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CAPITULO III: ESPAÇO E INTERATIVIDA DE EM ASSASSIN’S CREED

2. O Parque de diversões da História

2.1 Os tipos de espaço virtual nos games

Os espaços dos jogos eletrônicos demandam navegação e orientação, mas eles raramente apresentam de forma aberta e imediatamente acessível. Este é o caso de Assassin’s Creed III: progressivamente o jogador é inserido em espaços mais amplos de navegação – inicialmente, é

214 LIMA, Carlos William Ferreira de. A construção da imagem realista em jogos de videogame. Um estudo sobre as representações imagéticas nos games de nova geração. Dissertação (Mestrado em Comunicação e

Semiótica) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). 2008.

215 LAUREL, B. Computers as Theatre. Addison-Wesley, 1991.

216 NITSCHE, Michael. Video Game Spaces. Image, Play, and Structure in 3D Worlds. Massachussets: MIT

inserido em trilhos, percursos que treinam suas habilidades iniciais, posteriormente em um navio que lhe exige certa exploração de uma arena, finalmente se deslocando para a cidade de Boston. É só na Sequência de Memória 9 que o jogador finalmente tem acesso a todos os espaços exploráveis do jogo – e ainda assim, deixa de poder acessar alguns específicos a segmentos dramáticos. Essa “demora” em abrir o espaço navegável foi alvo de várias críticas na imprensa217, resultando nos jogos posteriores no acesso à quase totalidade dos espaços

reconstituídos logo após os primeiros momentos do jogo.

No tocante à questão lúdica, Nitsche afirma que os espaços de games de fato dividem qualidades com simulações, parques temáticos, ciberespaços e hipertextos, pontuando suas diferenças: enquanto os parques e brinquedos, como a montanha-russa, restringem a exploração e interatividade em uma experiência linear (isso é, o começo-meio-fim sempre será o mesmo) para controlar as sensações impostas, os games podem permitir a exploração de vastos ambientes que demandam o aprendizado de como navegá-los218.

Os espaços narrativos dos jogos eletrônicos são também espaços de possibilidade, conceito originado na matemática e aqui aplicado à arquitetura virtual. O espaço virtual é um produto de conhecimento humano e depende de lógica, software e hardware. Um espaço digital não tem qualquer contexto imediato com outros espaços à sua volta por que pode ser desenvolvido separadamente deles e independente de regulações de construções ou limitações em termos de altura, largura ou profundidade219.

Nitsche trabalha com duas tipologias para compreender os tipos de espaço: primeiro ele problematiza as metáforas de Playground, Sandbox e Garden, e propõe novas categorias, as de

Trilho, Labirinto e Arena220.

A ideia de Playground denomina um parquinho infantil, onde os brinquedos estão já

217 Diversos reviews e comentários avulsos de jogadores apontamesse “problema” no jogo. Por exemplo:

HAMILTON, Kirk. How Assassin’s creed III disappointed me? Let me count the ways. Kotaku, 11 ago. 2012. Disponível em: < http://kotaku.com/5958941/how-has-assassins-creed-iii-disappointed-me-let-me-count-the- ways > Acesso em: 20 ago. 2014.

218 NITSCHE, Michael. Video Game Spaces. Image, Play, and Structure in 3D Worlds. Massachussets: MIT

Press, 2008. pp. 13-21.

219 Mas é, entretanto, restrito as suas limitações técnicas. Ver mais em JENKINS, H; SQUIRE, K. Art of contested

spaces. King, L. (Org.). Game on: The history and culture of video games. New York: Universe Publishing, 2002. pp. 64-75

220 Para deixar claro, estas classificações são distintas do que propomos nos capítulos anteriores ao que chamamos

de tipos de exploração, que define o tipo de movimento sobre o ambiente virtual, enquanto aqui a discussão é feita sobre o tipo de espaço designado.

expostos e podem ser interagidos, e entrando ou saindo crianças, ele permanece imutável. O

Sandbox – ou caixa de areia – seria um espaço com menos brinquedos dispostos, mas passível

de grandes transformações, de se levantar novas atrações e depois destruí-las. Já o Garden (jardim) seria a metáfora de um sistema, ou ecossistema que se transforma a cada alteração de elementos.

Ele define os Trilhos como uma viagem entre dois pontos. Essa estrutura almeja confinar e direcionar o movimento dos avatares. O mundo parece acessível mas só pode ser navegado no confinamento de um percurso bem limitado. O layout não necessariamente é claro e inclui o elemento de descoberta. É uma jornada guiada onde os pontos individuais são importantes e o trilho invisível comumente usa a distância como um dos métodos para engajar o jogador. Essas estruturas mantêm o trilho interessante em vez de apontar ao objetivo diretamente.221

Desenvolvedores podem restringir o progresso do jogador a algum ou alguns caminhos para conseguir administrar a complexidade desses encontros e os arranjar da forma mais dramática possível.

Quanto aos Labirintos, Nitsche lista quatro tipos principais: o labirinto linear de um único curso; o não-linear de múltiplos cursos; o rizoma em que cada ponto pode ser conectado a qualquer outro ponto; e o “labirínto logico” que depende das condições de acesso. Em alguns jogos, como por exemplo, The Legend of Zelda (Nintendo, 1986) é possível ir a desertos, montanhas, florestas, se perder, e alguns lugares só é possível acessar com certos itens que se qualificam como condições de acesso. Labirintos não aparecem só como estrutura de game – fases -, mas como exploração de um espaço virtual. A narrativa da quest emerge das condições que estruturam o movimento que são espacialmente restritivas e moldam a experiência do jogador.

Já as Arenas são as estruturas mais abertas com uma demarcação dominante: o entorno (surrounding enclosement). Arenas proviriam um movimento relativamente livre em determinado espaço com alta visibilidade, enquanto labirintos restringem o movimento a um espaço complexo que complica a compreensão. Arenas são menos exploratórias – no sentido de descoberta - e mais uma locação contida.

Ambas tipologias (playground, sandbox e garden; trilho, labirinto e arena) devem,

221 NITSCHE, Michael. Video Game Spaces. Image, Play, and Structure in 3D Worlds. Massachussets: MIT

entretanto, ser problematizadas e acredito que ambas classes de categorias são úteis e se complementam. Um mesmo espaço pode ser uma arena como um playground, mas conter zonas labirínticas, ou outras combinações.

Os espaços de Assassin’s Creed são, em sua maioria, Playgrounds que podem ser

minimamente interagidos e alteráveis sem transformar significantemente a maneira na qual o espaço é vivenciado: o jogador pode comprar edifícios, derrotar infinitos inimigos, realizar inúmeras quests, e o pouco que pode ser alterado consiste na mudança de bandeiras e na diminuição do contingente de soldados opositores nos setores. São também livres a serem exploradas como uma Arena circunscrita que delimita seu entorno.

Entretanto, dentro das missões, essas categorias são relativizadas por conta da intenção dramática, como por exemplo na missão do Massacre de Boston, a necessidade de cumprir o objetivo de perseguir o alvo e impedir sua ação impõe um percurso momentâneo em Trilhos; na missão de assassinato de John Pitcairn, a Arena e os Trilhos se intercalam de acordo com a seção da missão; a disposição de soldados e perigos pode alterar substancialmente a disposição de como lidar com o espaço. Por exemplo, apesar da “Fronteira” ser uma grande Arena em que é possível velozmente atravessar suas colinas e árvores, de acordo com a estratégia e atenção aos detalhes do jogador, seus elementos de cenário (como a disposição de galhos, barreiras naturais e mato alto), podem dificultar sua compreensão do espaço como um Labirinto e ao mesmo tempo funcionar como instrumentos para cumprir seus objetivos.