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CAPÍTULO 4. FORMAÇÃO TRANSDISCIPLINAR

4.2 Pedagogia e transdisciplinaridade

Se tomarmos o modelo de Jean Houssaye, que nos apresenta um triângulo que tem por vértices (1) o professor, (2) o aluno, (3) o saber

Professor

Saber Aluno

ele poderá nos servir como instrumento heurístico de um diálogo entre a pedagogia e a transdisciplinaridade.

Como descreve Nóvoa (1998), “a partir de uma relação entre dois desses vértices, é possível imaginar, de forma necessariamente simplificada, três grandes modelos pedagógicos”:

a) se a ênfase for a relação entre os vértices Professor⇔Saber, “configura uma perspectiva pedagógica que privilegia no ensino a transmissão de conhecimentos”;

b) se a ênfase for a relação entre os vértices Professor⇔Aluno, configura uma perspectiva pedagógica que “valoriza os processos relacionais e formativos”;

c) se a ênfase for a relação entre os vértices Aluno⇔Saber, configura uma perspectiva pedagógica que “favorece uma lógica de (auto)aprendizagem”.

Portanto, segundo Jean Houssaye, cada um desses três grandes modelos pedagógicos, que é fruto da ênfase em dois dos três vértices de seu triângulo pedagógico, distingue um processo pedagógico diferente:

⎯ O modelo (a), centrado na relação Professor⇔Saber e na transmissão desse saber estruturado pelos professores, gera um processo pedagógico que privilegia o ensino;

⎯ O modelo (b), centrado na relação Professor⇔Aluno, gera um processo pedagógico que privilegia a socialização e a formação;

⎯ O modelo (c), centrado na relação Aluno⇔Saber, gera um processo pedagógico que privilegia a aprendizagem.

Houssaye chama esses três processos de processo ensinar, processo formar e processo aprender. Vemos que esse triângulo pedagógico é um modelo extremamente útil, pois, a partir dele, podemos estabelecer também outras relações e clarificações pedagógicas, como, por exemplo: o modelo (a), que gera um processo de ensino, transmite conhecimentos do professor, mas que são recebido pelo aluno como informações; o modelo (b), que gera um processo que privilegia a relação humana e os valores humanos e sociais, favorece a socialização e a formação do sujeito; o modelo (c), que gera um processo pedagógico que privilegia a aprendizagem, favorece a geração de conhecimento.71 Como vimos, a informação é de ordem exterior ao sujeito, o conhecimento é de ordem interior ao sujeito, e a passagem da informação ao conhecimento gera um saber, que, por sua vez, pode ser retransmitido.

A partir dos três vértices do triângulo pedagógico, Luis Not (citado por Altet, 1998) distingue três métodos de estruturação do pólo Saber:

⎯ O método de hetero-estruturação, na qual ele é estruturado pelo professor;

Professor

Saber Alunos

⎯ O método de auto-estruturação, no qual ele é estruturado prioritariamente pelo aluno; Professor

Saber Aluno

⎯ O método de inter-estruturação, no qual ele é estruturado pelo aluno, com a mediação do

professor.

Professor

Saber Aluno

Nóvoa chama atenção para o fato de que, em cada um dos três modelos pedagógicos, o vértice que é menos considerado, que é passivo, não desaparece: ele influência todo o processo, “mas não pode participar ativamente” nele, é um terceiro excluído. Segundo ele, com as novas tecnologias da computação, o modelo pedagógico atual tende a consolidar o eixo Saber⇒Aluno e, com isso, o pólo constituído pelos professores passa a ser o terceiro excluído. Embora, além de não questionar a utilização pedagógica dessas novas tecnologias, ele as valorize como “um poderoso instrumento de inovação e mudança”, Nóvoa afirma que é importante criticar os discursos que desvalorizam, no processo pedagógico, a relação humana e a mediação dos professores.

Segundo Maria do Loreto Couceiro,72 nas últimas décadas do século XIX e nas primeira do século

XX, “se pensava que para uma boa pedagogia bastava o professor conhecer muito bem seu assunto e transmiti-lo com clareza”. Pensava-se assim, pois a pedagogia se apoiava numa epistemologia positivista e behaviorista ⎯ modelo (a).

Os trabalhos de Jean Piaget e Carl R. Rogers, entre outros, mostram que uma formação de educadores que só leve em conta o modelo (a), que está muito mais ligada ao conceito de informação, tem resultados muito pouco satisfatórios, mesmo se for computado apenas o processo de aprendizagem:

"...há ensinos obviamente desprovidos de qualquer valor formador e que continuam a impor-se sem se saber ao menos se eles chegaram a atingir ou não a função utilitária que se objetiva. Por exemplo, admite-se comumente ser necessário, para viver socialmente, conhecer ortografia (...). Mas o que se ignora plenamente, e de maneira decisiva, é se o ensino especializado da ortografia favorece essa aprendizagem, se permanece indiferente ou se se torna nocivo. (...) Certas experiências têm mostrado que os registros automáticos realizados pela memória visual alcançam o mesmo resultado que as lições sistemáticas. Mas é inacreditável que um terreno de tal modo acessível à experimentação, e onde se encontram em conflito os interesses divergentes da gramática tradicional e da lingüística contemporânea, a pedagogia não organize experiências contínuas e metódicas, contentando-se apenas em resolver os problemas por meio de opiniões, cujo 'bom senso' encerra realmente mais afetividade do que razões efetivas" (Piaget, 1976, p. 15).

Portanto, Piaget afirmou que nem mesmo existiam pesquisas científicas que comprovassem que o modelo disciplinar de ensino (conteúdos a serem decorados) ⎯ modelo (a) ⎯ era mais eficaz do que qualquer outro método. Ou seja, o ensino amplamente dominante no último século é fruto de inferências abdutivas e dedutivas da epistemologia positivista, e que nem passaram pela verificação indutiva, a fim de comprovar ou não a sua eficácia.

Depois, “começou a se dar muita ênfase na boa qualidade da relação professor-aluno: pensava-se que isso era suficiente para que o aluno aprendesse”.73

Essa ênfase na relação Professor⇔Aluno, que caracteriza o modelo (b), esteve muito presente nos movimentos da Escola Nova74 e da chamada “educação nova”, termo genérico que reunia

73 Ibid.

74 O movimento da Escola Nova teve com modelo uma escola criada em Abbotsholme, Inglaterra, em 1899, por Cecil

Reddie na qual a pedagogia sempre emergia da prática e nunca de aulas disciplinares. Os alunos aprendiam matemática calculando as despesas da escola; inglês, escrevendo um jornal; história, fazendo conferências sobre seu país ou região

perspectivas pedagógicas diferentes, mas que tinham em comum a contestação do modelo “clássico” ⎯ modelo (a).

Nessa perspectiva, Carl Rogers, por exemplo, fala de duas espécies de aprendizagens, memorizada e experiencial (significativa ou auto-iniciada), e afirma que a segunda é imensamente mais eficaz para o processo de aprendizagem do que a primeira.

“A aprendizagem, creio, pode ser dividida em duas espécies gerais, dentro da mesma continuidade de significação. Num extremo da escala está (...) a aprendizagem de sílabas sem sentido (...) Porque não há significado algum, aprender tais sílabas não é fácil e, se aprendidas, são logo esquecidas. Com freqüência nos negamos a reconhecer que muito do material apresentado aos estudantes em sala de aula tem para eles a mesma qualidade desconcertante e destituída de significado que tem, para nós, a lista de sílabas sem sentido. (...) mas quase todo estudante descobre que extensas porções do seu currículo são, a seu ver, sem o menor significado. Assim, a educação se transforma na frustrada tentativa de aprender matérias sem qualquer significação pessoal. Tal aprendizagem lida apenas com o cérebro. Só se coloca ‘do pescoço para cima’. Não envolve sentimentos ou significados pessoais; não tem a mínima relevância para a pessoa como um todo. Em contraste, há algo significante, pleno de sentido ⎯ a aprendizagem experiencial. (...) Definamos, com um pouco mais de precisão, os elementos envolvidos em tal aprendizagem significativa ou experiencial. Tem ela a qualidade de um envolvimento pessoal ⎯ a pessoa, como um todo, tanto sob seu aspecto sensível quanto sob seu aspecto cognitivo, inclui-se no fato da aprendizagem” (Rogers, 1971, pp. 19-21).

Outra corrente na pedagogia logo percebeu que também “era necessário estabelecer uma relação direta” entre o aluno e o saber, mas afirmando ser essa a única relação realmente importante ⎯ modelo (c) ⎯, por se apoiar nas teorias construtivistas.75

para os outros alunos ou para os habitantes da cidade, etc. Era uma escola sem classes e sem cursos, que centrava a aprendizagem na relação do aluno com o saber que ele tinha que adquirir ao longo das diferentes práticas propostas pela escola.

75 Segundo a teoria construtivista, desenvolvida por Jean Piaget, o conhecimento é construído a partir da interação entre

os indivíduos e o meio no qual eles vivem, através de dois mecanismos simultâneos: a organização interna e a adaptação ao meio. Contrariamente ao que se pensava até o início do século XX, Piaget verificou que as crianças não

No entanto, o próprio Houssaye diz, na década de 80, “que todos os três pólos são fundamentais, mesmo que um dos três fique como morto alternadamente. Para que haja situação pedagógica, os três pólos têm de estar sempre em jogo”.76

Margarite Altet (1998), por sua vez, diz que “o triângulo pedagógico é demasiado rígido relativamente ao equilíbrio entre seus diferentes pólos” e propõe um modelo sistêmico que leve em conta “a complexidade, a totalidade, as interações e retroações, os fluxos, a regulação funcional, a dinâmica e a energia que caracterizam o processo ensino-aprendizagem e sua articulação dialética”. Essa reflexão é fundamental para uma perspectiva pedagógica transdisciplinar. No entanto, nesta perspectiva, temos de ir ainda além de um modelo sistêmico, pois, como vimos, além dos diferentes níveis de organização que ele abrange e de utilizar uma lógica dialógica, temos de levar em conta os diferentes níveis de realidade e de percepção, e utilizar também (sem exclusão das outras lógicas) a lógica do terceiro incluído. Além de todos os elementos novos que o modelo sistêmico abarca explicitamente em relação ao modelo de Houssaye, é necessário também ter em conta os diferentes níveis (ontológicos e perceptivos-cognitivos-imaginativos) do aluno,77 os diferentes níveis (ontológicos e perceptivos-cognitivos-imaginativos) do professor,78 os diferentes aspectos sob os quais as disciplinas podem ser olhadas (ontológico, metafórico, simbólico, etc.) e o diálogo entre as diferentes áreas do saber.79 Além disso, numa perspectiva transdisciplinar, a interação entre os três pólos deve se dar não só numa via dialética e dialógica entre os três, como no modelo sistêmico ⎯ onde os contraditórios podem encontrar sínteses que os ultrapassam no decorrer do processo pedagógico ⎯, mas também numa via trialética, na qual dois pólos contraditórios encontram seu terceiro incluído no mesmo momento do tempo, num outro nível de realidade, sem anular nenhum dos dois pólos contraditórios.80 Como vimos na descrição do terceiro incluído, um dos pilares metodológicos da transdisciplinaridade.

pensam como os adultos: a inteligência da criança se desenvolve em quatro estágios diferentes, cujo desenvolvimento pode ser influenciado (ampliado), mas não pode ser acelerado por ajudas externas.

76 Citado por Maria do Loreto Couceiro na palestra proferida em 15 de janeiro de 2003 em São Paulo. 77 Cf. Carta da Transdisciplinaridade, art. 5, 6 e 11.

78 Cf. ibid. 79 Cf. ibid., art. 5.

80 Os métodos adequados para isso ainda têm de ser criados. No curso O Pensamento Transdisciplinar, em 2002, o

4.2.1 As correntes pedagógicas

A partir dessa descrição sucinta do modelo de Houssaye, é interessante estabelecer um diálogo entre este modelo e as quatro correntes pedagógicas enunciadas por Altet (1998):

(1) A corrente magistro-centrista, que tem por finalidade a transmissão, pelo professor, de um saber constituído;

(2) A corrente puero-centrista, que tem por finalidade “o desenvolvimento, a formação e o desabrochar do aluno-pessoa”;

(3) A corrente sócio-centrista, que “tem por finalidade formar um homem social”, “membro da comunidade e sujeito social”;

(4) A corrente tecno-centrista, que “tem por finalidade adaptar o aluno à sociedade técnica e industrial”.

A corrente (1) corresponde ao modelo pedagógico (a), que enfatiza a relação entre os pólos Professor⇔Saber, utiliza os métodos de hétero-estruturação (nos quais o pólo Saber é estruturado pelo professor) e abarca as pedagogias chamadas da transmissão. Essas pedagogias, que são as predominantes nos ambientes de ensino, têm como fundamento as teorias behavioristas, que consideram a aprendizagem como um condicionamento81, privilegiam o processo instruir e a transmissão de informações.

A corrente (2) corresponde aos modelos pedagógicos (b) e (c), que enfatizam, respectivamente, a relação entre os pólos Professor⇔Aluno e Aluno⇔Saber, utiliza os métodos de inter-estruturação e/ou auto-estruturação do saber, e abarca as chamadas pedagogias da aprendizagem. Conforme a ênfase maior é dada ao modelo (b) ou ao modelo (c), essa corrente centrada nos alunos ⎯ na qual “o professor suscita as situações, acompanha a criança na sua procura e construção do saber, a comunicação vem do aluno e é horizontal entre o aluno e o professor, que o ajuda a reorganizar seu saber, ajustando sua ação à pessoa da criança” ⎯, privilegia o processo formar ou o processo aprender. Dentre os educadores que cooperaram para a emergência dessa corrente, é possível citar

81 “Behaviorismo, palavra de origem inglesa que se refere ao estudo do comportamento: behavior.” (Matos, 1995) A

teoria behaviorista, que surgiu no início do século XX, influenciada pela ciência positivista amplamente dominante daquela época, postula que o ser humano não precisaria de formulações de ordem mental ou cognitiva para justificar os comportamentos, mas que estes emergem da relação da sua realidade física (biofísica e bioquímica) com o meio ambiente e com a cultura na qual está inserido.

Ovide Decroly,82 John Dewey,83 Maria Montessori,84 Vygotsky,85 Roger Cousinet,86 Jean Piaget,87 Carl Rogers.88

82 Pedagogo belga (1871-1932) cujas obras postulam que a educação deve ser globalizante, partir da criança e não

seguir um modelo pré-fixado: partir de centros de interesse que surgem naturalmente de qualquer ato, como o de comer. A partir do centro de interesse que emerge da observação da criança, deve começar um diálogo com diferentes disciplinas, ao longo do qual a criança passaria de novo por três momentos ativos: observação, associação e expressão.

83 Psicólogo, filósofo e pedagogo americano falecido em 1952. Dewey não aceitava a educação pela instrução proposta

por Herbart, e contrapunha a ela a educação pela ação; criticava a educação tradicional, principalmente no que se refere à ênfase dada ao intelectualismo e à memorização.

84 Médica e pedagoga italiana (1870-1952) que começou seu trabalho pedagógico com crianças “deficientes” e depois

passou a experimentar com todas as crianças os procedimentos que tinha desenvolvido para a educação das primeiras. Os princípios fundamentais da sua pedagogia são: a individualidade da criança e a livre escolha das atividades. Como os estímulos externos formariam o espírito da criança, precisariam ser determinados: na sala de aula, a criança está livre para agir sobre os diferentes objetos, mas estes já estão pré-estabelecidos.

85 Psicólogo russo (1896-1934)que estudou o desenvolvimento mental da criança e as relações deste com o ensino, a

aprendizagem e o desenvolvimento. Um dos pontos em que sua proposta pedagógica diverge daquela de Piaget é que a deste não aceita a possibilidade de ajuda externa para acelerar o desenvolvimento da inteligência da criança nos quatro diferentes estágios (e sim uma educação adequada a cada um deles), enquanto a de Vygotsky afirma que não se deve esperar a maturação mecânica dos estágios, mas dirigir o ensino para os estágios ainda não alcançados, pois para ele a aprendizagem impulsiona o desenvolvimento e o professor pode ativar esquemas cognitivos ou comportamentais ainda potenciais na criança.

86 Pedagogo francês (1881-1973), cuja pedagogia postulava que, para favorecer a aprendizagem do aluno, o professor

deve se abster de ensinar: ser ensinado é simplesmente receber informações e procurá-las por si mesmo é aprender.

87 Biólogo, psicólogo e filósofo suíço (1896-1980), que, enquanto cientista, pesquisou, ao longo de toda a sua vida, o

desenvolvimento da inteligência humana. Constatou a existência de quatro estágios do desenvolvimento: estágio sensório-motor (zero a dois anos), estágio pré-operatório (de dois a sete anos), estágio das operações concretas (de sete a 12 anos) e estágio das operações formais com pensamento hipotético-dedutivo (de 12 a 15 anos). Com base nessas comprovações empíricas, Piaget concebeu uma pedagogia (mas não estabeleceu um método de ensino) que deve ser adequada a cada uma dessa quatro etapas, a fim de formar seres humanos “criativos, inventivos e descobridores”, pessoas críticas e ativas, em busca constante da autonomia.

88Psicólogo e pedagogo americano (1902-1987) representante da corrente humanista, não diretiva, na educação, em

contraposição frontal à corrente comportamentalista (behaviorista), que teve em Skinner um de seus nomes principais. Afirmou a existência de dois tipos básicos de aprendizagem: a memorizada e a auto-iniciada, significativa ou experiencial. Em suas obras, busca demonstrar que a segunda é muito mais eficaz para o processo de aprendizagem do que a primeira, propõe uma metodologia não-diretiva, a auto-avaliação do aluno, a ausência de avaliação externa, um professor que estabeleça uma relação pessoal com seus alunos, consiga aceitar o aluno tal qual ele é (compreendendo seus sentimentos e facilitando uma aprendizagem significativa), valorize as relações interpessoais e intergrupais, favorecendo uma “aprendizagem que não se limite a um aumento de conhecimentos, mas que penetre profundamente todas as parcelas de sua existência” (Rogers, 1998).

A corrente (3) privilegia o modelo (c), que enfatiza a relação entre os pólos Alunos⇔Saber, utiliza os métodos da auto-estruturação (nos quais o pólo Saber é estruturado pelo aluno) e os métodos da inter-estruturação. Essa corrente, centrada na relação do aluno com a sociedade, “visa a socialização, a inserção do aluno na sociedade para formar um homem novo e caminhar para uma sociedade nova”, está apoiada nas teorias marxistas e socialistas, e privilegia o que eu chamaria de um quarto processo pedagógico, o processo socializar, que favorece a socialização do sujeito e a geração de conhecimento. Dentre os educadores que podem ser citados nesta corrente estão Celestin Freinet89 e Paulo Freire.90

A corrente (4) também privilegia o modelo (a), que enfatiza a relação entre os pólos Professor⇔Saber, e utiliza os métodos de hétero-estruturação (nos quais o pólo Saber é estruturado pelo professor). Essa corrente, centrada na adaptação do aluno à sociedade tecnológica e industrial, está apoiada nas teorias positivistas e behavioristas, e privilegia o que poderia ser considerado um quinto processo pedagógico: o processo capacitar. Um nome que podemos destacar nesta corrente é o de B. F. Skinner.91

Vemos que essas quatro correntes pedagógicas enfatizam ou a capacitação, ou a socialização, ou a instrução/informação, ou a aprendizagem/conhecimento, ou a formação/sabedoria. Uma pedagogia

89 Pedagogo francês (1881-1966) que fundou um movimento pedagógico que se caracteriza por sua dimensão social,

centrada na criança e na relação desta com a sociedade. Critico tanto da escola diretiva (por ser orientada pelos interesses das classes dominantes, inimiga do tatear experimental, e do interesse e do prazer da criança) como da Escola Nova (por não questionar os valores burgueses da sociedade de seu tempo, por definir os locais, os materiais e as condições para a realização do trabalho pedagógico), criou o movimento da escola moderna, cujo objetivo principal era o desenvolvimento de um escola para as classes populares.

90 Pedagogo brasileiro (1921-1997) que contribuiu muito para a educação popular. Segundo ele, há dois tipos de

pedagogia: a pedagogia dos dominantes, onde a educação existe como prática da dominação, e a pedagogia do oprimido, que precisa ser realizada, na qual a educação surgiria como prática da liberdade. Não é suficiente que o oprimido tenha consciência crítica da opressão, mas que se disponha a transformar essa realidade; trata-se de um trabalho de conscientização e politização. A pedagogia do dominante é fundamentada em uma concepção bancária de educação, (o educador deposita "comunicados" que os educandos, recebem, memorizam e repetem), da qual deriva uma prática totalmente verbalista, dirigida para a transmissão e avaliação de conhecimentos abstratos, numa relação vertical, onde o saber é dado, fornecido de cima para baixo, e autoritária, pois manda quem sabe.

91 Junto com Pavlov, foi o pai dos estudos sobre o condicionamento animal. Skinner construiu sua teoria de ensino-

aprendizagem a partir da observação de animais colocados em situação de aprendizagem. A partir dessa observação, transferiu-a e adaptou-a à educação humana e elaborou uma teoria da aprendizagem na qual o aluno aprende sendo recompensado pelos seus êxitos e recebendo reforço quando não obtém êxito na assimilação dos conteúdos e na resolução dos problemas. É considerado o criador do ensino programado.

que pretende levar em conta as diferentes dimensões ou os diferentes níveis do sujeito nas diferentes etapas da sua formação ⎯ como é o caso da perspectiva transdisciplinar92 ⎯ tem de

valorizar essas quatro grandes correntes, e não uma em detrimento da outra, pois cada uma delas é mais apropriada para cada um dos aspectos do desenvolvimento do sujeito, na relação consigo mesmo (autoformação), na relação com os outros (heteroformação), na relação com a sociedade e na relação com o meio ambiente (ecoformação). Além disso, se “a maior ou menor satisfação dos três pilares metodológicos da pesquisa transdisciplinar gera diferentes graus de transdisciplinaridade” (Nicolescu, 2001, p. 53), para que uma pedagogia tenha um grau mais elevado de transdisciplinaridade ou para que se apoie num conceito forte de transdisciplinaridade, além de valorizar essas quatro correntes ⎯ o que já satisfará, de algum modo os pilares metodológicos do terceiro incluído e da complexidade ⎯, a corrente (2), centrada no desenvolvimento e formação do aluno-pessoa, deve se abrir também para o diálogo com os