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Panorama da Educação Especial no Brasil

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1. A EDUCAÇÃO ESPECIAL: UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA

1.2 Panorama da Educação Especial no Brasil

O presente tópico tenciona apresentar, mesmo que sucintamente, um panorama histórico da educação especial no Brasil fundamentado em estudos desenvolvidos por autores especialistas nesta temática, no sentido de possibilitar um entendimento ampliado sobre a constituição dessa modalidade de educação,além de abrir espaço ao debate e a novas reflexões.

No Brasil, durante séculos, o tratamento de confinamento e isolamento perpetuou-se para pessoas com deficiência. No século XIX surgiram novas expectativas em relação ao desenvolvimento do trabalho educativo junto às pessoas com deficiência, sobretudo, a partir da teorização de médicos sobre as possibilidades reais de desenvolver ações específicas de ordem social e educacional. Segundo Jannuzzi (2012),

[...] a orientação principal na educação dessas crianças seria dada pelo médico, auxiliado pelo pedagogo. Este deveria ser instruído em escola superior, por mestres vindos da Europa e dos Estados Unidos. (JANNUZZI, 2012, p. 40).

Muitos foram os estudos e experiências desenvolvidas no sentido de se prestar atendimento aos deficientes. Entretanto, conforme Mazzotta (2005, p.27),“a inclusão da “educação de deficientes”, da “educação dos excepcionais” ou da “educação especial” na política educacional brasileira veio a ocorrer somente no final dos anos cinquenta e início da década de sessenta do século XX”.

Inicialmente, as escolas de Educação Especial restringiam-se a prestar atendimento exclusivamente aos alunos classificados como “excepcionais”12 e eram

instaladas para atender alunos de um determinado tipo de excepcionalidade como: Deficiente Visual (DV), Deficiente Auditivo (DA), Deficiente Intelectual (DI), e Deficiente Físico (DF), enquanto outras davam atendimento àqueles com diferentes tipos de excepcionalidade. Conforme Mazzotta (1993), a educação especial pode ser assim definida:

Conjunto de recursos e serviços educacionais especiais organizados para apoiar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação formal dos educandos que apresentem necessidades educacionais muito diferentes das da maioria das crianças e jovens. (MAZZOTTA, 1993, p. 21).

No Brasil, a educação especial surgiu para oferecer escolaridade a crianças com “anormalidades” que, a princípio, foram rotuladas como prejudicadas e, por

12 Excepcionais. Como se chamavam pessoas com deficiência. São Paulo: RNR, 2003. Texto disponível em: http://sivc.saci.org.br/files/chamar.pdf. Termo utilizado nas décadas de 50, 60 e 70 para designar pessoas com deficiência intelectual. (SASSAKI, 2003).

vezes, impedidas de serem inseridas no processo regular de ensino. Como afirma Bueno (1994):

[...] Todo processo de ampliação da Educação especial quer em relação à quantidade de crianças por ela absorvidas, quer na diversificação das formas de atendimento e do tipo de clientela. [...] reflete a ampliação de oportunidades educacionais para crianças que, por características próprias, apresentam dificuldades para se inserirem em processos escolares historicamente construídos. (BUENO, 1994, p.24).

Autores como Stainback, S. e Stainback, W. (1999,2008); Mazzotta (2005,1993); Mantoan (2006,2009); Rodrigues (2006); Ropoli, Mantoan et al (2010); Jannuzzi (2012) defendem a presença da coletividade, do caráter público no atendimento educacional especializado. Assim também, Carvalho (2008) considera:

[...] compromisso público dos governos traduzido por um conjunto de ações coletivas voltadas para garantia dos direitos de atendimento educacional especializado de crianças, adolescentes, jovens e adultos marcados por processos excludentes nas escolas regulares. (CARVALHO, 2008, p.41).

Ressalta-se, no entanto, o surgimento de movimentos em escala mundial pela educação inclusiva preconizando ações de cunho político, cultural, social e pedagógico em defesa do direito de todos os estudantes, a que conjuntamente aprendam e participem do processo educacional, indistintamente, sob a égide dos direitos humanos.

No período de transição do século XX para o XXI é possível perceber uma sensível preocupação com as questões voltadas à educação especial. O processo de inclusão e sua implantação no sistema educacional passam a ser discutidos de maneira mais pontual, ganhando força no âmbito político e educacional.

A década de 1990 trouxe para a educação especial um novo cenário. As políticas públicas, os movimentos nacionais e internacionais que alavancaram o processo de inclusão, tanto no aspecto legal quanto no socioeconômico, cultural e político, intensificaram-se através de mobilizações e regulamentações.

A Conferência Mundial sobre Educação para Todos (ONU, 1990) ao aprovar a Declaração Mundial sobre Educação Para Todos (Conferência de Jomtien, Tailândia) e o Plano de Ação para satisfazer as necessidades básicas de

aprendizagem; promoveram a universalização do acesso à educação. A Declaração de Manágua, (1993) que contou com delegados de trinta e nove países das Américas, estabeleceu como exigência a inclusão curricular da deficiência em todos os níveis da educação, formação dos profissionais e medidas que assegurassem acesso aos serviços públicos e privados, incluindo saúde, educação formal em todos os níveis e trabalho significativo para os jovens. Em 1994, a Declaração de Salamanca, na Espanha, reafirmou o compromisso para com a Educação para Todos e reconheceu a necessidade de prover educação para pessoas com necessidades educacionais especiais13 dentro do sistema regular de ensino.

No Brasil, foi promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, Lei Federal n. 8.069, de 1990), que mediante o artigo 53 passou a assegurar a todos o direito à igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, e atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino. Ainda, na esfera educacional, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) assegurou aos alunos com Necessidades Educacionais Especiais currículos, métodos, recursos educativos e organização específicos visando atender as peculiares desse alunado. O Ministério da Educação (MEC) elaborou e sancionou, em 1998, os Parâmetros Curriculares Nacionais - Adaptações Curriculares (BRASIL, 1998), com o intuito de fornecer as estratégias para a educação de alunos com deficiência. Em 2001, o MEC estabeleceu as Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica, reforçando a importância e a necessidade de que “todos os alunos” possam aprender juntos em uma escola de qualidade.

O Ministério da Educação, por meio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) ao apresentar a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, demonstra acompanhar os avanços do conhecimento e das lutas sociais, visando constituir políticas públicas

13 O termo “Necessidades Educacionais Especiais” foi adotado como nomenclatura correta a partir da Convenção sobre os Direitos da pessoa com deficiência e seu protocolo facultativo, assinado em Nova York, em 30 de março de 2007. Aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo n. 186 e pelo Decreto do Poder Executivo n. 6.949, página externa de 25 de agosto de 2009,conforme o procedimento do § 3º do art. 5º da Constituição que baliza a política nacional para a “pessoa com deficiência”. Secretaria Especial de Direitos Humanos Ministério da Justiça e Cidadania-Convenção da ONU, conforme Parecer n. 21/2009/CONADE/SEDH/PR.

Disponível em: http://www.sdh.gov.br/assuntos/pessoa-com-deficiencia Acesso em: 01 set. 2016. O termo Necessidades Educacionais Especiais, a partir de então, somente será utilizado quando se referir especificamente a uma determinada legislação.

promotoras de uma educação de qualidade para todos os estudantes. (BRASIL.MEC.SECADI. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva,2014).

Ampliando esse aspecto, em 2008, o Brasil ratificou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada pela ONU, bem como seu Protocolo Facultativo, por meio do Decreto legislativo n. 186, de 09 de julho de 2008 e, posteriormente pelo Decreto n. 6.949, de 25 de agosto de 2009. O documento obteve, assim, equivalência de emenda constitucional, valorizando a atuação conjunta entre sociedade civil e governo, em um esforço democrático e possível. (BRASIL. Secretaria de Direitos Humanos, Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, 2011).

Tomando por base o estabelecido pela convenção e, em destaque, o seu artigo 4, das Obrigações gerais, alínea “c”, o governo brasileiro assume o compromisso de “[...] levar em conta, em todos os programas e políticas, a proteção e a promoção dos direitos humanos das pessoas com deficiência”.

Assim, tendo em vista o preconizado pelos movimentos nacionais e internacionais em favor da educação inclusiva, torna-se pertinente refletir sobre as reais possibilidades da inserção dos alunos com deficiência nos programas implantados pela Secretaria de Estado da Educação.

Em dimensão estadual, a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo incisivamente passou a encarar o processo de inclusão14 como uma realidade a

compor o Sistema de Educação Básica das Escolas Estaduais, afirmando que:

Especificamente em relação ao processo de atendimento aos alunos com deficiência, as Diretrizes passaram a definir que tais alunos, antes matriculados em classes especiais15, as quais permitiam a permanência por tempo necessário para o

14 Processo de Inclusão: Processo de transformação das escolas de modo que possam acolher indistintamente todos os alunos nos diferentes níveis de ensino. MANTOAN, Maria Teresa Eglé (2006) 15 Classes especiais são salas de aula em escola de ensino regular, organizada de forma a se constituir em ambiente próprio e adequado ao processo ensino/aprendizagem do alunado de educação especial. (BRASIL. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial. Brasília: MEC/SEESP,1994. p.19, livro 1).

cumprimento do aprendizado correspondente ao Ensino Fundamental, agora dispõem do direito de terem suas matrículas efetivadas no ensino regular nessa modalidade, e cursar em um período aulas da escolarização regular e no contraturno do seu horário escolar receber o atendimento de Serviço de Apoio Pedagógico Especializado (SAPE), nas salas de recurso. As salas de recurso são concebidas como salas multifuncionais em um espaço organizado com materiais didáticos, pedagógicos, equipamentos e profissionais com formação para o atendimento às necessidades educacionais especiais e projetadas para oferecer aos alunos condições de acesso ao conhecimento.

Dessa forma, a Secretaria da Educação ao propor as novas diretrizes e orientações sobre o atendimento para o alunado da educação especial em classes do ensino regular e oferecendo o serviço de apoio pedagógico especializado no contraturno, redirecionou sua política educacional para o envolvimento e compromisso de todos os profissionais da rede de ensino na promoção de uma escola com qualidade para os alunos com necessidades especiais, passando a olhar com maior rigor para que “todos” os alunos recebam um ensino igualitário e qualitativamente superior.

Conforme afirma Mantoan (2009),

Nossas ações educativas têm como eixos o convívio com as diferenças e a aprendizagem como experiência relacional, participativa, que produzem sentido para o aluno, pois contemplam sua subjetividade, embora construídas no coletivo das salas de aula. (MANTOAN, 2009, p.23).

A reestruturação que mobilizou a efetivação do processo inclusivo acarretou de forma acelerada, momentos de angústia para os pais, alunos e professores, uma vez que temia-se acontecer o atendimento especializado em ambientes não apropriados, e, por decorrência, pudesse gerar obstáculos para a não consideração plena das necessidades individuais dos alunos, bem como, para o não enfrentamento das dificuldades do processo de ensino-aprendizagem.

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