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3 O CARÁTER PRINCIPIOLÓGICO DA PROTEÇÃO DA RELAÇÃO DE

3.4 PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO E SEUS DESDOBRAMENTOS

3.4.2 Princípio da norma mais favorável

Nas palavras do autor:

Havendo dúvida do juiz em face do conjunto probatório existente e das presunções aplicáveis, ele deverá decidir em desfavor da parte que tenha o ônus da prova naquele tópico duvidoso, e não segundo a diretriz genérica in dúbio pro operario. É que o caráter democrático e igualitário do Direito do Trabalho conduz ao desequilíbrio inerente às suas normas jurídicas e à compatível sincronia que esse desequilíbrio tem com a teoria processual do ônus da prova e com as presunções sedimentadas características desse ramo jurídico. Não se estende, contudo, o mesmo desequilíbrio à figura do juiz e à função judicante – sob pena de se comprometer a essência da própria noção de justiça. O que há de positivo, portanto, na velha diretriz (in dubio pro operário) – sua referência a um critério de interpretação de normas jurídicas – já se manteve preservado no Direito do Trabalho (através do princípio da norma mais favorável), abandonando-se, contudo, a referência superada que o antigo aforismo fazia à função judicante de avaliação e valorização de fatos. (Grifos do autor).34

Américo Plá Rodriguez leciona de maneira diversa, ou seja, admitindo a utilização do princípio in dubio pro operario inclusive no âmbito valorativo das provas. A idéia de utilizar o princípio em situações de caráter probatório é defendida pelo autor com base na condição de hipossuficiência do trabalhador. Nesse sentido, não apenas situações que ensejem desigualdade compensatória devem ser levadas em consideração pelo juiz, mas havendo dúvida no conjunto probatório, cabe ao magistrado ponderar favoravelmente ao obreiro. Justifica o autor uruguaio:

Com um maior conhecimento prático das realidades discutidas nos dissídios trabalhistas, começou a desenvolver-se, até se tornar predominante, a posição que estende a regra in dúbio, pro operário inclusive a esse campo. Apesar da vigência do sistema inquisitório, continua importante o problema do ônus da prova, entendendo-se que, na medida em que se aborda esse problema, o trabalhador merece uma consideração especial. Não apenas pela desigualdade básica das partes, nem somente pelo estado de subordinação em que se encontra muitas vezes o trabalhador, mas também pela natural disponibilidade de meios de prova que tem o empregador e que contrasta com a dificuldade que possui o trabalhador nesse aspecto.35

3.4.2 Princípio da norma mais favorável

34 DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 197-198. 35 RODRIGUEZ, Américo Plá. Op. cit., 2000, p. 116.

Pode-se extrair o princípio da norma mais favorável da própria Constituição Federal de 1988. Ab initio, dentro dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, mais precisamente no art. 5°, §2°, encontra-se albergado que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

Entretanto, a explicitação constitucional do princípio da norma mais favorável encontra guarida no caput do art. 7° da Lei Maior, quando dispõe que “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social”. Desta forma, os direitos expressamente albergados nos XXXIV incisos e no parágrafo único do art. 7°, constituem um conteúdo mínimo que não exclui outros direitos destinados a melhorar a condição social do obreiro.

Logicamente as normas estatais objeto de análise devem estar revestidas de vigência e validade, posto que não há conflito de normas quando a comparação é feita tomando-se como referência um conteúdo legal excluído do ordenamento jurídico. Nessa comparação de normas estatais, não importa o status legal da norma, pois o aplicador do direito deve centrar seu foco para aquela disposição legal mais benéfica ao trabalhador. Amauri Mascaro esclarece este ponto através do seguinte lição:

De modo geral é possível dizer que, ao contrário do direito comum, em nosso direito, a pirâmide que entre as normas se forma não terá como vértice a Constituição Federal ou a lei federal ou as convenções coletivas de modo imutável. Os níveis normativos se alternam em constante modificação. O vértice da pirâmide da hierarquia das normas trabalhistas será ocupado pela norma aplicável no caso concreto em se tendo como tal a que resultar do ordenamento jurídico interpretado com um sistema.

[...].

Desse modo, entre o direito constitucional e o infraconstitucional, a prioridade é sempre daquele, a menos que dele emane uma autorização para que outra hierarquia se estabeleça. Entre um convênio coletivo, expressão aqui tomada em sentido genérico para abranger todos os tipos de instrumentos gerados pela negociação coletiva, e um contrato individual de trabalho, prevalece o que for mais benéfico para o trabalhador, não podendo este reduzir vantagens estabelecidas por aquele.36

36 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho: História e Teoria Geral do Direito do

Quando a comparação é feita com normas criadas através dos contratos proveniente da autonomia da vontade das partes, deverá prevalecer sempre a norma mais benéfica ao trabalhador. Essa idéia é compartilhada por Murilo Carvalho Sampaio Oliveira, conforme demonstra nas seguintes palavras:

Tem-se como principal conseqüência da regra a supressão do comando geral de prevalência da norma hierarquicamente superior, que noutros ramos do direito seria aplicável na hipótese de colisão. É comum afirmar-se, em consideração a tal conseqüência, que o Direito do Trabalho possui uma hierarquia flexível e não pré determinada, uma vez que a norma ápice será a mais benéfica.37

A utilidade do princípio pode ser sentida através das decisões proferidas pelos Tribunais. Observa Murilo Carvalho Sampaio Oliveira no tocante a este ponto que:

O TST vem acolhendo o princípio da norma mais benéfica, particularmente quando trata de reforçar os dispositivos mais favoráveis dispostos em norma coletiva. Outra situação clara de implementação da norma mais favorável é a inteligência do E. n. 36238, que estipula que a prescrição relativa às

cobranças de depósitos de FGTS é a trintenária. É exemplo paradigmático da norma mais benéfica posto que, entre a prescrição qüinqüenal disposta no art. 7° inciso XXIX e a trintenária elencada na Lei n. 8.036/90, art. 23, § 4°, o princípio elege a norma hierarquicamente inferior, porque mais favorável.39