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4.6 ÁGUA DOCE: INDICADORES SECUNDÁRIOS 176 

4.6.1 Pobreza e saúde 176 

O Distrito Federal apresentou, em 2009, o maior rendimento médio mensal do Brasil. Conforme encontrado em IBGE (2010c), enquanto a rendimento médio mensal real brasileiro do trabalho das pessoas, de 10 anos ou mais de idade, foi de R$ 1.106,00, o distrital atingiu R$ 2.239,00, cerca de duas vezes maior. Contudo, a Capital também foi marcada pela desigualdade na distribuição da riqueza. Dentre as 27 unidades da federação, foi o DF aquela que apresentou o pior índice de Gini, que é uma medida do grau de concentração de uma distribuição e cujo valor varia de zero (perfeita igualdade) até um

(desigualdade máxima). Enquanto o valor do Gini nacional foi, em 2009, de 0,524, o índice brasiliense alcançou 0,607 (IBGE, 2010c). A concentração de riqueza poderia contribuir para o surgimento ou agravamento de diferenças no acesso a bens e serviços essenciais para garantia e melhoria da saúde humana.

A ONU (2007) considerou a existência de um vínculo entre os temas Pobreza e Saúde e o tema Água doce. O vínculo fora estabelecido pelo reconhecimento de três indicadores comuns a ambos os temas: proporção da população utilizando uma facilidade melhorada de saneamento, proporção da população utilizando uma fonte melhorada de água e proporção da população morando em condições precárias. Os entrevistados expressaram ter como crença que a proporção da população utilizando uma facilidade melhorada de saneamento era alta no Distrito Federal. Segundo a ONU (2007), esse indicador, relacionado ao subtema Saneamento, mensurava o percentual de pessoas com acesso a uma facilidade sanitária melhorada para disposição de excrementos humanos, na própria moradia ou na vizinhança imediata. O conceito de facilidade melhorada considerado era amplo, variando desde simples latrinas até toaletes ligados a sistemas de coleta de esgotos.

Sendo considerado um serviço essencial básico, a disponibilidade de saneamento adequado apontava para a redução da pobreza e para a proteção da saúde, uma vez que minimizava o risco e a freqüência de contaminação por doenças de veiculação fecal. Todos os entrevistados manifestaram ter como crença que a proporção era alta e independente tanto do poder aquisitivo, quanto da localização rural ou urbana da moradia. Dessa forma, não foi possível inferir sobre evidências de desigualdades regionais ou sociais a partir das crenças. A visão de futuro dos entrevistados era de a conservação ou mesmo de aumento da proporção. Conforme expôs um dos entrevistados, representante do Poder Público, a falta de acesso a um recurso sanitário adequado, certamente, existia em alguns lugares do Brasil, mas seguramente nunca existiu por longo tempo ou atingiu parte considerável da população. Para o entrevistado, nunca existirá tal realidade em Brasília, que era um pólo de riqueza cuja sociedade não aceitaria essa situação social. Mesmo aqueles moradores de “bolsões de miséria”, ainda existentes no DF, tinham acesso a serviços de latrinas e sanitários ligados à rede coletora ou a fossas sanitárias, sépticas ou negras. Os entrevistados não identificaram, ou não reconheceram como significante, o impacto da alta proporção sobre o meio ambiente ou sobre aspectos econômicos. O impacto, identificado a partir das entrevistas, foi unicamente o social, pela condição digna de vida e pela minimização do risco de contração de doenças.

A crença expressa pelos entrevistados na alta proporção era mais próxima da realidade distrital urbana do que da totalidade das áreas distritais, conforme estimativas obtidas a partir de pesquisas amostrais de campo realizadas em 2007 e em 2009. Os dados de 2007, disponíveis em IBGE (2010b), apontaram que 99,8% dos domicílios particulares urbanos estavam ligados a uma rede coletora que conduzia águas servidas e dejetos a um sistema de coleta, inclusive fossa séptica. Conforme encontrado em IBGE (2010d), o percentual do total de domicílios particulares permanentes com serviço de rede coletora de esgotamento, ligada ou a não a fossas sépticas, era de 88,9%, cerca de 30 pontos percentuais mais elevado do que o equivalente nacional. Nas regiões urbana e rural, no entanto, restariam quase 87 mil domicílios nos quais eram utilizados modos rudimentares para a disposição de dejetos, tais como fossas negras, buracos, valas, rios ou lagos.

A totalidade dos entrevistados apresentou ter como crença que a proporção da população utilizando uma fonte melhorada de água, na moradia ou a uma distância conveniente era alta. Conforme descrito em ONU (2007), as fontes melhoradas incluíam água engarrafada, água da chuva, poços e cisternas protegidos, fontes públicas e canalizações conectadas às moradias. O indicador apontava para a importância de cobertura de um serviço fundamental para a redução de riscos associados a doenças de origem hídrica. Os entrevistados mostraram ter como visão de futuro que a alta proporção seria mantida. De fato, a tendência era, para os entrevistados, de avanço da cobertura, com a melhoria da disponibilidade, ampliação do acesso e da qualidade da água ofertada ao universo da população, sem distinção de natureza econômica ou geográfica. Os entrevistados não manifestaram a crença de que alta proporção fosse um fator positivo para a economia ou para o meio ambiente. De outra forma, foi identificado o impacto social, com o acesso à água sendo considerado como um direito de todos.

As entrevistas mostraram a crença em uma proporção alta e independente de fatores econômicos, tanto em regiões urbanas quanto rurais. Os entrevistados apontaram que mesmo nas regiões de baixa renda o acesso a fontes de água melhoradas era adequado. A adequação seria garantida pelo provimento de água potável pela CAESB ou pela captação em poços e cisternas construídos e mantidos de modo a evitar a contaminação por fossas, águas pluviais ou lixo.

As crenças expressas pelos entrevistados eram condizentes com a realidade encontrada em pesquisas amostrais domiciliares, conduzidas nos anos de 2007 e de 2009. O percentual de domicílios particulares permanentes urbanos dotados de serviço de abastecimento de água por rede geral, com ou sem canalização interna, era, em 2007, de 96,1%. Os 27 mil domicílios restantes eram abastecidos, dentre outras formas, por

captações em poços, nascentes e caminhões-pipa. Em 2009, 95,3% dos domicílios particulares permanentes urbanos e rurais foram atendidos por uma rede geral de distribuição de água. O atendimento no DF era, dessa forma, cerca de onze pontos percentuais maior do que o valor nacional equivalente (IBGE, 2010b; IBGE, 2010d).

A proporção da população urbana morando em condições precárias na Capital Federal foi julgada como baixa ou considerável pelos entrevistados. A ONU (2007) definiu como condição precária a falta de uma ou mais destas cinco características na moradia: uso de facilidade melhorada de saneamento, uso de fonte melhorada de água, área suficiente, mas não superlotada, qualidade estrutural e segurança de posse.

A proporção da população habitando de modo precário apontava para uma falta de adequação de abrigo como fator de deterioração de condições de vida. Para a ONU (2007), a falta de saneamento ou de água adequadas, a superlotação, a qualidade da habitação ou a posse inapropriada eram manifestações de pobreza e apontavam para a severidade de condições inadequadas de moradia. Tais características habitacionais privavam os residentes de direitos humanos básicos, estavam associadas a riscos para a saúde e podiam ser fontes impeditivas de desenvolvimento. Os entrevistados não consideraram como importante para avaliação da precariedade de moradia nem o saneamento, nem a fonte de água e nem a superlotação. No entanto, os entrevistados reconheceram a existência, em pontos isolados do Distrito Federal, de moradias com problemas estruturais, mas condizentes com as rendas domiciliares e adequadas a partir da perspectiva da qualidade construtiva. A superlotação foi considerada como raramente encontrada na Capital, tanto em áreas urbanas quanto rurais. Dentre as cinco características elencadas pela ONU (2007), as entrevistas apontaram a insegurança da posse como aquela mais preocupante e degradante da qualidade de vida. O impacto da falta de segurança habitacional foi considerado pelos entrevistados como social, não tendo implicações ambientais ou econômicas. Conforme citou um dos entrevistados, o Distrito Federal se caracterizara, em especial a partir da década de 1990, pela presença de condomínios irregulares ou ilegais, escolhidos como opção de moradia tanto por pessoas de alta, quanto de média e de baixa renda. A irregularidade estava, muitas vezes, definida desde antes mesmo da construção da moradia, pois eram inexistentes ou imprecisos os documentos que comprovavam quem era o proprietário de direito da terra. A visão de futuro era de continuidade dessa situação. Alguns entrevistados lembraram que existia sempre um clima de insegurança nos condomínios e que havia já ocorrido a derrubada de moradias, erguidas em áreas públicas ou de preservação ambiental.

Quanto à precariedade de moradia, as crenças expressas pelos entrevistados estavam próximas da realidade estimada com base em pesquisas amostrais domiciliares realizadas em 2001 e 2004. Os conceitos de superlotação, qualidade estrutural e segurança de posse não foram, de modo claro, definidos pela ONU (2007). Assim, para os objetivos do presente trabalho, foi considerada como superlotada aquela residência cuja densidade de residentes por dormitório fosse superior a quatro, como tendo qualidade estrutural inadequada para moradia permanente ou temporária as residências tipo “barraco” e como posse insegura aquela relativa a moradias erguidas em terrenos sem escritura imobiliária lavrada em cartório. Segundo os dados disponíveis em IBGE (2010d), cerca de 3,6% dos domicílios distritais poderiam ser considerados como superlotados em 2001, último ano para o qual o dado de número de residentes por dormitório estava disponível. Para a CODEPLAN (2004), perto de 3,5% dos cerca de 563 mil domicílios permanentes, em construção ou improvisados, encontrados na Capital Federal no ano de 2004, eram do tipo “barraco”. Segunda a mesma fonte, mesmo ano, um total aproximado de 43 mil domicílios particulares ocupados haviam sido erguidos em terrenos próprios não legalizados e para os quais a documentação, quando existente, não garantia o direito a posse.