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2 FUNDAMENTOS DA PERCEPÇÃO SOCIAL SOBRE O REÚSO DE ÁGUA

2.4 REÚSO E GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS

2.4.1 Políticas Públicas

Várias são as abordagens teóricas que tentam qualificar as políticas públicas. Do institucionalismo, à teoria das elites e dos grupos de interesse aos modelos “input-output” e teoria dos sistemas. Cada uma dessas abordagens dirige a atenção para aspectos particulares, a depender de qual natureza da política que está sendo objeto de estudo. Dye (1992) destaca a relação entre políticas públicas e governo, uma vez que são as instituições governamentais que implementam e legitimam essas políticas. Thomas Dye no clássico Understanding Public Policy define a política pública da seguinte forma: “Política pública é tudo aquilo que os governos escolhem fazer ou não fazer” (DYE, 1992, p. 2). O referido autor considera política pública como uma decisão de governo, que inclui desde questões triviais às mais complexas, definindo a alocação de esforços e recursos. As políticas públicas envolvem não somente a decisão de elaboração legal, mas os atos subsequentes relacionados à implementação, interpretação e cumprimento da lei

A política pública é o estado em ação. Essa ação torna-se imperativa quando uma questão converte-se em problema. Um problema é considerado público quando um grupo significativo de pessoas considera que o mesmo deve ser objeto de atenção especial por parte do governo, passando a se construir em objeto de intervenção. Deste modo, a constituição de um problema é de fundamental importância para desencadear a ação do ente público. Eventos, crises e indicadores costumam qualificar e quantificar tais problemas podendo os mesmos passarem a fazer parte da agenda política – podendo se converter em política pública. (KINGDON, 2003 apud CAPELLA, 2008). Desta forma, as políticas tornam-se reais e traduzem-se em realizações governamentais. Entender esse processo é fundamental para compreender a forma como questões como o uso racional da água e o reúso são abordadas pelo governo e pela sociedade.

Autores como Bernardo (2001), apresentam uma outra visão, distinguindo políticas públicas de políticas de governo. As primeiras teriam caráter mais amplo que as segundas, tendo os atores não governamentais um papel além do de demandantes, escolhendo, formulando e implementando políticas que seriam sistematizadas nas instâncias governamentais. Neste caso, percebe-se a participação de organizações da sociedade, empresas, associações, etc. como atores da implementação de políticas.

Anderson (1983) acrescenta que política pública é um processo ou constitui um padrão de atividade e não uma simples decisão, constituindo-se em uma série de decisões direcionadas a atingir uma meta. Souza (2002) define política publica da mesma forma, sendo a mesma qualificada como “um processo em que o governo é posto em ação” (p.6), resultando em planos, programas e sistemas, dentre outros. A referida autora apresenta ainda a política pública como sendo um ciclo deliberativo composto de diversos estágios: definição de agenda, definição de alternativas, avaliação de opções, seleção de opções, implementação e avaliação.

Considerando-se política pública como uma unidade de análise, pode-se entendê-la como uma variável dependente e as forças ligadas ao poder como variáveis independentes (Faria, 2003). Desta forma, pode-se analisar a influência das forças socioeconômicas sobre as políticas e os resultados dessas políticas na sociedade, em termos da resolução de conflitos.

Desde o fim do regime militar, o Brasil tem passado por profundas reformulações na gestão de políticas públicas, passando de um estado extremamente centralizador ao retorno ao Estado federativo (ARRETCHE, 1996). O governo Fernando Henrique Cardoso buscou a descentralização da alocação de serviços, com o objetivo de abrir espaço para o setor privado. Segundo a avaliação desse governo, para o qual a descentralização geraria agilidade:

Políticas tarifárias voltadas a satisfazer o eleitorado, renegociação sistemática das dívidas com o governo federal, empreguismo e uma burocracia ativa na defesa de seus próprios interesses eram o resultado do modelo anterior (ARRETCHE, 2002, p.33).

A reforma proposta deveria atingir também as empresas de saneamento, bastante endividadas na sua maioria. Para tal, seria necessário atrair capital privado, terceirizando a prestação de serviços. Apesar da tentativa de diversos estados em fazer a privatização das suas empresas de saneamento, esta reforma não se concretizou devido a questões políticas e institucionais que inviabilizavam o processo (ARRETCHE, 2002).

Do ponto de vista do regional, cabe destacar o contínuo crescimento da disparidade no nosso país e o desafio de construção de políticas de desenvolvimento para o Semiárido. Nesse contexto, vale ressaltar que políticas formuladas para atender as demandas do Sul-Sudeste desenvolvido não são adequadas ao Nordeste Semiárido. A dificuldade em definir padrões comuns para todos no país leva à formulação de leis e políticas inadequadas que tendem a ter pouco impacto ou não atende as demandas de regiões com problemas muito específicos como o Semiárido (MOLINAS, 1996).

As oscilações das políticas públicas brasileiras, ao longo das últimas décadas, entre um posicionamento estatizante e liberal tem tido forte impacto sobre o desenvolvimento da Região Semiárida. Até a fundação do Banco do Nordeste do Brasil – BNB (em 1952), as ações governamentais se limitavam a obras de infraestrutura e ações emergenciais assistencialistas. Apesar da maior regularidade das ondas de desenvolvimento, persiste na região a escassez de diretrizes e ações no sentido de melhorar a convivência do homem com a seca. Desta forma, tem

persistido a visão da região como economicamente inviável. Os problemas relacionados à pobreza são mais agudos nas áreas rurais onde a falta de saneamento e a escassez de água tornam ainda mais precárias as condições de reprodução da vida. (ROCHA E BURSZTYN, 2008).

A falta de saneamento tem impacto sobre o acesso à educação, uma vez que os estudantes ficam doentes e deixam de frequentar a escola, e à produtividade econômica, além de ser uma afronta à dignidade humana, que impacta sobremaneira os pobres. Não apenas por serem eles os que mais sofrem pela falta de saneamento, mas frequentemente os esgotos são lançados em rios utilizados pelos pobres como fonte de água de beber, além de serem forçados a viver em áreas degradadas por disposição de lixo. Soluções inadequadas de saneamento têm mantido a desigualdade nas sociedades (IANWGE-UN, 2005).

Sistemas tradicionais de tratamento de esgotos envolvem grandes custos financeiros de construção e operação, consomem energia e produtos químicos, exigem manutenção e consomem muita água, de forma a evitar impactos negativos à saúde pública e ao meio ambiente. A sustentabilidade de sistemas de esgotos convencionais, comumente adotados no mundo desenvolvido, pode ser questionada pela demanda de grande quantidade de energia e pelo grande desperdício de água limpa. Na medida em que crescem as populações dos países em desenvolvimentos, melhoram-se os padrões de vida e crescem os impactos ao meio ambiente. O desenvolvimento de tecnologias sustentáveis em tratamento de efluentes é cada dia mais premente (EVANS, 2004).

2.5 INSTRUMENTOS LEGAIS E ARRANJOS INSTITUCIONAIS DO REÚSO NO