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MUNICÍPIO DE ABAETETUBA

3.5 População caboclo-ribeirinha: categoria social analisada

Na Amazônia, vários estudos sobre população caboclo-ribeirinha e sua identidade foram analisados por Morán (1990; 1994); Lima (1999); Castro (1997); Fraxe (2004a); Simonian (2005, 2007); Brondízio (2006); Fraxe et al. (2006); Adams; Murrieta; Neves (2006); Fraxe et al. (2007); Cruz (2008); Fraxe et al. (2008), entre outros, que desenvolveram um sistema adaptativo específico com o território amazônico, sendo também utilizado na literatura acadêmica para fazer referência direta à população rural de ocupação histórica na Amazônia

O termo caboclo é vastamente utilizado na Amazônia brasileira como uma categoria de classificação social característica da população rural formada pelos pequenos produtores familiares, refletindo a história da formação da sociedade amazônica6, que vive da exploração dos recursos da natureza (LIMA, 1999).

6 A população amazônica denominada de caboclos, ribeirinhos, caboclos-ribeirinhos, seringueiros, entre outros, é

fruto da confluência de sujeitos sociais distintos, concretizados na relação entre ameríndios da várzea e/ou terra firme, negros, nordestinos e europeus de diversas nacionalidades (portugueses, espanhóis, holandeses, franceses, etc). Ou seja, os caboclos são frutos da colonização europeia e da assimilação indígena que inauguram novas e singulares formas de organização social nos trópicos amazônicos (FRAXE; WITKOSKI; MIGUEZ, 2009).

Para Simonian (2005), os caboclos amazônicos são os que vivem em íntima relação com o ambiente e que, apesar de disporem de uma tecnologia simples, conseguem não apenas sobreviver dos recursos naturais disponíveis, mas desenvolver toda uma cultura, uma complexidade impar e que inclui estratégia de conservação.

Portanto, o caboclo é composto de traços culturais que distingue seu modo de vida de uma existência branca e urbana. As características de uma arquitetura distinta, os meios de transporte que usam, seus instrumentos de trabalho, seu conhecimento e modo de manejar os recursos da floresta, seus hábitos alimentares, sua religiosidade, mitologia, sistema de parentesco e diversos maneirismos sociais expressam a existência de uma cultura cabocla que é básica para o conceito desse típico amazônida (LIMA, 1999).

No sentindo do uso acadêmico, o termo caboclo refere-se aos pequenos produtores rurais de ocupação histórica, também classificada como camponeses ou camponês- ribeirinhos. Essa população vem sendo identificada pelo termo ribeirinho, por habitarem as margens dos rios, neste caso ilha e igarapé, desenvolvendo atividades aquáticas, florestais e em alguns casos agrícolas (HIRAOKA, 1993).

Na Amazônia ribeirinha, assim como, no território do Baixo Tocantins, a população rural da área de várzea é denominada de ribeirinha, carregando a mesma conotação regional que caboclo descrito por Lima (1999). De fato, a existência de uma população rural que tem um estilo de vida distinto, em estreito relacionamento com a água e a floresta, justifica que ela seja agrupada como uma categoria social específica. O termo ribeirinho é usado na Amazônia para designar os camponeses que vivem às margens das águas (rios) e vivem da extração e manejo de recursos florestais, aquáticos e da agricultura (HIRAOKA, 1993; LIMA, 2004).

Assim, caboclos, ribeirinhos, caboclos-ribeirinhos, agricultores, agricultores familiares, trabalhadores rurais, trabalhadores do campo e pequenos produtores são formas de identificar os homens que vivem à margem dos rios, lagos e igarapés da Amazônia (FRAXE et al., 2008). Esses autores apresentam também o termo caboclo-ribeirinho7 enquanto classe social representativa de uma parte da população rural da Amazônia, coloquialmente chamada de ribeirinho ou população caboclo-ribeirinha por viver às margens dos rios amozônicos. Por

7 Os caboclos-ribeirinhos integram o grupo das populações tradicionais definidos como grupos humanos

culturalmente diferenciados que historicamente reproduzem seu modo de vida, de forma mais ou menos isolada, com base em modos de cooperação social e formas específicas de relações com a natureza, caracterizados tradicionalmente pelo manejo sustentado do meio ambiente. (DIEGUES, 1996; DIEGUES et al., 2000). As populações tradicionais podem ser definidas como sociedades que desenvolveram formas particulares de manejo dos recursos naturais que se ligam diretamente na representação cultural e social, como também em percepções e representações em relação ao mundo natural que marcadas pela ideia de associação com a natureza e dependência com seus ciclos (DIEGUES, 2005).

isso, nesta tese, denominamos estes de caboclos-ribeirinhos, enquanto categoria social pesquisada8.

Em termos conceituais, os caboclos-ribeirinhos compreendem populações humanas que residem às margens dos rios, lagos e igarapés amazônicos, que desenvolvem permanentemente uma estreita relação com a natureza, a qual se manifesta numa intensa interação, contituinte de um modo de vida adaptada ao mundo das águas e das florestas, vivendo da extração e manejo dos recursos naturais, voltados principalmente para a subsistência, com o uso de mão de obra familiar (FRAXE, 2004; FRAXE et al., 2006, 2007, 2008, 2009).

Essa é a definição que melhor expressa a situação da população caboclo-ribeirinha das áreas de várzea do Baixo Tocantins. Portanto, caboclo-ribeirinho, nesta tese, caracteriza um segmento social que vive e interage com as águas (rio/igarapé) e com as florestas, dispondo de conhecimentos construídos na vivência e nas experiências com o território (LOPES, 2012).

O caboblo-ribeirinho é uma construção histórica e cultural que envolve tradições (raízes), resultante de processo de longa duração de adaptação com a natureza, revelando, em diversos aspectos, o cotidiano em relação à conservação dos recursos naturais (solo, da água, da fauna e da flora) que caracteriza a condição sociocultural das comunidades ribeirinhas (DIEGUES, 1996; FRAXE, 2000; 2004; CRUZ, 2008). Portanto, pode-se firmar que a identidade caboclo-ribeirinha é territorial, construída a partir de uma relação concreta/simbólica/imaginária dos grupos sociais com o território (HAESBAERT, 1999; CRUZ, 2008).

Castro (1997) mostra que os caboclos-ribeirinhos possuem referências no modo de vida, na linguagem e na relação com a água, construindo concepções de vida construída sobre a natureza, a partir do uso dos recursos das florestas, e dos cursos d’água, que atravessam gerações e fundam uma noção de território, seja como patrimônio comum, seja como de uso familiar dos recursos naturais. Eles são herdeiros de parte dos conhecimentos indígenas e criadores de um modo de vida adaptado às condições ecológicas da região; possuem um singular conhecimento sobre o uso apropriado da várzea amazônica (LIMA, 2004; FRAXE et al., 2007).

8

Além do termo caboclo ou caboclo-ribeirinho, diversos autores empregam e usam o termo camponês ou camponês-ribeirinho em muitos estudos acadêmicos, desde os mais restritos, que incluem os cultivadores do solo, até os mais amplos, que compreendem todo o trabalhador rural do campo ou aqueles que partilham de segmentos da sociedade nacional, através das culturas caiçara, caipira, tabaréu e/ou cabocla (FRAXE et al., 2008).

O saber desses caboclos-ribeirinhos revela um conhecimento relativo ao modo de vida e a suas múltiplas práticas produtivas por meio do cultivo e manejo de açaí, pesca, caça, extrativismo vegetal, criação de animais domésticos, agricultura, dentre outras atividades, seguindo ritmos sazonais impostos pela dinâmica do ecossistema de várzea. Essas práticas são uma expressão sofisticada da relação entre o homem e a natureza, expressando não apenas dimensões técnicas, mas também princípios morais e simbólicos (WOORTMANN, 2009).

Entre as principais características das populações caboclo-ribeirinhas observadas, a diversidade de manejo e uso dos recursos naturais e modo de organização econômica e social das comundades, são típicas das atividades agroextrativistas e pesqueiras, baseadas no uso intensivo da mão de obra familiar, com pouca tecnologia e de baixo impacto ambiental, em estreita relação com o ambiente natural em que vivem, recorrendo a mitos, lendas, plantas medicinais, assim como, ao trabalho e ao lazer.

Essas características transportam-se também para as condições em que exercem o trabalho ribeirinho, aproveitando os movimentos da natureza (safra de peixes, camarão, açaí, de frutas, criação de animais, entre outras). Integrados ao meio ambiente, os ribeirinhos, nas condições de pescadores, agricultores e extrativistas mostram nuanças de uma natureza que deles exigem criatividade e instigam a compreensão imaginativa (FRAXE, et al., 2007).

Os caboclos-ribeirinhos do território do Baixo Tocantins vivem e se desenvolvem a partir de uma dinâmica própria há várias gerações, ali construídas, como verdadeiros testemunhos das modificações que foram acontecendo no território. Isso tem possibilitado a constituição de uma identidade única, fortemente carregada de uma sabedoria, que só se adquire na convivência com a natureza. Assim, para compreender a dinâmica da população caboclo-ribeirinha do ecossistema de várzea precisam ser conhecidos seus processos adaptativos, aplicados aos seus estilos de vida, suas práticas produtivas e sua relação com a natureza, a partir do uso múltiplo dos recusos naturais.

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