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4.4 A REGULAÇÃO COM A TIR FLUTUANTE

4.4.1 Realinhamento da TIR aos Custos de Oportunidade

As sete concessões federais leiloadas em 2007 foram balizadas por uma TIR de 8,95%, definida a partir do custo de capital, que por sua vez é determinado com base em uma

série de fatores econômicos e financeiros, os quais são afetados diretamente pelo cenário econômico interno e externo, bem como pelas condições de estabilidade institucional do país, conforme já demonstrado neste trabalho. Isso explica porque as taxas desses leilões foram tão inferiores àquelas praticadas nas concessões da primeira etapa, iniciadas no final da década de 1990 e que estão vigentes até hoje.

Na tabela a seguir, apresenta-se o resultado do leilão, com as tarifas máximas estabelecidas nos editais e as respectivas tarifas vencedoras com os correspondentes deságios alcançados:

Tabela 11 - Resultado do leilão da segunda etapa do PROCROFE Lote Máxima Tarifa Vencedora Tarifa Concessionária Vencedora Deságio

Lote 01 4,083 2,450 BRVias 40,00%

Lote 02 4,188 2,540 OHL Brasil 39,35%

Lote 03 4,037 2,940 Acciona 27,17%

Lote 04 3,824 2,258 OHL Brasil 40,95%

Lote 05 2,884 0,997 OHL Brasil 65,43%

Lote 06 2,685 1,364 OHL Brasil 49,20%

Lote 07 2,754 1,028 OHL Brasil 62,67%

Fonte: ANTT

Considerando as tarifas máximas estabelecidas e os fluxos de caixa propostos nos leilões, a TIR atingiria os 8,95% em cada um dos projetos, entretanto, como os proponentes apresentaram as suas propostas com um determinado deságio, baseados nas suas perspectivas de custos e receitas, uma nova taxa passou a ser a referência das concessionárias.

As tarifas desses contratos são indexadas contratualmente pela variação anual do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), sem prejuízo de eventuais alterações oriundas de revisão do equilíbrio econômico-financeiro, as quais podem ocorrer a qualquer momento em virtude de um fato de força maior ou pelas revisões quinquenais que estão previstas nos contratos, com o objetivo de compatibilizar o projeto às reais necessidades advindas da dinâmica das rodovias.

Esse conjunto de regras contratuais é que garante a manutenção da TIR constante ao longo da vigência das concessões, independentemente das variações do custo de capital e que, segundo a ótica deste estudo, deveriam ser revistas de modo que a taxa pudesse flutuar de acordo com as variações desse custo.

Imagine-se um cenário econômico semelhante ao que ocorre no Brasil nos últimos anos, de estabilidade institucional e econômica, queda na taxa de juros e perspectiva de crescimento e, por consequência, redução nos custos de capital. Para efeito da simulação, considerou-se uma variação no IPCA nos próximos cinco anos idêntica à que ocorreu nos cinco anos que antecederam a assinatura dos contratos, ou seja, 28,71%. Nessas condições, dentro de cinco anos as tarifas seriam as seguintes, caso não houvesse nenhum evento que provocasse alteração por desequilíbrios contratuais:

Tabela 12 - Tarifas reajustadas no sexto ano Lote Tarifa Inicial Tarifa Reajustada

Lote 01 2,450 3,153 Lote 02 2,540 3,269 Lote 03 2,940 3,784 Lote 04 2,258 2,906 Lote 05 0,997 1,283 Lote 06 1,364 1,756 Lote 07 1,028 1,323

Fonte: Elaborado pelo autor

Também em função do cenário positivo, supõe-se que a TIR, baseada num custo de capital atualizado pelos mesmos critérios adotados na origem das concessões, caia para 5,28%. Nessas circunstâncias, em tese, o capital das concessionárias estaria sendo remunerado por uma TIR de 8,95%, enquanto o custo de oportunidade seria de 5,28%, o que poderia ser corrigido na revisão quinquenal por meio da metodologia de realinhamento que estamos propondo.

Essa metodologia consiste em reconstituir o fluxo de caixa do leilão com uma tarifa máxima que produza a nova TIR atualizada, e sobre ela seriam aplicados os mesmos deságios oferecidos pela concessionária, dando origem à tarifa contratada realinhada pelo custo de oportunidade atual, a qual seria corrigida pelo IPCA do período a fim de repor a mesma perda inflacionária embutida na tarifa vigente.

Para compreender e avaliar os efeitos práticos dessa proposta, tomou-se como exemplo o Lote 6, cuja tarifa iniciou em R$ 1,364 em 2008 e, após cinco anos, atingiria R$ 1,756, segundo o cenário proposto.

Segundo a metodologia proposta, tem-se que trazer a TIR para 5,28%, a fim de adequar o projeto aos níveis do custo de capital atual e, para tanto, considerando o fluxo de caixa do edital, a tarifa máxima que produziria tal resultado seria de R$ 2,15. Como o deságio

desse lote atingiu 49,20%, tem-se que aplicá-lo sobre a nova tarifa máxima, e assim chegar a uma tarifa realinhada de R$ 1,092. Essa tarifa estaria posicionada na data de origem do leilão, portanto, resta corrigi-la em 28,71%, recolocando-a nos níveis da data da revisão, ou seja, a nova tarifa seria de R$ 1,406.

Na tabela a seguir demonstra-se resumidamente a sequência descrita:

Tabela 13 - Realinhamento em cenário de redução do custo de capital

Dados 2007 2013 TIR 8,95% 5,28% Tarifa Máxima 2,685 2,150 Deságio 49,20% 49,20% Tarifa c/ deságio 1,364 1,092 IPCA 28,71% 1,756 1,406

Fonte: elaborada pelo autor

A evolução temporal desse exemplo pode ser visualizada no gráfico a seguir, onde é demonstrado o ponto de redução das tarifas, realinhando-as ao cenário de queda do custo de capital: 1,00 2,00 3,00 4,00 5,00 6,00 7,00 8,00 9,00 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 Período

Custo de capital decrescente

Realinhamento das tarifas ao custo de capital

Figura 15 - Cenário de decréscimo do custo de capital Fonte: Elaborado pelo autor

Numa situação inversa, de uma economia em crise, com deterioração dos indicadores econômicos, supõe-se que, no mesmo período de cinco anos, o custo de capital aponte para

uma TIR de 12,80% e variação do IPCA de R$ 41,20%, o que faria com que a tarifa reajustada do Lote 6 estivesse em R$ 1,926.

A tarifa máxima necessária para produzir a nova TIR, nesse caso, seria de R$ 3,28, que descontada pelo respectivo deságio e corrigida pela variação do IPCA do período, atingiria R$ 2,353, conforme resume a tabela a seguir:

Tabela 14 - Realinhamento em cenário de aumento do custo de capital

Dados 2007 2013 TIR 8,95% 12,80% Tarifa Máxima 2,685 3,280 Deságio 49,20% 49,20% Tarifa c/ deságio 1,364 1,666 IPCA 41,20% 1,756 2,353

Fonte: elaborada pelo autor

Da mesma forma como no cenário de redução do custo de capital, demonstra-se no gráfico a seguir, a evolução das tarifas e o respectivo ponto de realinhamento:

1,00 3,00 5,00 7,00 9,00 11,00 13,00 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 Período

Custo de capital crescente

Realinhamento das tarifas ao custo de capital

Figura 16 -Cenário de crescimento do custo de capital Fonte: Elaborado pelo autor

O método aplicado, em tese, ajustaria as tarifas aos custos de oportunidade atuais, mantendo-as, porém, dentro das condições estabelecidas nos leilões, atenuando disparidades como as que vêm ocorrendo atualmente com concessões apresentando TIR de até 25%, com tarifas básicas de R$ 0,145 por km, como é o caso da rodovia Osório - Porto Alegre, tendo por paradigma as últimas concessões federais com taxa de 8,95% e tarifas de R$ 0,022 por km, como por exemplo, na Autopista Régis Bittencourt.

5 CONCLUSÕES

As grandes mudanças de paradigma na administração pública, ocorridas em vários países, a partir dos anos 1980, também foram adotadas no Brasil, fazendo-se sentir fortemente na política de financiamento da infraestrutura. A carência de recursos orçamentários, aliada à política crescente em todo mundo de reduzir a participação do Estado na economia, fizeram com que os governos buscassem alternativas no setor privado para financiar atividades que até então eram de responsabilidade exclusiva ou majoritária do setor público.

A onda de privatizações e concessões de serviços públicos alcançou o Brasil numa época em que o país recém havia saído de um longo processo inflacionário crônico, tendo experimentado, nesse período, uma série de planos econômicos frustrados e choques heterodoxos que quebraram contratos e não alcançaram os objetivos desejados.

A concessão à iniciativa privada da exploração de rodovias, mediante a cobrança de pedágio, foi a alternativa utilizada pelo governo para recuperar e ampliar a malha rodoviária que estava deteriorada pela falta de investimentos de longa data.

Para que as concessões fossem bem sucedidas, uma legislação específica foi editada, prevendo a garantia do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, com o objetivo de atrair investidores, garantindo-lhes a estabilidade dos contratos e uma taxa de retorno ao longo da vigência das concessões.

A política tarifária aplicada às concessões de rodovias, prevista no capítulo IV da Lei 8.987/95, restringe-se a estabelecer as condições de manutenção do equilíbrio econômico- financeiro, cujo modelo apresenta distorções em virtude da já mencionada falta de sincronia com o custo de capital ao longo da vigência dos contratos, bem como pela desconsideração dos ganhos de eficiência. Essas distorções afetam as tarifas de forma significativa, inclusive causando embaraços aos usuários que podem interpretar que as diferenças de preços são fruto de políticas governamentais. Não são raras as críticas a determinados governos estaduais pelos elevados preços dos pedágios, especialmente quando comparados aos das novas concessões federais, todavia, muitos usuários ignoram que os preços elevados também atingem diversas concessões federais da década de 1990.

Assim, não é compreensível ao usuário conviver com tais diferenças de tarifas, especialmente se for levada em consideração a existência de uma agência nacional encarregada de regular o setor. Não há dúvida que o papel das agências pode e deve ser rediscutido. Saravia (2007) ressalta que as agências poderão desempenhar seus papéis de

executores de políticas públicas de forma mais eficaz, na medida em que os ministérios assumam integralmente a sua função de formuladores dessas políticas.

Este trabalho buscou aprofundar a discussão sobre a regulação por meio da TIR estática utilizada nesses projetos de longo prazo, tendo em vista que os fatores que determinam o custo de capital, e por consequência a taxa de retorno, são afetados por variáveis endógenas e exógenas à concessão, inclusive pela estabilidade institucional do país.

Demonstrou-se que as tarifas de pedágio dos contratos da primeira etapa das concessões, contratadas com TIR média de 18,87%, apresentam preços significativamente mais elevados que as estabelecidas nas concessões contratadas em 2008 com taxa de 8,95%.

A fixação da TIR no patamar 8,95%, atraindo concorrentes com ofertas de tarifas ainda menores, demonstra que essa taxa não tem origem apenas numa mera decisão política, mas que os custos de oportunidade caíram muito em relação às primeiras concessões.

O equilíbrio econômico-financeiro garante a manutenção das taxas contratadas fixas ao longo da vigência dos contratos, provavelmente permitindo aos monopólios naturais uma remuneração superior aos padrões atuais, a qual é compulsoriamente arcada pelos usuários.

A análise das demonstrações contábeis das concessionárias e dos relatórios dos órgãos concessores e reguladores indicou que as taxas realizadas, ainda que inferiores às contratadas, estão muito acima dos custos de oportunidade atuais e que a grande assimetria de informações encontrada sugere que alguns projetos podem alcançar taxas até superiores às contratadas. Também foi demonstrada a formação de consórcios e holding com a participação de construtoras do setor rodoviário, que assumem a condição de fornecedores e acionistas, o que pode indicar a remuneração indireta dos investidores.

O longo prazo de vigência dos contratos, normalmente superiores há 20 anos, exige que a legislação seja aperfeiçoada com a inserção de mecanismos de proteção, tanto para os usuários quanto para as concessionárias, com o objetivo de compatibilizar a remuneração do capital aos custos de oportunidade atualizados. Dessa forma, os usuários teriam uma compensação tarifária nas revisões quinquenais, uma vez que no setor rodoviário não é previsto nenhum mecanismo de repartição de ganhos de produtividade com os usuários, como ocorre, por exemplo, no setor de energia elétrica. Normalmente, tal mecanismo é representado na equação da tarifa, presente nos contratos de concessão de distribuição de energia elétrica, pelo fator X.

Considerando as dificuldades já mencionadas para identificar as taxas de retorno efetivamente realizadas pelas concessionárias, desenvolveu-se uma metodologia alternativa de

realinhamento da TIR de referência, baseada da recomposição das condições estabelecidas nos respectivos leilões.

Por essa metodologia, a TIR de referência é ajustada com base no custo de capital atualizado, e a tarifa máxima é recalculada por meio do fluxo de caixa original do leilão. A nova tarifa básica seria estabelecida pela aplicação dos mesmos percentuais de deságio originais sobre a nova tarifa máxima encontrada, e corrigida pelo respectivo indexador previsto no contrato.

As simulações realizadas, tanto em cenários de crescimento quanto de queda dos custos de capital, demonstraram os efeitos práticos nas tarifas, as quais poderiam ser reduzidas ou aumentadas, dependendo do comportamento dos indicadores econômicos que afetam os custos de capital e do indexador contratual das tarifas.

Assim sendo, essa metodologia, com os devidos aperfeiçoamentos e ampliação dos testes, poderia ser uma alternativa para tornar mais eficiente o modelo de regulação do equilíbrio econômico-financeiro pela TIR.

Evidentemente que as alterações propostas só poderiam alcançar as concessões vigentes por meio de negociações com as concessionárias, sob pena de caracterizar quebra contratual e afetar o risco regulatório. Entretanto, muitos dos contratos estão no fim da vigência, portanto, uma nova etapa de concessões deverá ocorrer em poucos anos, sem contar eventuais novos projetos que deverão ser implantados, o que pode ser uma oportunidade para aperfeiçoar a legislação, visando proteger os agentes das flutuações econômicas durante longos períodos, como é o caso das concessões de rodovias.