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CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DAS COLEÇÕES “PARA VIVER JUNTOS” E

3.2 Análise da coleção “Para viver juntos”

3.2.1 Os gêneros textuais explorados nas atividades da coleção voltadas para a análise

3.2.1.3 Os gêneros nas seções de análise linguística

O trabalho com as dimensões de gêneros que identificamos em seções específicas de análise linguística nos permite perceber algumas diferenças em relação ao desenvolvido nas seções de leitura e produção escrita. Percebemos que a seleção textual das seções de reflexão linguística, por exemplo, em comparação às seções de leitura e produção, apresentava um conjunto de gêneros muito inferior, concentrando-se em gêneros prescritivos, instrucionais – como a receita e a instrução de montagem, com poucos exemplos da ordem do narrar, expor, relatar e argumentar.

Um exemplo da baixa frequência desses gêneros é o caso do conto, que foi bastante explorado nas seções de leitura e produção em todos os anos, apresentando apenas duas ocorrências (6º e 8º anos) nas seções de análise linguística, como pode ser visualizado no Quadro 4:

Quadro 4: Gêneros trabalhados nas seções de análise linguística por volume (ano) – coleção "Para viver juntos".

GÊNERO 6º Ano 7º Ano 8º Ano 9º Ano

Acrósticos X Autobiografia X Biografia X Classificados X X Conto X X Diário virtual X Horóscopo X Instrução X X Notícia X X X X Poema X X Propaganda X X X Receita culinária X Reportagem X Resenha crítica X Romance X Sinopse de filme X X Texto expositivo X X Verbetes poéticos X

Seguindo essa direção, e cruzando os dados dos quadros 2 e 4, não encontramos atividades com gêneros como carta do leitor e artigo de opinião, os quais só foram trabalhados nas seções de leitura/produção. O oposto ocorreu no caso de gêneros como classificados, receita e instrução, os quais foram abordados, apenas, nas seções de reflexão linguística. Em contrapartida, a propaganda e a notícia foram abordadas nas seções de leitura, produção e análise linguística.

Nessa direção, os gêneros selecionados para a leitura e produção parecem apresentar um trabalho mais sistematizado, com diversas atividades que trabalhavam tanto o texto como o gênero. Em relação ao gênero, objeto de nosso estudo, as atividades enfatizavam, nas seções de leitura e produção, a organização do texto em determinado gênero, as condições de produção – relação entre os interlocutores, finalidade comunicativa – e os aspectos linguísticos que lhes são recorrentes, com o objetivo de aprendizagem desses gêneros pelos alunos. Nas seções de AL, as oportunidades de sistematização dos gêneros eram bastante escassas e aconteciam, geralmente, quando a coleção abordava o estudo de tópicos linguísticos, relacionando seus usos aos gêneros, justificando, assim, o caráter de funcionalidade real de conhecimentos gramaticais e/ou textuais, como podemos ver na atividade a seguir:

Figura 13: Propaganda - AL (Col. Para viver juntos).

(7º Ano, p. 150).

Após essa breve caracterização dos gêneros abordados nas atividades da coleção, bem como do tipo de trabalho desenvolvido nas seções analisadas, apresentaremos e discutiremos as dimensões contempladas nas atividades de análise linguística relativas aos gêneros. Posteriormente, discutiremos os tipos de atividades desenvolvidas, visando analisar como a análise linguística é utilizada e se contribui para a apropriação das propriedades dos gêneros.

3.2.2 Que dimensões foram contempladas nas atividades de análise linguística relativas às propriedades dos gêneros?

Nesta seção, discutiremos os dados relativos às dimensões contempladas nas atividades de análise linguística expostas anteriormente. Para tanto, apresentaremos a frequência de dimensões dos gêneros contempladas por volume (ano) e seção didática, bem como exemplos de atividades da coleção analisada.

De entrada, esclarecemos que uma das dificuldades encontradas nessa categorização diz respeito a uma mesma atividade referir-se, em alguns casos, a mais de uma dimensão do gênero – aspectos estruturais, linguísticos, sociodiscursivos e conteúdo do gênero. Nesse

sentido, a quantificação dessas dimensões seguiu a mesma lógica da distribuição de atividades por gênero, em que a referência nelas a mais de um gênero – notícia e crônica, por exemplo, – implicava a sua distribuição em ambos os casos.

Com base nas dimensões citadas, organizamos uma tabela com os dados quantitativos das atividades analisadas por seção didática da coleção. Vejamos:

Tabela 2: Distribuição, por seção didática, das dimensões dos gêneros contempladas nas atividades de análise linguística relativas aos gêneros – coleção “Para viver juntos”.

Dimensão Leitura Produção escrita Análise linguística Total % % % % Estrutura textual 107 26,5 167 48,3 5 6,8 279 33,9 Aspectos linguísticos 114 28,2 123 35,5 42 57,5 279 33,9 Aspectos sociodiscursivos 161 39,9 31 9,0 22 30,1 214 26,0 Conteúdo 22 5,4 25 7,2 4 5,5 51 6,2 Total 404 100,0 346 100,0 73 100,0 823 100,0

A leitura da tabela evidencia uma predominância de atividades referentes à estrutura e aos aspectos linguísticos do gênero (279), cada uma representando 33,9% do total de atividades. Em seguida, aparecem os aspectos sociodiscursivos com um número um pouco menor (214), representando aproximadamente 26,0% das atividades e o conteúdo (51), representando apenas 6,2% do total de atividades.

Embora os aspectos sociodiscursivos e, principalmente, o conteúdo14 apresentem uma quantidade menor de atividades, acreditamos que a coleção apresentou, em relação às três dimensões mais frequentes, um equilíbrio na abordagem de diferentes propriedades dos gêneros. Esse dado parece indicar que a coleção se preocupa em mostrar aos alunos que os gêneros são constituídos não apenas por uma estrutura reconhecível, mas também por diferentes recursos linguísticos e sociodiscursivos, os quais são bastante relevantes para o estudo dos gêneros, tal como defendem autores como Antunes (2009); Marcuschi (2008, 2011) e Mendonça (2007a).

Não obstante, salientamos a necessidade de um investimento maior em relação aos aspectos sociodiscursivos e, principalmente, ao conteúdo, uma vez que estes não foram tão trabalhados como as demais dimensões. Talvez a estrutura e os aspectos linguísticos dos

14 Embora tenhamos distinguido “conteúdo” de “aspecto sociodiscursivo”, é preciso reconhecer que o primeiro

gêneros tenham sido mais explorados por constituírem propriedades mais visíveis no texto, isto é, mais fáceis de serem reconhecidas.

Em relação às seções de leitura, observamos que foi predominante o trabalho com os aspectos sociodiscursivos (161), representando, aproximadamente, 39,9% do total de atividades dessas seções, embora os aspectos linguísticos e a estrutura também tenham sido bastante explorados: (28,2% e 26,5%, respectivamente).

Já o conteúdo apresentou 22 atividades, representando apenas 5,4% do total de atividades inseridas nas seções de leitura, o que não configurou uma surpresa, visto que, de forma geral, esta foi uma propriedade pouco abordada na coleção. A mesma apresentou apenas 6,2% de atividades que abordam a dimensão do conteúdo do total de atividades desenvolvidas para o ensino das propriedades dos gêneros na coleção analisada.

Levando-se em consideração esse fato, podemos perceber que o problema não está na distribuição das atividades relativas ao conteúdo do gênero, mas na quantidade geral que esta propriedade apresentou na coleção, o que denota a necessidade de mais investimentos na abordagem do conteúdo do gênero, como fator de caracterização e diferenciação de textos de gêneros diferentes.

De forma geral, observamos que o quantitativo de atividades dessas seções parecia indicar um tratamento bastante sistemático dos aspectos constituintes dos gêneros. Nesse sentido, entendemos que as atividades relativas às dimensões dos gêneros inseridas nas seções de leitura poderiam contribuir para a observação, análise e reconhecimento dos aspectos sociodiscursivos que envolvem as interações, das escolhas linguísticas, que podem ser diferentes de acordo com o gênero e com a situação interativa, e da estrutura pertinente a cada gênero textual.

Já as seções da produção textual apresentaram um predomínio de atividades voltadas para a estrutura do gênero (167), com aproximadamente 48,3% das atividades e, em seguida, os aspectos linguísticos (123) com 35,5% do total de atividades. Se a estrutura e os aspectos linguísticos apresentaram mais atividades nas seções de produção, o mesmo não aconteceu com os aspectos sociodiscursivos, apresentando apenas 31 ocorrências, cerca de 9,0% de atividades. Essa dimensão do gênero foi trabalhada quase exclusivamente nas seções de leitura, o que nos leva a indagar se o trabalho desenvolvido na produção estaria sendo suficiente para a compreensão dessa propriedade.

Dessa forma, chamamos atenção para a baixa frequência de atividades com os aspectos sociodiscursivos nas seções de produção, uma vez que estas poderiam aproximar o aluno de situações de uso, contribuindo para o entendimento de que não basta escolher um gênero: é preciso estar atento a outros aspectos que vão influenciar ou mesmo determinar o gênero e a linguagem a serem utilizados em adequação ao suporte, ao interlocutor, aos objetivos da comunicação, etc.

Quanto ao conteúdo do gênero, este apresentou 25 atividades (7,2%) o que, como dissemos anteriormente, representa, em todos os casos, um percentual muito baixo. De uma forma geral, acreditamos que a quantidade de atividades envolvendo o conteúdo é pouco representativa, parecendo, assim, oferecer oportunidades limitadas para que o estudante possa observar as relações entre o gênero e seu conteúdo.

Em relação às seções específicas de AL, foram mais frequentes as atividades relativas aos aspectos linguísticos dos gêneros (42), representando 57,5% do total de atividades (73). Em seguida, aparecem os aspectos sociodiscursivos, com 22 atividades, representando, assim, 30,1%. A estrutura e o conteúdo do gênero aparecem como as dimensões menos frequentes, apresentando, respectivamente, 6,8% e 5,5% das atividades.

Talvez o quantitativo mais elevado de atividades voltadas para os aspectos linguísticos e sociodiscursivos, nessas seções, possa indicar uma orientação da obra didática em trabalhar os conhecimentos linguísticos em articulação com os textos, de forma a justificar a funcionalidade de tópicos gramaticais, textuais e discursivos a partir das relações que estes podem estabelecer com os gêneros.

Em síntese, a abordagem das atividades relativas às dimensões parece sugerir um ensino articulado, no qual a prática de análise linguística funciona como ferramenta integradora, contribuindo para a ampliação de habilidades de leitura e de escrita (MENDONÇA, 2007a). Não obstante, questionamos a necessidade de seções específicas para a leitura, para a produção e para a AL, já que tais práticas aconteciam de forma articulada.

Em seguida, apresentaremos um quadro (Quadro 5) que aborda a frequência das dimensões contempladas nas atividades por gênero, a fim de evidenciar que gêneros foram mais intensamente explorados em relação a suas propriedades.

Quadro 5: Distribuição, por gênero, das dimensões contempladas nas atividades de análise linguística relativas aos gêneros textuais escritos mais frequentes da coleção “Para viver juntos”.

GÊNERO DIMENSÕES CONTEMPLADAS

Estrutura textual Aspectos linguísticos Aspectos sociodiscursivos Conteúdo Total

Conto (popular; de suspense; de enigma, terror e fantástico; psicológico, social e de amor).

51 21 7 22 101

Artigo de divulgação científica 22 31 20 0 73

Artigo de opinião 13 27 29 0 69 Notícia 18 35 10 3 66 Poema 30 27 6 0 63 Propaganda 12 20 29 0 61 Reportagem 13 17 12 0 42 Resenha crítica 12 11 11 0 34 Crônica literária 8 10 7 5 30 Texto expositivo 13 5 11 0 29 Verbete de enciclopédia 7 11 9 2 29 Carta do leitor 6 8 12 0 26 Texto dramático 20 1 2 0 23 Diário virtual 8 7 3 5 23 Diário íntimo 6 6 6 2 20 HQ / tirinha 8 4 5 2 19 Carta de reclamação 7 4 5 0 16

Crônica social e esportiva 0 5 8 0 13

Entrevista 6 3 2 0 11 Classificados 1 8 1 1 11 Lenda 1 1 3 6 11 Roteiro 6 0 2 0 8 Instrução 0 3 4 0 7 Relato de viagem 1 3 3 0 7 Mito 2 1 2 1 6 Diário de viagem 2 4 0 0 6 Narrativa de aventura 3 1 0 0 4

Romance (de aventura e de ficção) 0 0 2 2 4

Receita 1 2 0 0 3

Biografia 0 2 0 0 2

Sinopse de filme 0 0 2 0 2

Outros 2 1 1 0 4

TOTAL 279 279 214 51 823

A leitura do quadro permite constatar que nem todos os gêneros tiveram as quatro dimensões exploradas. Quanto a isso, uma de nossas hipóteses é que a coleção pode ter optado por trabalhar com os aspectos que fossem mais marcantes em cada gênero. Isso poderia explicar, por exemplo, o porquê do conteúdo do gênero ter sido bastante explorado em relação ao conto e não ter sido contemplado em outros gêneros, talvez porque não constituísse, para a coleção, um fator diferencial para outros gêneros. Sobre isso, acreditamos

que também pode ter contribuído para a baixa frequência dessa dimensão o fato de a coleção parecer ter privilegiado atividades voltadas para o assunto/temática desenvolvido no texto (e não no gênero).

Partindo dessas considerações, observamos que os gêneros que tiveram as quatro dimensões contempladas foram os seguintes: conto, notícia, crônica, verbete de enciclopédia, diário virtual, HQ/tirinha, diário íntimo, classificados, lenda e mito. Em seguida, destacam-se mais 12 gêneros por apresentarem, pelos menos, três das quatro dimensões analisadas. São eles: artigo de opinião, artigo de divulgação científica, poema, propaganda, reportagem, resenha crítica, texto expositivo, carta do leitor, texto dramático, carta de reclamação, entrevista e relato de viagem.

Todavia, alguns desses gêneros apresentaram uma frequência pouco representativa de atividades, oferecendo, assim, poucas oportunidades para o ensino das propriedades dos gêneros. É o caso do mito, por exemplo, que, apesar de contemplar as quatro dimensões, apresentou apenas 6 atividades, o que pode ser considerado pouco relevante, principalmente, quando se compara com gêneros como a notícia, com frequência de 66 atividades.

Nesse sentido, tomaremos como referência para o trabalho de análise mais detalhado, os gêneros que apresentaram uma maior frequência de atividades, uma vez que acreditamos que sejam estes os escolhidos para uma maior sistematização de suas dimensões: conto com 101 atividades; artigo de divulgação científica com 73 ocorrências; artigo de opinião com 69; a notícia com 66; o poema com 63 e a propaganda com 61 atividades.

A seguir, procederemos à análise das dimensões exploradas nessas atividades, considerando, conforme dissemos, os gêneros mais intensamente trabalhados na coleção.

3.2.2.1 Propostas de atividades de análise linguística com o gênero “conto”: tratamento