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5 SOFRIMENTO E PRECARIZAÇÃO NO MUNDO DO TRABALHO

5.7 AS TRAGICAS CONSEQÜÊNCIAS DA PRECARIZAÇÃO SOBRE A SAÚDE DO

5.7.2 Os danos emocionais

47 Ibidem, p. 114.

48 Ibidem, p.171 e 176. Quando eu procuro o médico da empresa, ele sempre me dizia: “Você está prejudicando a empresa. Por sua causa, a produção esta diminuindo. É uma seqüência o teu serviço! Pede a tua conta porque, no teu caso...você só vai sofrer a cada dia”. (M., branca, LER, ind. farmac.).

Eu tive vários problemas com os médicos do INPS e da empresa. Se é o médico do INPS, trata a gente humilhado. Ele disse. “Você não tem nada. Já está boa. Tem que trabalhar, porque o INPS não vai ficar lhe sustentando para o resto da vida. Você é jovem e tem que se virar”. Tive raiva desse médico. Ele falou isso alto e com a porta aberta. Todo mundo ficou olhando e parecia que eu era criminosa, que eu estava roubando o INPS. Com toda a raiva que eu estava, eu disse: “Doutor, eu só quero o que é meu. Eu quero trabalhar, mas quero a minha saúde de volta, e o senhor é médico e não ta sendo capaz de me dar ela de volta”. Tive vontade de dar nesse médico! (M., parda, asma, ocupac., ind. Cosmét.).

Todas as situações de sofrimento, assédio, intensidade do trabalho, meio ambiente do trabalho desequilibrado, enfim, as diversas circunstâncias de trabalho precarizado expostas ao longo deste capítulo são, potencialmente, causadoras não apenas de doenças de ordem física, mas também atingem o lado emocional do trabalhador. Obviamente, a reação de cada indivíduo ocorre de maneira diferenciada, pois cada um reage de maneira diferente às agressões impostas. Enquanto uns desistem rapidamente, outros acumulam uma carga de stress que pode culminar, inclusive, com o suicídio. A seguinte notícia ilustra este fato:

Um funcionário de 57 anos da France Telecom se suicidou nesta terça-feira ateando fogo ao próprio corpo no estacionamento de uma unidade da empresa na cidade de Mérignac, nos arredores de Bordeaux, no sudoeste do país. A morte aumenta a já longa lista de casos de funcionários da companhia que se mataram nos últimos anos. Houve 32 suicídios entre 2008 e 2009 e pelo menos 25 no ano passado, segundo sindicatos. [...].Empregado na France Telecom há 30 anos, ele não teria suportado as mudanças frequentes de locais de trabalho, ocorridas nos últimos tempos, afirmam sindicalistas. "Essas transferências impostas o levaram a vender sua casa. Ele havia escrito várias vezes à direção, mas não obteve resposta", diz François Deschamps, representante dos sindicatos CFE-CGC-Unsa da região sudoeste da França.49

O suicídio do trabalhador é a conseqüência de uma política destinada a eliminar aqueles julgados como obstáculo ao acumulo de capital. A corporação passa a atribuir metas inatingíveis e a manipular perversamente o empregado que, entre desistir de uma história de trabalho e tentar começar em outra carreira numa idade já avançada, prefere abreviar a morte através do suicídio.

A desvalorização e o desrespeito do trabalhador durante sua jornada laboral, seja por motivações de natureza profissional ou mesmo devido a características pessoais, incrementam a lista de fatores que desencadeiam o sofrimento. Margarida Barreto assevera que nos atos de humilhação:

Predominam as emoções tristes que despontencializam e submetem, persistindo no tempo. Muitas vezes, eles vêem como única saída a solidão, situação mais freqüente entre os homens. Deprimidos e desvalorizados, sentem-se impotentes para agir; a vida gradativamente perde o sentido, e eles já não acreditam em sua capacidade. A recordação do vivido toma conta dos

49 Disponível em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/04/110426_suicidio_france_telecom_df.shtml. Acesso em: 08 de junho de 2011. Ainda segundo o site, o processo de privatização da estatal que contava com mais de 100 anos de história e a conseqüente política de reestruturação da empresa que previa a demissão de 22.000 pessoas em 3 anos, parece ter acionado o estopim para a onda de suicídios da companhia.

pensamentos e não consegue esquecer a violência sofrida. São situações que persistem por longo período em alguns, chegando a interferir no sono e na memória.50

No caso dos transtornos psicológicos advindo do assédio moral, é possível que as repercussões e os traumas resultantes da exposição a este problema persistam durante anos sob a forma de estresse pós-traumatico, sendo necessário o acompanhamento médico deste trabalhador. Marie-france Hirigoyen esclarece como o assédio moral atormenta a vida posterior do trabalhador:

A rememoração das cenas de violência e humilhação se impõe à pessoa traumatizada, que não consegue se livrar delas. Essas imagens, exteriores à pessoa que as recusa, funcionam como flashbacks dolorosos. À noite, as situações traumáticas são revividas sob a forma de pesadelos. A evocação das cenas violentas permanece dolorosa por muito tempo, às vezes até para sempre. Anos depois, as vítimas continuam a ter terríveis pesadelos associados a elas. Muitas pessoas dizem que, mesmo dez ou vinte anos depois, começam a chorar quando têm, por exemplo, de olhar papéis lembrando aquela situação. Nas cartas que vieram junto com o questionário devolvido, algumas pessoas, para quem o assédio moral tinha acontecido há muitos anos, mostraram-nos quanto o fato de reviver as feridas passadas reativava o sofrimento, intacto como no momento que ocorreu. Elas recordavam as cenas de humilhação, sentiam outra vez o mesmo golpe no estômago, a mesma vertigem.51

Ante o exposto, torna-se impreterível que os órgãos de fiscalização, o Ministério Público do Trabalho e os Auditores do Trabalho, intensifiquem suas investigações e fiscalizações nas empresas, sobretudo naquelas onde as denúncias ocorrem de maneira reiterada e naquelas onde a atividade, de per si, é potencialmente precarizada, caso das empresas que terceirizadas como os call centers, evitando com isso a proliferação dos casos de doenças ocupacionais físicas ou mentais, que decorrem, conforme exposto, das condições degradantes do ambiente de trabalho.

Procedendo desta forma, haverá uma diminuição da despesa estatal em face das aposentarias precoces por invalidez e a diminuição do tempo das licenças médicas. Porém, o

50 BARRETO, Margarida Maria Silveira. Op. cit. p. 192. Nesta mesma página, a autora colaciona um depoimento de funcionário acometido de doença profissional e dos reflexos da humilhação que sofria em decorrência da doença: “Quando eu era humilhado, eu sentia tudo: medo da doença, de ficar aleijado, de ser demitido, de não ter mais convênio...Ficava remendo o corpo todo...Tinha raiva, revolta...”(H, pardo, hérnia discal, ind. quím.).

51 HIRIGOYEN. Marie-France. Mal-estar no Trabalho: Redefinindo o Assédio Moral. Tradução: Rejane Janowitzer. 5ª ed.. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010, p.165-166.

mais importante é a melhoria da qualidade de vida do trabalhador enquanto pessoa humana, pois um ambiente de trabalho sadio repercutirá positivamente nas relações familiares do trabalhador com sua família e nas relações do individuo com a sociedade. Infere-se, outrossim, que o trabalho realizado de forma saudável e equilibrada, conduzirá a sociedade num contexto macro, a situações de maior equilíbrio.

6 SITUAÇÃO DA RELAÇÃO DE EMPREGO NA