou a existência de defeito no conjunto do cubo da roda dos veículos Fiat Stilo e recomendou que a montadora efetuasse recall. Além da determinação do recall, a empresa também foi condenada a pagar uma multa administrativa no valor de R$ 3.000.000,00.

O processo administrativo conta com 29 registros de reclamações de consumidores, totalizando 31 vítimas, sendo 8 fatais, localizadas na BA, DF, GO, MG, MS, PR, SC, SP e TO.

BRASIL. Ministério da Justiça. Fonte: http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={7CBDB5BE-654D-4BA8- 8A49-8FC8AA654ECE}&BrowserType=IE&LangID=pt-br&params=itemID%3D{469F9C88-4E6B- 42C4-B2FE-BAFAF12B7D35}%3B&UIPartUID={2218FAF9-5230-431C-A9E3-

E780D3E67DFE}.Acessoem 24/11/2014.

Neste caso, mesmo diante da incerteza científica e jurídica, diante da ocorrência de 35 mortes que estariam supostamente relacionadas à soltura das rodas em razão da fratura do cubo, caberia à empresa adotar providências precauciosas em relação ao produto.

118 AVELAR, Ednara Pontes de; PORTO, Rafaela Grania. A aplicação do princípio da precaução no direito do consumidor e sua direta relação com o instituto do recall. Revista de Direito Privado. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, v. 9, n. 36, out. /dez. 2008, p. 93-118.

a diretriz normativa assecuratória de elevado nível de proteção preventiva ao consumidor quanto à qualidade de produtos, nos casos em que os dados científicos disponíveis ainda não permitam uma completa avaliação de risco à sua integridade física e à sua saúde.

Mesmo não havendo uma previsão expressa do princípio da precaução na lei consumerista, há entendimento de que o CDC apresenta dispositivos a ele relacionados, como ao enfocar os direitos à informação, à saúde e à segurança do consumidor.

O Estado, por meio da atuação de seus órgãos governamentais, encontra no instituto do recall não só uma forma de proteger o consumidor de possíveis danos decorrentes de defeitos no processo de produção de produtos, mas também de prevenir o consumidor dos acidentes de consumo. O recall, por vezes, poderá ser utilizado com o objetivo de precaver riscos, nos casos em que não se tenha a certeza científica, mas nos quais paira a dúvida quanto à segurança dos produtos ou serviços colocados no mercado de consumo.120

Ivar Alberto Hatmann121 considera que o dever de informação contido no artigo 9º do CDC retrata a aplicação do princípio da precaução nas relações de consumo. Para ele,

a informação ostensiva da precaução requer a revisão de todos os requisitos para informar o consumidor, qual seja: a adequação, a suficiência e a veracidade. A adequação determina que esta informação seja difundida e atinja os maiores números de meios possíveis, devendo conter uma linguagem capaz de transmitir ao consumidor sobre o estado de incerteza acerca da segurança, pertinente sobre determinado produto ou serviço. A suficiência é por

119 GRASSI NETO, Roberto. Princípios de Direito do Consumidor: elementos para uma teoria geral. 2 ed. Santo André: Esetec, 2007, p. 88.

120 Nesse sentido: “Após seis adolescentes que receberam a vacina contra o Papiloma Vírus Humano (HPV) no Rio Grande do Sul apresentarem "reações adversas atípicas", o Ministério da Saúde informou nesta sexta-feira (28) que o uso das doses "está suspenso, como medida de precaução, enquanto ocorrem as investigações sobre se há ou não relação causal entre os eventos e esse lote específico" Fonte: http://www.farmaja.com.br/site-noticia?id=390.Acesso em 21/09/2014.

121 HARTMANN, Ivar Alberto Martins. O princípio da precaução e sua aplicação no direito do consumidor: direito de informação. RDC 70/175, 2009.

ocasião, critério que configura mais exigência quanto às situações normais, pois a informação precauciosa deve ser mais ostensiva e ampla que as demais.

A discussão é relevante e merece atenção, tanto que o Projeto de Lei nº 281/2012122 que tramita no Congresso Nacional, que tem por finalidade atualizar o Código de Defesa do Consumidor, traz em seu bojo proposta de inserção do artigo 10-A: “Art. 10-A. As regras preventivas e precautórias dos arts. 8º, 9º e 10 deste código aplicam-se aos riscos provenientes de impactos ambientais decorrentes de produtos e serviços colocados no mercado de consumo”, deixando clara a ideia de que o CDC já contempla regras de prevenção e precaução.

Fato é que com fundamento nos princípios da prevenção ou da precaução, o instituto de recall é um instrumento por meio do qual a norma busca que o fornecedor pratique atos que impeçam, ou procurem impedir, mesmo que tardiamente, que o consumidor sofra algum dano em função do defeito que o produto ou o serviço tenha apresentado após sua comercialização.

122 BRASIL Senado Federal. http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate =106768.Acesso em 12/01/2015.

4 A EVOLUÇÃO DA REGULAMENTAÇÃO DO RECALL NO CÓDIGO