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programas de sinalética para Jogos Olímpicos

208 Eco, op.cit., p.153.

5.3 origens históricas: da sinalização e pictografia à sinalética moderna 1 pictogramas e modernos sistemas de signos

5.3.4 programas de sinalética para Jogos Olímpicos

- os Jogos Olímpicos do México (1968) e de Munique (1972)

A questão dos eventos internacionais tais como feiras, exposições, congressos ou manifestações desportivas de carácter mundial – e.g. Jogos Olímpicos - criam um problema diferente do da sinalética de aeroportos ou, até, de edifícios públicos: o desenho de pictogramas específicos, muitas vezes caracterizados por uma estilização exagerada, com preocupações de imagem corporativa. Exagerada e contraproducente, segundo uns, “inovadora” segundo outros, as opiniões sobre o assunto dividem-se. Se autores como Neurath, Aicher e Krampen, ou R. Dewar defenderam sempre a normalização / unificação do vocabulário de sinais, Joan Costa ou o conjunto de autores norte-americanos que colaboraram no

recentemente editado This Way: Signage Design for Public Spaces, de James G. Trulove, argumentaram em sentido contrário. 95

É neste contexto que Thomas Geismar, presidente da comissão da AIGA que elaborou o relatório sobre os signos DoT, lamenta que alguns designers envolvidos na construção de programas de sinalética,

“especially those associated with temporary events such as Olympic Games or World’s fairs, have spent considerable effort to achieve graphic excellence. At the same time, they have made conscious effort to give their symbols a unique graphic character inappropriate for wider functional needs.”96

Em finais dos anos 60 o conceito de sistemas de design integrado tornara-se realidade. Os directores de empresas e os presidentes de organizações

responsáveis pela preparação de grandes eventos culturais ou desportivos haviam- se apercebidos da necessidade de projectos integrados – o que incluía programas de sinalética eficazes – em acontecimentos que envolviam o alojamento e

fornecimento de informação a um grande número de pessoas. Bons programas de sinalética tornavam-se particularmente importantes em eventos de carácter

internacional como Feiras e Jogos Olímpicos, onde a comunicação com uma audiência multilíngue deveria ser feita através de uma linguagem pictográfica. Nos Jogos Olímpicos de Londres, de 1948, utilizaram-se já pictogramas desportivos e de serviços, mas estes consistiam em desenhos muito figurativos e

acompanhados de textos; na verdade, eram mais ilustrações do que verdadeiros pictogramas. Apenas em 1964, aquando dos Jogos Olímpicos de Tóquio, os designers japoneses (sob direcção de Masaru Katzumie) criaram pictogramas propriamente ditos, i.e. “signos icónicos que não precisam de texto explicativo”97 Os Jogos Olímpicos do México (1968) e de Munique (1972) Munich foram

considerados autênticos marcos na evolução dos sistemas gráficos de sinalética.98

No caso do México, os Jogos decorriam dentro da própria Cidade de México (uma das maiores do mundo) e arredores, o que envolvia complexos problemas de logística, controle de tráfego, e informação a um público multilíngue.

A organização escolheu uma equipa internacional de designers, sendo o norte- americano Lance Wyman o director responsável pela parte de design gráfico. Wyman escolheu uma solução que visava reflectir a herança cultural de México, através do uso de linhas múltiplas repetidas para formar padrões, e o recurso a cores puras, de tonalidades luminosas.

95 Cf. supra, nota 90.

96

The American Institute of Graphic Arts, Symbol Signs ..., p.9. Cf. também R. Dewar, op.cit., pp.290, 296.

97 J. Costa, op.cit., p.146.

98

O sistema desenvolvido incluía pictogramas para os eventos de carácter desportivo e cultural, bem como sinais de direcção a serem implementados pelo Departamento de Design Urbano ao longo da cidade, outdoors informativos, mapas e outro

material. A cor foi usada de forma ao mesmo tempo decorativa e pragmática: um arco-íris de cores, utilizado no mapa oficial para identificar os itinerários principais foi pintado nos lados do passeio das ruas correspondentes.

Visando distinguir entre eventos culturais e atléticos, os pictogramas referentes aos primeiros tinham como fundo a forma-silhueta formada pelo 68 do logotipo dos

Jogos. 99 Note-se todavia que, se os pictogramas das modalidades desportivas são

facilmente decifráveis, o mesmo não sucede com os dos eventos culturais. Isto acontece porque, enquanto que é relativamente fácil representar modalidades reconhecíveis por um certo número de elementos distintivos (objectos), torna-se muito mais difícil de ilustrar actividades que remetem para conceitos abstractos.100 Otl Aicher, que dirigiu a equipa de designers aquando dos Jogos Olímpicos de Munique, em 1972, foi responsável pelo desenvolvimento e implementação de “a more formal and systematized design program”.101

Um manual de identidade estabelecia os procedimentos standard para utilização dos símbolos, foi seleccionado um tipo único de lettering (Univers), e criado um rigoroso sistema de grelhas de composição para as publicações, cartazes e

restante material gráfico. A paleta de cores incluía dois azuis, dois verdes, amarelo, laranja e três tons neutros (branco, preto e cinza intermédio), mas excluía o

vermelho. A escolha de uma paleta limitada a um segmento do espectro visava criar uma harmonia de cores por proximidade de tons.

Uma extensa série de pictogramas foi desenhada a partir de uma grelha quadrada organizada em módulos divididos por linhas horizontais, verticais e diagonais. Foi criado um pictograma para cada um dos desportos olímpicos, enfatizando o movimento dos atletas e indicações diagramáticas do respectivo equipamento, de modo a facilitar a sua imediata identificação apesar das barreiras linguísticas. 102

Figura 5.10: alguns dos cerca de 30 pictogramas referentes a modalidades olímpicas, desenhados por Aicher; o programa incluía ainda centena e meia de sinais referentes a serviços.

99

Ibid., pp. 401 e s.

100 Cf. por exemplo: Youth Reception, Word Art Exhibition, Human Genetics and Biology [símbolos marte/vénus

sobrepostos], Olympiad Facilities Exhibition; reproduções em Meggs, op.cit. p. 402, Fig. 23-49 e 23-50.

101 Meggs, p.404.

102

O programa concebido por Aicher é unanimemente considerado, juntamente com o DOT, um dos expoentes máximos do design gráfico, na sua vertente

funcionalista.103

No programa sinalético dos Jogos Olímpicos de 1976, que tiveram lugar em Montreal, foram novamente utilizados os pictogramas de Aicher, completados e

ampliados para um total de 200, aproximadamente.104

- conceito de coerência gráfica

Já nos escritos de Neurath105 havia a sugestão de duas importantes regras

para o desenho do vocabulário pictográfico: 1) redução106, i.e. estilização, por depuração da forma, dos sinais individuais; e 2) consistência na aplicação de formas, regras, e estilo a um grupo de sinais, de modo a dar-lhe uma aparência de sistema coerente.

Estas regras não têm apenas uma função prática explícita. Elas desempenham igual uma função implícita ou retórica, embora esse aspecto nem sempre seja suficientemente reconhecido. De certo modo, reforçam a "qualidade linguística" de dos sinais, fazendo com que os signos individuais se pareçam, até certo ponto, com letras, e os sistemas de signos com linguagens verdadeiras, idiomas completos e auto-suficientes.

De um ponto de vista prático, a coerência estilística 1) simplifica o processo de design; 2) ajuda a unificar uma série de pictogramas dispersos num espaço, facilitando o seu reconhecimento.

De um ponto de vista retórico, a coerência estilística transmite o efeito de uma linguagem ordenada, auto-suficiente. Todavia, este código, ou matriz estilística aplicada a um determinado conjunto de ícones,

“does not control the basic semantic or syntactic workings of picture signs … The semantic value of a picture sign is tied to its being a picture, not to its style.”107

O mesmo objecto que é representado por um pictograma, poderia sê-lo igualmente por uma fotografia ou uma ilustração de estilo elaborado. Os antigos pictogramas dos sinais de trânsito “Crianças” não eram menos legíveis que alguns dos horríveis bonecos desarticulados com que se pretendeu

substituí-los. Como refere Ellen Lupton, do ponto de vista semântico, a famosa coerência estilística funciona ao nível da conotação, não da denotação; e, do ponto de vista sintáctico, funciona mais projectando uma aparência de

coerência gramatical, do que propriamente, como regra linguística verdadeira. «The sign system for the Munich Olympics of 1972 exemplifies the principle of consistency. As in the Tokyo system of 1964, each sport is represented by a figure drawing. But whereas the Tokyo figures are drawn to order, the Munich signs are generated by a consistent “body alphabet”. This matrix, though

103

Cf., por exemplo, E. Lupton e A. Miller, Design Writting Research, Londres: Phaidon, 1999, p.43: “The sign system

designed for the Munich Olympics in 1972 was the semiotic climax of international pictures: a geometric body alphabet…” Cf. também E. Lupton, “Reading Isotype”…, p.155: “The sign system prepared for the U. S. Department of Transportation by the American Institute of Graphic Arts is another exemplar of stylistic consistency”.

104

J. Costa, op.cit., pp. 208-211.

105 E. Lupton, “Reading Isotype”…, p.151.

106

J. Costa ( op.cit., pp.142 e s) prefere falar de “processo de “abstracção e esquematização gráfica”, e “tendência para a economia máxima de infrasignos”.

107

visually systematic, does not constitute an actual grammatical rule. One could put together a motley but legible set of symbols from a variety of picture alphabets. The legibility of the Munich pictures does not absolutely depend on the consistency of the body alphabet, as consistency is a rhetorical, stylistic device, rather than a necessary and independent syntax.» 108

- decadência do design funcionalista: Los Angeles

As questões de comunicação levantadas pelos Jogos Olímpicos de 1984 (Los Angeles), que ficaram também conhecidos como “os jogos da era Reagan”, são muito diferentes.

Em primeiro lugar, devido a cortes orçamentais (resultado directo das novas políticas da administração Reagan de diminuição dos impostos) o comité

organizador dos Jogos de Los Angeles não dispunha dos enormes subsídios que eram habituais em muitos dos jogos anteriores.

Assim, decidiu-se utilizar um total de 26 instalações desportivas preexistentes, a que apenas se acrescentou uma piscina e uma pista de ciclismo construídas de raiz. O problema de design consistia em transformar temporariamente este vasto conjunto, de modo a conferir-lhe uma identidade e criar um sentimento celebratório unificado, que pudesse expressar o carácter internacional dos jogos, não apenas para o público local mas também para uma audiência televisiva global.109

Trabalharam neste projecto de um novo vocabulário visual mais de 60 empresas de design, sob direcção dos designers gráficos Deborah Sussman e Paul Prejza, e de

Jon Gerde e David Meckel, do gabinete de arquitectos Jerde Partnership.110

«Due to the limited amount of time from the start of the design process to the start of the Olympic games, existing technologies, prefabricated parts, and rented items were used extensively.

(…) Sonotube columns, normally used as molds for casting concrete columns, but used here as columns themselves, were decorated with colorful painted stripes; the sonotubes were lined up to make colonnades, combined with rented tents to make colorful pavilions.»111

Em contraste com o projecto de carácter sistemático e racionalista de Otl Aicher, com a sua grelha geométrica e paleta de cores reduzida, nos Jogos de Los Angeles utilizou-se a um grafismo “stars and stripes”, inspirado na bandeira americana, e uma paleta de tons vivos, numa estética claramente pós-moderna.

108 Ibid., p. 154 e s.; para a posição tradicional sobre este tema, cf. Costa, op.cit., p.144: “La pauta modular

(...) corresponde a la dimensión sintáctica de un programa señalético, del mismo modo que la parte que hemos desarrollado acerca del diseño de signos icónicos corresponde a la dimensión semántica de cada pictograma por separado. Si esta última se refiere, pues, a la expresividad unívoca de cada pictograma de la serie, la dimensión sintáctica es el nexo de unión estilístico entre todos los pictogramas que integran esta serie.”

Cf. ainda exemplos de aplicação, pp. 159, 161; cf. também supra, nota 92, os já referidos critérios do AIGA, na selecção de símbolos para o sistema DoT: "The syntactic dimension (…) How well does this symbol relate

to other symbols? Is the construction of this symbol consistent in its use of figure/ground, solid/outline, overlapping, transparency, orientation, format, scale, color and texture?” A utilização do termo “sintaxe” para

referir uma unidade de estilo no desenho de pictogramas é, na minha opinião, abusiva. A analogia com a língua, típica do estruturalismo dos anos 60-70, é exagerada. Este assunto será desenvolvido mais à frente.

109

Meggs, op.cit., p.406.

110 Ibid.

111

Outra característica inédita foi uma especial preocupação a com a audiência televisiva - os mais de dois biliões de espectadores esperados em todo o mundo. As próprias soluções a nível arquitectónico, trabalhando sobretudo a “pele” exterior dos edifícios e pavilhões temporários, sugerem o início de uma nova era em que,

como dizia Débord, se assiste a um deslizar generalizado do ser para o parecer.112

Assisti-se, assim, ao emergir de um novo paradigma de design, com inevitáveis repercussões ao nível da concepção de programas de sinalética. Este assunto será desenvolvido mais à frente.

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