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Pilares mantenedores da mitificação da mulher-professora

No documento História e Historiografia (páginas 172-175)

Diante desses fatores que há muito foram cunhados em nossa rea- lidade social podemos notar que, apenas não estando mais em seu estado inicial de extremo binarismo de papéis, ocorrera a consolida- ção dessa relação natural entre a mulher e à docência, onde esse mito apenas se remodelou aos novos caracteres, signos e transformações sociais de cada tempo. Como afirma Scott (1995, p. 86):

Esses conceitos estão expressos nas doutrinas religiosas, educativas, científicas, políticas ou jurídicas e tomam a forma típica de uma oposição binária fixa, que afirma de maneira categórica e inequívoca o significado do homem e da mulher, do masculino e do feminino.

É de comum conhecimento que toda base só se solidifica satis- fatoriamente se seus suportes forem bem moldados, executados e alicerçados. Isto posto podemos eleger que o trajeto de readaptação do mito Mulher-Professora aos contextos históricos obteve bases de apoio sólidas o suficiente para alcançarem grande proporção, neste momento do trabalho tentaremos elucidar algumas delas.

Compreende-se que, disposto sobre muitas teorias e estudos acerca de classes e no que tange a “máquina” econômica que move o mundo, o sistema capitalista é como um organismo vivo e pulsante dentro de nossa sociedade, destarte toda a longa e aprofundada li- teratura que existe sobre, se discutirá no presente trabalho somente os entrelaces que dizem respeito à docência, cargos e espaços que às mulheres tem ocupado, não significando isto que há uma história po- lítica e econômica exclusivamente separada de um gênero (SCOTT, 1995, p. 74), pois sem a complementariedade de um, não haveria a sustentação do outro (gênero aqui estabelecido enquanto O Homem e A Mulher), mas apenas elucidando o recorte atualmente feito.

Entre a maternidade e a docência: O mito da educadora nata e a mulher professora na educação básica

Apesar de haver um horizonte a se perder de vista se formos pro- curar origens e isolá-las cada qual em seu contexto sociocultural, a literatura nos trouxe a luz o processo que se fizera intrínseco ao capi- talismo, o devidamente bem estruturado patriarcado. Sendo este pre- sente de forma indissolúvel na sociedade,” o patriarcalismo compõe a dinâmica social como um todo, estando inclusive, inculcado no inconsciente de homens e mulheres individualmente e no coletivo enquanto categorias sociais” (MORGANTE; NADER, 2014, p. 3). E como nos elucida também Saffioti (2000, p. 72): “Foi nas sociedades de caça e coleta, nas quais reinava a igualdade de gênero, que os ho- mens, desfrutando de tempo livre (a caça sendo atividade praticada uma ou duas vezes por semana), criaram os sistemas simbólicos que inferiorizam socialmente as mulheres” (SAFFIOTI, 2000, p. 72).

Sendo denominado este o responsável pela hierarquização, sub- jugação de gêneros (até mesmo pelos novos significados embutidos neste conceito) pode-se reafirmar também com a colocação da so- cióloga Saffioti (1987 apud GONÇALVES; SILVA, 2019), “Assim, o patriarcado não é apenas um sistema de dominação, mas também de exploração, sendo que aquela pode ser localizada no campo político, esta localiza-se no campo econômico” (GONÇALVES; SILVA, 2019, p. 7). Partindo desse trecho podemos ter maior clareza da indisso- ciabilidade do sistema capitalista com a organização social patriar- cal, trabalhando a partir do prisma de que há a relação dominação/ exploração nas relações de classe, raça e gênero, o patriarcado desta- ca-se pois percorreremos a análise histórica de que fora crucial que a mulher, enquanto sujeito submisso e por conseguinte, explorado, se consumasse por suas obrigações matrimoniais de esposa e edificado- ra do lar para que o homem então pudesse desenvolver prestigiosa- mente sua vida pública, ocupando espaços públicos, consumindo e ditando as normas sociais dessa esfera macro e pública. Não sendo apenas circunscrito a vida privada familiar, observamos essas bases patriarcais nas relações de trabalho, de educação e etc.

História e Historiografia: experiência de pesquisa

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Como esfera complementar e igualmente inseparável dos costumes sociais, encontramos a grande valorização dos costumes tradicionais re- ligiosos de origem judaico-cristã. Perpetuados com exímia naturalidade em nosso seio sociocultural, a instituição em si é inegavelmente deten- tora de um magnânimo poder basilar em nossa sociedade ocidental. Sua contribuição para a subjugação feminina dentro do patriarcado também fora construída sob a égide de múltiplos fatores, desde a culpabilidade feminina do pecado inicial até sua delimitação de função enquanto re- produtora. Seguindo o mesmo princípio afirmara Delumeau (1989, p. 314) (1989 apud LEMOS, 2013, p. 204) ao redigir:

Pandora grega ou Eva judaica ela cometera o pecado ori- ginal ao abrir a caixa que continha todos os males ou ao comer do fruto proibido. O homem procurava uma res- ponsável pelo sofrimento, o fracasso, o desaparecimento do paraíso terrestre e encontrou a mulher.

Em vista disso, são elaborados dogmas os quais são norteadores da doutrina judaico-cristã e que, até hoje, orientam os fiéis que escolheram seguir tal crença, dentre eles e de modo exclusivo feminino temos as- sociações com a pureza, permissividade, santidade pacificadora e entre outros. Elaborados a partir deste prisma e corroborados por passagens bíblicas (BÍBLIA, Efésios 5, 22-24), (BÍBLIA, Coríntios 11, 7-9) como:

Esposas, cada uma de vós respeitai ao vosso marido, por- quanto sois submissas ao Senhor; porque o marido é o cabeça da esposa, assim como Cristo é o cabeça da Igreja, que é o seu Corpo, do qual Ele é o Salvador. Assim como a igreja está sujeita a Cristo, de igual modo as esposas es- tejam em tudo sujeitas a seus próprios maridos.

E ainda:

O homem, pois, não deve cobrir a cabeça, porque é a ima- gem e glória de Deus, mas a mulher é a glória do homem. Porque o homem não provém da mulher, mas a mulher

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do homem. Porque também o homem não foi criado por causa da mulher, mas a mulher por causa do homem.

Como estas existem outras que ratificam a necessidade da sub- missão feminina perante o marido, sendo este o ideal de autorida- de máxima dentro do seu lar. Vemos particularmente neste último trecho citado, a direta situação de subalternidade que fica explícita ao colocar a Mulher como consequência do, e para o Homem, ou seja, essa só parece existir em função da necessidade do outro, como um corpo complementar ao outro e não enquanto um ser individual. Embora todo esse papel de subalternidade seja acoplado a mulher, elas ainda “compõem, de fato, a maioria da população de fiéis. ‘Em nome de Deus’, tornam-se ativistas, freiras, obreiras, pastoras, bispas, mães-de-santo, políticas[...]” (ROSADO-NUNES, 2005, p. 364), to- davia não cabe a esse atual trabalho distinguir ou julgar quais as ra- zões que, superficialmente observando, levam as mulheres a preen- cher amplamente um espaço que as subjugas em certos aspectos.

No documento História e Historiografia (páginas 172-175)