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CAPÍTULO 2: A Psicologia nos Escritos Latinos de Wolff

2.2 Psychologia Empirica

2.2.1 Prefácio e Prolegômenos

A PE, assim como os demais escritos latinos de Wolff, contém uma dupla introdução, feita parte em seu prefácio, parte em seus prolegômenos. Ambos tratam efetivamente dos mesmos assuntos, mas enquanto no prefácio Wolff adota um estilo mais livre e ensaístico, os prolegômenos são já parte da cadeia demonstrativa do tratado, e neste caso ocupam os seus dez primeiros parágrafos. A seguir acompanharemos estes, e apontaremos em notas os eventuais acréscimos do prefácio à introdução geral.

Wolff inicia os Prolegômenos da Psicologia Empírica com duas noções já visitadas em seu DP (DP, §§.111-112): a definição dessa disciplina, “a ciência de estabelecer princípios através da experiência pelos quais é dada a razão das coisas que ocorrem na alma humana” (Wolff, 1738/1968, p. 1, §.1), e a razão de sua distinção em relação à psicologia racional, que é, por um lado, a certeza e importância que têm os seus princípios para a filosofia prática e teologia e, por outro, a novidade e o caráter controverso de alguns conteúdos da psicologia racional (PE, §.1)52.

Em seguida, Wolff dá as linhas gerais do seu método. Primeiramente, ele afirma que “aquilo que diz respeito à Psicologia empírica é conhecido a partir da atenção

àqueles fatos que se fazem conscientes para nós na nossa alma” (Wolff, 1738/1968, p.

2, §.2 – ênfase no original). Com essa afirmação, Wolff pretende estabelecer como se chega ao conhecimento das coisas que são ensinadas na psicologia empírica, além de esclarecer como se pode entender corretamente e examinar aquilo que é fornecido por

52 No prefácio à PE, após reforçar a prova dada pela história do conhecimento de que novas doutrinas

sempre são recebidas com resistência, Wolff sugere que aqueles que não possuem engenho suficiente para entender a psicologia racional, podem deixá-la de lado e avançar diretamente para a filosofia prática, estando certos de que progridem tanto quanto aqueles que se dedicaram a conhecer sua alma a priori.

ela. Dessa maneira, continua, aquele que quer descobrir noções psicológicas deve eliciar por si muitas operações da alma, e estar em condição de ter muitas experiências. A partir do que se dá na alma, então, deduz-se o que pode ocorrer nela, e isto leva, por sua vez, a noções determinadas. Da atividade de experimentar em si o que a psicologia fornece, portanto, provêm a certeza das verdades e o entendimento das palavras correspondentes às noções (§.2)53. Por outro lado, complementa Wolff, deve-se igualmente ser forte no hábito de levar aquilo que se experimenta a definições acuradas e proposições determinadas, porque a experiência ensina tão somente fatos singulares, mas em filosofia estes se explicam por definições e proposições. A falta desse hábito, conclui, está por trás do pouco avanço em psicologia até o seu tempo (§.3)54.

Entendidas as linhas gerais do método da psicologia empírica, Wolff esclarece sua relação com outras disciplinas filosóficas. Em primeiro lugar, diz, ela fornece princípios para a psicologia racional, na medida em estabelece princípios pelos quais pode ser dada a razão do que ocorre na alma, o que, por sua vez, constitui o papel da psicologia racional (§.4). Por outro lado, segue Wolff, na medida em que a psicologia racional devolve com juros o que pede emprestado à empírica, e leva o conhecimento psicológico, a partir do conhecimento a priori da alma, aonde pela pura experiência quase não se poderia ir, a psicologia empírica serve também para examinar e confirmar aquilo que é extraído a priori sobre a alma humana, de maneira que a certeza disto é estimada a partir de sua concordância com a experiência, ou ao menos com aquilo que pode ser corretamente derivado dela. Aqui, repara Wolff, o psicólogo imita o astrônomo, que a partir de observações extrai teorias, e tais teorias comprova novamente por observações, além de deduzir, pela influência da teoria na observação, aquilo que de outra maneira não alcançaria. Por isso, enfatiza, “Decide otimamente, portanto, quem conjuga constantemente o estudo da psicologia racional com a empírica, apesar de que nossa decisão tenha sido separar aquela desta.” (Wolff, 1738/1968, p. 5, §.5).

53 Richards (1980) identifica a adoção por Wolff do método introspectivo como método principal da

psicologia, e nisto parte significativa do legado deixado por ele para o desenvolvimento da psicologia empírica. Apesar de podermos concordar parcialmente com esta colocação, desejamos alertar que a discussão da adoção de um método introspectivo por Wolff deve contemplar muitos outros elementos, a começar pelo fato de que o próprio Wolff não utilizou o termo “introspecção” para definir seu método, nem sustentou nele o critério de identidade de sua psicologia empírica.

54 No prefácio à PE, Wolff acrescenta que tudo ali é tratado de forma que uma verdade sempre segue de

uma anterior, e pode por ela ser provada. Isto resulta em uma exposição das faculdades da alma condizente com a ordem em que ocorrem suas mudanças. Por isso, explica, as faculdades cognitivas são tratadas antes das volitivas, e as inferiores antes das superiores.

Por fim, Wolff refere-se às demais relações da psicologia. Na medida em que fornece princípios a respeito da faculdade apetitiva da alma, diz, ela fornece princípios também para o direito natural (§.6) e para a filosofia prática (§.8), nos quais a noção de bem e mal das ações é indispensável. Ela fornece princípios igualmente para a lógica, na medida em que ensina muito a respeito da faculdade cognitiva da alma (§.9). Como elabora ainda, em geral, as noções das faculdades da alma, e encontra princípios que se aplicam a qualquer ser espiritual, ela serve também à teologia natural, que toma daí elementos para construir o conhecimento sobre Deus (§.7). Ela auxilia, finalmente, outras áreas que Wolff decide não comentar aqui55, remarcando apenas que este conhecimento não é impossível em função da imaterialidade da alma e, ademais, fornece à mente um grande prazer, e ao homem um senso de felicidade (§.10).