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Responsabilidade civil e responsabilidade penal

2.2 Responsabilidade civil prevista no Código Civil

2.2.2 Responsabilidade civil e responsabilidade penal

Importante diferenciar a responsabilidade penal da responsabilidade civil. Esta ocorre somente quando o interesse particular é lesado (ilícito civil), aquela, por sua vez, ocorre quando o ato lesa o interesse público (ilícito penal). Na primeira, a responsabilidade é patrimonial, na segunda, é pessoal.

Segundo Carlos Roberto Gonçalves, “no caso da responsabilidade penal, o agente infringe uma norma de direito público. O interesse lesado é o da sociedade. Na responsabilidade civil, o interesse diretamente lesado é o privado. O prejudicado poderá pleitear ou não a reparação”.82

80 TJMG − Processo n. 1.0079.04.156253-3/001(1), 1ª Câmara Cível, rel. Armando Freire, j. 27.03.2007,

publ. 03.04.2007.

81 TJRS − Apelação Cível n. 70004382214, 6ª Câmara, rel. Ney Wiedemann Neto, j. 04.05.2005, publ.

18.05.2005.

82 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 8. ed. rev. de acordo com o novo Código Civil

Referido autor esclarece ainda que a responsabilidade penal é pessoal e intransferível, “responde o réu com a privação de sua liberdade. Por isso, deve estar cercado de todas as garantias contra o Estado. A este incumbe reprimir o crime e deve arcar sempre com o ônus da prova. Na esfera civil, porém, é diferente. A regra actori

incumbit probatio, aplicada à generalidade dos casos, sofre hoje muitas exceções, não sendo tão rigorosa como no processo penal. Na responsabilidade civil não é o réu mas a vítima que, em muitos casos, tem de enfrentar entidades poderosas, como as empresas multinacionais e o próprio Estado”.83

Em outras palavras, a responsabilidade civil é facultativa e patrimonial, enquanto a responsabilidade penal é pessoal, atinge o interesse público e independe da existência de prejuízo sofrido pela vítima e de sua vontade.

No entanto, é possível que o mesmo ato ilícito, pela sua gravidade, tenha efeitos na esfera penal e civil, como ocorre, por exemplo, no caso de um homicídio, no qual o autor do crime será condenado às penas do artigo 121 do Código Penal e, pela Justiça Civil, a pagar indenização para a família da vítima.

O Código Civil, em seu artigo 935 (art. 1.525), preceitua que “a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas se acharem decididas no juízo criminal”. Sobre essa independência, Nelson Nery Junior explica que “a coisa julgada penal não interfere na área civil. Absolvição do réu no processo penal, por exemplo, não significa automática liberação de responder na esfera civil. O direito penal exige a culpa em sentido estrito para a condenação, enquanto o direito civil pode sancionar o devedor que tenha agido com culpa, ainda que no grau mínimo. Assim, pode o réu ser absolvido no processo penal por falta de provas (CPP 386 VI) e responder ação civil e ser condenado a indenizar pelo mesmo fato”.84

83 GONÇALVES, Carlos Roberto, Responsabilidade civil, cit., p. 19-20.

84 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil anotado e legislação

De acordo com o Código de Processo Penal, faz coisa julgada no juízo cível: a) quando o juiz reconhecer expressamente a inexistência do fato ou a sua autoria (art. 66 do CPP); e b) quando o juiz reconhecer ter o réu agido em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito (art. 65 do CPP).

Em princípio, salienta Sílvio Venosa, “não pode o juiz civil discutir o que ficou assente no juízo criminal, no tocante à existência do fato ou quem seja seu autor. Assim, se a sentença criminal definiu que o fato não existiu ou fulano não é o autor da conduta, essas questões não podem ser resolvidas no juízo indenizatório. Desse modo, se a indenização dependia dessas premissas, não há como ser concedida”.85

Não surpreende, portanto, decisão do Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, ao afirmar que se intercomunicam as jurisdições civil e criminal. A segunda repercute de modo absoluto na primeira, quando reconhece o fato ou a autoria. Nesse caso, a sentença condenatória criminal constitui título executivo no cível. Se negar o fato ou a autoria, também de modo categórico, impede, no juízo cível, questionar-se o fato. Diferente, porém, se a sentença absolutória apoiar-se em ausência ou insuficiência de provas, ou na inconsciência da ilicitude, remanescendo, então, o ilícito civil.86

Por outro lado, em se tratando de delito de competência do Juizado Especial Criminal, existem algumas peculiaridades. Segundo Jurandir Sebastião, “eventual transação penal (aceitação da culpa e da pena pelo acusado) não importará em obrigação de indenizar. É a redação expressa do parágrafo 6º do artigo 76 da Lei n. 9.099/95, que cria exceção à regra geral. Nada impede, contudo, que nessa mesma oportunidade as partes

transacionem também a indenização cível, perante o mesmo Juizado Especial, nos termos do artigo74 dessa lei, pondo fim a essa questão, quer pela fixação do valor a ser pago ou

85 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. 7. ed. atual. de acordo com o Código Civil

de 2002. São Paulo: Atlas, 2007. p. 185.

86 STJ − RESP n. 975/RJ, 1989/0010526-4, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, 2ª Turma, j. 07.02.1990,

DJU, de 05.03.1990. No mesmo sentido: Tentativa de homicídio. Responsabilidade civil. Prescrição. A sentença criminal condenatória, com trânsito em julgado, confere à vítima título executório no Juízo cível. Intercomunicação das jurisdições, com prevalência da penal, quando reconhece o fato e a autoria. Desnecessário o processo de conhecimento, no âmbito cível. Em conseqüência, a prescrição não corre enquanto em curso o processo criminal. (STJ − RESP n. 4525/SP, 2ª Turma, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, j. 05.09.1990, DJU, de 01.10.1990).

bens a repor, quer pela declaração formal de inexistência de reparação civil a ser feita. Se não houver composição para a indenização cível, mas ocorrendo transação penal, a vítima poderá pleitear a reparação material devida, no Juizado Cível competente, mediante prova da culpa do agente, tal como nos casos criminais de absolvição por insuficiência de provas”.87

Por fim, acentua referido autor que “se o agente (réu) não aceitar a proposta de

transação penal, mas receber condenação ao final da instrução, a indenização cível seguirá pelas regras comuns. Nesse caso a condenação com trânsito em julgado será tida como título judicial ilíquido, para os efeitos de execução na esfera cível, por simples liquidação (processo de apuração do quantum)”.88