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Os comunistas e a união nacional

No documento História e Historiografia (páginas 185-188)

Para compreendermos a forma que as representações políticas assumem no jornal, devemos pensar inicialmente sobre as questões próprias dessa conjuntura política, as condições e a própria linha po- lítica adotada pelos comunistas. Durante a ditadura estadonovista, quando quase toda a direção partidária estava presa, o PCB encon- trava-se em profunda clandestinidade, reprimido, com graves defi- ciências organizativas e atuava de forma reduzida na sua influência na sociedade, por ser um dos poucos órgãos partidários em funcio- namento nesse período, o Comitê Regional da Bahia “que era pro- vavelmente o principal Comitê Regional do PCB organizado entre 1941/42” (SENA JUNIOR, 2007, p. 132), funciona como uma espécie de Comitê Central do PCB durante esses anos de clandestinidade.

Em 1942, a mudança da política externa brasileira com a entra- do país na guerra ao lado dos aliados, fortalece internamente a luta em defesa da democracia, expressa sobretudo com o aumento das mobilizações contra o Estado Novo. A mudança de postura do go- verno tornou possível a construção de um projeto político de união nacional, com a adesão do PCB. “Os comunistas afirmam a defesa da união nacional, de apoio ao governo Vargas na luta antifascista” (MELO, 2011, p. 726), posição oficial consolidada na Conferência da Mantiqueira em 1943. Entretanto, as divergências e disputas in- ternas eram uma constante presença, na Bahia e no Rio de Janeiro, grupos de militantes se organizaram em torno da Comissão Na-

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cional de Organização Partidária (CNOP), que defendiam o apoio incondicional dos comunistas ao estado novo e governo Vargas em um “momento em que a Segunda Guerra Mundial começava a ga- nhar contornos decisivos com as potências europeias somando for- ças contra os países do eixo” (BORGES, 2016, p. 38). Em São Paulo, desagradados e descontentes com a decisão oficial de “apoio incon- dicional a Vargas”, o Comitê Regional de São Paulo defendia uma postura de independência política em relação ao governo varguista, “militantes como Caio Prado e Mário Schemberg, Organizados no Comitê de Ação, rejeitava a liderança carioca, opondo-se a decisão da conferência de Mantiqueira (1943) de apoio a Vargas” (MELO, 2011, p. 727). Nos anos de 1945, 1946 e 1947 da Tribuna Popular, nenhuma menção significativa sobre as divergências internas sobre a União Nacional são feitas no jornal.

A respeito da União Nacional, Ildefonso Rodrigues Lima Neto assinala:

Os comunistas entendiam que a nova etapa de mudanças na conjuntura seria atuar no processo eleitoral. A política era uma forma de atuação nas decisões do poder, portan- to, a “União Nacional” conclamada pelo líder Luís Carlos Prestes, em 1945, era uma forma de participar e ser acei- to diante das mudanças políticas (LIMA NETO, 2006, p. 223).

Em um discurso6 publicado pela Tribuna Popular em 24 de maio

de 1945, na terceira edição do jornal, Prestes manifesta a posição ofi- cial do PCB durante um comício no estádio do São Januário

Dirigir a Pátria pelo caminho do progresso. Esta é a nossa tarefa atual e urgente. Para levá-la a bom termo, de ma- neira ordeira e pacífica, é que precisamos da união mais firme e leal de todo o nosso povo, dos patriotas, demo-

6 Esse discurso de Prestes se tornou um livreto vendido pela Edições Horizontes ao preço de Cr$ 1,50, anunciado nas páginas da Tribuna Popular.

O PCB e o campo Intelectual comunista da América Latina (1945-1952)

cratas e progressistas de todas as classes. Contra uma unidade tão ampla só poderá ficar a minoria reacioná- ria e fascista que ainda espera conseguir deter a avalan- che democrática com golpes de estado e guerra civil [...] Ao proletariado cabe um papel dirigente e fundamental nesse grande esforço de unificação nacional, porque só a classe operária organizada sindicalmente pode realmente mobilizar as grandes massas populares e fazer com que a política nacional se desenvolva mais rapidamente no sentido da democracia e da liberdade (TRIBUNA POPU- LAR, 24/05/1945, p. 5).

A Tribuna Popular tem uma participação estratégica na disputa das ideias e das leituras na sociedade, ao publicar frequentemente na íntegra os discursos de Prestes e de outras figuras públicas favoráveis a união nacional.

Como já ilustrado pela fala de Prestes, a linha política da União Nacional pode ser entendida enquanto uma transição para a demo- cracia dando ênfase na cooperação entre a classe trabalhadora e a burguesia nacional progressista em torno de um desenvolvimento pacifico e comum a nação brasileira, contra as forças imperialistas, latifundiárias e fascistas. A proposta do PCB, naquele contexto, con- vocava a classe operária a se organizar e “assumir um papel dirigen- te”, defendendo a linha de moderação e cordialidade com os patrões, pois eles poderiam estar dispostos a escutar e atender as demandas dos trabalhadores. Entretanto, os capitalistas “na realidade, não es- tavam nem um pouco dispostos a fazer concessões salariais e con- tinuaram a cerrar os dentes e punhos diante dos crescentes apelos proletários por melhores condições de vida e serviço” (OLIVEIRA, 2011, p. 17). O otimismo do convívio pacifico logo foi substituído pelo temor às forças burguesas. A ascensão das reivindicações e mo- bilizações sociais da classe trabalhadora durante esses anos não foi permitida pela burguesia, que junto ao governo “deu sinais claros de que não estava disposto a dialogar com as lideranças sindicais e

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muito menos tolerar o crescimento do protagonismo da classe traba- lhadora” (OLIVEIRA, 2011, p. 28).

Entre 1943 a 1947, a política oficial do PCB foi a da União Na- cional, elemento unificador ao longo do nosso recorte temporal não só entre os comunistas brasileiros, mas um denominador comum, inclusive, entre outros partidos comunistas de diversas partes do continente que também adotaram essa orientação política, cada qual guardando a sua particularidade e o seu contexto. Esse período po- lítico latino-americano constitui um momento de grande relevância, sendo complexo e problemático, pois ação política implementada por esses partidos comunistas são vitoriosas durante um momento desse processo, entretanto, saem desse período com um complicador e uma série de problemas que repercutirão nos anos seguintes.

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