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4 REPERCUSSÕES DO CONCEITO DE TRANSTORNOS GLOBAIS DO

4.5 Estudos de Casos

4.5.1 Caso T Autismo na escola regular: o encontro com o desconhecido

4.5.1.6 O professor e a inclusão escolar

A Professora 1 revela que, de maneira geral, os professores do ensino regular não recebem preparação acadêmica em suas formações para lidar com os diferenciais apresentados pela criança em questão. Afirma ela que

A gente não faz pedagogia para trabalhar com o aluno que tem dificuldade. Todas as teorias pedagógicas que eu tive nos meus quatro anos de pedagogia e depois na pós-graduação foram para alunos de quem a gente consegue alguma resposta. (sic – Professora 1)

Desta maneira, a inclusão escolar do aluno em questão é definida para esta professora pela medida do encontro com o que ela denomina de “Mundo muito desconhecido!” (sic – Professora 1), não localizando muitos endereços em que possa tratar das dificuldades que emergem dele. Em sua percepção, casos como o de T não são alvo de discussão na escola. Em suas palavras,

Por mais que você lê, por mais que você lê os relatos, não tem com quem conversar sobre isso! [ênfase na frase] Será que o que eu vi ali tá certo? Igual eu te falei sobre ele estar falando mais... Será? [...] Acho que no final o que fica para mim é um pedido de socorro mesmo. (sic Professora 1)

Portanto, o que esta professora diz a respeito de sua convivência com o aluno revela a dimensão do encontro contingencial com uma criança que lhe apresenta algo imponderável, para o qual ela deve dar uma resposta. Em princípio, resta-lhe a certeza do dever de algo a ser feito pelo aluno, mas também a insegurança e a sensação de estar só nesta empreitada. Sendo assim, mesmo sem ter a real noção de por onde seguir, diante da diferença e do desafio colocados pela necessidade de levar adiante os processos pedagógicos da criança em questão, esta professora imediatamente buscou alternativas que visassem ao rompimento ou à minimização das dificuldades que ela identifica para o processo de inclusão no aluno:

Eu não conseguia sair do lugar com ele! Comprei uns livrinhos daqueles que a gente compra com coisas de colorir, de levar o menininho até um lugar, assim... porque eu não sabia o que eu ia fazer com ele! (sic Professora 1)

Nesta busca por alternativas, o percurso feito por ela levou-a a sites e a blogs que falavam da Síndrome do X-frágil, sendo este o seu referencial diagnóstico em relação à criança e o seu referencial teórico para construir uma saída pedagógica para T. Foi desta forma que ela chegou à atividade de informática que hoje ele frequenta na Escola, auxiliado pela Monitora de Apoio à Inclusão. Em sua avaliação, em comparação com outras crianças que têm a mesma síndrome, T está aquém em seu desenvolvimento cognitivo.

Assim como as anotações dos registros acadêmicos, a Professora 1 também faz observar os contínuos avanços do aluno na socialização e no contato com as pessoas, inclusive com ela. Ela identifica que, ao curso de cerca de cinco meses de contato com o aluno, ele já consegue interagir melhor com ela e com a Monitora de Apoio à Inclusão. Nas palavras desta Professora,

Agora ele pega na minha mão, porque antes ele não pegava. Ele entra na fila... ele não aceitava que você tocasse nele... que você se aproximasse dele, sabe? E agora ele dá beijo na [Monitora de Apoio à Inclusão], ele abraça, ele já consegue lidar melhor com isso. (sic - Professora 1)

Em relação ao contato da criança com a Monitoras de Apoio à Inclusão, observamos que ela oferece ao aluno uma possibilidade de apaziguamento diante de algumas agitações cotidianas na escola. Segundo a Professora 1, logo no início do ano, quando houve uma interrupção temporária deste acompanhamento e a substituição de uma profissional pela atual Monitora, T regrediu na aquisição das habilidades sociais, adquiridas até então. Ela teve a impressão de que ele sentiu-se “perdido”, pois a criança voltou a perambular pela escola, evacuar na própria roupa e acentuou-se nele algumas manifestações sintomáticas que podemos identificar como sendo próprias ao Autismo Infantil Precoce – estereotipias motoras, agitação psicomotora com balanceio do corpo e isolamento, além de auto e heteroagressividade. Atualmente, ele encontra-se sereno com a atual Monitora.

Interrogada sobre o cotidiano de seu aluno, esta professora afirma que procura estar sempre por perto, que lhe apresenta as oportunidades de maneira igualitária àquelas apresentadas aos demais alunos, mas que não impõe nada a ele. Assim, aceita a forma com que ele faz as atividades direcionadas em sala de aula, as quais são comuns a todos. Nas observações que fizemos da dinâmica estabelecida entre o aluno e esta professora, destacamos que, ao seu modo, T dirige-se com frequência a ela, comunicando-se, estabelecendo contato, inclusive físico, e que há a preocupação frequente dela em traduzir, colocar sentido nas suas

manifestações, tal como pudemos verificar quando do primeiro encontro desta pesquisadora com a criança: “Nossa, que colorido bonito! É! Hoje você tá alegre... olha as cores. Tem dias que é tudo preto. Hoje você tá bem... ó, que joia!” (sic – Monitora de Apoio à Inclusão).

Observa-se que esta professora parece guardar com ele uma aproximação que, em certo sentido, diríamos ser calculada, pois ela se coloca claramente em uma postura de quem sabe que cumpre o papel de orientá-lo na medida do que ele necessita e lhe demanda, secretariando-lhe em suas necessidades diárias e ofertando-lhe os estímulos necessários para que, no seu ritmo, ele possa avançar, sem forçá-lo a atividades e atitudes para as quais ele não manifesta interesse. Desta maneira, ela parece entender que, na interação com a criança, há a necessidade de um espaço de aproximação e distanciamento físico e subjetivo, aparentemente conseguindo com que ele permaneça tranquilo na escola, na maior parte do tempo. Ela afirma que todo o seu empenho é para que ele consiga autonomia em tarefas cotidianas.

Trata-se, então, de um olhar lançado para a criança que parece considerar o tempo, a forma e as possibilidades de resposta que ele pode dar. Encontramos aqui a dimensão do laço social explicitado por Rahme (2010) como estratégia de inclusão escolar e social de sujeitos que apresentam quadros de autismo.