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A Discussão do Novo Modelo de Avaliação de Desempenho Docente na Esfera Pública (2007-2009)

Capítulo 1: Opções Metodológicas

1.4 Procedimentos Metodológicos

Na análise que nos propusemos fazer tomamos em consideração quatro grandes dimensões tendo em conta o modelo de análise proposto: Os Agentes, os Temas e as Vozes e por fim, o Tempo.

1.4.1 Caracterização dos Agentes e o seu Grau de Envolvimento

Com vista à análise da natureza da argumentação desenvolvida é necessário possuir um conhecimento não só da situação da enunciação mas também da representação prévia do autor. É necessário conhecer o capital simbólico que está associado ao OM. Investigar sobre a imagem pública da personalidade que fala, a ou as imagens que dele circulam, se se trata de uma personalidade política, mediática ou especialista do campo académico, leva ao conhecimento do respectivo ethos prévio. Este é usualmente construído sobre planos estreitamente imbricados, dando credibilidade aos olhos da opinião pública e contribuindo decisivamente para o carácter persuasivo da argumentação. Tal como afirma Perelman (2008, p. 426) “o enunciado não é o mesmo quando é emanado de um autor ou de outro, ele muda de significado; não há uma simples transferência de valores mas uma reinterpretação num novo contexto fornecido pelo que temos presumido do autor”. O percurso profissional, as afinidades político-partidárias, o capital social, político, cultural e económico de cada OM confere-lhe legitimidade e dá força à sua palavra. Estes elementos são fundamentais para compreender o seu interesse no tema em estudo e para descodificar os princípios legitimadores presentes no respectivo discurso. Sempre que nos foi possível, tivemos em consideração o “lugar” ou a “posição” onde falava o OM, isto é, se se apresentava como político, investigador, professor universitário ou professor do ensino superior, professor do ensino básico e secundário, advogado, administrador ou economista.

O perfil aqui identificado permitiu constituir grupos por categoria profissional (institucional na medida do possível) e analisar os interesses subjacentes ao discurso produzido e o tom em que foi emitido.

1.4.2 As Fichas Temáticas, os Agentes e as Agendas

Efectuámos um levantamento do número de artigos publicados sobre o tema em estudo por cada OM no sentido de se averiguar o destaque deste tema no espaço “opinião”. O número de artigos publicados por cada agente sobre o tema em estudo constituiu, à partida, um indicador do seu investimento argumentativo no tema.

Seguidamente, estabelecemos uma analogia entre o número de artigos publicados mensalmente em ambos os jornais sobre o tema e os acontecimentos mais relevantes relativos ao processo de avaliação, de modo a aferir a relação entre a agenda pública, a agenda dos media e a agenda política. Face à síntese que apresentámos sobre o processo de implementação do NMA considerámos, a dado momento, três épocas distintas na análise dos temas e da argumentação da opinião: um primeiro momento, o início do processo de implementação, que decorreu no ano lectivo 2007/2008, até à data do acordo entre a Plataforma Sindical e o Ministério da Educação; um segundo momento, entre 16 de Abril de 2008 e 31 de Dezembro de 2008; e o terceiro momento, após a introdução de alterações ao modelo inicial até ao final do primeiro ciclo de avaliação, a 31 de Dezembro de 2009.

1.4.3 Os Temas em Torno do Tema da Avaliação de Professores – Metodologia de Análise

Num segundo momento foi analisada a natureza e forma de argumentação produzida pelos OM sobre o processo de avaliação dos professores. Embora o material recolhido fosse respeitante ao processo de avaliação de docentes, isto é, ao NMA na sua fase de implementação, estes agentes opinaram acerca deste assunto de maneira diversificada e mediante processos e recursos estilísticos diferentes. Em determinadas ocasiões orientaram o seu discurso claramente para os dirigentes dos partidos políticos, noutras para os membros do Governo ou para os dirigentes dos sindicatos, professores ou para um público genérico. Uns colocaram a ênfase nos processos de negociação da política com os parceiros sociais; outros nas características do modelo implementado e nos seus efeitos e consequências na escola pública; outros ainda, relacionaram-no com outras medidas de política educativa ou outras implementadas pelo XVII Governo ou mesmo por governos anteriores. Uma análise do conteúdo dos artigos de imprensa de estilo essencialmente crítico, como são os artigos publicados quer no editorial de um jornal quer na rubrica de “opinião”, necessita levar em consideração não só os assuntos em torno dos quais o tema é abordado, mas também a forma como estes são tratados, a sua pertinência, os esquemas argumentativos utilizados.

Assim, optámos por fazer um recorte do discurso de cada artigo/ficha temática tendo por base o modelo de análise aplicado pela primeira vez, em 1960, por Naville-Morin enquanto investigadora da EHESS7 (Chartier, 2003), tendo como unidade de recorte do discurso, a unidade de significação ou unidade de informação (UI). Naville-Morin estabelece um paralelo entre o modo de recorte da UI e o modo de selecção das informações por parte do leitor ao afirmar que a UI adapta-se ao modo de leitura. Do ponto de vista da lógica, as UI contêm o nível mais geral de compreensão de uma ideia, a que corresponde à realidade concretizada pelo leitor ou destinatário. Segundo a autora, pelo facto da quantidade de informação transmitida pelos media apresentar-se optimizada (na tentativa de colocar o máximo no mais curto espaço), cada notícia é demasiado visível para passar despercebida e demasiado breve para ficar retida. Assim, o leitor acumula as notícias antes de as seleccionar e simplifica-as antes de as concretizar. Voyenne, compatriota de Naville-Morin, estabelece uma analogia entre os modos de leitura e a forma de recorte da informação: “qualquer jornal convida o leitor a fragmentar a leitura em notícias “independentes”, ao sabor da deslocação do olhar”. (Chartier, 2003, p. 68)

Desejando permanecer o mais próximo possível desta proposta, tentámos assumir o papel de leitor “inocente” que se encarregasse de fragmentar a informação recolhida em unidades independentes a que Naville-Morin chamou UI. Este movimento analítico que oscila entre os modos de leitura e o modo de recorte da informação, aproxima-se ainda, do ponto de vista de Lise Chartier (2003, p. 68), com a forma como o jornalista transmite, no seu discurso, um certo número de ideias a propósito de factos e de acontecimentos que lhe despertaram interesse levando-o a partilhá-las com o seu auditório.

Do ponto de vista semântico a unidade de informação pode compreender algumas palavras, uma frase completa ou um ou mais parágrafos, reatando a mesma ideia ou sentido sem que seja acrescentada mais algum significado (Chartier, 2003).

Com vista ao recorte da informação contida em cada uma das fichas temáticas, tornou-se necessário definir as regras de recorte da informação em UI: identificar as ideias ou assuntos, temas a recortar, a sua definição ou descrição precisa e a selecção de categorias de classificação. Num primeiro passo procurámos identificar os temas enquadradores a destacar relacionados com o tema da avaliação de professores. Como pretendemos saber se a opinião veiculada nas colunas de opinião se orientava para os processos democráticos de construção das políticas públicas, para as opções de política educativa tomadas pelos governantes na área da educação em geral e as suas repercussões na escola pública, ou se estava significativamente centrada no NMA, após uma leitura cuidada dos títulos e subtítulos dos artigos, considerámos 31 categorias agrupadas em três grandes temas enquadradores        

do tema em estudo: “Processos de negociação das políticas públicas”, “Medidas de política educativa”, “Avaliação de docentes” (desenho da política, implementação do modelo e efeitos – também aqui designada “Avaliação de desempenho docente”). Um “tema” “Diversos” foi considerado de modo a incluir informação que não se enquadraria em nenhuma dos temas anteriores e que surgia pontualmente nas fichas temáticas.

No Quadro 1 apresentamos a estrutura de análise que nos propusemos levar a efeito, onde cada tema enquadrador se encontra dividido em categorias de conteúdo e é apresentada a respectiva definição ou descrição. Como estabelecemos como objectivo perceber até que ponto os posicionamentos adoptados traduziram os campos de filiação institucional e profissional e os respectivos interesses dos OM considerámos, por conseguinte, o grupo profissional (institucional na medida do possível) do autor do artigo/ficha temática, uma categoria de classificação.

As UI foram caracterizadas pelo seu índice de frequência e tonalidade (ou orientação valorativa), desdobrada, neste último caso, em três modalidades, seguindo o método proposto por Naville-Morin (Chartier, 2003): positivo (+), negativo (-) ou neutro ou ambíguo (0), consoante o OM manifestasse uma opinião favorável, desfavorável, neutra ou ambígua, relativamente ao assunto tratado na categoria de conteúdo em que se enquadrasse a unidade. Foi considerada positiva toda a opinião que encorajasse, favorecesse, suportasse, apoiasse, aderisse, subscrevesse, sustivesse, consentisse ou apoiasse o assunto em análise. Foi considerada negativa toda a opinião que desencorajasse, desfavorecesse, se opusesse, denegrisse, rejeitasse, desaprovasse, obstruísse, destruísse, refutasse, negasse ou militasse contra o assunto em análise. Toda a opinião manifestada sob a forma de informação que reconhecesse simplesmente um facto, um acontecimento, uma ideia ou uma teoria relacionada com o assunto em análise sem que daí se inferisse qualquer juízo de valor, foi considerada neutra.

Na análise de conteúdo, quer o recorte das UI quer a sua classificação por assunto (categoria de conteúdo) e a atribuição da orientação exigem grande exactidão, devendo, na prática ser efectuado por um grupo de analista e codificadores. De modo a aumentar o grau de objectividade deste método decidiu-se, por conseguinte, cooptar um elemento externo, da área das línguas e humanidades, o qual após o processo de recorte e classificação das UI concluído, analisou minuciosamente o processo, desempenhando o papel de “juiz” e obrigando, quando tal se justificou, à introdução de alterações de modo a atingir um tratamento consensual das UI.

As UI foram ainda referenciadas ao OM, à ficha temática e à data da sua publicação, sendo portanto a data da publicação do artigo/ficha temática, também uma categoria de classificação.

QUADRO 1: ESTRUTURA DA ANÁLISE DO CONTEÚDO - OS TEMAS ENQUADRADORES E AS