• Nenhum resultado encontrado

PERÍODO

6.4 Pesca artesanal

A pesca na Amazônia é uma das principais atividades da região de várzea e também tem passado por mudanças profundas nos últimos trinta anos. A pesca tem se tornado uma atividade cada vez mais importante para a região, sendo responsável por 25% da produção nacional de pescado (RUFFINO, 1996; ALMEIDA et al., 2001; ALMEIDA et al., 2009a; ALMEIDA et al., 2009b; ALMEIDA et al., 2012).

A pesca é realizada no contexto de uma variabilidade espacial, expressão dos múltiplos ambientes da paisagem amazônica (rios, igarapés e furos). A percepção desses elementos, pelos caboclos-ribeirinhos, permite administrar as interações do recurso com o processo de reprodução humana, atuando sobre os elementos biológicos, de modo a orientar suas forças produtivas para a manutenção dos estabelecimentos familiares (ALMEIDA, 2013).

O Baixo Tocantins possui um conjunto de condições físico-químicas e biológicas que servem de base para o desenvolvimento da pesca e, ao mesmo tempo, consagram-lhe a noção de espaço para a produção extrativa, aliada às múltiplas faces contextualizadas sobre a paisagem amazônica. Assim sendo, essa região, além de caráter geográfico, que naturalmente

incorpora, assume, deste ponto de vista, o caráter de ecossistema: no âmbito das interações dos recursos vivos com o processo de reprodução dos habitantes da várzea, por meio de relações de produção e de forças produtivas refletidas nas distintas tipologias hídricas (ALMEIDA, 2013).

As principais espécies capturadas pelos entrevistados são: camarão (Macrobrachium

amazonicum), pescada (Plagioscion spp.), mapará (Hypophthalmus marginatus), mandi

(Pimelodidae), dourada (Brachyplatystoma rousseauxi), sarda (Sarda sarda), acará (Geophagus proximus), jacundá (Crenicichla spp), tucunaré (Cichla spp.), mandubé (Ageneiosus dentatus), piaba (Brachyplatystoma vaillantii), pirarara (Phractocephalus

hemiliopterus), bacu (Doradidae), ituí (Gymnotiformes) e traíra (Hoplias malabaricus), tipos

de peixes mais frequentes nas pescarias efetuadas pelos caboclos-ribeirinhos na área de estudo (Tabela 5).

Tabela 5 - Principais Espécies de peixe capturadas no ecossistema de várzea no território do

Baixo Tocantins

Espécie Nome Científico Finalidade

Camarão Macrobrachium amazonicum C, V

Pescada Plagioscion spp. C, V

Mapará Hypophthalmus marginatus C, V

Mandi Pimelodidae C

Dourada Brachyplatystoma rousseauxi C, V

Sarda Sarda sarda C

Acará Geophagus proximus C

Jacundá Crenicichla spp C

Tucunaré Cichla spp.) C

Mandubé Ageneiosus dentatus C

Piaba Brachyplatystoma vaillantii C

Pirarara Phractocephalus hemiliopterus C

Bacu Doradidae C

Ituí Gymnotiformes C

Traíra Hoplias malabaricus C

Não informaram Finalidade da pesca segundo entrevistados % Consumo (C) 69,0 Venda (V) 0,9 Ambos (A) 30,2

Do total de caboclos-ribeirinhos que desenvolvem atividade de pesca, 70,7% pescam camarão (Macrobrachium amazonicum); 57,8%, pescada (Plagioscion spp.); 26,7%, mapará (Hypophthalmus marginatus); 16,4%, mandi (Pimelodidae); 11,2%, dourada

(Brachyplatystoma rousseauxi); 11,2%, sarda (Sarda sarda); 9,5%, acará (Geophagus

proximus); 8,6%, jacundá (Crenicichla spp); 6,9%, tucunaré (Cichla spp.); 6,0%, mandubé

(Ageneiosus dentatus); e 4,3%, piaba (Brachyplatystoma vaillantii) (Gráfico 22).

Gráfico 22 - Principais espécies de peixes capturados pelos caboclos-ribeirinhos pescadores no

Território do Baixo Tocantins

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013/2014.

O estudo de Almeida (2013) revela que as principais espécies capturadas pelos caboclos-ribeirinhos, pescadores de Mocajuba, foram: camarão, pescada, acaratinga, tucunaré, mapará, jutuarana, jacundá, entre outras espécies, como identificada nesta tese.

A pesca artesanal praticada no território do Baixo Tocantins caracteriza-se por ser uma atividade de subsistência caracterizada pelo uso tradicional de recursos pesqueiros. O pescador artesanal desenvolve suas atividades de pesca durante os 12 meses do ano, com o uso de equipamentos simples: rede malhadeira, matapi, espinhel e facão, além do paneiro e lanterna.

A maioria dos apetrechos utilizados na atividade pesqueira é artesanal, adaptados para captura de pequenas quantidades. A pesca artesanal nas áreas de várzea do território é

0 10 20 30 40 50 60 70 80 Acará Bacu Camarão Dourada Ituí Jacundá Mandi Mandubé Mapará Pescada Piaba Pirarara Sarda Traira Tucunaré

desenvolvida principalmente com o uso de "rabetas" de madeira com motor de popa ou canoa a remo19 (fotogaafia 5).

Fotografia 5 - Caboclo-ribeirinho desenvolvendo atividade de pesca artesanal no território

do Baixo Tocantins

Fonte: Pesquisa de Campo, 2013/2014.

A pesca de camarão nos rios do Baixo Tocantins está atrelada à sazonalidade das marés e é feita principalemtne utilizando uma armadilha em forma cilíndrica que mede em torno de 40 cm de comprimento e 25 cm de diâmetro. O matapi é uma armadilha confeccionada de fibra vegetal, armada por um traçado de cipó ou cordas de poliamida, tem forma cilíndrica, possuindo em cada extremidade um funil, que facilita a entrada e dificulta a saída dos camarões, além de uma abertura lateral onde fica a isca. Os matapis são colocados dentro da água no período da maré cheia e retirados quando a maré seca (Fotografia 6).

A dinâmica de captura do camarão, com o uso do matapi ocorre ao longo dos canais. Igarapés e os furos dos rios, em frente ou nas proximidades das propriedades ribeirinhas. Os matapis são amarrados nas estacas ao longo das bordas dos rios, iscados com farelo de babaçu (Orbinya speciosa). A pesca de camarão da espécie Marcrobrachium amazonicum é realizada

19 Canoa a remo: embarcação movida a remo, sem convés ou com convés semi-fechada, sem casaria, com quilha,

com pintura, de pequeno porte, e mutuamente utilizada nas pescarias com espinhel e nas pescarias de campanha. Rabeta: embarcação movida a motor a diesel, com ou sem convés semi-fechado, sem casaria, de porte curto ou mais alongado, com uso para variados fins: pescarias, transporte curtos e de maiores distancias (deslocamento para a sede do município) (ALMEIDA, 2013).

nos meses de fevereiro a maio, com mais intensidade, considerado período de safra dessa espécíe no Baixo Tocantins.

Em geral, a pesca artesanal é um componente estratégico do sistema de produção nas áreas de várzea do território do Baixo Tocantins, em razão de sua dupla finalidade: subsistência e comercialização, como mostra a Tabela 5, p. 168. A finalidade principal da atividade de pesca é a captura de peixes e camarão para a alimentação das famílias, correspondendo a 69% do total pesquisado, os quais informaram que pesca é para consumo familiar, e o excedente é destinado para comercialização nas comunidades ribeirinhas e nas feiras municipais deste territóro. Dificilmente os caboclos-ribeirinhos se deslocam para o centro urbano das cidades do Baixo Tocantins, com o objetivo de realizar a comercialização.

Fotografia 6 - Pesca de camarão com o uso do matapi em área de várzea no território do Baixo

Tocantins

Fonte: Pesquisa de Campo 2013/2014

Os dados apresentados mostram que a atividade pesqueira é desenvolvida pela mão de obra familiar, realizada por diferentes gerações, nas comunidades pesquisadas, sendo

realizada tanto por homens quanto por mulheres. Considerando somente os entrevistados que pescam, a idade oscila entre 19 e 63 anos, média de idade de 40 anos.

Os caboclos-ribeirinhos possuem um acordo informal e tácito, procedente de uma consciência coletiva, de respeito pelo local de pesca no território: cada um atua nas faixas dos rios nas proximidades de sua residência, sem ultrapassar os limites estabelecidos informalmente e divididos, geralmente, por acidentes geográficos (ALMEIDA, 2013).

A pesca tem sido uma das práticas extrativistas mais tradicionais e importantes da várzea do Baixo Tocantins, representanto uma das principais fontes de proteína na alimentação das comunidades ribeirinhas. Deste modo, os caboclos-ribeirinhos estabeleceram relações produtivas específicas no ecossistema de várzea, desenvolvendo práticas de conservação e de manejo sustentável, por meio da diversificação produtiva e uso múltiplo dos recursos naturais, não só preservando a biodiversidade, mas gerando trabalho e renda. Assim, a natureza converte-se em recurso econômico, social, ecológico e ambiental e, principalmente, em patrimônio biocultural.

No entanto, os caboclos-ribeirinhos entrevistados informaram que existem dois problemas centrais na atividade da pesca artesal nas áreas de várzea do território do Baixo Tocantins. Ao longo dos anos, principalmente depois da construção da Hidréletrica de Tucuruí e com a intensificação nos padrões de exploração e comercialização do pescado, observa-se a escassez dos pescados e a redução do tamanho dos peixes.

A instalação da hidrelétrica de Tucuruí no território do Baixo Tocantins e consequentemente, o barramento do rio Tocantins, ocasionou diversos impactos ambientais no território, principalmente com relação aos recursos pesqueiros (peixe e camarão) disponíveis, que tiveram a sua rota migratória interrompida, tendo como conseqüência o declínio da abundância de algumas populações e do número de espécies. (MÉRONA et al., 2010; ALMEIDA, 2013; BENTES et al., 2014; ARAÚJO et al., 2014).

Essa constatação é feita com base no acompanhamento de duas espécies nas pescarias da região do Baixo Tocantins, o camarão e o mapará. A redução das quantidades de capturas nessa região, em relação ao mapará, nos anos de 1987/88 foi de 184.000kg; e, em 1999, cerca de 101.000 kg. Em Cametá, principal porto de desembarque, a queda na produção desta espécie, vista individualmente, é ainda maior: em 1981/82 foram capturados 287.000 kg, caindo, em 1987/88, para 160.000 kg. Em 1999, o desembarque registrou 64.000 kg. Relatórios da Eletronorte mostram que, de 1981/82 até 1999, a redução relativa das quantidades capturadas e desembarcadas foi de aproximadamente 78% (SILVA, 2003).

A escassez e a redução de muitas espécies de peixe e camarão no território do Baixo Tocantins levaram os caboclos-ribeirinhos a aumentarem a pressão sobre os recursos pesqueiros, para compensar a perda da diversidade do pescado, assim como desenvolver iniciativas de manejo da pesca, a partir de sistemas de criação de pescados em cativeiros, como alternativa para a escassez de peixe.

Documentos relacionados