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Resumo sobre o problema

No documento Pesquisa em Mídias na Educação (páginas 53-60)

Problema de pesquisa é a dúvida, a pergunta que se deseja responder e que vai nortear todo a pesquisa. Ele determina, em diálogo com as teorias que o embasam, o ângulo, o ponto de vista do trabalho. Eleger um problema para a pesquisa pode não ser tão simples quanto parece e pode demandar algum tempo, um estudo mais profundo do tema. Ao se elaborar o problema, leve em conta que ele:

• deve ter uma formulação clara, compreensível, unívoca (geralmente podendo ser sintetizado numa pergunta).

• deve-se focar, delimitar um ponto, eleger um determinado aspecto para a pesquisa, a propósito de determinado tema, o que se relacio- na com o realismo ou exequibilidade da proposta.

• deve ser passível de verificação empírica, sendo factivel a obtenção de dados e informações imprescindíveis a essa tarefa. Nessa pers- pectiva que destaca a pertinência da formulação, com respeito ao que existe e pode ser observado, deve evitar a abordagem de valores. • deve ter aderência às áreas envolvidas e, no caso do curso Mídias

na Educação, estar relacionado não só à Comunicação e Educação,

mas à produção do conhecimento de mídias e sua relação com a educação.

• deve ser baseado e poder dialogar com teorias e discussões da área em questão, tendo intenções compreensivas, analíticas – ultrapas- sando o mero tratamento de dados –, de modo a trazer contribuições, em termos da aquisição de conhecimentos, ao campo de estudo. • pode decorrer de uma questão prática (“situação problemática” ou

“problema existencial”), mas objetiva essencialmente adquirir co- nhecimentos, com um teor maior de abstração e reflexão, mais do que agir direta e imediatamente sobre determinada situação ou con- texto. Trata-se, antes, de entendê-lo.

cas, de que ele dispõe (em especial, a natureza da sua experiência social, a formação que recebeu) e também as possibilidades de acesso a informadores e a informações, a documentos ou a fontes, etc. Muitas vezes, é só ao cabo de um verdadeiro trabalho de socioanálise que se pode realizar o casamento ideal de um investigador e do seu “objeto”, por meio de toda uma série de fases de sobreinvestimento e de desinvestimento.

(4) O problema é significativo

Evidentemente, se aquilo que se deseja pesquisar não revelar nada de importante, não tiver relevância ou não puder acrescentar ou trazer contribuições ao tema pesquisado, não há motivo para que a pesquisa seja realizada.

De um modo geral, o caráter significativo de um problema relacio- na-se com o seu teor compreensivo e não meramente informativo ou descritivo. Isto é, uma pergunta que resume um problema significa- tivo, como notam Quivy e Campenhoudt, é aquela que permite ao investigador “por em evidência os processos sociais, econômicos, po- líticos ou culturais que permitem compreender melhor os fenôme- nos e os acontecimentos observáveis e interpretá-los mais acertada- mente” (1992, 41). Desse modo, exemplificam os autores, uma per- gunta como “os jovens são mais afetados pelo desemprego do que os adultos?” ainda que exija um trabalho de coleta e tratamento de dados não permitiria mais do que investigar o tema que aborda (no caso, o desemprego juvenil) de modo superficial, sem aprofundamento com- preensivo sobre o mesmo. “Resumindo, uma boa pergunta terá uma intenção compreensiva ou explicativa” (idem).

Além disso, deve-se notar que a importância de um problema rela- ciona-se com as disciplinas, áreas e tradições de pesquisa na qual a investigação insere-se. Um problema bastante significativo em “edu- cação matemática” pode ser pouco ou nada em “educação inclusiva”. Dessa maneira, a questão da aderência , no nosso contexto à discus- são das mídias na educação, também diz respeito a esse aspecto.

Cochran-Smith e Lytle afirmam que a pesquisa do professor é parte de um aprendizado para ensinar “contra a maré”, e, nessa perspectiva, associa-se mais “a incerteza do que à certeza, a propor problemas e dilemas do que resolvê-los, e com o reconhecimento de que investi- gação é igualmente provocada por perguntas e as produz” (1999, 21). Problemas de teor significativo ajudam a que se elaborem, no proces-

Cf. o tópico 2.

so de investigação, ideias mais pertinentes sobre as questões de inte- resse e novas perguntas, melhores do que quando se parte de proble- mas triviais ou mal formulados.

De qualquer forma, é importante que seja explicitada (via de regra na justificativa) a relevância que a pesquisa tem para o universo soci- al, acadêmico ou profissional (pode ser até uma escola) do pesquisa- dor. Assim, uma série de questões poderão ser arroladas na discussão da utilidade, necessidade, pertinência da investigação (e isso ajuda a justificá-la ). Entre esses pontos, há, como nota Creswell (2010), a possibilidade de que o estudo beneficie os indivíduos que estão sendo estudados, o que expande o teor significativo do problema para além dos interesses do pesquisador e de uma área de conhecimento. (5) Os pressupostos estão claramente estabelecidos

Pressupostos são parâmetros básicos sobre os quais se assentam a proposta da pesquisa e que nos permitem encaminhar a investigação. Eles representam as bases de partida, aquilo que está implícito. É algo de que se parte, um saber prévio que colabora na formulação do pro- blema, objetivos e justificativas da pesquisa. No entanto, cabe ao au- tor de um projeto tornar os pressupostos claros para quem lê o traba- lho, e também a si mesmo. O projeto é uma peça que favorece a própria reflexão do pesquisador.

Não se confundem com hipóteses porque essas são possibilidades a serem investigadas. É interessante sempre deixar claro quais são as bases da quais partimos ao realizar uma pesquisa.

Dois exemplos ilustram como os pesquisadores podem fazem de- clarações que possuem pressuposições implícitas ou afirmações (que funcionam como pontos de partida) que precisam ser esclarecidas:

• No primeiro caso, um pesquisador afirma que procurará obter, com sua investigação, elementos para que o uso das TICs em determinada escola se faça de modo “educomunicativo” (participativo, democrático, etc.).

• Em outro, o autor comenta: “Sabe-se que a introdução na es- cola da mídia X melhora o aprendizado de Y, por isso...”. Qual é o pressuposto implícito da primeira assertiva? Naturalmen- te, de que a utilização das tecnologias, no contexto de interesse, se dá de uma forma não educomunicativa. Porém, não basta dizer, é neces- sário mostrar, comprovar – por mais que o autor do projeto “saiba” alguma coisa, deve convencer quem lerá o trabalho disso. Para tanto,

Cf. a discussão a partir do tópico 11.

pode apresentar exemplos, situações e indicadores, que explicitem e reforcem sua declaração, bem como deve discutir, no caso, o que para ele significa a “educomunicação” e o que seria um uso sob esse referencial das mídias. Em suma, é preciso trazer elementos que am- parem aquilo que estava implícito (pressuposto) em seu argumento. No segundo caso, a declaração terá um teor meramente retórico ou ideológico (sem valor científico) se não for amparada por informa- ções (de estudos, pesquisas) que deem sustentação ao que se diz, sir- vam como evidências firmes para que o investigador possa utilizá-las como pontos estabelecidos para construir sua reflexão.

É necessário reconhecer que a “ciência não é uma criação miracu- losa a partir do nada, não é geração espontânea de conhecimentos a partir da ignorância” (KAPLAN, 1969, 91), ou seja, os pressupostos, esta- belecidos com base em investigações anteriores, nas teorias sobre os objetos em estudo, na sabedoria popular e nas experiências de vida do pesquisador, têm papel numa investigação. Nota-se que, quando ocor- rem modificações nas grandes teorias , implicando a superação de certos pressupostos, há uma “revolução científica”6. Situação, entre-

tanto, excepcional.

De qualquer modo, é necessário que o pesquisador tenha consciên- cia do que assume como pressuposições. Como é bem observado por Kaplan (1969, 92): “A metodologia não nos priva de nossos pés; pres- creve, antes que os tenhamos em consideração”. O mesmo autor, ali- ás, faz uma distinção entre os pressupostos e o que chama de supostos de uma investigação, que seriam as crenças que brotam conforme esta se desenvolve, e que são geralmente modificados conforme o problema da pesquisa se encaminha para sua solução.

Questionar e aclarar os pressupostos são formas de evitar que raci- ocínios menos adequados à pesquisa ou de senso comum enfraque- çam a construção mais rigorosa do problema e a própria investigação. Isto é, que prenoções do senso comum sejam tomadas como ponto de partida de uma investigação. Disto resultam, perguntas de pesqui- sa mal formuladas, sem teor compreensivo.

Nesse sentido, quanto à preocupação em esclarecer pressuposto e

Sobre o alcance das teorias ver o tópico 7.

6. Na famosa obra de Kuhn (1976), que discute a mudança na ciência, esse processo é visto como decorrente da sucessão de “paradigmas”. Estes podem ser vistos como “visões de mundo”, grandes teorias que alicerçam a construção do conhe- cimento científico. Um paradigma entra em “crise” quando falha na compreensão de fenômenos que estariam em seu âmbito. Caso um paradigma alternativo supere o tradicional, ocorre a chamada “revolução científica”. O exemplo clássico desse processo é o que alguns chamam de “revolução inaugural” da ciência: o desafio da teoria de Galileu sobre o movimento e a posição da Terra às concepções de um planeta como centro do universo e estático.

como atitude geral de pesquisa, é que se recomenda a reflexividade ao investigador. Tal termo possui, na discussão da pesquisa científica, similaridade com o debate na educação sobre o profissional ou o professor reflexivo (SCHÖN, 2000, PERRENOUD, 2002). Trata-se de um questionamento da própria prática e das condições, inclusive pesso- ais ou subjetivas, a partir das quais ela é feita. Como nota, por exem- plo, Bourdieu, “a tomada de consciência das atitudes favoráveis ou desfavoráveis que estão associadas” a um pesquisador, dá a ele a chance “de atuar sobre essas atitudes” (1992, 50-51). Para este autor, aliás, o fato científico deve ser conquistado, construído e constatado contra os preconceitos e prenoções do saber imediato (BOURDIEU et al., 1999). São, então, recomendadas, numa perspectiva mais ampla sobre a reflexividade, atitudes de busca de distanciamento – entendido como uma compreensão de vieses e interesses menos científicos, de modo a tentar controlar os mesmos –, confronto das práticas de pesquisa e seus objetivos com a realidade, assim como autocrítica por parte do autor. Com efeito, seria uma forma de controlar prenoções e pressu- postos não problematizados.

Pode-se sintetizar essa discussão, ressaltando que os “pressupostos sempre estarão por trás de pesquisas”, de acordo com o que diz Luna (2002, 40). O mesmo autor nota que o principal risco não é a presen- ça de pressupostos, mas o desconhecimento deles. Assim, ressalta que é preciso levar em conta os pressupostos na análise dos resultados, o que seria uma maneira de contornar os seus efeitos.

(6) As limitações do estudo são apontadas

Aceitar descrever e pensar sobre os percalços, imprevistos e limita- ções de uma pesquisa reflete uma atitude crítica e reflexiva por parte de um investigador, importante também por evidenciar a incorpora- ção da lógica não dogmática do conhecimento científico. Como é observado por Laville e Dionne (1999, 97):

Em suas pesquisas, o pesquisador [deve] aceita[r] que os dados colhi- dos não conduzam aos resultados previstos, que os fatos contradigam seus pontos de vista, que suas hipóteses não sejam verificadas... Dis- põe-se então a se reorientar, a revisar suas perspectivas, como a tole- rar que outros, com perspectivas diferentes ou outros procedimentos, possam ter sobre os resultados de sua pesquisa opiniões diferentes, e que possam eventualmente produzir, por sua vez, saberes divergentes.

de seus resultados pode conduzir a correções nos rumos de uma pes- quisa, enquanto ela se processa, e dá mais consistência ao relato de investigação. Ao abordar esses pontos numa monografia, o autor po- derá aquilatar de modo mais racional seus resultados, dando contri- buição realista aos leitores. Estes poderão partir, no processo coletivo de construção do conhecimento, de limitações apresentadas por de- terminado trabalho, com mais segurança, para outros estudos.

Como bem notam Moreira e Caleffe, um “pesquisador não pode fazer tudo em um estudo de pesquisa”, e por isso recomendam que este “deve deixar claro que está ciente das limitações do estudo” (2008, 231), possivelmente na própria Introdução do relatório da pesquisa. Uma pesquisa pode apresentar limitações por diversos fatores: tem- po, recursos, conhecimento, planejamento, procedimentos metodo- lógicos , experiência do pesquisador, etc. Mas é muito melhor que o investigador, com franqueza, reconheça aspectos em que o resultado que se obteve foi problemático, ambíguo ou incerto, do que oferecer conclusões que não sejam compatíveis com a realidade da pesquisa. Para dar um exemplo, digamos que um pesquisador, para saber se o uso do software X colabora com o ensino de aritmética, desenha um experimento que, por algum motivo que se percebe depois, apresen- tou problemas. Mais correto, caso não seja possível realizar nova- mente a pesquisa empírica, será explicitar no relatório (monografia ou TCC) da mesma o quanto isso limita (ou invalida) os resultados. Assim, outro pesquisador poderá se precaver contra o erro e avaliar o que lê a partir disso. O relato honesto da limitação será mais útil do que uma validade de conhecimento duvidosa, mas não evidenciada. Nessa perspectiva, é pertinente a observação de Perrotta (2004, XV):

muitas vezes são justamente as imperfeições de uma dissertação que apontam caminhos para possíveis novas formulações, para a constru- ção do saber e até mesmo para aprofundamentos e superações futuras por parte do autor. O não saber leva ao saber.

(7) Termos e conceitos relevantes são definidos

É importante ter clareza na exposição das ideias de modo que nosso leitor saiba exatamente a que estamos nos referindo. A linguagem é um instrumento de mediação e construção de conhecimento. Ela serve para apreendemos o mundo e para que expressemos as relações percebidas. A linguagem cotidiana, comum, entretanto, é muitas ve- zes ambígua, imprecisa e conotativa. Como a ciência busca valorizar

O quesito Metodologia aprofunda o tema.

a racionalidade, a coerência e a intercomunicabilidade de seus pro- cessos e resultados, o uso de definições de termos e conceitos relevan- tes a determinado estudo se impõe.

A definição de um termo, para Creswell (2010, 68), deve ser feita sempre que o autor tiver dúvida que o leitor possa desconhecê-lo. Este autor recomenda também que os termos sejam definidos já quan- do aparecerem pela primeira vez, para que um leitor não prossiga na leitura operando com um conjunto de definições e perceba, depois, que o autor utilizou um grupo diferente.

A escolha por determinado termo ou conceito implica adesão a certa abordagem ou compreensão de um fenômeno. Pode-se obser- var, por exemplo, que, quando um pesquisador fala em “letramento” (midiático ou não), escolhe essa palavra por opção teórica, por que ela apresenta sentidos diferentes de “alfabetização”, que pretende explo- rar. Outro exemplo, que esclarece bem a relação entre a teoria e o mundo empírico é dado por Köche (1999, 96):

Na educação, os professores, quando utilizam instrumentos e técnicas de avaliação, para medir a aprendizagem dos alunos, se servem das teorias da aprendizagem. O que é aprender matemática? É saber apli- car fórmulas prontas ou desenvolver o pensamento matemático? De- pendendo da teoria da aprendizagem admitida, a avaliação observará um ou outro aspecto.

Um mesmo termo ou conceito pode ser entendido por diferentes ângulos. Por exemplo, Finatto nota que um conceito como “língua” apresenta “variadas perspectivas de compreensão para esse tópico no âmbito dos estudos sobre a linguagem” (2002, 74). Assim, é preciso definir claramente com que sentido ele é utilizado na pesquisa.

Conceitos e termos genéricos, vagos, não definidos com precisão, podem dar margem a interpretações errôneas e dificultar uma inves- tigação. Isso ocorre, pois cabe às definições traduzir os conceitos do nível teórico e abstrato ao empírico e observável, proporcionando meios para o teste empírico (na realidade investigada) das proposi- ções elaboradas (KÖCHE, 1999, 116). Por isso, a definição dos termos (em particular, os conceitos), como notam Bruyne et al. (1991, 126), “deve permitir a investigação coerente, deve ser o sinal que nos indica o objeto de investigação e faz com que apreendamos”, servindo como um fio condutor que ajuda a introduzir ordem nos fatos observados e guiando a busca daqueles fatos que devem ser procurados.

Numa reflexão similar, Kaplan (1969, 55) afirma que os conceitos “assinalam as trilhas pelas quais podemos caminhar mais livremente no espaço lógico”, indicam “as intersecções e encruzilhadas na rede de relações, pontos em que podemos deter-nos, mantendo a máxima liberdade de escolha quanto à direção a seguir”. A respeito de uma substância, por exemplo, nós podemos saber a “cor” da mesma, no entanto, nesta caracterização, conheceremos menos sobre ela do que quando optamos pela conceituação – mais abstrata e talvez mais útil em determinada investigação científica – de “composição química”.

No documento Pesquisa em Mídias na Educação (páginas 53-60)