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O papel das escolas e dos professores em face da realidade dos alunos e sua mobilização em direção ao saber

No documento VÂNIA APARECIDA RIBEIRO DOS SANTOS (páginas 74-78)

QUADRO TEÓRICO DE REFERÊNCIA

2.2 O papel das escolas e dos professores em face da realidade dos alunos e sua mobilização em direção ao saber

Além de atentar para as relações sociais estabelecidas na escola, o Projeto de Pesquisa aqui proposto visa verificar as relações com o saber que as práticas de educomunicação podem estabelecer na escola. Neste sentido prevê-se que as concepções de Bernard Charlot (2000 e 2005) sobre os sujeitos alunos e suas relações com o saber presente na escola e na sociedade permitam analisar os efeitos das práticas de educomunicação nessas relações.

A conceitualização de Bernard Charlot parte do estabelecimento de relações entre a origem social e sucesso ou fracasso escolar dos alunos. Charlot (2005) afirma que não se deve apenas tomar como referência a posição social, mas que é preciso considerar “(...) o sujeito na singularidade de sua história e das atividades que realiza” (p.15), uma vez que cada indivíduo pertence a um grupo, a um contexto sociocultural e interpreta singularmente sua relação com a escola e o saber, dando sentido ao mundo e a si mesmo. Durante sua trajetória o indivíduo vai construindo sentidos e significados sobre si e o mundo, forjando sua individualidade (CHARLOT, 2005, p.41). O autor também busca “(...) compreender como o sujeito categoriza o mundo, como ele dá sentido a sua experiência e especialmente a sua experiência escolar, como sujeito que apreende o mundo e como se constrói e transforma a si próprio” (CHARLOT, 2005, p.41).

As pesquisas de Charlot enfocam como o sujeito dá sentido principalmente às experiências que acontecem dentro da escola. No entanto, para o autor, a condição social do indivíduo, por si só, não explica suas relações com o saber no âmbito escolar (CHARLOT, 2005, p.40).

Relacionando a condição social do indivíduo com o conhecimento, Charlot (2001) afirma que a aprendizagem escolar é fundamental na construção do sujeito e esta o torna

um sujeito social e único, um membro da comunidade escolar que constrói relações com o mundo a sua volta. Trata-se, segundo o autor, de:

(...) Aprender para viver com os outros homens com quem o mundo é compartilhado. Aprender para apropriar-se do mundo, de uma parte desse mundo, e para participar da construção de um mundo pré-existente. Aprender em uma história que é, ao mesmo tempo, profundamente minha, no que tem de única, mas que me escapa por toda parte. Nascer, aprender, é entrar em um conjunto de relações e processos que constituem um sistema de sentido, onde se diz quem eu sou, quem é o mundo, quem são os outros (CHARLOT, 2001, p.53)

Categorizando a diferença entre saber e aprender (CHARLOT, 2001, p. 63), esse autor afirma que o saber é uma forma de representação de uma atividade que, por sua vez, consiste numa das formas de relações dos sujeitos com o mundo. Isso leva o autor a considerar que a educação escolar deveria proporcionar atividades que estabelecessem condições do sujeito fazer relações de sua experiência social com o saber e não apenas acumular conteúdos. Também evidencia através de suas pesquisas que o ato de aprender encerra diferentes significados para alunos de diferentes classes sociais. Assim, aprender para os estudantes pode ser adquirir um saber ou cumprir as tarefas obrigatórias proposta pela escola.

As relações com o saber, segundo Charlot (2001, p.62) não são apenas socialmente determinadas, ou seja: “(...) os jovens com as mesmas condições não estabelecem as mesmas relações com o saber, uma vez que o interesse por este saber se relaciona a sua identidade e à relação com o outro” (CHARLOT, 2001, p. 63). E acrescenta:

(...) o que é aprendido só pode ser apropriado pelo sujeito se despertar nele certos ecos: se fizer sentido para ele. Porém o sujeito só pode aprender se entrar em certas atividades normatizadas, aquelas que permitem apropriar-se deste ou deste aprender (CHARLOT, 2001, p. 21)

Outro aspecto relevante nas pesquisas realizadas por Bernard Charlot sobre a relação com o saber entre os jovens estudantes tem a ver com o sentido que esses jovens atribuem aos estudos e à escola. Com a proposta da escola para todos muitos destes

adolescentes estão focados no estudo para a empregabilidade, isto é, muitos jovens vão para a escola apenas com propósito de passar de ano, uma vez que o conhecimento adquirido fora da instituição escolar é considerado o mais importante nesta cultura juvenil. Com o desenvolvimento econômico da sociedade o consumo é legitimado pelo desejo provocado pela indústria cultural e pela manipulação da mídia. Os alunos transferem esse comportamento para a escola e com isso, aos professores cabe a satisfação do desejo desses alunos através de elaboração de aulas mais interessantes, pois se as aulas forem consideradas “chatas”, os alunos não as acompanharão, quando muito, apenas memorizarão os conteúdos para se saírem bem nas provas. Para Charlot (2013, p.19) “(...) estas mudanças geram uma transformação na relação com o saber e na relação com o desejo: e ambas geram problemas para o professor”.

Refletindo sobre a inserção da mídia e tecnologia na escola, o autor propõe a elaboração de um novo modelo pedagógico e uma nova redefinição de como tratar a diversidade de meios de comunicação e ferramentas tecnológicas no ambiente escolar. De acordo com Charlot (2013, p.20), não se trata apenas de equipar as escolas com tecnologia, mas de “(...) como tratar o acesso ao saber dos jovens que têm mais acesso à informação e que se comunicam de maneira mais imediata do que nas gerações anteriores”. Entramos em uma sociedade da informação e do conhecimento científico e a juventude possui mais acesso a estas informações, porém, segundo o autor, estas informações não são saberes. Nessa nova configuração pedagógica, Charlot (2013, p.20) aponta que o papel do professor é de fundamental importância para transformar as informações em conhecimentos:

(...) nenhum docente pode entrar em concorrência com a tecnologia. É necessário termos “professor de saber”, isto é, um professor que

ensine como procurar, avaliar e reunir informações para entender o mundo e resolver problemas (CHARLOT, 2013, p.20).

A sociedade do século XXI não é apenas informativa. Ela precisa do trabalho em equipe, do sentido da responsabilidade e da solidariedade, de pessoas reflexivas e criativas, que atuem em rede e em grupos, o que não vai acontecer espontaneamente. (CHARLOT, 2013, p.21).

Portanto, o professor tem de ser menos professor de informação e mais professor de saber. Charlot (2013) também mostra que devemos ter cuidado com a informática, pois

nem todos os alunos têm computador em casa e nem todos são especialistas na internet e não a utilizam para aprender, mas a utilizam para jogar ou se comunicar. A questão central da informática na escola é o sentido que esta dá para o uso que se faz dos meios e como ela transforma as informações em conhecimento. Para isto, o aprendizado deve proporcionar um sentido significativo para o aluno. Nas palavras do autor:

(...) também não é possível esperar apenas a pergunta dos alunos, pois assim não vamos longe; é preciso fazer um trabalho de questionamento do mundo, inclusive para mudar a maneira do estudante utilizar a internet, para que ele tenha dúvidas e questionamentos a serem respondidos. A internet é um instrumento; o que importa, antes de tudo, é o caminho, trata-se de uma aula clássica ou on-line: despertar questionamentos, dar acesso a conhecimentos que são respostas e, assim, produzir sentido acerca do mundo e da vida (CHARLOT, 2013, p.20).

Assim, de acordo com as reflexões do autor, deve-se pensar a escola como um lugar de vida coletiva, onde os sujeitos participam como membro de uma sociedade democrática. A escola deve se preocupar em ensinar conteúdos que mobilizem os conhecimentos adquiridos fora da instituição e que sejam úteis para os jovens do século XXI (CHARLOT, 2013, p.21).

CAPÍTULO III

No documento VÂNIA APARECIDA RIBEIRO DOS SANTOS (páginas 74-78)