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O trabalho como mercadoria pela concepção marxista

CAPÍTULO 2 A RESPEITO DO HOMEM E DO TRABALHO

2.2 Súmula de Economistas

2.2.3 O trabalho como mercadoria pela concepção marxista

A questão do valor de produção trabalhado recebeu de Marx uma atenção especial. Foi ele o criador da teoria da mais-valia, que consiste no valor de trabalho não pago ao trabalhador, ou seja, a exploração exercida pelos capitalistas sobre os assalariados.

A abordagem marxista parte da teoria do valor exposta por David Ricardo. Como visto, segundo esta teoria o valor de um bem é determinado pela quantidade de trabalho necessária para a sua produção. Marx irá destacar a questão do valor trabalho, acrescentando, sobre a visão ricardiana, o conceito de trabalho socialmente necessário. O trabalho socialmente necessário refere-se ao tempo de trabalho requerido para produzir um valor de uso qualquer, nas condições dadas de produção socialmente normais, e com grau social médio de habilidade e de intensidade de trabalho.

Marx assinala que, enquanto o capital ainda se apresenta sob suas formas elementares – mercadoria e dinheiro –, estas não são em si mesmas capital. Da mesma forma, a eventual remuneração do trabalho ou a existência do mercado não configuram, isoladamente, um circuito de produção capitalista. Determinadas condições têm de ser cumpridas para que o capital exerça sua função específica, que é a produção da mais-valia, a produção de trabalho excedente ou a apropriação de trabalho não pago.

De acordo com Marx, a realização do lucro capitalista não é originada nas trocas, pois se assim fosse não existiriam mecanismos para a incorporação de valor, dado que se trataria apenas de intercâmbio de bens de mesmo valor. Marx afirma ainda que o valor é atribuído à produção e aos valores acrescentados a esta pelos trabalhadores, que por sua vez não recebem a diferença do valor incorporado à produção, mas apenas o necessário a sua sobrevivência, vindo a desenvolver, a partir deste hiato, a questão da mais-valia, que para Marx é a diferença entre o valor incorporado a um bem e a remuneração do trabalho que foi necessário à sua produção. O capital compra, pois, o valor de uso da força de trabalho, passando a ser o possuidor desta. A partir dessa situação, o desejo do capitalista é produzir mais-valia, ou seja, que o valor da mercadoria produzida ultrapasse o valor das mercadorias necessárias para produzi-la, estando entre elas a força de trabalho.

Marx afirmava que a origem do lucro está na mais-valia. Segundo a teoria marxista, no tempo de trabalho socialmente necessário para a produção das mercadorias há uma parcela paga ao trabalhador relativa ao seu salário, mas há outra que é sobre trabalho não pago. Essa parcela não paga representaria a mais-valia.

A crítica de Marx à economia política clássica consistiu em apontar que as relações de produção capitalista constituem relações de produção de valores de troca (mercadorias) que têm como objetivo a acumulação de capital, obtida pela expropriação da mais-valia gerada pela força de trabalho no processo capitalista de produção. No sistema capitalista ocorre a dissociação entre a força de trabalho e a propriedade dos meios de produção, sendo que, para o trabalhador livre, a venda da força de trabalho torna-se a única alternativa para obter, através do salário, sua sobrevivência. "O valor de toda mercadoria M de produção capitalista se expressa na fórmula: M = c + v +m. Descontando do valor do produto a mais-valia m, obteremos mero equivalente, isto é, valor que repõe em mercadoria o valor capital c + v empregado nos elementos da produção" (MARX, 1987, p.30).

Marx distingue o valor de uso do valor de troca. Valor de uso representa a utilidade que o bem proporciona à pessoa que o usufrui. O valor de troca de uma mercadoria, por sua vez, exige um valor de uso, mas não depende dele. Para Marx, o valor de troca depende da quantidade de trabalho socialmente necessária, ou seja, só o trabalho dá valor às mercadorias. As máquinas e os equipamentos apenas repassam parte do seu valor às mercadorias, mas não conseguem atribuir valor a estas, não contribuindo, assim, para a formação de valor.

Os trabalhadores, por seu turno, fazem com que os equipamentos e as máquinas transmitam valor às mercadorias, além de criar valor sobre estas.

Em troca da realização de sua atividade o trabalhador recebe salário, mas o valor que ele acresce ao processo produtivo é superior ao valor do salário, ou seja, geração de mais-valia. De acordo com Marx, os capitalistas e os proprietários procuram aumentar os seus rendimentos diminuindo o rendimento dos trabalhadores, configurando, assim, a exploração da força de trabalho pelo capital, sendo este um dos principais pontos da crítica marxista. "...O prolongamento da jornada aumenta o lucro mesmo quando pago o tempo extraordinário, e, até certo ponto, mesmo quando pago mais caro que as horas normais de trabalho. Por isso, no sistema industrial moderno, a necessidade cada vez maior de aumentar o capital fixo era poderoso incentivo no sentido de levar os capitalistas ávidos de lucro a prolongar a jornada" (MARX, 1987, p.87).

Parte da demanda de trabalho é explicada através do Progresso Técnico. Esta variável é inerente ao sistema capitalista, sendo também inversa à demanda por trabalho. Assim, na busca da concorrência capitalista e do domínio de mercado, os capitalistas avançam no progresso técnico reduzindo sua demanda por mão-de-obra.

Marx diferencia o capital necessário para a realização da produção em Capital Constante, representado pelo capital investido em meios de produção, e Capital Variável, que trata do capital investido na força de trabalho. O capital constante é

assim considerado porque o seu valor não muda durante o processo produtivo; já o capital variável produz um valor diferente, consoante à intensidade da sua utilização.

Os meios de produção só transmitem valor na medida em que perdem valor, ou seja, não podem acrescentar ao produto mais do que possuem, daí Marx defini-los como capital constante, pois, apesar de fazer parte do processo de criação de mais- valia, não a produzem. Por sua vez, o trabalho conserva e transmite o valor dos meios de produção ao Produto, teoria esta já especulada por Smith.

Tanto no Progresso Técnico, como, principalmente, na Acumulação de Capital, residem para Marx as principais contradições do capitalismo. A tendência do capitalista é a acumulação do capital, e tendo em vista que a taxa de mais-valia e a taxa de lucro são decorrentes da utilização do capital variável (força de trabalho), estas tendem a declinar quanto mais se intensifica a utilização do capital constante (máquinas, equipamentos, etc.). Portanto, a taxa de lucro do sistema capitalista é declinante.

Para Marx, o movimento de declínio da taxa de lucro pode ser contrariado pela exploração da força de trabalho. Aumentando esta, irá aumentar a mais-valia e, conseqüentemente, a taxa de lucro. "A taxa geral de lucro pode variar, sem que se altere o valor das mercadorias, quando varia o grau de exploração do trabalho." (MARX, 1987, p.189).

Uma observação não realizada por Marx é que o progresso técnico aumenta a produtividade marginal do trabalho, resultando numa maior exploração da força de trabalho e em uma maior mais-valia.

Outro ponto inerente ao progresso técnico e à acumulação de capital dentro do sistema capitalista é a monopolização. Uma vez que a acumulação é parte do sistema capitalista, algumas empresas não irão conseguir competir no mercado. As empresas menos competitivas desaparecem, concentrando a indústria em poucas empresas. À medida que a concentração e o progresso técnico aumentam, a concorrência diminui. Aquelas empresas que não conseguem acompanhar o ritmo das inovações, por não terem tecnologia e capital suficiente para seguir competitivas, são obrigadas a

cessar sua atividade. A tendência do capitalismo é, portanto, a concentração, uma vez que nem todos conseguem acompanhar o progresso técnico.

Ponto inerente à teoria marxista, e bastante relevante para o desenvolvimento desta tese, é que, dada a concentração e acumulação de capital, mais trabalhadores são excluídos do processo produtivo, formando o chamado Exército Industrial de Reserva. A introdução do progresso técnico faz com que parte do capital variável se transforme em capital constante, ou seja, parte dos trabalhadores fica desempregada, aumentando a reserva de força de trabalho. A existência do Exército Industrial de Reserva mantém a oferta de força de trabalho o suficiente para impedir que o preço desta aumente.

Marx argumentava que os produtores procuravam diminuir, continuamente, os custos da mão-de-obra e obter maior controle sobre os meios de produção, substituindo trabalhadores por bens de capital, sempre e onde fosse possível. Dizia que os capitalistas não lucravam apenas com a maior produtividade, custos reduzidos e maior controle sobre a produção, mas também com a criação de um imenso exército de trabalhadores desempregados, com o que o poder de trabalho estaria disponível para exploração em algum outro lugar da economia.

Quando Marx apresentou sua crítica ao capitalismo e aos capitalistas, em defesa do trabalhador, a economia vivia a euforia da industrialização, que começara no século anterior, na Inglaterra, e já se espalhava por toda a Europa.

A crescente automação e revolução tecnológica no mundo contemporâneo fez com que as previsões de Marx se confirmassem, uma vez que já na época da revolução industrial o homem era substituído pela máquina e o desemprego era crescente.

Prognosticou que a maior automação da produção acabaria por eliminar completamente o trabalhador, resultando na "derradeira metamorfose do trabalho", quando um sistema automático de maquinaria substituiria finalmente seres humanos no processo econômico.

Ainda no século XIX, Karl Marx faz observações, em seus escritos, que podem estar relacionadas com a nossa realidade contemporânea. Ele afirmou que as bases técnicas promovem um tal desenvolvimento da força produtiva social do trabalho que vão tornando livre o próprio trabalho.

Marx previu, assim, uma progressão constante de substitutos mecânicos cada vez mais sofisticados para a mão-de-obra humana, afirmando que cada salto tecnológico tornaria as operações do trabalhador mais e mais mecanizadas, até que, em determinado momento, o mecanismo poderia tomar seu lugar.