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O processo de privatização/desestatização da infraestrutura econômica brasileira

2. Desestatização e regulação das ferrovias brasileiras na década de 1990

2.1. O processo de privatização/desestatização da infraestrutura econômica brasileira

A proliferação de empresas estatais após o anúncio do Decreto-Lei nº. 200 de 1967 tornou o Estado excessivamente grande. Todos os setores econômicos nos quais o Estado tinha participação era povoado por diversas empresas estatais, assim foi na siderurgia, transportes, petroquímica e energia elétrica. O chamado Estado-empresário era resultado direto das políticas desenvolvimentistas que vigoraram a partir da Era Vargas, avolumando a participação do Estado na economia e promovendo a industrialização do país. Esse modelo, no entanto, já mostrava sérios traços de esgotamento. A principal crítica ao padrão de intervenção estatal na economia era o grande déficit público gerado pelas empresas estatais, as quais comprometiam grande parte do orçamento do Estado, assim como colocava o país numa situação de fragilidade frente a credores internacionais (REZENDE, 1987; REZENDE, 2004, p. 57).

Frente a esse cenário ainda na década de 1980, mais precisamente no ano de 1981, durante a presidência do militar João Figueiredo (1979-1985), o Estado brasileiro começou a se desfazer de algumas empresas públicas, a fim de melhorar as contas do Governo. Nesse ano foi criada a Comissão Especial de Desestatização, a qual até o ano de 1984 foi responsável pela privatização de 20 empresas (PINHEIRO; GIAMBIAGI, 1992, p. 33). Importante notar que nesse mesmo período o governo absorveu seis empresas em situação de falência, as quais passaram para o controle do BNDES. Os próprios técnicos do banco chamavam essa operação de “hospital” de empresas do BNDES (SCHNEIDER, 1992, p. 10; PINHEIRO; GIAMBIAGI, 1992, p. 33). O governo Sarney (1985-1990) também promoveu a privatização de empresas públicas, sendo privatizadas 30 empresas, 12 delas pertencentes ao BNDES. As características dos programas de privatização da década de 1980 foram bastante modestas. Com esses programas o Estado arrecadou cerca de US$ 1 bilhão, em valores

correntes da época. O acumulado no período (1981-1989) foi de 38 de empresas privatizadas, sendo que 20 delas pertenciam ao BNDES. As empresas privatizadas eram, em sua grande maioria, de pequeno porte, boa parte dos casos tratava-se de reprivatizações de ativos que foram incorporados pelo Estado para sua recuperação. Esses programas não tinham o intuito de redefinir o papel do Estado na economia, pois não tocavam no cerne do Estado empresário, ou seja, as empresas estatais mais lucrativas. As privatizações nesse período estavam acontecendo nos países desenvolvidos, tal como EUA e Inglaterra, sendo executadas pelos governos conservadores de Regan e Tatcher. Nos países da América Latina esse debate ainda não tinha ganhado volume, tampouco conquistado a opinião pública. Os governos de Figueiredo e Sarney pouco se empenharam em alavancar tais programas, restando ainda o bloqueio do poder Legislativo sobre a atuação do Executivo em diversos casos de privatização de empresas, alguns deles não ocorrendo (PINHEIRO; GIAMBIAGI, 1992, p. 33-34).

O grande choque em relação à participação estatal na economia, e mais precisamente no provimento de infraestrutura econômica, se deu no governo Collor (1990- 1992). O resultado eleitoral gerou a expectativa de que a economia brasileira seria reerguida após o pífio desempenho apresentado na década de 1980, seguindo um ideário liberalizante e a afirmação de um presidencialismo plebiscitário, à revelia das organizações burocráticas e seus burocratas, assim como um desprezo ao parlamento (SALLUM JR, 2011). Para Luciano Martins (1991, p. 33), o projeto de Collor “consistiria numa ampla abertura da economia brasileira à economia internacional com o abandono de qualquer veleidade de construir um capitalismo nacional”. Tal projeto passava pela desmontagem do Estado-empresário e sua substituição por um governo fortalecido em seu sistema decisório, eliminando barreiras protecionistas e recursos semelhantes percebidos como entraves ao livre jogo do mercado. Para Sallum Jr (2011, p. 263), o governo Collor era um misto entre um ideário liberal41 e um

pensamento de integração competitiva à economia mundial. Quanto ao primeiro aspecto, o autor afirma que somado às políticas monetaristas houve tentativas no sentido de desregulamentação dos mercados, redução dos gastos sociais e do intervencionismo do

41 Sallum Jr (2011, p. 266) rejeita o uso do termo neoliberal para caracterizar o governo Collor. Para o autor, o jargão neoliberal confunde a compreensão histórico-sociológica do processo político ocorrido no início da década de 1990. Schneider (1992, p. 12) é mais incisivo ao rejeitar a utilização do termo neoliberal para caracterizar o governo Collor, pois para o autor: “reformas neoliberais como a privatização têm recebido relativamente pouca atenção nos debates políticos porque o Brasil não possui uma direita disposta a defender uma agenda neoliberal explícita”. O texto de Schneider foi escrito no calor dos acontecimentos políticos de 1991, portanto, sua compreensão dos desdobramentos neoliberais do governo Collor é limitada. Escrito em maio de 1990, o texto de Luciano Martins (1991, p. 33) apontava para um processo de liberalização da política e da economia no Brasil, em que a integração brasileira ao bloco composto por EUA, Canadá e México (NAFTA) representaria o que o PSDB chamava, à época, de choque capitalista. Para nós, os contornos neoliberais do governo Collor estavam bastante acentuados no período.

Estado, assim como um saneamento das contas públicas e a instauração do livre fluxo de capitais e mercadorias. A integração competitiva atuaria como um mecanismo de transferência do motor do desenvolvimento brasileiro para a iniciativa privada, de modo a reduzir as funções empresariais do Estado e “abrir” a economia brasileira para o exterior. Para Sallum Jr, a integração competitiva se distinguia do neoliberalismo pois era um nacionalismo de afirmação nacional no plano internacional, visando fortalecer a indústria nacional frente à competição com a indústria mundial. Tal tese nos parece bastante complicada de ser defendida, ainda mais quando analisamos o processo de desestatização conduzido pelo governo Collor no período.

Nesse governo foi instalado, pela Lei nº. 8.031/1990, o Programa Nacional de Desestatização (PND). Collor tornava-se o primeiro presidente a enfatizar claramente a privatização como mote de seu programa de governo, tentando extinguir empresas estatais deficitárias e melhorar a eficiência do gasto estatal. Em sua primeira semana de governo Collor extinguiu as empresas estatais Siderbrás (siderúrgia), Portobrás (portos) e a Interbrás (comércio exterior de petróleo) (SCHNEIDER, 1992, p. 14). A conjuntura para a implementação de um programa de privatizações tinha mudado em relação à década de 1980. O governo teve respaldo nas economias políticas latino-americanas, as privatizações eram peça chave em reformas nos países da região. A eleição direta de Collor com um programa liberalizante forneceu maior apoio popular às privatizações, assim como o apoio do congresso na aprovação da lei das privatizações.

O PND era composto de seis objetivos, tal como colocados pela Lei nº. 8.031/1990:

Art. 1° É instituído o Programa Nacional de Desestatização, com os seguintes objetivos fundamentais:

I - reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público;

II - contribuir para a redução da dívida pública, concorrendo para o saneamento das finanças do setor público;

III - permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada;

IV - contribuir para modernização do parque industrial do País, ampliando sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia;

V - permitir que a administração pública concentre seus esforços nas atividades em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades nacionais;

VI - contribuir para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo da oferta de valores mobiliários e da democratização da propriedade do capital das empresas que integrarem o Programa.

A gestão do PND ficou sob o comando do presidente do BNDES, banco cuja atuação nas privatizações da década de 1980 o gabaritava para o desempenho da função no governo Collor. O PND contrastou fortemente com os planos de privatização da década de 1980, pois alcançava um maior número de empresas, as quais, em sua grande maioria, eram de origem estatal. O valor do programa também era bem superior à década anterior, apenas a venda da Usiminas, em 24 de outubro de 1991, rendeu ao governo duas vezes mais do que a soma de todas as privatizações da década de 1980. Além disso, o programa de privatização fazia parte da estratégia de reformas mais amplas, tais como a Política Industrial e Comércio Exterior (PICE) e a redução do déficit público (PINHEIRO; GIAMBIAGI, 1992).

A implementação do PND não foi tão bem sucedida quanto parecia ser. Collor foi eleito sem uma maioria parlamentar, o que dificultaria a passagem de suas medidas de ajuste fiscal no congresso. A administração do PND também foi difícil, devido à precária situação das empresas estatais e acordos de acionistas que impediam a alienação pura e simples de várias empresas. Para a venda das empresas o governo criou um papel para realizar as privatizações, chamado de “Certificados de Privatização” (CPs), os quais foram compulsoriamente adquiridos pelos bancos. Esses papéis só poderiam ser utilizados na aquisição de estatais “e que renderia correção monetária de mais 6% ao ano, até o primeiro leilão de privatização feito pelo BNDES; a partir daí, sofreria deságio de 1% ao mês, até atingir uma desvalorização máxima de 60%, 40 meses depois” (FILGUEIRAS, 2000, p. 87- 88). Devido aos atrasos no início do PND, a oferta de CPs, junto ao sistema financeiro, foi reduzida significativamente. O governo, no início do processo, esperava arrecadar entre 7 a 9 bilhões de dólares em CPs, mas menos de US$ 500 milhões dessa moeda foram usadas nas privatizações (PINHEIRO; GIAMBIAGI, p. 49).

Um dos principais lemas do PND era a redução do déficit público, porém, no próprio texto da Lei nº 8.031/1990, tal item é figurado secundariamente, assim como os próprios gestores do processo sabiam que o programa não seria suficiente para tal fim. Como colocado pelo presidente do BNDES e da Comissão Diretora do PND:

A redução da dívida pública, que será alcançada com a privatização, como se sabe não resolve o problema do déficit público. Com a privatização se troca um fluxo de recursos futuros por seu valor presente. A liquidez do Governo aumenta e suas contas ficam menos vulneráveis às taxas de juros, o que é um efeito altamente benéfico para se consolidar a estabilização econômica, mas seu patrimônio líquido não se altera. Por isso, o esforço do ajuste fiscal não poderá ser minimizado (MODIANO, 1991, p. 45. Apud. PINHEIRO; GIAMBIAGI, 1992, p. 41).

O PND falhou enquanto parte de uma política de reformas estruturais mais amplas. Desse modo, o afã de liberar recursos humanos, físicos e financeiros para outras áreas

do governo foi bastante problemático, pois houve uma séria desarticulação entre as políticas que deveriam apoiar o programa, a ponto de o PND não cumprir seus objetivos. O programa de reformas do governo Collor não foi acompanhado de políticas específicas condizentes com o objetivo de fortalecer áreas como saúde e educação. Para Pinheiro e Giambiagi (1992, p. 54), o governo lançou-se em uma reforma administrativa mal concebida, desarticulando a máquina pública e descoordenando a política econômica em curso.

Com o aprofundamento da crise política e o consequente impedimento do presidente Fernando Collor em 1992, o PND perdeu força e foi paralisado. A inserção da RFFSA no PND foi feita nesse ano, por meio do Decreto nº. 473/1992, contribuindo para sua não desestatização no período.

O governo Itamar Franco (PMDB) (1992-1994) privatizou 15 empresas, que renderam um montante de US$ 4,6 bilhões para os cofres públicos. Nesse rol de empresas figuram a empresa de geração de eletricidade, FURNAS, e a empresa de engenharia e construção aeroespacial, EMBRAER (FILGUEIRAS, 2000, p. 115). Em 1993, o então Senador pelo estado de São Paulo, Fernando Henrique Cardoso (PSDB), assumiu o Ministério da Fazenda do Governo Itamar Franco. Fernando Henrique foi um dos criadores do Plano Real, cujo objetivo era diminuir a inflação e abrir o mercado brasileiro ao capital estrangeiro. O Estado, com isso, assumia os compromissos da agenda liberal sistematizada pelo chamado Consenso de Washington. Entre esses compromissos figuravam a abertura de novos espaços e oportunidades de investimento para os capitais privados (FILGUEIRAS, 2000, p. 28).

Em 1994, Fernando Henrique Cardoso foi eleito Presidente. Sua eleição marcou, definitivamente, a entrada do Brasil na variedade de capitalismo neoliberal. Uma das primeiras pautas de sua agenda de governo era a privatização do restante de ativos públicos, aí incluídos grandes filões, tal como a concessão de serviços públicos e algumas das empresas mais lucrativas do Estado brasileiro. O governo Collor destravou o processo de privatização da economia brasileira, cabendo ao Governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) expandí-lo e acelerá-lo.

Junto às desastizações e privatizações, vieram medidas de ajuste fiscal, liberalizando o câmbio e reforçando a necessidade de se fazer caixa para o funcionamento da administração pública. Isso, face às condições de empréstimos que o Governo contraía junto a instituições financeiras internacionais, tais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. As privatizações no governo de Fernando Henrique serviram para o Estado fazer caixa, iniciando as desestatizações pelas empresas do setor de serviços, especificamente o de comunicações, o qual rendeu US$ 29,1 bilhões (FILGUEIRAS, 2000, p. 115). Uma das

primeiras leis sancionadas pelo governo Fernando Henrique Cardoso foi a Lei de Concessões, Lei nº. 8.987/1995. A referida Lei teve por base o Artigo 175 da Constituição Federal (BRASIL, 1988) e permitia a participação da iniciativa privada em novas áreas, tal como a prestação de serviços públicos de infraestrutura Essa lei abriu espaço para a concessão de uma gama diversa de serviços de infraestrutura, tal como comunicações, energia e transportes.

As privatizações tornaram-se, na prática, elemento central do novo projeto de desenvolvimento do governo. O setor de telecomunicações foi um dos primeiros a ser privatizado, necessitando, para tal fim, da promulgação da Emenda Constitucional nº. 08/1995. Isso aponta para o grau de organicidade entre as propostas da Presidência e o Legislativo, pois para a aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) são necessários 3/5 dos parlamentares. Destravados os nós jurídicos do processo de privatização, os leilões ocorreram sem maiores atrasos.

A complexidade institucional do Governo Fernando Henrique foi maior do que os anteriores. No pacote de medidas neoliberais, figuravam uma reforma previdenciária assim como uma reforma administrativa, a qual separou as atividades fulcrais do Estado daquelas atividades que poderiam ser designadas públicas não estatais42 (BRASIL, 1995). A prestação

de serviços públicos não estava na prioridade das atividades a serem mantidas no núcleo duro do Estado, por isso foi concessionada para a iniciativa privada. A reforma administrativa contribuiu para o programa de privatizações e desestatizações do governo, fornecendo os meios institucionais para a regulação dos setores concedidos à iniciativa privada por meio da criação de Agências Reguladoras. Tais agências não figuravam de maneira consistente e definida no PDRAE (BRASIL, 1995), de modo que, apenas em 1996, o MARE recomendou os princípios para a institucionalização delas. As agências foram formuladas nos ministérios setoriais, sendo que as organizações voltadas para a reforma administrativa tentavam compatibilizar seu desenho ao processo de institucionalização em curso no governo de Fernando Henrique. Assim, o MARE não elaborou regulamentos para a operacionalização das

42 A reforma administrativa implementada pelo Ministério da Administração Pública Federal e Reforma do Estado (MARE), capitaneado pelo economista Bresser Pereira, foi mais um passo na tentativa de alterar alguns legados estatais do período Varguista. Ainda em 1995, foi instituído o Plano Diretor da Reforma do Estado (PDRAE) (Brasil, 1995), contendo um novo modelo de gestão para o setor público a partir da redefiição do papel do Estado e da instauração de um novo modelo de administração por resultados. O PDRAE possuía três elementos principais: a) a transformação do papel do Estado e das estratégias de desenvolvimento; b) as funções vitais da burocracia pública; e c) os modelos institucionais diferenciadores. O primeiro elemento era uma clara crítica às políticas desenvolvimentistas centradas na política Estatal e na crença de que fora do Estado não existiria desenvolvimento. O segundo e terceiro elementos tinham a intenção de transformar os órgãos públicos, por meio de vigorosas reformas em seus mecanismos institucionais, em competidores de mercado, ou seja, moldar instâncias da burocracia pública para concorrer com outras empresas no mercado. O grande mote da reforma era desconstruir a estrutura da administração pública federal, que no diagnóstico do MARE, era vista como grande e ineficiente. (PEREIRA, 1998; REZENDE, 2004).

agências, tampouco seu relacionamento com outras instâncias do Governo Federal (NUNES et al, 2007). O conceito43 de agências reguladoras foi importado de outras experiências

administrativas nacionais, principalmente a estadunidense, tal como já vimos no capitulo I, o caso da Interstate Commerce Comission (ICC).

A criação de agências reguladoras no Brasil não se deu num vazio teórico. Entre as décadas de 1970 e 1980 surgiram algumas experiências de reformas administrativas em países de língua inglesa, intitulada de New Public Administration. Essa reforma começou nos países desenvolvidos, e seus princípios se baseavam na descentralização da burocracia, enxugamento da máquina estatal, princípios de confiança e responsabilização dos funcionários públicos, gerência por resultados, entre outros (POLLITT, 1990; FERLIE et al, 1999). Esses pressupostos básicos das reformas administrativas se espalharam pelo mundo, atingindo também o Estado brasileiro. Apesar de conter elementos de isomorfismo institucional frente a outras experiências nacionais, as reformas administrativas foram elaboradas e implementadas de acordo com o contexto político em que estiveram inseridas.

As agências reguladoras, tal como apontado em seu princípio normativo jurídico, devem ser alinhadas às políticas públicas que regulam, de modo a exercerem em seu interior os três poderes concernentes ao Estado moderno concomitantemente. Assim, as funções regulatórias das agências podem ser discutidas em termos Executivos, Legislativos e Judiciários. As funções regulatórias executivas dizem respeito à concessão e a fiscalização de direitos econômicos; as legislativas são concernentes à definição de normas e procedimentos com força legal; a função judiciária é relativa à interpretação de contratos e a imposição de penalidades (NUNES, et al, 2007, p. 251).

Para a implementação das privatizações no setor de telecomunicações o Governo criou um marco regulatório, erigido pela Lei nº. 9.472/1997, a qual regulamentou a Emenda Constitucional nº. 08/1995. A criação da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), em 1997, foi realizada no sentido de dotar o Estado de capacidade regulatória frente aos capitais privados que entravam no recém-aberto setor. Dinâmica diferente foi observada no setor de transportes, o qual primeiro foi privatizado para depois ser regulado. A análise sobre esse ponto será feita mais adiante neste capítulo.

O Ministério da Fazenda nos mandatos de Fernando Henrique Cardoso ocupou posição central na coordenação do Executivo Federal. O que de mais importante acontecia no

43 A formatação institucional da regulação econômica no Brasil foi baseada no estilo estadunidense de regulação, onde corpos burocráticos ou organizações independentes já eram utilizados desde o final do século XIX para a consecução desse objetivo (CRUZ, 2007). Porém, existem importantes diferenças entre a concepção jurídica das agências nos EUA e no Brasil, tal detalhamento é feito por Nunes et al (2007).

país, em termos de reformas e definições econômicas e políticas, passava por tal ministério. Dada a ênfase nas questões fiscais, redução de gastos e políticas de estabilização macroeconômicas implementadas pelo Governo Federal, a partir de 1995, o ministério, com alta capacidade técnica, exerceu seu poder de coordenação sobre o restante do gabinete ministerial. Essa coordenação se deu por mecanismos formais e informais. Os mecanismos formais foram ligados à capacidade de liberar ou contingenciar recursos por intermédio da Secretaria do Tesouro, possibilitando ao presidente da República controlar a delegação de funções nos outros ministérios. O ministério também exerceu a coordenação disseminando informalmente seu raio de ação ao restante do gabinete com o aumento significativo de profissionais ligados à área econômica no gabinete ministerial, numa tentativa de vincular determinados nichos de poder no interior da coalizão ao plano econômico do governo. O Governo de Fernando Henrique Cardoso optou por uma estratégia de negociação na implementação de políticas neoliberais, lançando o Ministério da Fazenda para essa função, o qual foi uma das instituições com maior poder dentro da burocracia federal no período 1995- 2002. (LOUREIRO; ABRUCIO, 1999).

A reforma administrativa não prosperou, principalmente, pelos constantes vetos do Ministério da Fazenda na condução do processo. A reforma administrativa avançou apenas enquanto estava em consonância com os pressupostos do ajuste fiscal elaborado e conduzido pela Fazenda. A dificuldade de articulação do MARE com outros ministérios setoriais o levou a um isolamento, impedindo o avanço do ímpeto reformista (REZENDE, 2004).O legado da reforma permanece sendo inconteste quando olhamos para a burocracia pública federal hodierna, as agências reguladoras são resultado desse movimento.

A privatização e a desestatização do setor de infraestrutura econômica não foi exclusividade do Brasil. A América Latina, como um todo, passou por tal processo, desnacionalizando setores importantes de apoio ao desenvolvimento econômico nacional. Essa conjuntura internacional é analisada no próximo item.

2.2. O investimento em infraestrutura econômica na América Latina nos anos 1990.