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CAPÍTULO V – ESGOTAMENTO DA MADEIRA E DEGRADAÇÃO AMBIENTAL:

5.5 A PROTEÇÃO DAS TERRAS FLORESTAIS

Desde o início do século XX, os agentes governamentais já se mostravam preocupados com a sustentabilidade da produção florestal e com a preservação ambiental. Em 1906 o Paraná criou o primeiro código florestal do Brasil, o qual já previa a necessidade de garantir a regeneração das florestas e a produção em regime sustentado. Entretanto, na prática, este código tornou-se letra morta. Em 1926, Romário Martin, no Paraná, já defendia a primeira proposta de desapropriação de áreas para a criação de reservas ambientais, a qual não foi aprovada.

Em 1939 o desmatamento estava fora do controle, e em 1948 estudiosos da época solicitavam leis para disciplinar a ocupação da terra (MAACK, 1968). A resposta do Governo Federal em 1949 através de lei dobrando os impostos sobre as áreas florestais intensificou o desmatamento, no intuito de acelerar o crescimento econômico do país. Em 1965, o Código Florestal Brasileiro regulou novamente o manejo sustentado das florestas nativas e estabeleceu que as propriedades rurais deveriam ter áreas de reserva legal e preservação permanente. Em contrapartida, o Ministério da Agricultura ainda fomentava o desmatamento como meio para a expansão da agricultura.

As medidas de ordem institucional e administrativa culminaram com a criação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em 1989, e do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal dando ao setor distinção e identidade política compatível com os objetivos e interesses compartilhados com outras nações no contexto mundial (PEREIRA, 2001).

De forma geral, as matas ciliares (ou florestas de galeria) são consideradas APP123,

bem como as formas de vegetação natural ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água em

faixa marginal dependendo da largura do mesmo124. Adicionalmente, determina-se APP as

áreas localizadas em declives superiores a 45º de declividade e topos de morro. De acordo com a região do país e tipologia vegetal existente se define o percentual da propriedade a ser averbado como Reserva Legal, que no Sul do Brasil é de 20%, onde é permitido o uso da

floresta mas impedia sua supressão125. Criavam-se diversas categorias de espaços terrestres

com limitações para a exploração florestal, antes realizadas livremente em qualquer local, independente do tipo de solo e vegetação.

Em 1992, “Devido a intensa exploração da planta e a diminuição e degradação de seu espaço natural”, a araucária e outras espécies, como o xaxim126, foram incluídas na lista de Perigo de Extinção (Portaria nº. 37-N/1992) (IBAMA, 1997), criando para estas espécies uma

123 Área de Preservação Permanente (APP) é a área protegida, “coberta ou não por vegetação nativa, com a

função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.”

124 pela Lei Federal n.º 4.771/65 (nos artigos 2º e 3º alterados pela Lei Federal n.º 7.803/89).

125 O Código Florestal Brasileiro (Lei 4.771/65) define o conceito de Reserva Legal como toda: “área localizada

no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.”. Esta denominação de Reserva Legal foi revista na Lei 7.803, de 18 de julho de 1989, que introduziu, entre outros aspectos, a exigência de averbação ou registro da Reserva Legal à margem da inscrição da matrícula do imóvel, sendo vedada “a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, ou desmembramento da área” (Art. 16 § 2º).

126 Dicksonia sellowiana, da família Dicksoniaceae, natural na Mata Atlântica das regiões Sul e Sudeste do

Brasil. A espécie é utilizada para a fabricação industrial de vasos, placas e palitos suportes para o cultivo de plantas ornamentais. Os vasos são feitos escavando-se fatias largas do pseudo-caule e, o pó residual é utilizado como substrato para a produção de orquídeas e samambaias (IBAMA, 1997).

nova relação de formas de controle de uso da floresta, sem necessária localização terrestre, ou seja, a despeito do sítio florestal. O controle da atividade florestal não estava alinhada ao tipo de solo, mas à espécie vegetal a ser explorada. Definiam-se normas específicas para a araucária, ou para a erva-mate, sem contudo, regular a intervenção no restante da vegetação.

A proteção das espécies ameaçadas, e a preservação de sítios de notável valor paisagístico (do ponto de vista estético), incentivaram a criação de Unidades de Conservação127. Em 1961 criou-se na região de Lages o Parque Nacional de São Joaquim, com 49.300 ha, abrangendo os Municípios de Urubici, Bom Jardim da Serra, Grão Pará, São Joaquim e Orleans. Sem implantação definitiva passou a sofrer contínua pressão extrativista (IBAMA, 1997) levando a perda de grande parte dos atributos que motivaram sua criação. Em 2001 é fechado o posto do IBAMA em Lages, que se não ajudava, dizia-se que atrapalhava.

O certo é que a função burocrática aumentava os custos, e postura fiscalizatória displicente, ou mesmo ausente, punha em risco atividades que insistiam em descumprir o código florestal e o dec. 750. O instituto não agradava. E uma de suas funções estatutárias continuava a fazer falta na região: fomento florestal e promoção de políticas públicas. As atividades do órgão não foram iguais em todos os setores, mantinha-se a serviço das redes vitoriosas do pinus, e punha-se contra as atividades perniciosas e socialmente excluídas do passado, como xaxinzeiros.

Este processo culminou na interpretação do bioma Mata Atlântica, composto por uma série de ecossistemas bastante diversificados, além de biologicamente distintos daqueles encontrados em outras regiões do país. A Mata Atlântica ainda abriga uma parcela expressiva da diversidade biológica do Brasil, com altíssimos níveis de endemismo. A riqueza pontual é tão significativa, que os dois maiores recordes de diversidade botânica para plantas lenhosas foram registrados na Mata Atlântica (PEREIRA, 2001)128. A percepção do processo de destruição deste ecossistema com grande riqueza biológica no início da década de 90, que levou a Mata Atlântica a uma drástica redução de sua cobertura vegetal original, que cobria cerca de 15% do território brasileiro, espalhados por 17 estados129, impulsionou o

127 Termo utilizado com efeito após a promulgação da lei 9.985 de 18 de julho de 2000, que trata do Sistema

Nacional de Unidades de Conservação, conhecida por SNUC, em 1997. Antes disto, diversos termos eram utilizados de forma imprecisa, como reservas e parques.

128 As estimativas indicam que a região abriga 261 espécies de mamíferos (73 deles endêmicos), 620 espécies de

pássaros (160 endêmicos), 260 anfíbios (128 endêmicos), além de aproximadamente 20.000 espécies de plantas vasculares, das quais mais da metade são restritas à Mata Atlântica. Mais de 2/3 dos primatas da Mata Atlântica são endêmicos a essa região. A densidade de espécies para alguns grupos indicadores, como por exemplo os roedores, pode ser superior à da Amazônia.

desenvolvimento de políticas de conservação da mata atlântica (CAPOBIANCO E LIMA, 1997).

A Mata Atlântica foi protegida pelo Decreto 750 embalada pela ECO 92. A inclusão da floresta de Araucária no âmbito da Mata Atlântica amplia a abrangência do decreto 750 que impede pela primeira vez o corte indiscriminado da floresta com Araucária, já presente na Lista Oficial de Espécies em Extinção. Reduziu-se a um reduto da Mata Atlântica, um Bioma que se estende do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul. A mata de araucária, que não possui muita diversidade vegetal, agora é parte do hotspot mundial e ameaçadíssima floresta tropical do Brasil, a Mata Atlântica.

Em 2001 o Brasil participava com 22% da área coberta com florestas tropicais úmidas em todo o mundo e com 58% em relação à América do Sul e se distingue dos demais países pela exuberância e pela diversidade biológica de seus recursos naturais. Seus ecossistemas variados e distintos representam 1/3 da fauna dos trópicos e 1/3 dos recursos hídricos da terra, correspondentes a 20% de toda a água doce do planeta (BRASIL, 2001). “As florestas ainda remanescentes constituem hoje uma imensa reserva de recursos naturais, cuja preservação e uso sustentável interessam não ao Brasil, mas a toda a humanidade” (PEREIRA, 2001).