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Revista de História − Um Periódico Institucional dedicado a Clio; Académico, Não-Universitário, Fruto de uma Sociedade de Saber

Èpoque das Revistas

2.6. Revista de História − Um Periódico Institucional dedicado a Clio; Académico, Não-Universitário, Fruto de uma Sociedade de Saber

Quando a Revista de História começou a funcionar, a universitarização de saberes em Portugal era ainda incipiente, estava a dar os primeiros passos. É lícito pensar o periódico como participante de uma marcha paralela com vista ao desenvolvimento do que viriam a ser as ciências Humanas – então encaradas como letras no seio das Humanidades –, dado que era o principal canal portador das mensagens e das ideias defendidas pelos membros da Sociedade Nacional de

202 Armando Luís de Carvalho Homem – Revistas Universitárias de História. In Revista de História das Ideias, vol. 18.

História/ Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos – ou por outros intelectuais – e um dos meios facilitadores da respectiva institucionalização.

Disso dá conta e constitui prova uma brochura publicada pela referida Sociedade, destinada a constituir-se como inventário das revistas publicadas em Portugal até 1915. Aquela instituição procurou, deste modo, fixar uma diacronia que servisse de contexto histórico à integração do seu órgão de informação: «Publicando a presente brochura, destinada a uma larga circulação, a Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos tem em vista contribuir para que se amplie o conhecimento do nosso trabalho intellectual e delle se formúle um juízo exacto e seguro: «(…) As revistas, sendo apenas uma parte, certo não a maior, da actividade intellectual , são sem duvida , pelo seu caracter de periodicidade e actualidade, e de associação e trabalho, a parte mais idonea para proporcionar um conspecto fiel de methodos e de orientações predominantes nos vários districtos do saber»203.

Resulta evidente um certo conhecimento de questões relativas a revistas, como as da periodicidade, sob a égide da actualidade, ou as que apelam a um trabalho colectivo que subsuma o esforço intelectual de cariz individual, encarado como indispensável mas insuficiente na sua singularidade. Por outro lado, o inventário em análise encarna um esforço de legitimação científica, do qual participa, enquanto instrumento heurístico de apoio à crítica, como atitude e apetência epistemológica, a nível genérico, mas também no que tange ao conhecimento histórico. A brochura teve a colaboração de sócios da Sociedade como: Pedro de Azevedo, Fortunato de Almeida Leite de Vasconcelos, Joaquim Fontes, João Maria de Aguiar, Afonso D’Ornelas, Gonçalo Santa Rita, Prado Coelho, Eduardo Moreira, Fidelino de Figueiredo. Também participaram individualidades não pertencentes à agremiação: Pedro José da Cunha, Vicente de Almeida Eça e Tomás Borba. Os redactores do documento elegeram a Inglaterra como pioneira no campo das publicações periódicas e, por essa razão, ergueram-na enquanto modelo e ponto de referência de iniciativas posteriores e descreveram uma cronologia comprovativa da alegada precedência.

Atente-se na definição de Revista apresentada para enquadrar o périplo pela História de publicações afins: «Cabe á Inglaterra a gloria de haver enthronizado este genero bibliographico, a revista, especie de percurso critico pelas questões contemporaneas de sciencia, litteratura, arte e politica, meio-termo entre o jornal, de que tem o regular apparecimento periodico, mas sem a sua precipitação e forçosa ligeireza, e o livro, de que pretende ter a gravidade»204.

203 Revistas Portuguesas, Inventário da responsabilidade da Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos, Lisboa,

1915 [Introdução] p. 3.

Note-se o relativo esforço consagrado à demarcação tipológica com intuito distintivo no plano genológico. Esta breve investida conceptual alavancou − enquanto substrato de cariz identitário − os considerandos tendentes a fixar algumas datas importantes para o aparecimento e consolidação de revistas europeias. Em 1749 surgiu a Monthley Review, em 1756 foi a vez da Critical Review. Em 1802 foi dado à estampa o primeiro número da Edimborough Review, e em 1809 iniciou-se a Quarterly

Review, destacada por se ter tornado instituição nacional por via de alegada influência

política e literária. O percurso das revistas britânicas citadas foi indiciado anteriormente nesta investigação de modo a enquadrar nova referência por parte da brochura da Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos que encara, implicitamente e sem confessá-lo, estas publicações político-literárias e de cultura geral como exemplos de empenhamento cívico e social ao qual uma publicação científica não deve ser indiferente, nem muito menos alheia, dado que a especialização não dispensa, antes concita um humanismo de mais largo espectro. Em França, o movimento editorial crescente teve com precursora, em 1804, a Revue Philosophique. Para o caso português o pioneirismo é concedido ao Ramalhete (1837) e ao

Panorama, dirigido, numa primeira fase por Alexandre Herculano.

Os responsáveis pelo inventário começaram por referir-se às revistas de índole cultural genérica publicadas ao longo do século XIX, correspondentes ao Romantismo e que prolongaram o carácter biográfico, panegírico, literário, crítico ou enciclopédico presentes, de forma larvar, na precursora referida: «As nossas revistas romanticas têm todos os predicados das suas congeneres estrangeiras, salvas as devidas proporções (…). A sua phase biographica é representada principalmente pela Revista

Contemporanea, fundada por Eduardo de Faria, em 1848, e pela Revista Contemporânea de Portugal e Brasil, de António de Brederode e Ernesto Biester,

fundada em 1850. Depois, transformando-se, fôram-se multiplicando as de litterattura e critica, poderosamente influindo na mentalidade nacional»205. Dentre as Revistas

louvadas pela sua novidade encontram-se a Peninsular, a Lisbonense, o Arquivo

Pitoresco, entre outras. Também mereceram referência as Revistas O Positivismo, EstudosLlivres, relevantes, ainda que procedentes de quadrantes ideológicos diversos

e possuidoras de um carácter distinto.

Os elementos expostos personificam dados relevantes e indícios para a História de um género específico da imprensa periódica portuguesa dos séculos XIX e XX, cuja génese resulta muito embrionariamente esboçada. Convirá ampliar e aprofundar este quadro, de modo a perceber a forma como a Revista de História nele se insere e inscreve. Os redactores do inventário em análise tinham em mãos uma vasta

empresa, mas numa primeira fase tiveram que se ater às Revistas de História, tal a amplitude, vagamente enunciada, do projecto inicial. «Este projecto occorreu-nos independentemente da suggestão de qualquer obra congenere, pois que apenas nos movia o desejo de, pela propaganda, contribuir para o bom nome da mentalidade portuguesa. Todavia, temos de confessar que não nos cabe a prioridade nesta tarefa de organizar um inventario critico de revistas, em curso de publicação, de determinada especialidade. A revista belga Ísis, consagrada à História da Sciencia , no seu número de Junho de 1914, publicou um trabalho semelhante ao que hoje entregamos ao publico de Portugal e aos seus amigos. Este trabalho que conhecemos por obsequiosa mediação do socio, Dr. Maximiano de Lemos, intitula-se Bibliographie Synthéthique

des Revues et des Collections de Livres (…)»206.

O inventário materializa e prolonga certos traços da cultura Oitocentista, como a vontade de construção de um espaço público e de uma opinião pública, baseados em atitudes propagandísticas, promotoras e defensoras de valores e de modos de pensar tributários de um cariz nacional. Por outro lado, alicerça-se uma perspectiva que salvaguarda o conhecimento de instrumentos de pesquisa similares, neste caso promovido pelo recurso aos préstimos de um intelectual imbuído de espírito de corpo, pertencente à Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos. A brochura é um retrato incipiente do ambiente cultural da sua época e a catalogação de revistas constitui uma forma de sobre ela intervir, de modo a contrariar uma tendência percebida e sentida: «Repetidamente, as revistas portuguesas deixaram de ser fieis á orientação inicial, para seguirem um caminho que mais prometta uma desafogada existencia; mas tal caso não se exemplifica muito nas revistas enumeradas na presente brochura. A direcção, não sendo sempre energica na fiscalização de materias e doutrinas apresentadas é frequentemente responsavel de ser quebrada a intransigente fidelidade que todas as revistas devem manter ao seu programma , por motivos de ordem intellectual e de honra»207.

A parte do inventário de Revistas rastreado pela Sociedade Nacional de História que se revela mais importante e até crucial para a nossa investigação intitula-se

Revistas Históricas. O destaque que merece deriva do facto dos organizadores da

Brochura em análise terem incluído o periódico dirigido por Fidelino de Figueiredo no grupo daqueles que versem assuntos cujo denominador comum passa pala dedicação à ciência de Clio e também advém da circunstância de todos os periódicos terem sido recomendados pelos redactores da brochura. Esta assunção resulta de uma avaliação em causa própria e denota a imagem que intelectuais próximos do órgão de

206 Ibid., p. 5. 207 Ibid.

informação e comunicação da agremiação citada pretendem transmitir do seu periódico, incluindo-o num conjunto no qual pontificam, por esta ordem: o Boletim da

Segunda Classe da Academia (Real) de Sciencias de Lisboa; O Archivo Histórico Português; O Oriente Português; Tombo Histórico e Genealògico de Portugal; Boletim Bibliographico da Academia de Sciências de Lisboa; O Boletim Bibliographico da Biblioteca da Universidade de Coimbra; os Annaes das Bibliotecas e Archivos de Portugal. Este inventário apresenta essencialmente um carácter descritivo que

comporta duas vertentes. A primeira diz respeito à indicação das características físicas das publicações − como as que comportam o tamanho, altura e largura incluídos − sem esquecer a referência aos seus directores e à morada das revistas. A segunda perspectiva contemplada insere-se no âmbito metodológico da História sumária da evolução dos periódicos. Esta componente resulta essencialmente informativa, escasseando os juízos de valor, o que não significa que primem pela inexistência. Todavia, os redactores da brochura preferiram alinhar pela parcimónia na expressão das suas impressões sobre as iniciativas editoriais afins para evitar dissabores no caso das críticas endereçadas serem negativas, eximindo-se a excessos laudatórios, atitude situada nos antípodas da ante-referida, para não inflaccionar o estatuto de Revistas que eram, em última instância, vistas como suas concorrentes, mesmo nos casos em que cooperavam oficial e publicamente. O maior detalhe é aplicado na tentativa de não esquecer a identificação de nenhuma Revista de História conhecida, de modo a testemunhar a vontade de afirmar projectos congéneres e a persistência na respectiva execução.

Sobre o Boletim da Segunda Classe da Academia (Real) de sciências de Lisboa,

os autores do inventário documentam as dimensões do periódico (23cm 5 X 14 cm) e

referem que o director da publicação é Cristóvão Ayres de Magalhães Sepúlveda, erudito e militar que foi um dos fundadores da Sociedade Nacional de História, conforme se confirmará no capítulo seguinte. Por outro lado, o Boletim começara a ser dado à estampa em 1898, sob a direcção do secretário da classe, José de Sousa Monteiro, sendo dividido em três secções distintas: uma dedicada a actas da instituição, outra relativa a comunicações e uma terceira consignada à emissão de pareceres solicitados. Sob a égide desta estrutura foram publicados dois volumes, o primeiro contendo materiais correspondentes aos anos de 1898 a 1902, enquanto o segundo albergou a produção científica e intelectual coligida entre e derradeira data citada e 1909.

A partir de Janeiro de 1910, o novo director, Cristovão Aires, implementou um novo plano, sujeito a periodicidade que passou de anual a mensal e, posteriormente, a semestral: «A sua publicação passou a fazer-se em fasciculos mensaes e a dividir-se

em duas partes: a primeira é constituída pelas actas de classe e pareceres apresentados nas respectivas sessões; a segunda é formada pelos estudos, documentos e notícias lidas ou destinadas à classe, acompanhadas de uma indicação em francês do assunto tratado. A regularidade do primeiro anno não pôde ser mantida depois que o governo provisorio privou a Academia da sua typographia e que a impressão delle passou a fazer-se na Imprensa da Universidade, em Coimbra. Deixou ultimamente de conter a indicação das materias tratadas em francês, assim como deixou de sair em fascículos mensais, mas semestraes, com princípios em Novembro e Abril. Os volumes nem sempre correspondem ao anno académico. Entre os seus collaboradores, contam-se os academicos, Srs. David Lopes, Cristovam Ayres, J. Leite de Vasconcellos, Pedro de Azevedo, Esteves Pereira, Victor Ribeiro, Veiga Beirão, Cunha Gonçalves, Edgar Prestage, D. Carolina Michaëlis de Vasconcellos, D. Maria Amélia Vaz de Carvalho, Lopes de Mendonça, etc.»208.

As quatro primeiras personalidades citadas, tal como Victor Ribeiro ou Prestage, estavam ligadas à futura instituição promotora da Revista de História e, a maioria delas, ao periódico cuja criação se lhe seguiu. Na descrição produzida pelos redactores da brochura em análise perpassa, sub-reptícia mas claramente, a ideia segundo a qual o governo provisório que tomou posse em 1910 possa ter entravado a regularidade do Boletim da Academia de Ciências − verificada durante o primeiro ano de vigência da direcção presidida por Ayres de Magalhães Sepulveda −, ordenando a extinção da tipografia da referida instituição, situação que determinou a alteração de periodicidade da publicação, impressa mais espaçadamente, ou a supressão da indicação em francês das matérias tratadas.

De modo mais explícito, os autores do inventário reconheceram, em seguida, a qualidade do Archivo Histórico Português e lamentaram a respectiva suspensão devido à intervenção do governo republicano recém-empossado: «Esta excellente revista, cuja publicação se acha suspensa desde 1910, é um dos muitos emprehendimentos intellectuaes, prejudicados pela desordem política, que desde esse anno tem avassalado o paiz. Fundada em 1903, na advertencia com que abre o primeiro número, os seus fundadores já deixavam entrever que a funcção que á sua revista destinavam era a de accumular materiaes»209.

Esta revista também se ressentiu de alguma irregularidade na sua publicação, tendo tido como colaboradores algumas personalidades que tinham trabalhado no Boletim ante-citado, para além de outros com ligação à Sociedade Nacional de História/ Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos, ou ao respectivo órgão de

208 Ibid., p. 12. 209 Ibid.

comunicação e informação e ainda eruditos não referidos até este momento: «Collaborada pelos mais distinctos especialistas e eruditos, o Archivo Historico Português organizou um grupo de trabalhadores, todos mais ou menos concordes quanto aos methodos e rigor de, investigação. Alêm dos seus directores, têm nelle collaborado Sousa Viterbo, Costa Lobo, Ramos Coelho, historiadores já fallecidos, e os Srs. Pedro de Azevedo, Antònio Baiâo, Brito Rebello, Júlio de Castilho, Jordão de Freitas, Carolina Michaëlis de Vasconcelos, Guilherme Henriques, Figueiredo da Guerra, Gomes de Brito, Vitor Ribeiro, Edgar Prestage e Maximiano de Lemos. O

Archivo Historico Português é a primeira revista Histórica de Portugal, como repositorio

de materiaes, documentos principalmente. Desprezou bastante as questões de actualidades que uma Revista não póde esquecer, e inteiramente a critica bibliographica»210.

Quando, em 1915, a Socedade Portuguesa de Estudos Históricos realizou o inventário de revistas existentes à época em Portugal, a Revista de História tinha três anos e uma estrutura que demonstra a complementaridade face ao Arquivo Histórico

Português − dirigido por Anselmo Braamcamp Freire e D. José da Silva Passanha,

sediado na Rua do Salitre, portador das seguintes dimensões 27,5 cm de altura por 19 de largura; acresce que a assignatura anual custava três escudos e seiscentos reis− dado que na secção de artigos o periódico dirigido por Fidelino de Figueiredo confere amplo espaço à acumulação e publicação de documentos. Todavia, ao contrário do que acontecia na publicação fundada em 1903, a Revista de História dedicou atenção à actualidade através da Secção de Factos e Notas e à crítica bibliográfica por via do andamento específico sobre Bibliografia, desse modo intitulado. Ficam em aberto as questões suscitadas pela interrogação central segundo a qual a publicação da Rua do Salitre pode ter funcionado como arquétipo ou, inversamente, enquanto Anti-modelo da Revista de História. Parece-nos, contudo, que a tese da ruptura total e sem retorno não tem cabimento, dado que no plano da defesa da erudição existe uma base comum entre os dois periódicos, ainda que os redactores do inventário em análise tenham reconhecido que a revista dirigida por Fidelino de Figueiredo procurava evitar cingir-se à acumulação de materiais. Voltaremos mais adiante a comparações entre publicações e, sobretudo, no final deste capítulo, à consignação da Revista de

História, sob o signo do veredicto dos autores da brochura da Sociedade Portuguesa

de Estudos Históricos.

Os responsáveis pelo inventário em análise referem-se ao Oriente Português, revista da Comissão de Arqueologia da Índia Portuguesa. Este periódico foi fundado em 1914 e, em 1915, contava onze volumes, saídos com uma periodicidade anual. A

redacção situava-se na Imprensa Nacional Nova Goa. Esta publicação surgiu para suprir a lacuna deixada pela extinção do Archivo Português oriental e do Chronista de

Tissuary, cuja supressão acarretou um interregno na actividade que consistia em dar à

estampa documentos imprescindíveis para a História da colónia Portuguesa e que foi retomada pela elogiada comissão que esteve na origem da revista em apreço, impulsionando-a. A vocação do periódico assentava na salvaguarda do património cultural indiano, revelando articulação com instituições locais devotada a interesses análogos: «Na Revista têm sido publicados os decretos sobre a conservação de monumentos de valor archeologico. Os archivos particulares e os da Repartição Superior da Fazenda da Índia têm aberto as suas portas aos investigadores, e muitos documentos valiosos se salvaram pela publicação no Oriente. Em todos os numeros se encontram artigos sobre a chronologia, epigraphia, numismatica, linguística, História indiana, etc, firmados pelos melhores nomes da Índia Portuguesa, quer europeus, quer indígenas. Assim o Oriente constitue um núcleo do nacionalismo português na Asia, onde se encontram lutadores ricos de experiencia que empregam em prol dos interesses da colónia»211.

Os redactores do catálogo organizado pela Sociedade Nacional de História sublinharam a vertente nacionalista da Oriente, encarando-a como uma característica positiva da publicação na qual colaboraram, em nome da causa colonialista, personalidades como «Dr. Osório de Castro, Roçadas, Ismael e Amâncio Garcia, Carmo Nazareth, Herculano de Moura, Dr. Luis da Cunha Gonçalves, Ferreira Martins, Tavares de Mello, etc»212

O penúltimo nome citado também escreveu um artigo para a revista dirigida por Fidelino de Figueiredo, confirmando o relativo afunilamento do meio redactorial e intelectual português metropolitano e ultramarino no dealbar de novecentos, bem como as relações estreitas entre intelectuais de um lado e de outro do mundo, nos espaços europeu e asiático. Esta proximidade pode derivar de uma partilha de práticas historiográficas comuns, assentes na publicação de documentos escritos, desiderato que unia o Oriente ao Arquivo Histórico Português. Enquanto este estava suspenso aquele manteve a sua actividade, sendo encarado, nessa matéria e de modo implícito, como exemplo a seguir. Para mais, nele também eram acarinhadas ciências auxiliares da História.

Esse mesmo procedimento constituiu a base da publicação de um periódico não dedicado prioritariamente à arqueologia − ao contrário do que acontecia na Revista

Oriente − mas incidente sobre a Genealogia, intitulado sugestiva e denotativamente

211 Ibid. 212 Ibid.

Tombo Histórico e Genealógico de Portugal, dirigido por um eminente colaborador da Revista de História, Afonso D’ Ornelas e por A. Gusmão Navarro, ostentando as

dimensões físicas mais generosas dentre todas as publicações consignadas à História (38 cm de largura por 25 de cumprimento, provavelmente com o propósito de mimetizar a fisionomia de nobiliários e de assentos relativos a matérias do foro genealógico). A assinatura anual custava dois escudos e setecentos. A brochura em análise dedica um espaço reduzido a este periódico, fazendo sobre ele breve apreciação, na qual destaca, genericamente e sem qualquer especificação, o respectivo valor intrínseco ou o carácter luxuoso da sua aparência física: «Publica-se em fasciculos de 16 páginas, desde 1 de Julho de 1911, sem periodicidade certa. É seu fim principal a publicação de trabalhos de Genealogia e Heraldica e também de História geral. Insere gravuras e a partir do numero 13 em todas as paginas ostenta vinhetas imitando gravura antiga em madeira. Nesta luxuosa revista, collaboraram principalmente, além dos seus directores, os senhores Luiz de Bettencourt, Jacinto de Bettencourt, Visconde de Faria, Nogueira de Brito, Mancellos Sampaio e Costa Veiga. Além do seu valor intrinseco, tem o merecimento do seu luxuoso apparato material, que os seus directores cada vez mais aperfeiçoam»213.