• Nenhum resultado encontrado

A NOVA GESTÃO PÚBLICA E OS IMPACTOS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

1.2 Projetos de educação e projeto de universidade

Coexistem duas ideias de universidade pública brasileira uma de que a universidade não está aberta a mudanças, portanto, é irreformável e a única alternativa para a sua transformação é optar pela descapitalização mediante a desestruturação da universidade pública em favor do emergente mercado universitário, ou seja, a opção pela mercadorização da universidade pública. E a outra ideia seria a de identificar as debilidades e em seguida superar o modelo de educação com gestos reformistas contra o embate da globalização neoliberal. Ambos os embates em prol da valorização do bem público e seus determinantes acabaram por inaugurar os pilares do projeto político- educacional do tempo presente. Primeiro comecemos pelo o que entendemos por educação.

A educação é a ação exercida, pelas gerações adultas, sobre as gerações que não se encontrem ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política, no seu conjunto, e pelo meio, particularmente a que se

14 Prefiro nomear esse processo marcante e próximo à caracterização desses autores com uma adequação,

no qual eu nomeio de ‗mundialização do capital científico’, que não deixa de ser um projeto global de grande impacto nas políticas públicas e na gestão da universidade pública brasileira imprimindo o caráter de mercadorização do ensino e não resolvendo as crises outrora pontuadas.

45 destine. Conclui-se que a educação consiste numa socialização metódica das novas gerações. (DURKHEIM 1978, p.41)

E também neste sentido:

É um bem de produção imprescindível para nossa existência, dado que ela por se constituir em entendimento, averiguação e interpretação sobre a realidade, é o que nos guia como ferramenta central para nela intervir; ao seu lado se coloca o conhecimento (em suas múltiplas formas), que é o veículo que o transporta para ser produzido e reproduzido. (CORTELLA, 2009, p.39)

A definição de educação historicamente perpetua a construção da vida coletiva como forma de transmissão de uma geração a outra através da hereditariedade, o homem não adquiri o saber se a sociedade não lhe despertar esse saber. Para Durkheim (1978) esse momento nasceu quando a vida social, sob todas as formas, se tornou demasiado complexa para funcionar de outro modo que não fosse pelo pensamento refletido, isto é, pelo pensamento esclarecido pela ciência. (p.44)

Neste sentido, os projetos de educação mantêm a diferenciação institucional entre a universidade pública e a universidade privada e norteia o conjunto de diretrizes para a gestão universitária, para a certificação, a formação dos docentes, avaliação dos docentes e discentes, planos de estudo, transforma a universidade em seu conjunto inelutável de atores sociais, sujeitos que se colocam a frente das contradições do capitalismo mobilizando as práticas e os saberes contextualizados e coerentes com o projeto de educação da universidade pública brasileira.

A universidade pública – e o sistema educacional como um todo – esteve sempre ligada à construção do projeto de país, um projeto nacional quase sempre elitista que a universidade devia formar (...). A tal ponto que, questionar o projeto político nacional, acarretou consigo questionar a universidade pública. O defensismo reativo que tem dominado a universidade, nomeadamente em suas respostas à crise financeira, decorre de a universidade, dotada de uma capacidade reflexiva e crítica que nenhuma outra instituição social tem estar a concluir – com uma lucidez que só surpreende os incautos – que deixou de haver projeto nacional e que, sem ele, não haverá universidade pública.

(SANTOS & ALMEIDA FILHO 2008, p. 46)

O projeto nacional de educação tendeu estimular o nacionalismo para defender a invasão da globalização. O peso educacional reside em afastar a submissão às imposições econômicas do capitalismo nacional dependente. A expansão do capitalismo global fragiliza o projeto de educação e por isso isola qualquer tentativa de

nacionalismo. Para os países em desenvolvimento no contexto global a assertiva consiste em reinventar o projeto nacional de universidade pública. (LEHER, 2004, p.23-

46 O traço deixado pelos primeiros pensadores sobre a Ideia15 de universidade brasileira é descrito assim pelos filósofos do idealismo16 como: 1) uma manifestação diversa do saber uno; 2) totalização sistemática do saber diverso; 3) concepção ideal de uma universidade liberal e autoritária. Após a Revolução Francesa de 1789 com o objetivo de consolidar o regime burguês é empreendida uma ampla obra em torno de reformas institucionais de ensino, assim, inicia-se as críticas quanto ao projeto de educação da universidade medieval, da utilização da cultura clássica, das ciências experimentais e do enciclopedismo. A universidade brasileira incorporou os valores do projeto de educação napoleônica e se abriu ao pensamento educacional da burguesia francesa por meio da aceitação das políticas educacionais iluministas e dos ideais revolucionários franceses.

A própria estrutura da universidade revelava a vitória do empirismo anglo- saxônico sobre o racionalismo francês e o idealismo alemão, embora este fosse evocado em sua justificativa. (...) não nos situamos no campo idealista, supondo que a reforma da universidade resultou da mente de alguns poucos homens, aqueles pelos quais, como dizia Fichte, a Universidade se exprime sem mediação, aqueles nos quais e pelos quais o mundo existe verdadeiramente. Ao contrário, entendemos que as transformações do ensino superior resultaram de múltiplas determinações, a maior parte ignorada pelos protagonistas mais

15―Uma instituição só manterá a sua funcionalidade na medida em que seja capaz de encarnar de forma

viva a ideia que lhe é inerente. Logo que o espírito abandona, uma instituição cristaliza em qualquer coisa de meramente mecânico, do mesmo modo que o organismo desaminizado se desintegra em matéria morta. Também a universidade deixa de constituir uma totalidade a partir do momento em que os laços que consolidam a sua consciência corporativa se desintegram. As funções que a universidade desempenha

para a sociedade permaneceriam assim ligadas, como que a partir de dentro, com os Objetivos, os

motivos e as ações dos membros que nela colaboram em regime de divisão de tarefas, ao nível de uma rede de intenções comuns. Neste sentido, a universidade deve representar enquanto instituição, cimentar enquanto centro motivador, uma forma de vida intersubjetivamente partilhada pelos seus membros, com

um estatuto que se pode dizer exemplar. Aquilo que desde Humboldt dá pelo nome de "Ideia da

Universidade" é o projeto de materialização de uma forma de vida ideal. Esta ideia distinguir-se-á ainda

de outras ideias fundadoras pelo facto de não remeter apenas para uma das muitas formas de vida particulares dos começos da sociedade burguesa, estratificada em corporações profissionais, mas antes — mercê das suas afinidades com a ciência e a verdade — para uma instância universal anterior ao pluralismo das formas de vida sociais. A ideia da universidade remete para os princípios culturais segundo os quais se constituem todas as configurações do espírito objetivo‖. (HABERMAS, 1993, p. 112 (grifos meus)

16 Humboldt e Schleiermacher associam à ideia de universidade dois pensamentos centrais. Em primeiro

lugar preocupa-os o problema das possibilidades de institucionalização da ciência moderna, liberta das

tutelas da religião e da Igreja, de modo a que a sua autonomia não seja posta em perigo por outras

instâncias — quer elas sejam as imposições da autoridade do Estado, que possibilita a existência exterior da ciência, quer se trate das pressões da sociedade burguesa, interessada nos resultados úteis do trabalho científico. Humboldt c Schleiermacher vêem a solução do problema numa autonomia científica com

organização estatal, que protegeria as instituições científicas contra as intervenções políticas e contra os

imperativos sociais. Por outro lado, interessa-lhes explicar também porque razão é do próprio interesse do

Estado garantir à universidade essa imagem exterior de uma liberdade ilimitada no seu interior. (HABERMAS 1993, p. 115)(grifos)

47 ostensivos, ainda que seu pensamento e sua ação estivessem entre essas determinações. (CUNHA, 2007, p. 21).

Daí então, o projeto de educação estar definido por múltiplas determinações externas e históricas, a concepção original de universidade encontra sua complexidade nas evidencias das medidas restritivas evocadas contra a modernização do ensino superior já no século XX17. As resistências de cunho democrático em boa parte eram concebidas pela concepção da ‗universidade crítica‘, expressão essa contrária ao projeto do governo autoritário.

A reflexão filosófica permite conduzir a ciência no campo do idealismo tendo como referencia três aspectos que totalizam a força da ciência: a) tradição cultural, b) socialização e c) integração social. A ciência filosófica, pensa de fato que a idéia de universidade deve libertar o homem de toda a sua unilateralidade e o saber constituir-se pela manifestação da extensão da unidade das ciências e da cultura geral, mediante esclarecimento crítico. A unidade na investigação e no ensino prepara as novas gerações de cientistas. A hermenêutica filosófica ainda continua a mercê do Estado18.

Tabela1: METODOLOGIA DE ENSINO NA UNIVERSIDADE BRASILEIRA

ELEMENTOS DE UMA TRAJETÓRIA