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4.5 ÁGUA DOCE: INDICADORES PRIMÁRIOS 169 

4.5.2 Qualidade da água 172 

A ONU (2007) definiu três indicadores para o subtema Qualidade da água: a presença de coliformes na água potável, a demanda bioquímica de oxigênio (DBO) nos cursos de água e a proporção dos esgotos tratados. A presença de coliformes na água potável poderia ser indicadora de contaminação fecal e da presença de organismos patogênicos. A ONU (2007) definiu o indicador como a proporção da oferta de água potável contendo concentrações de coliformes fecais que excediam níveis recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O indicador avaliava a qualidade microbiana e possíveis contaminações, por excrementos de origem humana ou animal, da água disponível para as necessidades básicas das famílias, como beber e cozinhar. A presença de coliformes poderia possibilitar o surgimento de doenças como a diarréia, que era uma das causas principais de morbidade e mortalidade entre crianças de países em desenvolvimento. Episódios freqüentes de diarréia, mesmo sem conseqüências fatais, interrompiam o desenvolvimento e a educação infantis, trazendo também conseqüências negativas para o desenvolvimento sustentável.

Os entrevistados expressaram ter como crença que a proporção da água potável distribuída no Distrito Federal contendo concentrações significativas de coliformes fecais era baixa. Em Brasília, a CAESB era a única companhia responsável pela distribuição de água potável e, assim, não existiam, para os entrevistados, diferenças regionais. A visão de futuro expressa nas entrevistas era de continuidade da oferta de água potável com baixas concentrações de coliformes. O impacto identificado nas entrevistas foi de caráter social, com garantia de qualidade de vida pela minimização de riscos para a saúde a partir do

consumo de água. Para um dos entrevistados, representante dos usuários, a proporção sempre foi muito baixa e iria continuar assim em todo o DF, pois a sociedade brasiliense era bem informada, tinha alto poder aquisitivo e não aceitaria um retrocesso na qualidade de vida causada por uma redução de qualidade na água distribuída. Em algumas comunidades, não atendidas pelos serviços da CAESB, a água potável era captada em poços e cisternas. Mesmo nesse caso, em função de trabalhos de fiscalização por órgãos de governos, não havia sido historicamente coletada uma quantidade significativa de amostras de água contaminadas por coliformes.

A crença na baixa proporção da água potável com concentrações significativas de coliformes encontrava respaldo em análises realizadas mensalmente pela CAESB. Segundo encontrado em CAESB (2009), no ano de 2008, 98,3% do total de 12.233 amostras analisadas estavam em conformidade com os parâmetros demandados por Portaria do Ministério da Saúde, cujas exigências eram similares àquelas da OMS. Segundo estabelecido na Portaria, a água potável para consumo humano deveria, para o caso de sistemas em que se analisassem 40 ou mais amostras por mês, apresentar o padrão microbiológico mínimo correspondente à ausência de coliformes totais em 95% das amostras examinadas no mês (MS, 2004). Em 2008, a ausência foi verificada, em cada mês, no mínimo, em 96,9% das amostras submetidas a exames e coletadas em pontos existentes em todos os sete sistemas produtores de água tratada, tais como o Torto-Santa Maria e o Descoberto (CAESB, 2009).

As mensurações de DBO poderiam ser aplicadas para avaliar contaminações por matéria orgânica nos cursos de água. Para a ONU (2007), a DBO era uma medida da quantidade de oxigênio requerido para a decomposição microbiológica por oxidação do material orgânico presente em uma amostra de água. O uso do indicador tinha como objetivo avaliar a qualidade de água disponível para necessidades básicas humanas básicas, para fins comerciais ou industriais e para a saúde dos ecossistemas. A presença de altos valores de DBO era um indicativo de contaminação fecal ou por carbono particulado ou dissolvido provenientes de fontes humanas ou não. Concentrações elevadas de DBO nas águas destinadas ao consumo humano poderiam levar à redução da capacidade de trabalho de indivíduos adultos e afetar o crescimento e educação das crianças. A constatação de altos valores em rios e lagos era uma ameaça a vários organismos aquáticos, incluindo peixes.

Para os entrevistados, os valores de DBO eram baixos nos principais rios e lagos existentes na Capital Federal. A remoção de matéria orgânica era muito eficiente nas estações de tratamento de esgoto além do que, os rios distritais eram de corredeira, facilitando a oxigenação da água, a oxidação da matéria orgânica e a diminuição da DBO. A visão futura descrita nas entrevistas era de manutenção do quadro de baixa DBO ou até mesmo de uma redução, em função de melhorias no desempenho das estações de tratamento de efluentes. Contudo, um dos entrevistados, representante dos usuários, citou que a situação de baixa DBO, encontrada a partir de meados da década de 1990, não existira desde sempre no Distrito Federal. O entrevistado lembrou que, em fins dos anos 1970, como resultado de lançamentos de efluentes não tratados de modo adequado, ocorrera eutrofização e elevação dos níveis de DBO no Lago Paranoá. A situação era, então, de alta mortalidade de peixes, trazendo um problema social, pelo abandono do uso recreativo do lago, e ambiental, com redução do estoque de várias espécies da fauna, em especial as piscícolas. O problema foi enfrentado a partir do início da década de 1980 e superado na segunda metade dos anos 1990. Outro caso citado pelo entrevistado foi o do ribeirão Melchior, que atravessava áreas urbanas densamente habitadas, como as RA de Taguatinga e de Ceilândia. O tratamento de esgotos utilizado não era adequado à pequena vazão do ribeirão, o que levou a um aumento da DBO e a um comprometimento da sobrevivência de ecossistemas aquáticos. O entrevistado lembrou que o Melchior era um afluente do rio Corumbá, que formava, já no estado de Goiás, o Lago de Corumbá IV, considerado como uma futura fonte de captação de água bruta para potabilização e distribuição no DF. Assim, os esforços de despoluição do Melchior, realizados entre meados das décadas de 1990 e 2000, tiveram razões sociais, pela melhoria dos padrões de vida dos moradores ribeirinhos, econômica, por minimizar custos das futuras ações para tratamento de água, e ambiental, possibilitando o restabelecimento de ecossistemas e a volta de espécies da fauna e flora aquáticas que haviam praticamente sido extintas no ribeirão.

As crenças descritas nas entrevistas eram coerentes com estimativas feitas a partir de dados coletados em vários cursos de água do Distrito Federal. Conforme encontrado em GOLDER-FAHMA (2006), entre janeiro e julho de 2004, a DBO do Lago Descoberto alcançou o valor médio de 1,5 mg/l de oxigênio. De forma similar, o ribeirão do Torto, afluente do Lago Paranoá, entre 1991 e 2004, apresentou um valor médio de DBO igual a 2,0 mg/l. Esses valores médios estavam abaixo do estabelecido pela Resolução no 357 do

Conselho Nacional do Meio ambiente, de 17 de março de 2005, na qual haviam sido estabelecidos padrões para enquadramento de corpos de água e para lançamento de efluentes. Segundo estabelecido na Resolução, as águas doces destinadas, dentre outros

usos, ao abastecimento humano após tratamento simplificado, deveriam ter como condição de qualidade um valor de DBO inferior a 5,0 mg/l (CONAMA, 2005).

A proporção dos esgotos tratados para a redução do conteúdo de matéria orgânica e de outros agentes poluentes indicava o grau de severidade de uma ameaça ao bem-estar social e de ecossistemas. Segundo encontrado em ONU (2007), o indicador fora definido como a proporção dos efluentes domésticos e industriais tratados, com o objetivo de reduzir poluentes antes de lançamento no meio ambiente aquático. O IDS era aplicável na avaliação do nível potencial de poluição a partir de fontes pontuais domésticas. O IDS ajudava a identificar aquelas comunidades onde eram requeridas ações para tratamento de esgotos e a monitorar o progresso na direção de uma gestão integrada de recursos hídricos. Esgotos não tratados, ou insuficientemente tratados, podiam resultar em aumento no nível de nutrientes e de substâncias perigosas nos cursos de água, ameaçando a saúde humana e de ecossistemas.

Os entrevistados manifestaram ter como crença que a proporção dos esgotos tratados no Distrito Federal era alta e que não existiam diferenças regionais na proporção de coleta ou de tratamento. Em lugares específicos, tais como em alguns condomínios não regularizados, não havia ainda sido implantada a coleta e tão pouco o tratamento de forma coletiva, sendo comum o uso de fossas sépticas. A proporção trazia impactos sociais e ambientais positivos. A visão de futuro apresentada era a de um aumento na proporção, com ampliação da malha de coleta e melhoria do desempenho das estações de tratamento de efluentes. Conforme apresentou um dos entrevistados, representante dos usuários, a proporção era alta porque a fragilidade dos recursos hídricos distritais assim exigia. O lago Paranoá, por exemplo, entre as décadas de 1960 e 1980, recebeu importantes volumes de esgotos não tratados, causando um grave problema de eutrofização e a restrição do uso com fins de recreação e lazer. O problema foi resolvido mediante investimentos nas estações de tratamento e pelo combate às ligações clandestinas. A baixa vazão, em especial nos períodos de estiagem, não permitia que os cursos de água superficiais do Distrito Federal fossem utilizados de modo satisfatório na diluição de esgotos não tratados.

A crença expressa de que era alta a proporção do tratamento estava em sintonia com dados apresentados pela CAESB. Em 2008, 93,71% da população residente fora atendida com serviços de coleta. O volume total coletado, que alcançou 9,174 milhões de m3, foi

tratado em 17 estações, dotadas de equipamentos para um tratamento no mínimo secundário. Nas duas estações que lançavam efluentes no lago Paranoá, os esgotos eram tratados em nível terciário, para remoção de fósforo e nitrogênio, com o objetivo de minimizar a ocorrência de episódios de eutrofização (CAESB, 2008b).

No tema Água doce foram agregados pela ONU (2007) cinco indicadores primários que, quando analisados em conjunto, permitem obter uma visão sobre a sustentabilidade dos recursos hídricos ainda que restrita a questões vinculadas diretamente à água. O Quadro 4 traz uma síntese de crenças sobre dos valores dos indicadores, segundo expresso por responsáveis pela gestão da política da água no Distrito Federal. No Quadro são apresentadas, ainda, a visão de futuro para o valor de cada um dos indicadores, a existência de diferenças regionais, as dimensões impactadas da sustentabilidade e a coerência entre valores das crenças e medidas obtidas a partir de dados coletados.

Indicador / Tema Crença Futuro Dif. regionais Dimensão Coerência

Quantidade de água

• Proporção utilizada dos recursos hídricos totais

Alta Aumento Sim Social e

econômica Sim

• Intensidade de uso da água por atividade econômica

Baixa Continuidade Sim Econômica Sim

Qualidade da água

• Presença de coliformes na água potável

Baixa Continuidade Não Social Sim

• Demanda bioquímica de oxigênio (DBO) nos cursos de água

Baixa Continuidade Não Social e

ambiental

Sim

• Proporção dos esgotos tratados Alta Aumento Não Social e

ambiental Sim

Quadro 4 - Síntese das crenças quanto aos indicadores primários Fonte: Dados compilados pelo autor.