• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DAS COLEÇÕES “PARA VIVER JUNTOS” E

3.2 Análise da coleção “Para viver juntos”

3.2.4 Síntese da análise da coleção “Para viver juntos”

A análise dos dados revelou, primeiramente, que a coleção utilizou um material textual muito diversificado para a exploração das dimensões dos gêneros, contemplando vários agrupamentos – argumentar/persuadir; relatar; narrar; expor; expressar; prescrever – sendo predominante a utilização de gêneros da ordem do argumentar enquanto os gêneros da ordem do prescrever ações apresentaram o percentual mais baixo de atividades relativas às dimensões dos gêneros.

Constatamos, também, que o trabalho mais sistemático com as dimensões dos gêneros foi desenvolvido nas seções de leitura e de produção escrita, nas quais, primeiramente, o aluno era convidado a conhecer e analisar as propriedades do gênero do texto que era trabalhado na leitura, para, em seguida, produzir um texto levando em consideração as dimensões já sistematizadas do gênero.

Partindo disso, fizemos um segundo mapeamento, considerando, neste, as dimensões dos gêneros que foram contempladas nas atividades analisadas. Para a discussão dos resultados, foram consideradas as atividades com os gêneros mais frequentes da coleção: conto, artigo de divulgação científica, artigo de opinião, notícia, poema e propaganda.

Essa análise permitiu-nos fazer algumas observações. Em primeiro lugar, destacamos a constatação de que nem todas as dimensões dos gêneros – conteúdo, estrutura, aspectos linguísticos e sociodiscursivos – foram trabalhadas de modo mais sistemático.

Nesse sentido, a análise das dimensões com os gêneros mais frequentes, já mencionados, revelou um quantitativo de 433 atividades, das quais predominaram as atividades relativas aos aspectos linguísticos (161); em segundo lugar, a estrutura, com 146 atividades; os aspectos sociodiscursivos apresentando 101 e, por fim, o conteúdo com apenas 25 atividades.

Em pesquisa realizada sobre a articulação da prática de análise linguística ao ensino dos gêneros, Gulart (2010) verificou resultados semelhantes: predominância do estilo, ao qual estamos chamando de aspectos linguísticos, seguido da forma composicional (estrutura), contexto sócio-histórico (aspectos sociodiscursivos) e do conteúdo temático. Para a autora, a predominância do estilo e da estrutura era esperada, uma vez que o estilo, referindo-se aos recursos fraseológicos, lexicais e gramaticais da língua, poderia fazer essa integração com o

gênero e no caso da estrutura, esta “foi e muitas vezes ainda é o foco nos estudos de gêneros” (GULART, 2010, p. 97).

Também percebemos que a ênfase em uma ou em outra dimensão dependia do gênero a ser trabalhado. O conto e o poema, por exemplo, apresentaram uma predominância de atividades com a estrutura, o que pode estar relacionado ao fato desses gêneros possuírem uma forma mais estabilizada. Outro motivo seria o fato de que tal aspecto pode constituir um importante recurso para a construção de sentidos, principalmente, quando se refere aos gêneros literários, conforme afirma Mendonça (2007a).

Nos demais gêneros – artigo de divulgação científica, artigo de opinião, notícia e propaganda –, destacaram-se os aspectos linguísticos e sociodiscursivos, o que acreditamos ser um fato relevante, uma vez que foram privilegiadas, para a caracterização dos gêneros, as escolhas linguísticas e o funcionamento discursivo.

Talvez a preferência por tais recursos possa ter relação com o fato de que, em comparação ao conto e ao poema, gêneros tradicionalmente estudados com foco na estrutura, o artigo de divulgação científica, o artigo de opinião, a notícia e a propaganda tenderiam a ter um tratamento diferenciado, com foco em outras especificidades dos gêneros, além de sua estrutura.

Outra hipótese para a predominância dessas dimensões, é que a coleção, no trabalho com os gêneros textuais, provavelmente, busque selecionar o(s) aspecto(s) que considera mais característico(s) em cada gênero. No caso desses gêneros, além da estrutura característica, talvez a coleção possa ter considerado como fator marcante a função que eles assumem na sociedade e, sendo assim, refletir sobre as escolhas linguísticas e sociodiscursivas seria uma forma de propiciar o entendimento dessas funções, já que estas contribuem para o funcionamento do gênero.

A esse respeito, Marcuschi (2002) ressalta que os gêneros são mais caracterizados por aspectos comunicativos e institucionais, nos quais notamos a influência dos domínios de circulação, que por traços estruturais. Nesse sentido, acreditamos que haja um esforço da coleção em propiciar, a partir das atividades, essa compreensão.

Por fim, analisamos os exercícios que foram desenvolvidos para o ensino das dimensões dos gêneros textuais escritos mais frequentes na coleção (conto, artigo de divulgação científica, artigo de opinião, notícia, poema e propaganda), considerando o tipo de

atividade (identificação/reconhecimento, análise, produção, comparação e classificação) e a dimensão contemplada (conteúdo, estrutura, aspectos linguísticos e sociodiscursivos).

A partir da análise dos dados, constatamos que as atividades de identificação foram predominantes no tratamento didático das dimensões dos gêneros, e, em seguida, as atividades de análise. Nesse sentido, ressaltamos que a coleção parece apresentar uma articulação entre os dois tipos de atividades, uma vez que a maioria das atividades de identificação servia como base para a reflexão das propriedades dos gêneros, como no exemplo a seguir, em que primeiro identifica-se a legenda para depois refletir sobre a importância de seu uso nas notícias. Vejamos:

Figura 48: Notícia - Leitura (Col. Para viver juntos).

(6º Ano, p. 125).

Constatamos que as atividades de análise foram mais frequentes em relação ao estudo do artigo de opinião, do artigo de divulgação científica, e da propaganda, enquanto a identificação destacou-se no estudo do conto, do poema e da notícia. Já as atividades de produção e comparação não foram predominantes em nenhum gênero. Apesar disso, salientamos que a produção foi trabalhada de modo relevante na coleção, principalmente no gênero artigo de opinião, com um percentual muito próximo das atividades de análise. Assim, apenas as atividades de comparação não foram contempladas de forma mais relevante, indicando, como dissemos anteriormente, a necessidade de investimento, uma vez que esta também constitui uma estratégia adequada para o tratamento das dimensões dos gêneros (SILVA, A., 2008).

Em relação às dimensões contempladas, percebemos que havia uma preferência por atividades de identificação para o tratamento do conteúdo e da estrutura. Já as atividades de análise foram trabalhadas de modo predominante em relação aos aspectos linguísticos e sociodiscursivos dos gêneros.

Tais dados parecem indicar que diferentes estratégias foram utilizadas para o ensino dos gêneros textuais escritos. Consideramos, de forma especial, o trabalho com os aspectos linguísticos, que, nessa perspectiva, acontecia articulado ao gênero e as condições de

produção. Isto é, na abordagem das propriedades dos gêneros, os recursos linguísticos pareciam ser mobilizados de acordo com o gênero que era utilizado como objeto de ensino, observando-se neste, que cada escolha linguística cumpria um papel especial, de forma a contribuir para a construção do gênero e sua função comunicativa. A esse respeito, Mendonça (2007a, p. 84) explica que

a variabilidade de funções dos recursos linguísticos nos diversos gêneros só se torna um princípio claro para os aprendizes se também há um trabalho diferenciado, específico com cada gênero a ser explorado na escola, em que se promova uma reflexão sobre como se constituem. Este é, sem dúvida, um dos objetivos principais da prática de AL na escola.

Nesse sentido, acreditamos que havia um esforço notável da coleção em ofertar um ensino diferenciado, baseado nas especificidades de cada gênero, considerando, assim, os usos que fazemos da linguagem, isto é, um trabalho pautado na prática de análise linguística como ferramenta que auxilia a leitura e a produção de texto de diversos gêneros, conforme propõem documentos curriculares como os PCN de Língua Portuguesa (1998) e diversos autores (GERALDI; 2006; ANTUNES, 2009; MENDONÇA, 2007a; MORAIS; SILVA, A., 2007).

Dessa forma, a coleção parece contemplar a prática de análise linguística como ferramenta para o ensino dos gêneros textuais, uma vez que propicia oportunidades para que o aluno possa identificar e analisar as diferentes funções sociais dos gêneros, como a linguagem pode ser utilizada de forma distinta em gêneros diferentes ou em um mesmo gênero, em função da adequação ao contexto de produção que envolve as interações, o que poderá contribuir para a apropriação dos modos de constituição dos gêneros textuais, sejam eles relativos ao conteúdo, à estrutura, aos aspectos linguísticos e sociodiscursivos.