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6 A GESTÃO DA EDUCAÇÃO NO MUNICÍPIO DE GOIANA

6.2 PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

A instituição do sistema de ensino na LDB correlaciona o planejamento e construção do plano municipal. Saviani menciona que a opção do sistema a ser adotado: “deverá ser prevista no plano educacional do município ao mesmo tempo em que determinará a forma como será detalhado o referido plano educacional” (1999, p.125). Nesse sentido, a construção do plano municipal materializa as diretrizes do planejamento e retrata a política local.

A constituição do plano de educação vai além de uma opção administrativa local, representa uma política que atende a objetivos que repercutem no desenvolvimento social. Saviani (1999) faz um relato sobre a concepção de plano em diferentes momentos históricos no Brasil. O autor discorre desde a concepção desenvolvimentista, atribuída aos anos de 1940, até a concepção estratégica dos anos de 1990, voltada para a estratégia de adequação ao financiamento de organismos internacionais. Para Saviani:

Uma proposta alternativa de “Plano de Educação” manterá, por certo, a ideia de plano como um instrumento de política educacional. Tratar- se-á, no entanto, de uma política que, visando atender efetivamente às necessidades educacionais da população como um todo, buscará introduzir a racionalidade social, isto é, o uso adequado dos recursos de modo a realizar o valor social da educação. (SAVIANI, 1999, p. 134).

O autor defende que o plano de educação é um instrumento político, que perpassa a questão de mandatos políticos, embora tenha um período de vigência. Reúne, entre outras questões, a concepção de uso racionalizado e transparência dos recursos públicos e responsabilidade fiscal. O plano concebido dessa maneira atende ao que o autor chama de “racionalidade social” e influencia também a execução da própria política.

O município de Goiana tem um plano municipal de educação, para o decênio de 2008- 2017. O Plano foi instituído pela Lei Municipal nº 2.090 de 29 de dezembro de 2008. A definição do Plano Municipal de Goiana menciona que:

É um conjunto de estratégias estabelecidas pela Secretaria de Educação, a vista de um diagnóstico das necessidades educacionais, para superar problemas e atingir objetivos, por meios e metas e recursos cientificamente definidos. As intenções e ações se entrelaçam em um programa com previsão detalhadamente quantificada e qualificada no espaço e no tempo, com avaliação e reprogramação periódicas. (GOIANA, 2008, p. 1).

A definição de Plano concebida parte de um diagnóstico de necessidades educacionais e é situado como instrumento estratégico para alcance das metas e objetivos. Os objetivos elencados no Plano são:

Elevação global do nível de escolaridade da população municipal; Melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis; redução das desigualdades sociais e de aprendizagem no acesso e no sucesso escolar; democratização da gestão de ensino público, pela participação dos profissionais da educação, na elaboração da proposta pedagógica e pela participação da Comunidade Escolar nos Conselhos Escolares. (GOIANA, 2008, p. 1).

A visão que o Plano transmite, a partir dos objetivos elencados, é que a política de educação, que é construída no âmbito local, está pautada, entre outras questões, na mudança de aspectos quantitativos, como o nível de escolaridade da população municipal e qualitativos como o fomento da gestão democrática. Sobre o âmbito de construção do Plano, o trecho da entrevista registra que:

O plano Municipal que está em vigência ele foi concebido dentro de um caráter muito democrático. Várias instituições, o professorado, os estudantes, todos os segmentos se envolveram no Plano e se a gente for fazer uma avaliação, do que a gente andou, do que a gente conseguiu com este plano, na maioria das vezes a avaliação é positiva. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-).

O espaço de participação registrado no trecho acima se refere à instituição de dois Fóruns Municipais, com objetivo de reunir vários segmentos para construção documental. De acordo com os dados do Plano Municipal, o grupo foi composto por professores, equipe técnica e comunidade escolar. A metodologia instituída foi a organização de debates com grupos temáticos, coordenados por Conselheiros do Conselho Municipal de Educação. Os grupos tinham como atividade discutir problemas educacionais e estabelecer alternativas e estratégias de enfrentamento.

A organização para a construção do Plano registra a participação da sociedade na construção. A experiência produzida pelos dois eventos é ressaltada no discurso abaixo apresentado pela Conselheira:

O fórum criado ele é um dos fatores que a gente vê como primordial por que reúne pessoas de todas as instâncias, do Conselho do FUNDEB, de Merenda, do Conselho municipal de Educação, do governo, para se reunir e debater a qualidade da educação [...] Então esse Fórum funcionou, esse Conselho funcionou, a comunidade teve participação: o pai, do aluno, estudante, representantes dos professores, de gestores, representante do Governo, de igreja, representantes da Justiça. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-).

Os Fóruns, nesse contexto, são percebidos como eventos pontuais do período de construção do Plano, sendo entendidos dentro do objetivo de organização da produção do texto do Plano. Embora a experiência tenha sido referenciada como relevante ao processo democrático, a construção desse espaço não foi consolidada posteriormente.

A estrutura do Plano Municipal de Educação de Goiana apresenta seção sobre o atendimento do nível da Educação Básica e modalidades de ensino. A organização dessa seção registra o diagnóstico, prioridades, diretrizes, objetivos e metas, para a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio e também para as modalidades, Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional, Educação à Distância, Educação Especial e Educação do Campo. Um cronograma de ações por período é apresentado, com prazos para ocorrência das ações.

O conteúdo do Plano também reúne uma seção sobre a Formação e Valorização do Magistério da Educação Básica. A valorização do magistério registrada no Plano implica objetivos da formação profissional, formação continuada, jornada de trabalho, salários e compromisso social e político.

Outra seção que compõe o Plano é a de Gestão democrática. A concepção de gestão democrática declara o compromisso de “garantir às escolas municipais, em todos os níveis a gestão democrática com eleição para diretores e vice-diretor” (GOIANA, 2008, p.111). A gestão democrática nesse contexto é referida à:

A efetivação do controle social, definindo competências especificas e a adoção de novas capacidades humanas, políticas e técnicas, tanto nos níveis centrais como nos descentralizados, tendo como objetivo o desenvolvimento de uma gestão responsável. (GOIANA, 2008, p. 112).

O compromisso de garantir a participação da comunidade nas eleições para diretores das escolas não foi efetivado e o descumprimento dessa ação inviabiliza a institucionalização de práticas democráticas locais. O depoimento abaixo evidencia essa contradição:

A gestão democrática, se reveste na forma de escolha dos diretores e da equipe gestora de cada escola. Aí já faz parte do princípio de uma democracia. E hoje aqui no nosso município, a questão é de indicação, cargos comissionados. Então é estranho você defender democracia numa situação em que a própria gestão é indicada. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-).

A ausência de eleições para as direções das escolas é evidenciada nos relatos e a divergência desse quadro é ressaltada, em relação à perspectiva de gestão democrática registrada no Plano. O entendimento é que o processo de gestão democrática mobiliza o envolvimento entre comunidade e gestor.

Em outra fala, destacamos a menção ao envolvimento que o gestor deve ter com a comunidade. Na visão da Conselheira, o conhecimento sobre a realidade de cada escola e as competências que são requeridas ao gestor, envolvem relações com a comunidade escolar, para além da demanda da organização burocrática de planos de financiamentos. O depoimento que registramos abaixo aponta essa questão:

[...] Tanto Sindicatos, como Conselhos, vem se articulando com os gestores, que não é desta gestão, mas de outras que a gente vem tentando, para que aconteça a gestão democrática de fato e de direito. Hoje os gestores são indicados pelo governo. E a gente tem grandes preocupações. Enquanto Conselheira eu vejo que os gestores, deveriam ter um conhecimento maior, por que hoje nós não temos apenas um gestor na escola para mandar ou colocar faltas. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-).

A gestão democrática, no que se refere à eleição da gestão das escolas, registrada pela Conselheira, é requerida em outras gestões e a efetivação não tem sido estabelecida. A participação da comunidade nas eleições para os gestores é prevista no artigo 188, no inciso 6º da Lei Orgânica do Município. A ausência do processo eletivo para diretor e ativação dos Conselhos escolares é também destacado no depoimento abaixo:

Existe um esforço de ativação ou de tentar que os Conselhos Escolares funcionem. Existe uma ideia, um apoio da Secretaria Municipal para que isto seja implantado. Mas isso é estranho por que gestão por gestão, isso é apoiado, isto é falado, da importância, mas os gestores das escolas não fazem. A Secretaria solicita que funcione, solicita que os Conselhos sejam implantados, mas na prática é tudo no papel. Nas boas intenções. Eu acho que aí tem uma coisa errada que a Secretaria ainda não atentou para isto. Se a gestão for realmente democrática, parte do principio de que a gestão de cada escola deveria ser escolhida pela comunidade e não apenas o Conselho seja motivador, mas que o próprio gestor dê o esforço pessoal para que isto

seja realizado. Talvez seja um principio que eles próprios não acreditam. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-).

O estabelecimento do processo eletivo para os cargos de direção das escolas, nesse sentido, é uma ação que permeia a gestão democrática, tem aparato legal e apoio de órgãos como Conselho Municipal e Sindicato dos Professores. Mas, a efetivação não foi estabelecida. A ausência do processo eletivo apontado nos relatos acima recai sobre a falha na constituição de práticas democráticas no contexto das escolas e reforça o descrédito da gestão. Dessa forma, a organização de processo eletivo é requerida, como também o fortalecimento de Conselhos escolares, para que práticas cotidianas possam fortalecer a construção da gestão democrática e de relações mais horizontais. Essa situação no relato apresentado abaixo incide sobre relações coletivas, mas também sobre outras relações individuais:

[...] imagine uma escola, onde tem seu gestor nomeado, que é cargo comissionado. E esse gestor era o pior professor da escola, um professor que não rendia. Então isso acontece muito, entendeu? Por causa de apadrinhamento político uma pessoa é designada para aquela escola, e veja que sentimento isso cria para os colegas da rede, os professores. É um sentimento de que por uma questão política você pode ter o maior cargo da escola e você não precisa render nada, você não precisa ser um bom professor para isto. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-).

No relato acima a construção de uma prática de gestão democrática incide sobre a rotina de relações construídas no âmbito da escola. Entendemos que a ausência de um sistema eletivo, interfere nas relações e nos valores que são construídos no ambiente escolar. Marques menciona que “a institucionalização de práticas democráticas na gestão escolar forma sujeitos democráticos. Supomos que estes sujeitos não serão democráticos apenas nas escolas, mais em todos os espaços sociais aos quais pertençam.” (MARQUES, 2011, p. 233). A autora ressalta a escola, como espaço de formação de valores para a transformação social.

O impasse entre o compromisso registrado no Plano a respeito de eleições para os cargos de diretor e vice-diretor compromisso este registrado na Lei Orgânica do município e a prática de escolha de diretores e vice-diretores através de indicação da gestão municipal se fortalece na ausência de práticas cotidianas que consolidam a gestão democrática.

O Plano ainda trata na última seção de seu conteúdo, do financiamento da educação. Nessa seção, ressalta-se o compromisso de implantação de políticas educacionais com objetivo de atingir a qualidade na educação realizada no município. Destacam-se, no diagnóstico, orientações da LDB sobre os recursos públicos destinados à educação, as

orientações da lei para os municípios e a definição de custos, identificação dos recursos e estratégias para aplicação diante das receitas municipais. A seção ainda registra a organização metodológica para a projeção de dados com composição de valores para os anos do decênio 2008-2017 que compreendem a execução do Plano.

Os objetivos e metas da seção de financiamento registram o estabelecimento de fundos específicos para níveis de ensino como a Educação Infantil, mobilização da comunidade para exercer fiscalização de aplicação dos recursos. Além disso, registra o objetivo de assegurar a autonomia das escolas quanto à gerencia de recursos, a criação de incentivos fiscais para adoção de programas de assistência estudantil, entre outras questões tratadas na seção.

Na elaboração do plano ressalta-se o estabelecimento dos espaços de debates para construção do documento, por outro lado, nos relatos coletados evidenciam-se críticas quanto à representação da realidade financeira exposta e ausências quanto à transparência dos recursos. Quanto às divergências apontadas em relação aos recursos, a discussão evidenciada pelos entrevistados recai sobre a viabilidade de metas e objetivos definidos no Plano. Sobre a discussão, o relato do atual Secretário de educação declara que:

A elaboração do Plano Municipal de Educação (PME) se deu fora de qualquer contexto de crescimento econômico, embora ele apresente metas que vão além da capacidade arrecadatória do Município, numa relação de dependência do apoio técnico e financeiro do Estado e da União. (REIS FILHO, 2014, não paginado).

O Plano, nesse sentido, não é entendido como um referencial de ações que visem à concretude e à descentralidade:

Sobre a elaboração, eu faço a mesma crítica que é feita no cenário nacional. O nosso plano de fato é carregado de boas intenções, só que é um documento de gaveta. De gaveta, por que não adianta só ter boas intenções, por que de onde vai vir o recurso para ser implantado determinada política. É por isto que o nosso plano agora ele vai ser reformulado, reformulado justamente para se adequar ao Plano Nacional. E ao se adequar ao Plano Nacional vai ter estabelecido metas bem claras, de onde vêm os recursos, quais são as necessidades que teremos nesses próximos anos. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-).

Nesse sentido, o Plano não atinge o cumprimento de metas e objetivos nele registrados e, por conseguinte, não se torna referencial para ações da gestão da educação. Entretanto, a implementação do Plano, que é uma orientação do Plano Nacional de Educação (PNE), não

foi conduzida para provimento dos ajustes necessários à realidade. O trecho da entrevista abaixo aponta o entendimento da Conselheira sobre o assunto:

Houveram acréscimos de várias modificações, o nosso Plano tem que acompanhar as modificações do governo federal, nós temos que seguir, e só em 2008 nós construímos um plano decenal, se ele não está contemplando as novas demandas como: não será mais obrigação do município fazer concurso para médico, para psicopedagogo, será parceria da Secretaria de Saúde com a Secretaria de Educação. Então aí é um ponto que já tem uma divergência do nosso Plano. Outro ponto é com a questão da acessibilidade, por que a gente tem que pensar acessibilidade não apenas na escola mas fora da escola. Então a gente tem um Plano que contempla essas situações mas precisam ser ampliadas. (Conselheira Municipal de Educação do Município de Goiana 2011-).

O trecho da entrevista se refere às divergências contidas no Plano em relação às demandas atuais. As divergências ocorrem, nesse entendimento, pelas orientações de políticas do governo federal e o entendimento local sobre certos temas como, por exemplo, a acessibilidade. Para além das divergências, o próprio cumprimento das metas e objetivos estabelecidos no atual Plano, não é incorporado pela gestão atual. O trecho abaixo evidencia essa afirmação:

O grande problema é transformar aquelas ações, que acho que isto não é exclusividade aqui de Goiana, é transformar aquelas ações, aquelas ideias que estão lá no Plano em realidade, em execução para que se torne realidade. (Presidente do Sindicato dos Professores do Município de Goiana 2013-).

O relato evidencia a desconexão entre o que é documentado em um plano de educação e a materialização do planejamento. Sobre as dificuldades de planejar e materializar o que é planejado a discussão no Plano Nacional relaciona a dificuldade “a complexidade do modelo federativo brasileiro, as lacunas de regulamentação das normas de cooperação e a visão patrimonialista que ainda existe em muitos setores da gestão pública” (BRASIL, 2014, p. 5). O entendimento é que deve haver um esforço contínuo para que as desigualdades estabelecidas historicamente sejam eliminadas. Dessa forma, a construção de um Plano perpassa o período de mandatos políticos e o desafio, nesse caso, é consolidá-lo como política de estado. Consideramos que o Plano que resulta da construção do planejamento municipal de educação para o decênio de 2008-2017 é instrumento político que não é incorporado como uma política de Estado e por isso, permeado por descontinuidades.

Nas entrevistas é enfatizado impasses entre o que está registrado no Plano Municipal de Educação e a prática política da gestão da educação. Este quadro é indicativo, de acordo com os relatos, que falta atualização do documento e, portanto, tornou-se desconexo para as ações da política de educação. O contexto de mudanças também favorece a necessidade de atualização e formalização de ações da política local direcionadas a demandas estabelecidas e do contexto mais recente do município.

6.3 REGIME DE COLABORAÇÃO E OUTRAS FORMAS DE ARTICULAÇÃO E