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CAPÍTULO 3 O Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública e o contexto da

3.6 Da implementação e acomodação do processo avaliativo externo no cotidiano escolar

3.7.2 O que os resultados das avaliações externas têm revelado na visão dos sujeitos

Quando indagados sobre o que os resultados das avaliações externas estaduais têm evidenciado, obtivemos as seguintes respostas, em ordem decrescente de citação:

• O alcance de metas pela escola (17 citações); • Tão somente números (15 citações);

• Refletem o desinteresse e desmotivação por parte dos alunos e a falta de objetivo dessas avaliações para os discentes (10 citações);

• Os resultados têm mostrado a realidade e estão dentro do esperado (8 citações); • O nível dos alunos tem melhorado (5 citações);

• Os alunos com dificuldades que precisam ser mais bem preparados para os testes (5 citações);

• Os resultados não refletem a realidade (4 citações);

• Que os professores precisam melhorar suas práticas pedagógicas (1 citação); • Inadequação dos programas de ensino (1 citação).

Contrariamente ao que se prevê no discurso oficial, apenas dois entrevistados apontam que os resultados revelam a necessidade de intervenções, dentre as quais ressaltam a diminuição do número de alunos por turma e seu uso como fonte de dados para o governo.

Para os entrevistados, as avaliações revelam ainda a variabilidade dos resultados segundo a turma: “Há oscilações, pois as turmas avaliadas não são as mesmas e não dá para comparar”. (Professora da Escola E, entrevista realizada em 20 de junho de 2012).

A Diretora da Superintendência de Avaliação Educacional, porém, sustenta que a “clientela” não muda muito de ano para ano e que independente de quais turmas vão estar na escola no próximo ano, as avaliações devem servir à gestão pedagógica e ao planejamento escolar.

A clientela é sempre a mesma. Vamos colocar que tem [sic] duas escolas particulares no interior e uma pública, os alunos da escola pública vão ser sempre aquela clientela da escola pública. Os menos favorecidos da cidade. Não dá um salto de um ano pra outro, nível socioeconômico, cultural, não pula de um ano pra outro. (Maria Inês Barroso Simões, entrevista cedida em 21 de julho de 2012)

Conclui-se que há diferença no pensamento do órgão central e no pensamento dos sujeitos que atuam nas escolas, o que pode ser um dos fatores para a não apropriação dos resultados. Para os professores e gestores escolares o foco é o aluno. Para a Secretaria o foco é a escola. Para a escola a clientela muda de ano a ano. Para a Secretaria, não. Essa divergência é geradora de problemas.

Dentre as consequências inesperadas advindas dos resultados do SIMAVE, destaca-se a pressão e o sentimento de injustiça decorrentes da consideração pelos sujeitos entrevistados de que as avaliações externas não vêm refletindo a realidade devido ao treino. Outra consequência comentada foi a responsabilização de professores pelos resultados:

Já teve assim, por exemplo, uma escola que sempre fica bem, tira resultados bons, aí um ano sei lá, com uma determinada professora, eu não sei o que aconteceu, caiu. Aí nossa, foi assim, uma escola inteira, a prefeitura inteira, a secretaria inteira, chamou ela, fechou numa sala, eu acho que isso é uma coisa assim, ela que levou, ela que levou. Contratada, ela que levou. (Professor da Escola, entrevista cedida em 19 de junho de 2012)

Em consonância com o que foi apontado pelos alunos nos Grupos Focais, percebe-se a criação de expectativas sobre turmas consideradas “melhores”. Considera-se uma consequência inesperada quando essa expectativa é frustrada:

Aquilo que eu te falei, às vezes a turma é muito boa e você fala, essa turma vai “arrebentar” né, e de repente, o resultado vai lá embaixo. Foi o que aconteceu conosco no ano passado. Nós pensamos que a turma ia ficar assim, que ia brilhar, e o nosso resultado não foi bom. Não tem nenhum fator que tenha interferido. Nada! A prova foi tranquila, quem aplicou foi a supervisora, o pessoal da Superintendência estava aqui, tranquilo também, não estava fazendo pressão dentro da escola não, o pessoal estava calmo, ambiente tranquilo, não teve nada que interferisse. Os meninos calmos, tranquilos, a turma toda, tinha faltado uma aluna que tinha ido ao dentista, ela ainda chegou a tempo, sabe? Ainda fez a prova também, todos fizeram, acharam a prova fácil, não acharam a prova difícil, esse é o meu medo, quando eles falam que a prova tá fácil, ai meu Deus. E não foram bem na prova. Então há essa possibilidade sim. (Diretora da Escola E, entrevista cedida em 20 de junho de 2012)

É possível inferir que se estabelece nas escolas investigadas uma associação direta entre o resultado da instituição e o trabalho do professor naquele ano.

Se o resultado é bom, a escola é ótima, o professor é ótimo. Se o resultado é ruim, coitadinho do professor. Não refletem a verdade. Não! Não! (ênfase) Não! Às vezes a gente esforça, a gente peleja de tudo quanto é jeito, mas não é só o que a escola, porque não é só o resultado de um ano, é uma vida inteira que o aluno vem. E aquela professora que tá lá no dia, ela leva! Se for bom ela leva o mérito, se for ruim ela leva, entendeu?! Isso aí é uma coisa assim, o aluno vem ruim no quinto ano e isso vem desde a educação infantil, vem passando por todas as etapas, não é só aquele ano que avalia. Então se for bom, ótimo pro professor. Se for ruim, coitadinha dela. Você pode ver que quando vai pegar aula, por exemplo, as professoras fogem de turmas que têm que fazer estas avaliações. Então sobram sempre pros contratos. E se elas forem ruins, coitadinha de nós. A gente que se vire, a gente que leva, entendeu? Não é só de um ano, é de um decorrer de um tempo escolar do aluno, não é resultado só de um ano não. (Professor contratado da Escola C, entrevista cedida em 19 de junho de 2012)

De acordo com o questionário, 50,6% acreditam não haver convergência entre os resultados do SIMAVE e os resultados das avaliações internas da escola. Aprofundando essa questão por meio da entrevista, dentre as justificativas apresentadas pelos entrevistados está o fato de as avaliações internas contemplarem melhor a realidade dos alunos do que as avaliações externas e a consideração da diferença nos instrumentos avaliativos. O trecho apresentado a seguir correlaciona o desempenho do aluno na avaliação externa ao treino para a prova:

Não, nem sempre, porque, por exemplo, a minha avaliação aqui da escola, eu dou com o olhar de tudo que o aluno aprendeu no percorrer do ano, e o aluno que vem na escola de vez em quando, ele é capaz de fazer algumas questões da minha prova, porque eu não estou avaliando ele só esse ano, eu to [tô] avaliando ele no que ele aprendeu no ano passado, e ele não é capaz de fazer da avaliação externa, porque ele não participou... do treinamento. Entendeu? (Professor da Escola C, entrevista cedida no dia 19 de junho de 2012)

Para a Diretora da Escola E os resultados não convergem porque as avaliações do SIMAVE são muito extensas.

Não há convergência nos resultados. O contrário. Sabe por quê? Os nossos professores têm tentado, principalmente de primeiro ao quinto, trabalhar, a fazer as provas de acordo com as provas do SIMAVE, né, bem contextualizadas, bem descritivas, do jeito que é pedido, do jeito que é pedido no CBC, né, do jeito que o supervisor pede pra eles. Ali na sala eles saem bem. Eu acho que é muita coisa. O caderno é muito grande, é muita matéria, o menino cansa, sabe? Isso é opinião minha. Não sou pedagoga não. Se hoje fosse a prova de Português, com menos questões, fosse a de texto hoje, amanhã a de gramática, amanhã fosse a de Matemática, sabe, assim, menos coisas, talvez rendesse mais. (Diretora da Escola E, entrevista cedida no dia 20 de junho de 2012)

Para os que acreditam haver convergência, dentre as justificativas predomina a da adequação das avaliações internas às avaliações externas e a aplicação de simulados. Para a diretora da Escola E, as avaliações externas são o retrato da escola e a convergência é

revelada inclusive quando o aluno marca aleatoriamente uma questão, pois segundo a mesma, esta é a realidade da escola e que deve ser repensada. A diretora considera que o enfoque que a escola dá para si mesma é retrógrado em relação às mudanças atuais e que a leitura de números se faz necessária. Segundo um professor da Escola E, essa convergência aparece ainda melhor nas avaliações do PROALFA que retornam o resultado de cada aluno. “No SIMAVE, os que destacam para melhor ou pior a gente já conhece. Os outros ficam juntos na média e não sabemos onde cada um está.” (Em 20 de junho de 2012) “Há convergência uma vez que as provas bimestrais são elaboradas nos moldes do SIMAVE” (Professor da Escola E, entrevista cedida em 24 de agosto de 2012).

Segundo o Secretário Municipal de Educação, há convergência tanto entre as avaliações do SIMAVE e as avaliações internas escolares quanto entre as avaliações externas estaduais e federais: “vem lá PROALFA, sai o resultado '95% dos alunos foram alfabetizados nesta escola', entendeu? Não tem evasão, 1%, praticamente não tem evasão, e depois vem o PROEB, configura o resultado, e depois vem o IDEB, 2 em 2 anos, e sempre convergem”.

Para a Diretora da Superintendência de Avaliação Educacional da SEE/MG, as avaliações externas estaduais e federais convergem pelo fato de seguirem as mesmas diretrizes nacionais. Segundo a mesma, são utilizados inclusive alguns itens da Prova Brasil para equalização e comparação, sendo exigido apenas o básico do aluno, pelo que a entrevistada afirma os resultados ainda estão muito ruins, uma vez que a matriz de referência da avaliação não envolve habilidades com níveis de complexidade altos.

O discurso da SRE é revelador:

Tem hora que o resultado da avaliação externa mostra um aluno que não sabe nada e o resultado da escola só tem nota azul. E às vezes tá exatamente o contrário. Aqui tá lá em cima e o resultado da escola tá lá em baixo. Um exemplo disso é a escola que reprovou um aluno que teve mais de 600 no PROALFA, e reprovou ele no terceiro ano. E ele estava no nível recomendável. (Reunião da SRE, 26 de junho de 2012)

Quando indagados em entrevista a quem ou a quê atribuem o bom ou mau desempenho dos alunos, encontrou-se que o bom desempenho é resultado do trabalho coletivo de alunos, professores e equipe gestora em função da dedicação (7 citações) e do treino (1 citação). Já o mau desempenho segundo os docentes é atribuído em primeiro lugar aos alunos (14 citações), seguido pelo sistema ( 7 citações), pela família (5 citações), pelos professores (4 citações), e finalmente por todos (1 citação). Buscando elucidar o que se entende por “sistema” na fala dos respondentes, apreende-se que os atores entrevistados designam genericamente como sistema o próprio governo, seus projetos e ações destinados à educação ou a ausência destes. Nesse sentido, o baixo desempenho atribuído às disfunções do sistema

compreendem, na visão dos sujeitos entrevistados, alguns projetos “de passar alunos”; falhas no programa, como a não responsabilização do aluno manifesta pela não atribuição de notas individualizadas no PROEB (10 citações); e problemas estruturais como a superlotação de salas. É questionada ainda a existência de muitas provas e a formação do professor (4 citações). É considerada a responsabilidade da família pelo baixo desempenho dos alunos na medida em que falta o apoio e a participação desta na vida escolar do aluno (4 citações). A atribuição do baixo desempenho aos alunos é justificada pelo desinteresse que o aluno manifesta, por exemplo, no alheamento durante a prova, nos “chutes” e na sua falta de compromisso (10 citações). A atribuição aos professores do baixo desempenho se deu em função de serem os mesmos responsabilizados pela nota da escola.