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5.3 Programa de Ação Econômica do Governo PAEG – 1964-

Por outro lado, o governo que assumiu o poder elaborou o Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG) para o período entre 1964 a 1966. Este, conforme explica Schiffer (1989, p. 54), “apontou praticamente os mesmo pontos nevrálgicos da economia brasileira discutidos como “reformas de base” no governo anterior. No entanto, as alternativas propostas visavam outros ins”.

Procurando reativar a economia de maneira a criar as condições que dessem maior tranquilidade social e política ao governo, são tomadas medidas para enfrentar os problemas detectados, mas que também estavam relacionadas ao processo político em curso. Skidmore (1988) analisando o período airma que

A luta contra a inlação não foi sacriicada apenas pelas reações à gigantesca safra de café nem pelo inesperado superávit comercial. O governo agravou o problema anunciando, no início de 1965, uma redução de impostos sobre bens de consumo duráveis. O propósito expresso da medida era estimular a demanda e assim elevar a produção industrial. Sem dúvida, destinava-se também a fortalecer os candidatos pró-governo às eleições para governadores de outubro de 1965. De qualquer modo,

os dois fatos elevaram para 75 por cento a expansão da base monetária em 1965, mais do dobro da meta de 30 por cento estabelecida no PAEG. (SKIDMORE, 1988, p. 98).

Em relação ao setor agrícola, o PAEG propunha eliminar o atraso relativo brasileiro, signiicando a criação de condições ao aumento da penetração das relações capitalistas no campo. Nos dizeres de Schiffer (1989, p. 55)

Iniciava-se no setor primário o processo denominado de “modernização conservadora”, centrado que estava na grande propriedade consumidora de insumos agrícolas modernos, voltadas ao plantio de produtos primários de exportação ou matérias-primas industriais34 e que paulatinamente

introduziu ao trabalho rural o assalariamento. (SCHIFFER, 1989, p. 55).

O interesse maior era promover “a transição do modelo extensivo tradicional para uma modernização intensiva, descartando assim as teses de reforma agrária nos moldes discutidos no governo anterior”. (GOODMAN, 1986 apud SCHIFFER, 1989, p. 55).

Outras medidas foram tomadas visando esvaziar e protelar as reivindicações de reforma agrária tais como a regulamentação no PAEG do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária e as propostas para expansão do crédito rural, inclusive com a criação de órgãos de controle central (Coordenação Nacional do Crédito Rural, Fundo Nacional de Reinanciamento Rural), além de políticas de preços mínimos. O crédito rural acabou sendo “o principal mecanismo inanceiro que possibilitou a transição da economia agrária, tradicionalmente extensiva, à modernizada”. (SCHIFFER, 1989, p. 55-56).

A partir do início de 1967 o quadro econômico do setor público estava sob controle, decorrente das medidas adotadas após o golpe de 1964 e, associado à conjuntura internacional favorável com as multinacionais investindo “em países onde os fatores de produção eram relativamente mais baratos” (SINGER, 1976, apud SCHIFFER, 1989, p. 63), abriu um novo ciclo de crescimento da industrialização brasileira que teve num programa estratégico as diretrizes para a destinação dos recursos, dentre elas a da elevação da produtividade agrícola, investimentos estatais nas áreas de energia, transporte e telecomunicações e a consolidação das indústrias básicas com a ampliação do mercado interno. (SCHIFFER, 1989, p. 64). “Iniciava-se assim um período de acelerado crescimento econômico, que perdurou até 1973, batizado de “milagre econômico” [...]”.(SCHIFFER, 1989, p. 64).

Veriica-se no Paraná, nesse período, o início do processo da erradicação dos cafezais, cultura perene que necessita de grande quantidade de mão de obra, substituídos por culturas temporárias, juntamente com o aumento da quantidade de tratores e o uso de insumos. Esta política, implementada a partir da União, acabou cumprindo múltiplas inalidades. Diminuiu a dependência brasileira de um produto de grande predominância na pauta de exportações brasileira, possibilitou a introdução da mecanização no campo e o uso de insumos industriais, liberou mão de obra do campo, engrossando o exército de reserva para as indústrias nas cidades e ainda abriu novas frentes de expansão de fronteira agrícola no Brasil, desta vez no centro- oeste e norte – Mato Grosso, Rondônia, Acre, etc. –, ocupando grandes áreas no interior do país, que em alguns casos eram mais adequadas a esses produtos. Muitos autores simpliicam a transformação que ocorreu no Paraná, principalmente no norte e oeste do estado,

creditando apenas às geadas e sobrevalorizando a de 1975 – “a geada negra” –, minimizando ou esquecendo das políticas econômicas que foram executadas pelo governo federal, inclusive com apoio do governo estadual. No entanto, Razente (1983) deixa bem evidente, além do aspecto climático, os interesses do Estado em mudanças estruturais.

A geada de 62 não é o único fato a se conjugar na eliminação da cafeicultura. Houveram (sic) também as geadas de 63, 66, 69, 72 e 75 que dizimaram a produção cafeeira nos anos subseqüentes, acarretando a erradicação de cafezais, uma vez que o sistema de preços altos não podia ser mantido pelo Estado. Além disso havia nítida intenção do Estado em desestimular a cafeicultura regional pela instabilidade que provocava na economia norte paranaense e brasileira. O Estado punha em evidência, a necessidade de incentivar o plantio de café em outras regiões como Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul. (RAZENTE, 1983, p.139-140).

Cancian (1977) também analisou o que ocorreu, ao estudar a importância da cafeicultura no norte do Paraná e identiicou as políticas federais que tinham como objetivo ajustar a produção à demanda do mercado como determinante nas mudanças veriicadas na região. Essas políticas consideraram inclusive a concorrência internacional de países da América do Sul e da África. Entre os mecanismos constavam a erradicação dos arbustos que não apresentavam resultados econômicos satisfatórios e inanciamentos que estimulavam a troca por culturas temporárias, que tinham necessidade de utilizar máquinas e implementos agrícolas e insumos industrializados.

O excesso de café frente à demanda, determinou em 1961, providências do governo brasileiro no sentido de eliminar a produção de excedentes. Para tanto foi criado o “Grupo Executivo da Racionalização da Cafeicultura” (GERCA), com o programa básico de erradicar dois bilhões de cafeeiros anti-econômicos, procurando ajustar a produção que era de 36 milhões

de sacas, para 24 milhões anuais, sendo 18 milhões para o mercado externo e 6 milhões para o mercado interno.

Tal medida se justiicava face à superprodução e deterioração dos preços que se seguiu, especialmente em virtude da entrada das grandes safras paranaenses no inal da década de 1950 e início da de 1960, e aumento da concorrência externa. Mesmo com o I.B.C. comprando café e realizando estocagem não era possível manter os preços externos em níveis considerados adequados. (CANCIAN, 1977, p. 103).

Sendo o objetivo modiicar a estrutura econômica através da diversiicação agrícola, seria preciso resolver outro problema além do café – “a superprodução dos produtos agrícolas, constantemente veriicada”. O pensamento do GERCA para a solução da questão foi dar cobertura aos projetos de industrialização “porque as fábricas que foram montadas constituirão fonte de absorção da matéria prima (sic) produzida pela agricultura e, por outro lado, poderão dar mais e melhores emprêgos (sic) aos elementos dispensados dos trabalhos agrícolas. (CANCIAN, 1977, p. 104).

No Plano Diretor normativo de conduta do GERCA, foram propostas as medidas consideradas adequadas, que, segundo Cancian (1977, p. 105), abrangiam:

1. “Erradicação de cafeeiros anti-econômicos; 2. Renovação racional das lavouras cafeeiras;

3. Diversiicação da agricultura nas regiões cafeeiras;

4. Financiamentos para melhoria das condições de rendimento das explorações agrícolas e pecuárias, para aquisição de máquinas e implementos agrícolas, e inanciamentos especiais aos governos dos estados cafeicultores;

5. Programas de instalação de usinas de açúcar em regiões cafeeiras.”

A previsão inicial de erradicação de 2 bilhões de pés de café foi diminuída para 580 milhões de cafeeiros erradicados numa primeira etapa, tendo em vista a falta de recursos disponíveis para inanciar a política.

Com as regiões Sul e Sudeste liderando os empréstimos subsidiados via crédito rural, os Estados destas regiões efetivaram a transição mais rapidamente. Goodman (1976 apud SCHIFFER, 1989, p. 56), baseado nos dados do censo agropecuário de 1975, veriicou que os Estados de ambas as regiões obtiveram 36% cada deste inanciamento, icando o nordeste com 14%, o centro-oeste com 13% e o norte icou com apenas 1%.

As medidas tomadas pelo governo central beneiciam o Paraná, particularmente com o crédito agrícola subsidiado e a organização de uma política cambial favorável, os quais manterão a exportação de produtos agrícolas, a continuidade do fornecimento de produtos alimentares ao mercado interno e a procura de ganhos de produtividade. (RAZENTE, 2001, p. 45).

Para fortalecer essa política, foi necessário alterar também a estrutura agrária da região, consequentemente a relação da área rural com as cidades, com implicações para a estrutura social e infraestrutura regional. As fazendas de café estruturavam sua produção com a contratação de mão de obra baseada em contratos de colonatos e parcerias, necessários para formar, cuidar e colher o café. Com a substituição do café por soja, trigo, milho ou outros produtos sazonais, isso não seria mais necessário, levando ao desmantelamento desses sistemas.

Schiffer (1989) argumenta que o sistema de colonato e parceria, predominante até então, foi desmantelado, com o estímulo

a monoculturas intensamente mecanizadas, dentre outros fatores, como a introdução do assalariamento, que modiicou as relações de trabalho e local de residência do trabalhador rural, que passou a residir em áreas urbanas próximas, constituindo “o exército de reserva de mão de obra, agora não só industrial como também rural, fator que contribuiu para a diminuição dos salários35 reforçando a concentração

de capital a nível (sic) nacional.” (SCHIFFER, 1989, p. 56-57).

No norte do Paraná o processo de colonização, onde, paralelamente à venda de terras também teve a grilagem36,

progressivamente foi estabelecendo as condições de acesso à propriedade através da aquisição, visto que na década de 1950 já se veriicava o início do acomodamento das disputas pela posse e propriedade, conforme identiicado por Lopes (1983, 175).

A partir de 1950, no Norte Novo, já era quase impossível a reprodução dos caboclos como classe social. Tão alheias a eles eram as noções de propriedade privada, mercado de terras, venda regular de força de trabalho, que passavam a vigorar. A propriedade privada tinha- se formado naquelas paragens. Como respeito a, como direito a, não importa. Agora ela existia e permeava de forma clara as relações entre as classes. O mercado de terras e de força de trabalho existiam plenamente no Norte Novo no começo dos anos 60, quando a fronteira agrícola move- se para o sudoeste.

A violência acompanhara todas as fases de apropriação privada das terras do Norte do Paraná. Os que primeiro para ali se dirigiram, ao Norte Velho, conquistaram a terra dos índios, matando-os, destruindo as aldeias, expulsando para mais longe os remanescentes. Depois, títulos de propriedades foram falsiicados e adulterados. Pouco mais tarde, no Norte Novo e Novíssimo, pequenos produtores estabelecidos – proprietários e posseiros – eram expropriados à força. Finalmente, aí também a violência se manifestou na superexploração do trabalho familiar dos sitiantes de café e algodão. O direito à renda fundiária que ele pagava com seu trabalho, em troca da propriedade do sítio, não icava com ele. Em seguida, aquela, como renda fundiária capitalizada, passava às mãos dos particulares, das companhias, do Estado. (LOPES, 1982, p. 175-176). Mesmo a política de erradicação do café, que se estendeu pela década de 1960, passou em parte obscurecida para os sitiantes, envolvidos que estavam no impasse de como levar adiante a produção. Desde esta época, muitos pequenos proprietários passaram a vender suas terras e a se mudarem para as cidades, ou para onde a fronteira agrícola estava aberta a seus pequenos capitais: no Paraguai, Mato Grosso, Rondônia... (LOPES, 1982, p. 184).

A concentração de capital, que prevaleceu de modo acentuado neste período que se iniciou em 1964, também signiicou uma concentração espacial de capital. (SCHIFFER, 1989, p. 57).

O processo que se sucedeu não era o único caminho possível pois, como questiona Skidmore (1988, p. 131), “os economistas de Castelo diziam que desejavam fortalecer a “racionalidade” na economia, mas nunca perguntaram se a estrutura industrial do país a partir de 1964 era uma base ótima para o futuro desenvolvimento”. Entretanto um novo quadro econômico, político e social resultou das medidas tomadas a partir de 1964 e da conjuntura internacional, favorável ao crescimento econômico, cuja “tendência à expansão das multinacionais alocando seus investimentos em países onde os fatores de produção são

35. Sobre as condições comparativas dos salários rurais e urbanos no período, ver SZMRECSANYI (1983), p. 238. 36.Grilagem, conforme Lopes (1982: 132-133), pode ser explicada de dois modos. Um seria o fato das escrituras serem

guardadas em caixas, nas quais acabavam também se escondendo grilos, e que estes apareciam quando se abria a caixa para pegar o documento, e o outro é que o apelido se origina da semelhança entre os falsiicadores e o bichinho, ambos difícil de serem pegos, pois ao chegar perto, pulam para longe. O fato é que a grilagem é a ocupação de terras por prepostos de pessoas bem relacionadas politicamente e com recursos para sustentar longas demandas, muitas vezes com violência, contra proprietários legítimos ou posseiros que ocupavam determinada área anteriormente à sua chegada. Lopes (1982: 134) airma que a “grilagem aparece quando já existe um mercado de terras, mesmo que incipiente. O que ocorre no Norte do Paraná por volta de 1920”.

relativamente mais baratos, delineavam (sic) as condições para o novo ciclo expansivo de industrialização que se seguiu”. (SCHIFFER, 1989, p. 63).

Juntamente com a modernização conservadora do campo, a infraestrutura que foi sendo inanciada proporcionava a consolidação das indústrias que se instalaram no Brasil, como a automobilística, que precisava de rodovias pavimentadas para que os caminhões assumissem o transporte de carga e proporcionassem as condições para a uniicação do mercado nacional. A expansão da malha rodoviária no Brasil e particularmente no Paraná continuou ocorrendo, principalmente após o golpe militar, que retomou o modelo de expatriação de excedentes.

5.4 - Investimentos em infraestrutura