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REFLEXÕES GERAIS SOBRE O COTIDIANO ESCOLAR – PRIMEIRAS PERCEPÇÕES

Desde o mês de agosto de 2018, os bolsistas do Núcleo de Pibid Geografia vêm experimentando processos formativos e momentos diversos de acúmulo de experiência através da observação do trabalho docente e do desenvolvimento de práticas pedagógicas em turmas do sexto e oitavo ano da EMEF Veneciano junto à professora supervisora e aos docentes do Curso de Licenciatura em Geografia do Campus Nova Venécia que acompanharam os trabalhos institucionais.

Os licenciandos bolsistas foram organizados em coletivos de trabalho para inicialmente fazer o acompanhamento da dinâmica escolar, e das atividades pedagógicas que já vinham sendo desenvolvidas pela supervisora na referida escola, refletindo sobre as demandas e os principais desafios do processo educativo da unidade de ensino, visando, em um segundo momento, ir além do acompanhamento, através de uma participação mais ativa por meio da proposição e do desenvolvimento de atividades didáticas.

A partir da observação, os bolsistas foram designados a realizarem relatórios mensais sobre essas experiências e a planejar projetos de intervenções que atendessem às necessidades encontradas, buscando sempre o diálogo entre essa realidade escolar e seus

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saberes teórico-acadêmicos, sobretudo com os princípios da Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire (1978). Por intermédio da leitura dessa obra de Freire (1978), proposta pelos coordenadores do programa, foi feita uma reflexão crítica sobre alguns desafios e dilemas docentes na perspectiva desse autor, como a defesa implacável que ele faz do princípio de que o homem não deve ser visto no processo de ensino-aprendizagem como um objeto, apenas como um “reservatório de conteúdos”, mas como sujeito construtor da própria história, capaz de problematizar suas relações com o mundo, cabendo ao educador, em constante diálogo com ele, ser uma espécie de instigador do saber. E, para tal objetivo, é imprescindível ao educador conhecer a realidade dos educandos.

Nesse sentido, a prática de observação e de inserção no ambiente de uma sala de aula proporciona a possibilidade de conhecer e compreender as diferentes realidades socioeconômico-culturais dos sujeitos que compõem o universo escolar e as características desse tempo-espaço a fim de esquematizar ações que sejam mais efetivas no processo de ensino-aprendizado, o que torna-se mais difícil se o educando é tratado de forma indiferenciada, desconsiderando sua situação estrutural, suas experiências pessoais, sua personalidade, etc.

Dessa forma, como diz Paulo Freire, é preciso sempre se colocar na condição de aprendiz da própria experiência e refletir sobre o processo de ensinar e aprender, partindo do princípio de que o docente não deve ser apenas um transmissor de conhecimento:

O educando precisa assumir-se como tal, mas assumir-se como educando significa reconhecer-se como sujeito que é capaz de conhecer o que quer conhecer em relação com o outro sujeito igualmente capaz de conhecer, o educador e, entre os dois, possibilitando a tarefa de ambos, o objeto de conhecimento. Ensinar e aprender são assim momentos de um processo maior – o de conhecer, que implica reconhecer (FREIRE, 2003, p. 47).

É ponto pacífico, dentre aqueles que escrevem este artigo, que o contato direto com uma realidade escolar concreta, in loco, mostrou-se inspiradora e incentivou os futuros profissionais da educação a desenvolverem sua sensibilidade de observação e de percepção e os instigou a buscar cada vez mais experiências que fomentem o seu saber como futuro docente.

Por diversas ocasiões, foi possível perceber, por exemplo, que os educandos mais jovens (como os do sexto ano do ensino fundamental, por exemplo) tendem mais a precisar de uma forma de incentivo para participar mais ativamente da aula, o que normalmente é obtido com propostas de atividades mais dinâmicas, uma vez que, em situações didáticas convencionais/conservadoras, eles tenderam a se mostrar bastante dispersos, apáticos. Em geral, aulas tradicionais, usando apenas a exposição do conteúdo por meio do quadro e/ou dos livros didáticos não conseguem despertar o interesse desses sujeitos, demonstrando a importância de se buscar inovar com atividades mais lúdicas, tais como brincadeiras, “viagens de descoberta” (as aulas de campo), exibição de filmes, documentários, etc.

Em suma, constatou-se que os discentes, em geral, se mostram pouco interessados/ atraídos pelas práticas docentes mais tradicionais/conservadoras, consideradas por

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RODRIGUES, Eduarda | MENEZES, Fagner JUVENCIO, Júlio | MACEDO, Sirlene

eles como “velhas”, as quais são incapazes de despertar sua curiosidade, o que explica o empenho observado na professora supervisora em tentar inovar, para que os alunos tenham mais interesse por suas aulas. Nesse sentido, ela parece fazer coro a alguns princípios de Freire:

Antes de qualquer tentativa de discussão de técnicas, de materiais, de métodos para uma aula dinâmica assim, é preciso, indispensável mesmo, que o professor se ache “repousado” no saber de que a pedra fundamental é a curiosidade do ser humano. É ela que me faz perguntar, conhecer, atuar, mais perguntar, reconhecer. (FREIRE, 2015, p. 84)

Da mesma maneira, também foi possível observar como o medo de errar, por parte dos educandos, é um fato que tende a reforçar um comportamento passivo e vertical na relação educador-educando, e que o diálogo entre essas partes é uma chave que pode abrir grandes portões, mas que também pode fechar muitos outros, uma vez que, se mal usado, pode ser fatal. Nesse sentido, uma das competências fundamentais ao educador é a capacidade de estabelecer diálogos frutíferos com os educandos e reconhecer a realidade e as adversidades enfrentadas por eles, além de tentar programar atividades que tenham a realidade como ponto de partida, ajudando-os, assim, a superar as suas limitações. É preciso entender que os educandos são mais do que índices escolares, os alunos são pessoas, e o educador deve levar em consideração também a dimensão afetiva dessa relação.

Quanto a isso, pode-se constatar, nesses meses de experiência na mencionada escola que, infelizmente, muitos educadores não promovem uma aproximação com os educandos, e preferem continuar se mantendo distantes e presos aos conteúdos programáticos e livros didáticos. E, nesse ponto, cabe aqui ressaltar o empenho da supervisora em efetivar esses diálogos e sua relativa independência em relação aos livros didáticos e mesmo aos conteúdos programáticos, os quais são utilizados, mas com o devido senso crítico e a sensibilidade que compete a um educador.

Convém ressaltar a esse respeito, para que não se interprete equivocadamente o que estamos a querer dizer, que tornar-se amigo do aluno, ser mais próximo do mesmo, não quer dizer ser negligente ou menos rigoroso quanto ao processo de ensino-aprendizagem. Estabelecer um vínculo afetivo para com os educandos é imprescindível à compreensão de suas realidades familiares, seus eventuais problemas cognitivos ou psicológicos, ter ciência de quem são os sujeitos dentro do ambiente escolar. Atuar como profissional não significa ser indiferente a essa realidade. Pelo contrário: todo bom educador deveria ter a percepção de que, antes de ser um educando, ou um aluno, o sujeito é um ser humano, e sem diálogo com esse ser humano é impossível estabelecer um bom processo de ensino- aprendizado, sendo necessário ao educador, como tanto defende Paulo Freire, reconhecer as peculiaridades dos educandos e levá-las em consideração ao traçar suas estratégias de ensino-aprendizado, dando foco ao universo sócio-cultural desses sujeitos. Em suas práticas, o educador, se de fato almeja construir um ambiente escolar democrático, necessita preparar pessoas para exercer sua cidadania numa sociedade democrática, devendo conseguir, portanto, levar em consideração esses aspectos mais subjetivos ao desenvolver suas práticas pedagógicas, pois:

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Uma escola democrática teria de preocupar-se com a avaliação rigorosa da própria avaliação que faz de suas diferentes atividades. A aprendi- zagem escolar tem que ver com as dificuldades que eles enfrentam em casa, com as possibilidades de que dispõem para comer, para vestir, para dormir, para brincar, com as facilidades ou com os obstáculos à experiência intelectual. Tem que ver com sua saúde, com seu equilíbrio emocional. A aprendizagem dos educandos tem que ver com a docência dos professores e professoras, com sua seriedade, com sua compe- tência científica, com sua amorosidade, com seu humor, com sua clareza política, com sua coerência, assim como todas as estas qualidades têm que ver com a maneira mais ou menos justa ou decente com que são respeitados. (FREIRE, 2003, p. 125-26)

PLANEJAMENTO E EXECUÇÃO DE UMA PROPOSTA

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