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Da punição ao reforço: a saída de Skinner de Minnesota e a mudança para Indiana

5. DA INFORMALIDADE À FORMALIDADE: O INÍCIO DA ORGANIZAÇÃO

5.1 Da punição ao reforço: a saída de Skinner de Minnesota e a mudança para Indiana

Um primeiro convite para Skinner chefiar o departamento de psicologia em Indiana aconteceu em 1940, e foi mediado por outro behaviorista membro do corpo docente daquela instituição, Jacob R. Kantor (Capshew & Hearst, 1980; Skinner, 1979). Porém, a negociação que ocasionou a mudança de Skinner para Indiana apenas se concretizou em 194546 . A

Universidade de Indiana, assim como as demais universidades estadunidenses, teve significativa expansão em suas atividades de ensino e pesquisa, após a Segunda Guerra Mundial (Capshew & Hearst, 1980). Naquele momento, o sentimento generalizado de confiança nos rumos da nação, por meio dos avanços da ciência e tecnologia, repercutiu positivamente no desenvolvimento da psicologia, que havia participado ativamente dos esforços de guerra (Capshew, 1999). Na Universidade de Indiana, em resposta às demandas de ensino, aplicação e pesquisa, esse clima foi notado com o acelerado crescimento do departamento de psicologia. O súbito aumento do corpo docente, que de oito membros em meados de 1940 !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

46!Sobre o fato de ter sido contratado por outro expoente behaviorista, também com planos de

estabelecimento de uma ciência do comportamento, Skinner (1979) embora assuma simpatia pelo behaviorismo de Kantor, por esse também se ater a análises funcionais do comportamento, afirma ter aceitado o cargo exclusivamente em virtude da oportunidade de uma substancial melhoria nas suas condições de pesquisa e nos rumos de sua carreira. Skinner (1979) já havia reconhecido o trabalho de Kantor, em 1938, em The Behavior of Organisms, como exemplo de um behaviorista que enfatizou o valor da noção de relação funcional, da mesma forma que ele quis enfatizar em seu primeiro livro. Além disso, mesmo sem desenvolverem pesquisas conjuntas, para Fuller (1973), um ex-aluno de Kantor e Skinner em Indiana, a interação entre esses dois psicólogos resultou no fortalecimento da aplicação dos princípios operantes a partir do final da década de 1940 e início da década de 1950. Motivo para tanto foi a compatibilidade do pensamento desses dois cientistas, o que fez com que Kantor incentivasse muitos de seus alunos envolvidos com questões aplicadas a recorrem a conceitos e técnicas da análise do comportamento. Por isso, para Fuller (1973): “Sem a influência de Kantor, estudos operantes poderiam ter ficado exclusivamente no laboratório animal um longo tempo.” (p.324). Ainda que um tanto exagerada, a conclusão de Fuller (1973) expõe o contexto de Indiana, como um contexto favorável à disseminação da produção

ampliou-se para 40 membros ao final da década de 1950, bem como o expressivo aumento do número de disciplinas, vagas, financiamento e linhas de pesquisas, sinalizam o progresso da psicologia em Indiana (Capshew & Hearst, 1980).

Portanto, em contraste com o período de término da última bolsa de pós-doutorado de Skinner em Harvard, dez anos antes, em 1936, quando sofreu dificuldades para ingressar no mercado acadêmico e tinha escassas opções de escolha, a proposta de assumir a chefia do departamento de psicologia em Indiana, em meados da década de 1940, denota o contínuo reconhecimento de sua figura na comunidade científica. Porém, assumir um cargo de chefia era algo incompatível com sua experiência acadêmica, que foi orientada, desde o doutorado, para o trabalho exclusivo com a pesquisa. Por isso, Skinner (1979) admitiu que seu ingresso em Indiana implicaria exercer aquilo que ele havia evitado nos últimos anos: qualquer tipo de responsabilidade burocrática da vida acadêmica.

Apesar da presumível objeção de Skinner quanto às incumbências de um posto de chefia de departamento, ele aceitou o cargo sem maiores conflitos. Mas, tendo em vista o seu histórico de parca experiência e aversão por envolvimento na vida institucional, a contratação de Skinner para um cargo burocrático foi comentada por aqueles que conheciam seu apreço por um estilo de trabalho informal: Elliot e Heron, da Universidade de Minnesota, e o chefe de departamento de psicologia em Harvard, Boring. Em primeiro lugar, esses se mostraram surpresos com a contratação de Skinner, pois concordavam que ele não tinha qualificações para ocupar aquele cargo administrativo. Ademais, são unânimes em assegurar que Skinner era valioso demais cientificamente para assumir um posto de chefia, uma vez que ele tinha coisas muitos mais importantes a fazer. Essa alegação, pautada no reconhecimento das capacidades científicas de Skinner, contudo, não foi acompanhada de nenhum esforço para mantê-lo em Minnesota por

meio de uma contraproposta. Em realidade, Heron, por exemplo, se opôs a qualquer incentivo para mantê-lo naquela instituição, e declarou-se aliviado com a saída de Skinner (Wiener, 1996).

A transferência de Skinner para a Universidade de Indiana, para assumir um cargo de chefia, designa a primeira vista uma postura antagônica, uma vez que esse cientista havia se mantido deliberadamente, nos últimos dezessete anos de sua carreira, afastado de cargos burocráticos, de modo a se dedicar apenas às suas pesquisas. Mas esse antagonismo é dissolvido quando se observa que a decisão de Skinner tinha propósitos práticos bem definidos: recuperar sua independência científica de modo a estabelecer novamente um ambiente de trabalho no qual a realização de suas pesquisas fossem prioridade e não sofressem nenhum tipo de controle institucional, como havia acontecido parcialmente em Minnesota (Skinner, 1979).

Dentre as prerrogativas, para Skinner, em se transferir para Indiana, estavam a retomada de uma localização geográfica estratégica para manter contatos com outros psicólogos, participar dos principais eventos científicos da área, construir um laboratório para realização de pesquisas fundamentadas em seu sistema científico e orientar alunos de mestrado e doutorado sem medo de represálias e sem a mínima necessidade de se associar a métodos de pesquisas incompatíveis com o seu (Skinner, 1979, pp. 284-285). Todas essas vantagens foram assim consideradas por ele como capazes de aumentarem sua influência profissional e liberdade científica. Como ele afirmou:

Eu aceitei a oferta de Indiana em parte porque eu estava me sentindo muito fora das coisas. ...Sob as restrições do tempo de guerra, eu não participei de nenhum encontro profissional e perdi contato com meus velhos amigos no Leste. (Skinner, 1979, p.285).

Minha posição em Indiana conseguiria mais peso profissional. Eu poderia construir um novo laboratório para aproveitar o que tínhamos aprendido no Pigeon Project . Eu poderia escapar daquele santuário à memória de R. A. Fisher – aquela monstruosa caixa de 24 compartimentos – e estudar um rato ou um pombo por vez. Eu poderia ter os meus próprios alunos de pós- graduação. (1979, p.286).

Ainda que tenha aceitado o cargo de chefia em Indiana com vistas a retomar o desenvolvimento de suas pesquisas, Skinner esboçou um plano de mudanças para o departamento de psicologia. Sua primeira proposta previa alterações drásticas no curso introdutório de psicologia daquela universidade, visto que mesmo antes de assumir seu novo cargo tomou conhecimento de que aquele curso era percebido, por docentes e alunos, como uma forma de estudantes de outros cursos complementarem seus créditos de maneira extremamente fácil. Por essa razão, professores de diversos departamentos, em meados da década de 1940, propuseram a sua extinção (Skinner, 1979; Wiener, 1996). Para evitar isso e mudar a imagem do ensino de psicologia em Indiana, Skinner sugeriu sua reestruturação, e aludiu que Keller seria a pessoa ideal para desempenhar aquela tarefa. Mas Skinner não anteviu que propor aquela mudança implicaria lidar com um “terreno sagrado” (1979, p.285), uma vez que tanto Kantor quanto os demais professores daquele departamento lecionaram, durante anos, seus cursos introdutórios de maneira independente, e com conteúdos definidos por motivações teóricas e metodológicas individuais. Razão pela qual, logo após sugerir a alteração daquele curso, Skinner recebeu uma carta incisiva de Kantor, repreendendo-o por sugerir aquelas modificações em Indiana. Por isso, Skinner desistiu de seus planos. Além do mais, Keller estava satisfeito com suas condições de trabalho em Columbia e indisponível para assumir o cargo (Keller, 2009; Skinner, 1979).

Esse é o único episódio, mencionado por Skinner (1979), no qual uma tentativa efetiva de transformação no cenário institucional de Indiana foi de fato empreendida por ele. Outros

planos foram descritos por Skinner (1979, p.286) sempre de forma superficial, sem evidencias de empenho concretos de sua parte. Na verdade, ainda no primeiro ano no cargo de chefia em Indiana, Skinner (1979) mostra crescente insatisfação com as tarefas burocráticas e os encargos políticos demandados por sua ocupação. De modo a lidar com tal cotidiano institucional, Skinner contratou um assistente qualificado e bem pago, e elaborou, em conjunto com esse, meios eficazes para administrar o departamento, sem que essa atividade ocupasse muito de seu tempo e sem, principalmente, prejudicar suas atividades de pesquisas. Com isso, ainda que em um cargo de chefia, Skinner recuperou e conservou estilo de trabalho similar àquele quando era um estudante de pós-graduação em Harvard.

Decerto, ocupar um cargo de chefia em Indiana apenas fortaleceu a aversão de Skinner pela vida burocrática e institucional no cenário acadêmico. Quando de sua saída de Indiana, em 1947, essa aversão e seus efeitos são descritas nos seguintes termos: “Eu tinha visto o lado político da administração universitária e resolvi nunca mais ver isso de perto novamente” (1979, p.340)47 . Mas, ainda que Skinner evidencie seu desprezo pela vida burocrática da ciência, sua passagem por Indiana como chefe de departamento marca um momento especial no processo de institucionalização de sua ciência. Neste período, em conjunto com Keller, Skinner empreende um dos primeiros esforços de organização comunitária de sua ciência, com a realização da primeira conferência de análise experimental do comportamento em Indiana.!

Antes de procedermos com a descrição e análise da realização do primeiro evento científico da análise do comportamento averiguamos a manutenção do contato informal entre Skinner e Keller no início da década de 1940; visto que parte da história do início da organização comunitária da análise do comportamento é explicada e ao mesmo tempo !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

47!Embora alegue nunca mais querer participar da vida institucional na ciência, Skinner assumiu, em

1947, a presidência da Midwestern Psychological Association e da Pavlovian Society no início da década de 1960 (Skinner, 1984b,). Todavia, acerca desses cargos, Skinner apenas os mencionam de forma breve, dando a entender

representada na posição assumida por Keller, a partir do final da década de 1930, como um divulgador e adepto, ainda que informal, do projeto científico skinneriano.

5.2 Indo além da informalidade: Keller e o início da disseminação e formalização da

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