• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO II AS MEDIDAS ADOTADAS PELA UNIÃO EUROPEIA

5. A prestação dos Estados-Membros no decorrer da crise migratória

5.3. Segurança e proteção nas instalações de receção

De acordo com a Diretiva relativa ao acolhimento de requerentes de proteção internacional, os requerentes de asilo têm o direito de ser apoiados logo que solicitem proteção internacional. Os Estados-Membros da UE são obrigados a fornecer às pessoas que procuram proteção internacional condições materiais de acolhimento com um padrão de vida adequado, que garantam a sua subsistência e salvaguarda da sua saúde física e mental (artigo 17.º). Além disso, os Estados-Membros devem adotar medidas para evitar assaltos e violência de género, nas instalações de acolhimento (artigo 18.º).

Numa análise mais minuciosa, a Human Rights Watch declara, em 26 de outubro de 2016, que antes desta semana, cerca de 10.000 requerentes de asilo e migrantes estavam no acampamento de Calais, França, a maioria em tendas ou abrigos desprotegidos, construídos ao acaso. E uma vez iniciado o processo de despejo do acampamento, que tinha implícito a transferência dos migrantes para outros centros de acolhimento, em toda a França, onde receberam informações sobre os procedimentos de asilo, segundo a Amnistia Internacional, as autoridades não conseguiram consultar verdadeiramente os migrantes e os requerentes de asilo, ou fornecer-lhes informações

adequadas antes do despejo. Falhando no dever de os informar previamente405 (artigo 9.º,

n. º4 da Diretiva 2013/33/UE).

Relativamente às condições de receção, na particularidade da proteção contra a violência, exploração e abuso, impõe-se instalações separadas, por sexo e famílias, sistemas de cartões-chave e gravação de vídeo, para controlar entradas e movimentos nos centros de acolhimento, bem como, pessoal especialmente preparado, apoio psicológico, oficinas sobre prevenção de violência e oficiais de segurança feminino. Além disso, os requerentes de asilo, colocados em instalações de receção, são informados sobre como entrar em contacto com as autoridades responsáveis pela aplicação da lei e organizações de apoio, se necessário (por exemplo, na Áustria e na Hungria).

Apenas a Suécia preparou diretrizes sobre proteção contra a violência e exploração que, no entanto, nem sempre são implementadas. Relatos de ameaças generalizadas, violência e abuso sexual contra mulheres e meninas em diferentes centros de acolhimento ilustram isso. A Bulgária implementou procedimentos operacionais padrão para identificar violência sexual e de género. No entanto, as organizações não governamentais relataram que esses procedimentos operacionais padrão não funcionam406.

Vários incidentes de abuso infantil e de agressões sexuais foram relatados na Alemanha, onde, de maneira similar às instalações de acolhimento de Itália, não possuem medidas sistemáticas de segurança e proteção. O ombudsman independente para questões de abuso sexual infantil, registou mais de 40 casos de ofensas sexuais em campos de refugiados, desde o início de 2016, enquanto o Ministério do Interior contou 128 ataques contra mulheres e crianças em centros de acolhimento, entre janeiro e o início de setembro de 2016.

No que diz respeito aos esforços erigidos para a redução do risco de tráfico e exploração (sexual), a Cruz Vermelha búlgara ofereceu uma série de sessões de informação, com o intuito de alertar, despertar e promover a sua consciencialização.

Na Alemanha407 os centros de acolhimento coletivo e, em particular, os maiores,

são muitas vezes criticados por organizações de refugiados e outras ONGs. As instalações

405 Informação obtida na página oficial da Amnistia Internacional, op. cit. [27.05.2017].

406 Informação obtida na página oficial da Agência da União Europeia para os Direitos Fundamentais, op. cit. [17.03.2017]. 407 Informação obtida na página oficial da Base de Dados de Informações de Asilo, op. cit. [06.04.2017].

geralmente são isoladas, ou em locais remotos. E muitas instalações temporárias não cumprem os padrões básicos e não garantem privacidade. O que desencadeou sérios problemas de saúde para alguns requerentes de asilo. Por exemplo, nas instalações em que os alimentos são fornecidos, os requerentes de asilo às vezes não têm permissão para preparar seus próprios alimentos e / ou não existem instalações para cozinhar. Especialmente onde a comida é entregue sob a forma de refeições pré-embaladas.

Além das condições gerais de vida, a segurança dos residentes também pode ser uma preocupação. De acordo com as estatísticas oficiais, mais de 900 ataques às instalações de alojamento ocorreram em 2016, incluindo 66 incêndios criminosos. A maioria dos ataques são classificados como crimes de motivação racial. De acordo com estatísticas compiladas pelas ONGs, o número de ataques em 2016 foi significativamente maior do que em 2015 – 1.578 ataques em instalações, incluindo 102 incêndios criminosos. Em muitas instalações, situações de sobrelotação e falta de privacidade levam à falta de segurança, particularmente para mulheres e crianças.

Em 2016, uma associação de várias ONGs iniciou uma campanha intitulada “Escola para todos” (Schule für alle) para chamar a atenção para o facto de as crianças em muitas instalações de receção terem apenas acesso a uma escolaridade muito básica e nenhum acesso ao sistema escolar regular.

Nos centros de acolhimento, a disponibilidade limitada de profissionais de saúde e voluntários, também foi relatada como um problema, especialmente nos fins de semana. O tratamento especializado para requerentes de asilo traumatizados e vítimas de tortura, pode ser prestado por alguns médicos e terapeutas especializados e em várias instituições especializadas (Behandlungszentren für Folteropfer). Mas, uma vez que o número de lugares nos centros de tratamento é limitado, o acesso a terapias nem sempre é garantido. Os centros de tratamento muitas vezes têm que cobrir os custos de terapias com doações ou outros fundos, uma vez que geralmente são apenas parcialmente cobertas pelas autoridades. Os custos para os intérpretes, regra geral, não são reembolsados. E as grandes distâncias entre os locais de residência dos requerentes de asilo e os centros de tratamento também podem impossibilitar uma terapia eficaz.

Na Bulgária, 14 requerentes de asilo e migrantes, incluindo três menores não acompanhados, detidos, descreveram ataques de guardas, falta de alimentos adequados e

condições insalubres em, pelo menos, dois centros de detenção: Busmantsi e Elhovo. Quatro deles reportaram que experimentaram ou testemunharam comportamentos abusivos, pelos funcionários búlgaros nos centros de detenção.

A Human Rights Watch entrevistou três requerentes de asilo e migrantes que descreveram as apreensões das autoridades policiais búlgaras, perto da fronteira da Sérvia, como atos de despojo dos migrantes, das duas pertenças, e seu transporte até às estações de polícia, durante 24 horas, muitas vezes sem água nem comida408.

Os migrantes comunicaram, inclusivamente que as expulsões para a Turquia, em 46 dos 59 casos, envolveram comportamentos abusivos e violentos, incluindo pancadas com punhos e bastões, pontapés e mordeduras de cães. Em todos os casos, exceto um, os requerentes de asilo e os migrantes reportaram à Human Rights Watch que as autoridades oficiais búlgaras os procuraram e levaram o seu dinheiro, telefones, alimentos, bebidas e outros itens.

Embora a Bulgária tenha o direito de garantir a sua fronteira, sob padrões universais incorporados nos Princípios Básicos Sobre a Utilização da Força E De Armas De Fogo Pelos Funcionários Responsáveis Pela Aplicação da Lei409, estes, incluindo os agentes da

fronteira, apenas podem recorrer à força quando os meios não-violentos tenham sido ineficazes. Qualquer uso da força deve ser proporcional e minimizar danos e lesões (ver n.º 4 e n.º 5 dos Princípios Básicos).

Desde 2016, um grande número de requerentes de asilo, principalmente da Chechénia, mas também do Tajiquistão e da Geórgia, tentou solicitar asilo na Polónia, na fronteira com a Bielorrússia. Porém, a Human Rights Watch no dia 1 de março de 2017 denunciou que as autoridades polacas negam rotineiramente o direito de requerer asilo, expulsando os referidos migrantes para a Bielorrússia410.

Os grupos locais de direitos humanos na Polónia e na Bielorrússia declararam que os retornos sumários acontecem há anos, mas que os números aumentaram significativamente em 2016. Uma inspeção, de agosto de 2016, da estação fronteiriça de

408 Informação obtida na página oficia da Human Rigths Watch, op. cit. [03.03.2017].

409Informação obtida na página oficial do Gabinete de Documentação e Direito Comparado, http://direitoshumanos.gddc.pt [07.04.2017].

Terespol, feita pelo Comissário dos Direitos Humanos da Polónia, cujo relatório foi publicado em setembro, mostrou que as entrevistas das autoridades de fronteira não identificaram adequadamente os requerentes de asilo. Num relatório, de novembro de 2016, da Polish Helsinki Foundation for Human Rights, descobriu-se que este Estado- Membro rejeitou sumariamente os requerentes de asilo na estação fronteiriça de Terespol, expulsando as pessoas em questão para a Bielorrússia411. Em fevereiro de 2017, ambos

os grupos confirmaram que as recusas de requerimentos de asilo e os retornos sumários estão em andamento.

De acordo com a lei polaca412, o Gabinete de Estrangeiros, autoridade de asilo da

Polónia, é responsável por decidir sobre os pedidos de asilo, não os Serviços de Guarda de Fronteiras. Contudo, na prática, os requerentes de asilo na fronteira entre a Polónia e a Bielorrússia relataram que os guardas de fronteira realizaram entrevistas superficiais, durante dois a dez minutos e, em seguida, recusaram a grande maioria do acesso ao procedimento de asilo.

No início de dezembro de 2016, a Human Rights Watch entrevistou 29 requerentes de asilo que tentaram, sem sucesso, entrar na Polónia. Todos os entrevistados disseram que tentaram explicar às autoridades polacas a sua intenção de procurar proteção, durante as entrevistas na estação fronteiriça de Terespol. Dois comunicaram que tentaram mais de 40 vezes e um deles comunicou que tentou 50 vezes, mas foi recusado sempre. Treze dos entrevistados disseram também que as autoridades da fronteira os humilharam.

A prática polaca dos guardas de fronteira, de negar rotineiramente o acesso das pessoas ao procedimento de asilo, viola o direito de asilo e cria um risco de refoulement, na medida em que a Polónia devolve requerentes de asilo a um hipotético país terceiro seguro que, de seguida, devolve os requerentes a um país inseguro, contrariamente ao direito internacional dos refugiados. Segundo a Human Rights Watch, os requerentes de asilo do Cáucaso do Norte e do Tajiquistão estão expostos ao risco de serem devolvidos, pelas autoridades bielorrussas, à perseguição na Rússia ou no Tajiquistão, em virtude da negação do acesso ao procedimento de asilo na Polónia.

411 Informação obtida na página oficial da Polish Helsinki Foundation for Human Rights, http://www.hfhr.pl [13.04.2017] 412 Lei de 12de dezembro de 2013, sobre Estrangeiros, v. http://www.asylumlawdatabase.eu.

Em 2016 a taxa de reconhecimento da Polónia para os requerentes de asilo da Rússia (incluindo os chechenos) foi de 5,6% e para os requerentes do Tajiquistão, 10,5% – comparativamente com a média, entre os 28 Estados-Membros da UE, de 19 % de reconhecimento para os requerentes de asilo da Rússia e 27,5% para os do Tajiquistão413.

Em fevereiro de 2017 o Ministério do Interior da Polónia publicou um projeto de alteração à lei de asilo do país que facilitaria os procedimentos acelerados de asilo e a destituição sumária de pessoas que solicitam asilo na fronteira.

A maioria dos requerentes de asilo entrevistados descreveu o processo de entrevista como acelerado e sem privacidade. Declararam que os funcionários pareciam desinteressados, ou agiam como se o resultado da entrevista estivesse predeterminado. Comunicaram, inclusive, que algumas das perguntas não se relacionavam com o receio de perseguição nos seus países de origem. E diversos descreveram um tratamento humilhante, expondo que os funcionários polacos gritaram com eles, abordaram-nos de forma depreciativa, rasgaram os documentos que os requerentes de asilo apresentaram para sustentar suas reivindicações de perseguição ou atiraram os passaportes aos seus rostos.

Nenhum dos requerentes de asilo entrevistados recorreu das rejeições. Para recorrer, o candidato a asilo deveria estar no território polaco, ou nomear um representante na Polónia, o que é difícil sem contactos neste país.

A Polónia tem o direito de se recusar a admitir migrantes irregulares sem necessidade de proteção internacional. Mas os procedimentos na fronteira de Terespol violam as obrigações deste Estado-Membro, de acordo com a legislação da UE e a prática internacional padrão de direito internacional dos refugiados, nos termos da qual, qualquer expressão de intenção de solicitar asilo deve ser imediatamente encaminhada às autoridades competentes para avaliação, com base em motivos individuais.

A 26 de julho de 2017 a Comissão Europeia enviou pareceres fundamentados à República Checa, à Hungria e à Polónia por incumprimento das suas obrigações legais em matéria de recolocação414. Apesar dos repetidos pedidos da Comissão para que

413 Informação obtida na página oficial da Human Rights Watch, op. cit. [13.04.2017].

414 O parecer fundamentado é a segunda fase do processo por infração, e consiste num pedido formal para o cumprimento do direito da União Europeia, no qual os Estados-Membros são convidados a informar a Comissão, dentro de um prazo estipulado, das medidas tomadas para o efeito. Na ausência de resposta, ou caso as observações apresentadas nas respostas sejam insatisfatórias, a Comissão

adotassem medidas, e da instauração de processos por infração em junho, os Estados- Membros em causa continuam a não cumprir as suas obrigações legais, ignorando os compromissos assumidos para com a Grécia e Itália (e restantes Estados-Membros, por reflexo).

De acordo com as decisões do Conselho, os Estados-Membros devem disponibilizar, de três em três meses, lugares para recolocação, com a finalidade de garantir um procedimento de recolocação rápido e ordenado. Contudo, segundo a Comissão Europeia, a Hungria não tomou qualquer medida, desde que o regime de recolocação foi instaurado e a Polónia não procedeu a qualquer recolocação, nem assumiu qualquer compromisso desde dezembro de 2015. A República Checa não procede a recolocações desde agosto de 2016 e não assume novos compromissos há mais de um ano415.