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Capítulo II – Avaliação Externa: Quadro Teórico

1. Avaliação: conceções, perspetivas e funções

1.1. Paradigmas e teorias de avaliação

Na perspetiva de Machado (2013), a avaliação é, atualmente, um domínio onde se jogam múltiplos interesses políticos, sociais e culturais, os quais podem ser manifestados sob a forma de “ideologias”, “modelos” ou “paradigmas”.

Segundo Alves (2004), MacDonald e Norris (1981) procederam à classificação dos processos políticos de avaliação de acordo com três categorias: burocrático, autocrático e democrático; Cardinet (1990) ponderou sobre a subsidiaridade de três abordagens: externa, interna e negociada; Bonniol e Vial (1997) explicitaram as diferenças entre um modelo- medida, um modelo-gestão e um modelo ainda a estruturar, partindo da investigação do sentido.

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O modo de estruturar os dispositivos e os processos de avaliação está relacionado com as orientações paradigmáticas que se adotam e que sustentam as abordagens e metodologias a implementar, bem como a forma de as considerar ao longo da avaliação, o status e o papel a atribuir aos diversos intervenientes e partes interessadas, e, inclusivamente, a forma de aferir o valor e qualidade da própria avaliação (Rodrigues & Moreira, 2014). No âmbito da avaliação, os paradigmas estruturam um conjunto de pressupostos ontológicos, éticos, epistemológicos e políticos, que se articulam de modo coerente e validam as diversas normas e práticas de avaliação (Machado, 2013).

No contexto da avaliação das escolas, Rodrigues (2002) propõe três grandes orientações paradigmáticas: orientação objetivista (externa); orientação subjetivista relativista (interna); orientação dialética, democrática e crítica (interativa).

O paradigma objetivista, preconiza uma avaliação externa, uma heterorregulação pelo estado e/ou pelo mercado e pressupõe uma acreditação ou certificação. Trata-se de uma orientação mais técnica da avaliação e equipara-se ao paradigma da avaliação baseada em standards, proposta por Stake (2006). Figari (2008) compara-o ainda à abordagem externa de Cardinet e ainda ao modelo da medida de Bonniol e Vial. Tem como atores preponderantes peritos ou especialistas, atores institucionais ou hierarquias administrativas, tratando-se, essencialmente de avaliadores externos. Sob esta orientação, a avaliação tem como funções, entre outras, controlar, garantir e certificar a qualidade do serviço educativo, responsabilizar, sancionar e premiar, prestar contas ao público e informar o “utilizador”, garantir a implementação das políticas educativas, conduzir a reforma escolar (Rodrigues & Moreira, 2014), desempenhando, assim um papel central numa política baseada na evidência (Pacheco et al., 2014). Trata-se de uma abordagem da avaliação que se caracteriza por ser normativa, criterial, de auditoria, inspetiva e centrada nos resultados (Ibidem). Neste pressuposto objetivista da avaliação, a realidade educativa tem um caráter estável, previsível e repetível, o que permite que os sujeitos sejam tratados como “objetos”, sendo sempre assimétrica a relação entre avaliador e avaliado (Machado, 2013).

De acordo com Alves (2004), a abordagem objetivista da avaliação destaca uma conceção curricular de influência positivista, associada aos fins a alcançar, que se traduzem em desempenhos dos alunos observados no final das aprendizagens e que seriam a garantia do investimento feito na instrução. Segundo a mesma autora, os instrumentos de avaliação, nesta abordagem, obedeceriam a uma racionalidade técnica, fazendo esquecer questões de ordem

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ética e ideológica. Além disso, a forte associação à teoria curricular técnico-racional com esta visão da avaliação, determina uma imagem de professor como técnico, como planificador, em suma, como “professor tyleriano” (Ibidem, p. 39), que desenvolve o seu trabalho da forma mais sequencial e programada possível, formulando rigorosamente as atividades dos alunos e as suas próprias atividades.

Esta perspetiva objetivista da avaliação possibilita que os professores, os alunos, os seus pais e, de um modo geral, toda a sociedade, compreendam e regulem o processo de ensino-aprendizagem (Berger, 1982; citado por Alves, 2004, p.40). Deste modo, sob este paradigma,

“A avaliação identifica-se, assim, inevitavelmente, a um processo de controlo externo, que não necessita de explicitar, questionar, fundamentar ou justificar o referencial da avaliação, estabelecido ou imposto autoritariamente pelas hierarquias administrativas, apelando privilegiadamente em termos metodológicos para os planos experimentais, com o intuito de averiguar os efeitos das políticas, programas, projetos, (…), bem como para mecanismos de observação e de inspeção que se proponham controlar e verificar a fiel implantação, utilização e realização dos dispositivos de formação nos termos em que tenham sido formalmente definidos e apresentados” (Alves, 2004, pp 40-41).

Por seu lado, o paradigma subjetivista preconiza a avaliação interna, fazendo a apologia da autoavaliação e autorregulação desencadeada pela própria escola. Caracteriza-se pela “centralidade pedagógica do sujeito” (Machado, 2013, p.66), sendo os avaliadores, essencialmente, internos (atores escolares ou lideranças e corpos escolares). Figari (2008) equipara-o à abordagem interna de Cardinet e ao modelo de gestão de Bonniol e Vial.

Neste paradigma, considera-se que a realidade social é complexa, composta por uma diversidade de valores e interesses, o que faz com que seja a prática a legitimar e a validar a teoria (Machado, 2013). Neste âmbito, a avaliação tem como principais funções avaliar o planeamento, a direção, a implementação, a gestão, a monitorização, o desenvolvimento, a adequação e a melhoria do trabalho na escola; prestar contas à tutela, à comunidade e ao utente, bem como diagnosticar para reivindicar apoio por parte dos órgãos tutelares (Rodrigues & Moreira, 2014).

Segundo Alves (2004), na abordagem subjetivista da avaliação, realça-se a experiência como fonte de conhecimento e, por isso, como meio essencial para aprender a ensinar. Nesta perspetiva, o professor é visto como um prático, que deve aprender diretamente por observação da prática profissional. De acordo com Rodrigues (1998, citado por Alves, 2004), o aluno é, neste caso, a origem do referencial de avaliação, que tem também o direito de

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participar na organização, gestão, execução, controlo do dispositivo e do processo de avaliação.

Procurando ultrapassar a dicotomia entre a generalização e normatividade da abordagem “objetivista”, bem como entre o relativismo e liberalismo da abordagem “subjetivista”, surge o paradigma dialético ou crítico que preconiza uma avaliação interativa e negociada, envolvendo todas as “partes interessadas” – atores institucionais, escolares, da comunidade, para além de possíveis mediadores. Trata-se, assim, de uma “coavaliação” e de uma “corregulação”, por se tratar de uma avaliação coletiva e com a comunidade ou os stakeholders (Rodrigues & Moreira, 2014). Este paradigma concebe a realidade escolar como o resultado da interação entre os sujeitos e a realidade social externa, sendo os indivíduos, “ao mesmo tempo, “sujeitos” e “objetos”, produtores e produto das condições políticas, sociais e culturais (Machado, 2013, p.67)”. Figari (2008) vê neste paradigma, semelhanças com a abordagem negociada de Cardinet e o modelo de avaliação como problemática do sentido de Bonniol e Vial.

Nesta abordagem dialética da avaliação, esta tem como principais funções operacionalizar uma síntese de perspetivas que promovam uma educação pautada pela equidade e pelo respeito por todas as partes interessadas, regular a ação escolar no âmbito de políticas educativas integradas, bem como envolver e corresponsabilizar todos os atores (Rodrigues & Moreira, 2014). Trata-se de uma avaliação que se caracteriza por uma abordagem participativa, colaborativa, crítica e transformativa, democrática e deliberativa (Ibidem).

Na opinião de Alves (2004), este paradigma exige uma postura emancipadora da avaliação, uma vez que, segundo esta abordagem, os comportamentos e ações sociais não são vistos completamente subordinados às pessoas, às suas conceções e intenções, devendo ocorrer, epistemologicamente, uma fração entre o conhecimento científico e o conhecimento empírico e subjetivo. Nesta perspetiva, o referencial de avaliação surgirá de uma avaliação “em ato” (Ardoino & Berger, 1998; citados por Alves, 2004, p.43), isto é, uma construção e reconstrução ao longo do desenvolvimento do processo de avaliação.

O paradigma dialético de Rodrigues (2002) tem ainda algumas semelhanças com o paradigma compreensivo de Stake (2006, p.28), uma vez que se trata de “um modo de buscar e documentar a qualidade de um programa. Nele tanto se utiliza a medição baseada em critérios quanto a interpretação. O seu aspeto essencial é a compreensibilidade (recetividade,

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sensibilidade) de questões ou problemas-chave, especialmente os que são experienciados pelas pessoas no seu lugar ou programa”.

Estando a função da avaliação, de um modo geral, relacionada com a tomada de decisões e relacionada, especificamente, com as duas perspetivas integradas de avaliação de escolas: a avaliação interna/formativa e a avaliação externa/sumativa, verifica-se presentemente, na opinião Pacheco et al. (2014), uma propensão para a valorização desta sobre a anterior, devido à exigente prestação de contas que se solicita da parte da escola, no que diz respeito à evidência do mérito e competência obtidos nas suas diferentes dimensões”.

Para além dos paradigmas, existem, também, várias teorias da avaliação. Scriven (2003, citado por Pacheco et al., 2014) identifica as teorias normativas e descritivas, que se fundamentam nos paradigmas de Stake. As teorias normativas da avaliação definem como esta é ou dever ser e como pode ser definida, enquanto as teorias descritivas referem o que a avaliação é, efetivamente, ou que tipos de avaliação existem (teorias classificatórias) e o que, realmente, fazem ou têm feito, ou sobre como fizeram ou sobre o que fazem (teorias explanatórias).

Donaldson e Lipsey (2007, citados por Pacheco et al., 2014), preferem o termo “programa” ao termo “teoria” por considerarem que o termo “programa” ilustra melhor as práticas, as formas de intervenção e as opções políticas envolvidas na avaliação, o que, no entender dos autores, está mais relacionado com a natureza da avaliação. Neste enquadramento surgem as teorias de avaliação prescritivas, que, através do controlo dos desempenhos, se orientam para a medição dos resultados e melhoria das práticas (Rogers & Williams, 2007, citados por Pacheco et al., 2014).

Considerando que as pessoas ficam mais motivadas quanto mais focadas estiverem na melhoria dos resultados e não na resolução dos problemas, Donaldson e Lipsey (2007; citados por Pacheco et al., 2014) referem ainda a pesquisa apreciativa, diferenciando-a da empowerment evaluation que se baseia na melhoria a partir da autoavaliação e da reflexão, bem como da evaluative inquiry que se define pela colocação de questões de questões e clarificação de valores, crenças e perspetivas, ocorrendo em situações de investigação-ação.

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