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Pesquisas sobre a história e as concepções a respeito da Deficiência Mental

A compreensão da especificidade da Educação Especial requer a recuperação de alguns aspectos de sua história e da deficiência mental, evidentemente atrelada, em alguns momentos, à história da própria escola pública. Como afirmado anteriormente, é por meio da recuperação do contexto histórico e social de atendimento ao indivíduo com deficiência mental que é possível estruturar a discussão sobre escolarização de subjetivação da pessoa com deficiência mental leve. Para tanto, os trabalhos selecionados foram:

Título Autor Publicação Ano

Deficiência mental: da superstição à ciência PESSOTTI, I. Livro 1984

1ª ed. A luta pela educação do deficiente mental no

Brasil

JANNUZZI, G. Livro 1985

1ª ed. Educação Especial Brasileira:

Integração/Segregação do aluno diferente

BUENO, J.G.S. Livro 1993

1ª ed. Práticas institucionais e exclusão social da

pessoa deficiente

BUENO, J.G.S. Artigo do livro Educação Especial em debate

1997

A produção da identidade do anormal BUENO, J.G.S. Artigo do livro

História social da infância no Brasil

Parafraseando Jannuzzi, no prefácio do livro de Julio Romero Ferreira (1995), pode-se afirmar que esses trabalhos selecionados integram um grupo que, a partir de 1970, tem como preocupação discutir a Educação Especial e seu inter-relacionamento com a sociedade brasileira global. De forma sistematizada abordam o tema da Educação Especial, possibilitando a construção de um conhecimento científico compromissado com a realidade educacional e social. Considerando sua importância, a preocupação maior é apresentá-los de forma consistente e fiel, no intuito de fundamentar de maneira clara as premissas da presente pesquisa. Para melhor compreensão, a discussão desses trabalhos seguirá uma ordem cronológica, pois sempre o mais recente se reporta ao anterior.

Inicia-se por Pessotti (1984) que busca compreender a evolução do conceito de deficiência mental, desde a Antigüidade até o século XX. Discute também o delineamento dos quadros de deficiência e sua etiologia, assim como a construção da ação em Educação Especial. Para fundamentar seu trabalho, recorre a uma série de publicações sobre o tema, em diferentes momentos da história. Explicita, antes de iniciar a discussão, que a história da deficiência mental tem relação direta com a filosofia humanista e reflete o entrechoque de eventos e idéias de diferentes campos do saber e da vida social. Portanto, para compreender uma determinada idéia, é preciso fazer referência aos momentos marcantes e sua relação com as determinantes de origem teológica, econômica, política, jurídica ou outras.

O livro traz uma descrição cronológica das principais idéias e personagens que geraram teorias e interpretações sociais sobre a deficiência mental, seja por meio de escritos, iniciativas didáticas ou assistenciais. O autor cita obras anteriores ao próprio conceito de deficiência mental, mas que têm uma íntima relação com certas concepções e preconceitos presentes até hoje.

Acreditamos ser importante, para melhor compreensão, apresentar, mesmo que superficialmente, como o livro está organizado. Ao mesmo tempo, por considerar que a forma como o tema foi abordado possibilitou que outros trabalhos posteriores se apropriassem de suas contribuições. Posta a explicação, partindo da Antigüidade Clássica o autor chega até a estruturação da educação especial para deficientes mentais com Itard. Analisa a importância das contribuições de Itard, bem como a construção do

discurso hegemônico médico sobre a deficiência mental, e seus grandes nomes como Pinel, Esquirol, Froebel..., posteriormente enfoca a obra de Seguin que, pioneiramente, alia o conhecimento médico ao enfoque pedagógico. Preocupa-se com a involução, pessimismo e retrocesso das teorias, nas últimas décadas do século XIX; e, finalmente, discute duas grandes contribuições do século XX, que são a educação especial para deficientes mentais e o avanço científico na compreensão da deficiência mental ou retardo mental.

O autor enfatiza que o enfoque organicista, fortemente presente na história da evolução do conceito de deficiência mental, é lamentável, denominando-o de ditadura médica. Ressalta que os experimentos de Itard e Seguin conseguiram se libertar dessa ditadura, porém foram considerados na época à margem do processo científico, por não abandonarem os aspectos filosóficos do que ele denomina naturalismo pedagógico.

Finaliza explicitando que, no início do século XX, os dilemas complementares eram para a:

 Medicina: como tratar os débeis mentais não confináveis;

 Pedagogia Científica: como estender aos deficientes mentais o ensino vigente;  Psicologia Científica: como medir as diferenças de capacidade mental dos normais

e dos débeis mentais.

Desta forma, a história da deficiência é marcada pela demolição do argumento demográfico e da exterminação, bem como do apelo à esterilização do deficiente. Porém é uma história ainda aprisionada pela marca de maldição ou castigo divino, e do fatalismo clínico da hereditariedade inevitável. O autor enfatiza que é preciso se libertar da postura organicista no que ela tem de fatalismo e unitarismo etiológico.

Jannuzzi (1985) tem como referência, o trabalho exposto anteriormente, entre outros, para realizar pesquisa com a proposta de estudar a concepção de deficiência mental na criança, e a teoria e prática escolar proposta para essas crianças no contexto sócio-econômico-político brasileiro de 1874 até 1935. Sua preocupação voltou-se para o possível inter-relacionamento do conceito e da educação dessas crianças com o contexto histórico-social em que foram produzidas, o que não significou o desmerecimento de

implicações genéticas, neurológicas, psiquiátricas dentre outras, porém, como a autora deixa claro, não foram o ponto de reflexão de sua obra.

No prefácio escrito pelo Professor Pedro Georgen é ressaltada a originalidade do trabalho, pela sua preocupação em recuperar sistematicamente a história da educação do deficiente mental no Brasil, bem como estabelecer um enfoque que evidencia o inter- relacionamento entre a educação do deficiente mental e a sociedade, nos diversos períodos estudados, evidenciando a educação como um processo integrado ao modo pelo qual a sociedade se organizou, ao reproduzir sua própria subsistência.

O enfoque pioneiro do trabalho de Jannuzzi (1985) busca compreender o relacionamento entre a sociedade e a educação do deficiente mental, dentro de um processo ativo de segregação, mais ou menos consciente, de uma parcela da população portadora de comportamentos dissonantes das expectativas dominantes. Esse trabalho constitui-se em um dos primeiros passos para a recuperação da história do deficiente mental no Brasil e na demonstração do relacionamento que se estabelece entre o diagnóstico da deficiência e os valores, as normas do comportamento, enfim ,o ideal de homem que está inserido nos diversos momentos da evolução cultural.

A autora explica, a partir das contribuições de Erving Goffman8, que a deficiência é compreendida de forma situada historicamente, com as marcas das expectativas sociais, do modelo de ser humano baseado principalmente em atributos valorizados pelas relações sociais surgidas em determinado modo de produção. Sendo assim, essa visão impossibilita a compreensão da educação como redentora do deficiente, pois é claro o limite do tempo histórico para o pedagogo, desde a conceituação da deficiência de seus alunos, até as exigências e as angústias das famílias e da comunidade em geral em torno de seu trabalho na escola.

O próprio conceito de deficiência, segundo Jannuzzi (1985), deve ser questionado, a partir de um ideal de normalidade que não corresponde a algo naturalmente estabelecido, mas às contingências e expectativas de determinado momento social. Enfatiza que não se trata da negação da patologia, mas do convite para refletir sobre o grau de responsabilidade social no surgimento da própria patologia, bem

como da ansiedade e irresponsabilidade ao se identificar e desvencilhar de crianças mentalmente diferentes, que não se enquadram nos modelos oficiais de comportamentos.

A história da educação brasileira, segundo a autora, é marcada pelos desejos e anseios da elite; foi sendo concebida na medida em que se tornava necessária para a subsistência do sistema dominante, até o momento em que os movimentos populares passaram a reivindicar a educação como um direito. No entanto essa elite, enquanto pôde, mandou seus filhos estudarem na Europa. Quando a alfabetização se tornou necessária para o voto, ou requisito para garantia do poder, foi ampliado o círculo no processo educativo. Partindo do mesmo princípio, segundo a autora, o novo sistema de produção passou a necessitar de uma mão-de-obra mais qualificada e, conseqüentemente, ocorreu a ampliação do sistema educacional.

Ressalta que, no Império, com o predomínio de uma sociedade rural e descentralizada, foi possível silenciar os deficientes mentais, assim como aqueles que mais se distinguiam e incomodavam. Entretanto, na medida em que a escola primária ia se organizando, concomitantemente iam se formando, também, as primeiras escolas para deficientes mentais, segundo achados da autora. Assim como ocorre com a educação em geral, há uma estreita relação entre a educação do deficiente mental e o modo de organização e reprodução da sociedade. Por conseguinte, a defesa da escolarização dos anormais fundamentou-se na economia dos cofres públicos e dos bolsos particulares, pois era preferível a incorporação dos mesmos no mercado de trabalho do que a manutenção dos manicômios, asilos, penitenciárias.

Jannuzzi (1985) salienta que há questões sérias que distinguem a problemática da educação em geral da educação do deficiente. Inicia a explicação afirmando que a escola incorpora expectativas sociais no cumprimento de sua função de transmissora do modelo oficial, e se serve de falsos critérios de cientificidade para selecionar os anormais, baseando-se num critério fluido e tênue de normalidade. É por meio desse processo seletivo que acaba estigmatizando certas pessoas como excepcionais, retardadas, atrasadas, não com base em razões patológicas, genéticas ou neurológicas, mas em fundamentos avaliativos do comportamento diferente em relação ao esperado e considerado normal, referendado pelo conjunto de normas e valores que a sociedade

estabelece em determinado momento histórico. Para a autora, “A definição da anormalidade está profundamente condicionada pelas conveniências da normalidade.” (p. 10)

Com base na sua pesquisa de campo, análise documental, a autora afirma que nas propostas pedagógicas estudadas não se cogitava nenhuma solução escolar mais geral, nacional, para as crianças com deficiência. As ações se restringiam a determinados locais, envolvendo sempre um número pequeno de educandos e educadores e, desta forma, não houve solução escolar para essas crianças com deficiência, no período estudado.

Muitos pedagogos, explica Jannuzzi (1865), agrupavam como deficientes mentais os alunos abandonados, irrequietos, com aprendizagem lenta juntamente com crianças que tinham lesões orgânicas, distúrbios mentais graves, todos sob o crivo da anormalidade. Nessa prática, eram englobadas diferentes crianças com comportamentos divergentes das “normas sociais” estabelecidas pela sociedade e veiculadas nos padrões escolares. Desse modo a conceituação de deficiência mental explicitada pelos educadores refletia a expectativa social naquele momento histórico, evitando, assim, a desestabilização dos padrões escolares vigentes.

Para a autora, a ação pedagógica voltada para crianças com deficiência reproduziu as expectativas históricas, principalmente das camadas dirigentes, sendo que em alguns momentos se tornou altamente opressiva, na tentativa de garantir alguma função social nos moldes aceitos daquele determinado momento. Enfatiza, também, que não foi um processo sem inquietações, dúvidas, contestações e até reformulações, porém, por meio dos documentos analisados, não foi possível resgatar como a ação se efetivou. Além disso, os pedagogos conseguiram com muita paciência, dedicação e eficiência viabilizar aprendizagens simples, apesar da dificuldade em manter a criticidade naquele momento histórico e agir efetivamente sobre a realidade educacional, por estarem presos a uma teoria que não lhes facilitou a atuação. Mesmo com toda essa dificuldade, a instrumentalização de alunos com deficiência, por meio de aprendizagens possíveis que só com o contato familiar não teriam acontecido, diminuiu a segregação e a marginalização dessas crianças no período estudado.

Para finalizar, Jannuzzi, (185) demonstra que a classificação das crianças anormais, como analisado na literatura e nos documentos, sempre impregnou a compreensão das mesmas na busca de uma certa cientificidade no processo seletivo, sendo que, no período estudado na pesquisa, a classificação da deficiência ficou mais no nível do discurso do que no da ação efetiva, de modo que a desescolarização foi predominante e a seleção muito restrita, tornando assim a classificação dos anormais um problema secundário.

Dando continuidade a esta discussão histórica, Bueno (1993), em sua tese, preocupa-se em resgatar aspectos históricos da Educação Especial, enfocando o Brasil desde o Império até 1970. Relata que a história da Educação Especial inicia-se no século XVI, inicialmente direcionada às crianças surdas e mudas, sendo que a prática social predominante até então era a de interná-las em asilos, manicômios, ou abandoná-los à sorte, sem nenhum tipo de atendimento específico, com o intuito de retirar os imperfeitos do convício social. O início da escolarização dos deficientes é marcado pela clara distinção de conteúdo em relação aos demais alunos, pois a finalidade maior da escolarização do deficiente era a reparação da deficiência. No século XVIII, segundo o autor, intensifica-se o movimento contraditório, em toda a sociedade capitalista, de participação e exclusão que se torna característico, também, da educação dos deficientes. Desta forma, a criação de instituições especializadas está relacionada com o ideal liberal de oferecer oportunidades para todos, sem que sejam desconsideradas as diferenças individuais e a necessidade de excluir os indivíduos passíveis de interferir na ordem social vigente. No século XX, a expansão da educação geral é acompanhada pela expansão da Educação Especial, sendo que, para o autor, é bastante simplista a relação entre democratização da escola e aparecimento da Educação Especial. Insiste, então, que é preciso ter clareza que as instituições de atendimento aos deficientes surgiram nos séculos XVII e XVIII, no contexto do movimento burguês pela universalização e democratização do ensino e contra os privilégios da nobreza. Portanto as instituições não surgiram com a democratização do ensino, e muito menos como uma forma de atendimento às crianças com dificuldades de aprendizagem.

Para Bueno (1993), uma das principais diferenças entre a Educação Especial e a Educação de modo geral é que a primeira se estrutura em regime de internato, acompanhando, historicamente, a necessidade de separação dos diferentes tipos de pessoas consideradas desviantes, que antes ficavam internas nos manicômios. Contrariamente, a Educação de modo geral se estrutura em regimes abertos, sem a marca da segregação.

Bueno (1993) explica:

Na realidade, a educação especial, na sociedade moderna, que na sua origem absorvia deficiências orgânicas (auditivas, visuais e posteriormente mentais), com o desenvolvimento do processo produtivo, foi incorporando a população com ‘deficiências e distúrbios’ cada vez mais próximos da normalidade determinada por uma ‘abordagem científica’ que se pretende ‘neutra e objetiva’, culminando com o envolvimento dos que não têm quaisquer evidências de desvio dessa mesma ‘normalidade média. (p. 80).

O autor relata que a história da Educação Especial no Brasil segue o mesmo curso da história na Europa e Estados Unidos, sendo que no Império são criados os institutos para cegos e surdos, na forma de asilos para inválidos, embora, nos lugares de referência, esse modelo já ser considerado ultrapassado e ceder lugar às oficinas de trabalho. A preocupação no Brasil não era o atendimento especializado às crianças deficientes, por conseguinte era mais importante acompanhar as tendências mundiais e, assim, fortalecer o sentimento nacional de caráter cosmopolita mimético dos grandes centros.

Com a Proclamação da República, a ampliação da Educação Especial acompanhou o mesmo ritmo da educação brasileira em geral. Conforme o autor enfatiza, nesse período não podem ser desconsiderados os anseios depositados na escola, a qual representava uma das poucas possibilidades de ascensão social para as classes populares. A diferenciação entre a Educação Especial e educação em geral vai sendo construída vagarosamente, por meio da ampliação do número de instituições e, fundamentalmente, pelo interesse crescente da saúde, bem como da educação, de compreender o funcionamento anormal e prestar-lhe atendimento adequado. Segundo Bueno (1993), no encontro entre saúde e educação, buscava-se, por um lado, a eugenia da raça do povo brasileiro, legitimando assim a segregação do diferente e a diferença social, ao mesmo

tempo em que a educação, com auxílio da psicologia, buscava compreender as causas do fracasso de tantos alunos com oportunidade de freqüentar uma escola. Logo, a Educação Especial se organiza, nesse momento histórico, com o respaldo da ‘neutralidade científica’ e da ‘universalização do ensino’.

A efetivação dessa perspectiva da Educação Especial se dá na estruturação de um processo de escolarização em que os conteúdos e a forma de apresentação dos mesmos precisavam ser diferenciados, pois o aluno deficiente deveria ser curado ou reabilitado, ou seja, ter sua deficiência extinta. Todo enfoque, portanto expectativa também, está no indivíduo que não corresponde ao esperado em termos de moral, de disciplina, de padrões de conduta, entre outros aspectos.

No período de 1930 e 1940, de acordo com Bueno (1993), há o aumento considerável das instituições privadas para atendimento dos deficientes mentais ou visuais, permanecendo, então, a característica filantrópica, assistencial e a ligação com alguma ordem religiosa, o que denota a compreensão da Educação Especial como caridade e não como direito do cidadão. Segundo o autor, a ampliação privada de atendimento ao deficiente, nesse período, é um processo antecipado do que aconteceria a partir de 1960 na Educação de forma geral, mantendo a justificativa de uma necessidade de educação com qualidade. Além disso, na rede pública surgem, concomitantemente, as primeiras classes especiais para deficientes mentais em escolas regulares.

Mesmo após a 2a Grande Guerra, o processo de ampliação mantém o caráter

privado, o que nos anos de 1960 e 1970 é compreendido como omissão do Estado na garantia dos direitos do cidadão, mediante a força das entidades privadas, conquistada nos anos anteriores. Esse caráter privado, segundo o autor, é o referencial para o estabelecimento dos critérios do padrão de qualidade da Educação Especial9. Para Bueno

(1993), a ampliação do atendimento ao deficiente também pode ser caracterizada pela distinção entre o atendimento oferecido à população de baixa renda, predominantemente assistencialista e caridoso, e à população com um poder aquisitivo

9 São instituições como: Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais, Federação Nacional das Sociedades

mais alto, visto como garantia de direitos, o que é compreendido como a concretização paulatina da privatização da saúde e da educação.

Nos anos de 1970, há o empenho na criação dos Serviços de Educação Especial, nas Secretarias Estaduais de Educação, de maneira a refletir o reconhecimento oficial da necessidade de um atendimento diferenciado às crianças consideradas deficientes. No mesmo período, as classes populares passam a lutar por melhores condições de vida, incluindo o acesso à escola como uma das principais preocupações; assim também o setor industrial exige melhor qualificação de seus trabalhadores. No entanto, mesmo com o aumento do número de vagas, mesmo com a ampliação do número de crianças integradas à educação especial, tais ações não foram suficientes para atender as reais necessidades da população, nem tampouco para atender a demanda, ou seja, a escola efetivamente amplia suas vagas, porém não cumpre seu princípio de escola para todos10.

Prosseguindo a discussão sobre os aspectos históricos do atendimento ao aluno com deficiência, Bueno (1997a), ao analisar a perspectiva de compreensão da função histórica da Educação Especial, propõe que essa seja abordada, desde o século XVIII, sem desconsiderar sua contradição estrutural, a saber, da mesma forma que proporciona condições de escolaridade às crianças, é também um instrumento de segregação do indivíduo deficiente.

O autor refuta a explicação denominada liberal tradicional de que a Educação Especial está atrelada ao surgimento da sociedade industrial e aos anseios de democratização da escola pública, de forma que estaria direcionada às crianças que por suas características individuais não acompanharam o ensino na classe regular. Refuta, também, a explicação de que a estruturação da Educação Especial tem como base a segregação do indivíduo deficiente, pelo fato de que suas primeiras instituições, no final do século XVIII, eram internatos que confinavam as pessoas. A ponderação feita pelo autor é que as instituições que substituíram as asilares mantiveram a marca da segregação. Por conseguinte, Bueno (1997a) propõe o reconhecimento da contradição no oferecimento de escolaridade concomitante à segregação, por meio da compreensão de

10 Em 1974, no estado de São Paulo, apenas 10,6% da população era atendida, sendo 55% atendida na rede

que a sociedade industrial moderna tem como característica básica o parâmetro da produtividade e da homogeneidade dos indivíduos.